No palco da vida, cada músico escreve sua própria sinfonia. Para muitos, seu caminho na música também cruza com o da Marinha do Brasil (MB), onde disciplina e talento formam a base de uma trajetória transformadora. A Força Naval mantém diversas bandas musicais, tradição cuja história teve início com a chegada da Família Real ao Rio de Janeiro trazendo consigo a Banda da Brigada Real da Marinha Portuguesa, composta, na época, por 60 músicos. Em 1968, sua sucessora, a Banda Marcial do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), já contava com 170 componentes, tornando-se a maior banda marcial militar e, também, a maior banda de gaitas escocesas do mundo.

Outra banda naval muito conhecida é a Banda Sinfônica, também do CFN. É nela que toca a requintista e Terceiro-Sargento (Fuzileiro Naval - Músico) Monique Norberto Leite. Aos 23 anos, a Terceiro-Sargento (FN-MU) Monique é a prova de que música e superação andam lado a lado. O clarinete, instrumento que abraçou aos 12 anos, foi seu refúgio em meio às dificuldades. Influenciada pelo tio saxofonista, queria tocar saxofone, no início. "Minha mãe sempre gostou muito de clarinete, então comecei por ele. Me apaixonei pelo instrumento", explica. "Só que, perto dessa época, minha mãe teve câncer. A música para mim foi um escape, estudava por horas e aquilo me animava". Para ela, a música tem esse poder: tocar as pessoas.

"Minha mãe dizia: 'Filha, estuda, porque é o seu futuro'. E foi isso que me guiou". Mesmo tendo que ajudar a mãe desde pequena, a agora Terceiro-Sargento conta que continuou estudando, mesmo com dificuldade. "Foi um processo bem difícil. Durante o meu ensino médio, tive que começar a trabalhar para ajudar mais em casa. Comecei trabalhando com o meu tio no estúdio de música, operando mesa de som, coisas assim. Depois de um tempo, percebi que precisava parar para estudar devido ao meu futuro – sabia que minha mãe dependeria de mim, assim como  o meu irmão, que é seis anos mais novo. Tentei o concurso (de Sargento Fuzileiro Naval Músico) três vezes. Foi no terceiro ano, em 2022, com muito esforço e fé, que finalmente passei", detalha. Monique conta que até os vizinhos ficaram felizes quando ela foi aprovada. "Eles não me aguentavam mais tocando por muitas e muitas horas para estudar", brinca.

O curso de formação militar foi um desafio à parte. Acostumada às partituras, Monique teve que aprender a marchar, usar armamentos e se adaptar à rígida rotina física, durante o curso realizado no Centro de Instrução Almirante Sylvio de Camargo (CIASC), no Rio de Janeiro. "A parte mais difícil para mim foi a corrida e a dica que dou para quem quer fazer a prova é manter a calma, a respiração e treinar. Treinar, treinar e treinar. Tive um professor que dizia que 'para um resultado eficaz é necessário praticar”, explica.

A carioca, que nunca havia saído do Rio de Janeiro, conta que a primeira vez que "tirou o pé da cidade" foi em uma apresentação, já na Marinha. "A gente foi para Cabedelo (PB) e Recife (PE)", conta. Mas, para ela, a apresentação mais emocionante, até o momento, foi no Theatro Municipal da cidade natal, neste ano. “Chamei a minha família toda para ver o teatro, para me ver tocando (...) Foi a primeira vez que eles me viram realmente atuando na minha profissão, tocando em uma banda, foi muito emocionante. Aquilo representou tudo o que lutei para conquistar”.

Sobre essas conquistas, a Sargento Monique finaliza destacando que, quando passou para Marinha, conseguiu passar a ajudar financeiramente a casa. "Passar nessa prova, nesse concurso, proporcionou uma vida melhor não só para mim, mas também para a minha família. Ser músico fora é difícil, mas na Marinha temos estabilidade e a chance de crescer”, conclui.

A Marinha e a Música: Um destino compartilhado

A Banda Sinfônica da Marinha conta, em cada música, inúmeras histórias de vida diferentes. É nela, também, que toca o fagotista e Terceiro-Sargento (FN-MU) Pedro Henrique Ramalho Martins, de 25 anos. Sua trajetória é uma prova de que talento, dedicação e apoio familiar podem transformar vidas. Natural de uma família sem vínculos com a música, o militar começou sua jornada musical aos 11 anos, tocando clarineta em uma igreja. “A Igreja foi minha base. Foi onde aprendi tudo e comecei do zero”, conta. Foi esse ambiente que despertou nele o amor pela música, sempre com o apoio incondicional da mãe.

Aos 16 anos, um convite inesperado mudou o rumo de sua vida: um professor enxergou potencial no agora Terceiro-Sargento Ramalho e falou sobre a chance de estudar fagote, um instrumento raro e caro, com apoio de um outro professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Eu não sabia nada sobre o fagote, mas aceitei o desafio. Era uma oportunidade única”, relembra. Sua dedicação logo o levou à graduação em música pela UFRJ, mesmo enfrentando dificuldades financeiras, dividindo uma kitnet com a mãe, ambos desempregados, e sobrevivendo com bolsas de estudo.

A entrada na Marinha, aos 22 anos, representou um divisor de águas. O ingresso como músico na Força não é apenas sobre tocar um instrumento; é sobre tornar-se militar, superar limites e descobrir novos horizontes. O curso de formação alia conhecimento musical e treinamento militar. "Aprendemos hierarquia, disciplina, regulamentos e ordem unida. Depois, nos aperfeiçoamos na música. É desafiador, mas gratificante". Ramalho destaca que o processo é intenso, incluindo provas teóricas, práticas, testes físicos e avaliações psicológicas.

A rotina na Banda é intensa, com apresentações quase diárias e turnês pelo País, como a que percorreu o Nordeste e o Espírito Santo, em 2023. O Sargento destaca que viveu momentos memoráveis nos últimos anos, como tocar na icônica Sala São Paulo, uma das mais modernas e bem equipadas salas de concerto do mundo, localizada na capital paulista. O concerto inédito, que ocorreu no Dia do Marinheiro do ano passado, foi uma experiência que ele descreve como um sonho realizado.

“Para mim, era um sonho muito distante, só queria estar na plateia. Todo músico sonha em estar ali. E eu tive a honra de tocar no palco, com meu fagote. (...) Lembro o dia que entrei pela primeira vez na Sala e fiquei observando cada detalhe igual criança”, conta. “Me deu orgulho das horas estudadas, de ver que todo o meu esforço está gerando resultados. Aquele dia foi incrível. Sinto-me honrado e grato por saber que todo meu sustento vem da música e que a Marinha me deu essa oportunidade”, finaliza. O futuro reserva ainda mais realizações para o jovem fagotista, que planeja concluir os dois últimos semestres da graduação e continuar a inspirar outros músicos com sua história de superação e amor à música.

Dia do Músico

No Brasil, o Dia do Músico é comemorado em 22 de novembro, data que homenageia Santa Cecília – padroeira dos músicos e da música sacra. A celebração reconhece o papel destes profissionais na cultura, na educação e para a identidade nacional. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), há mais de 200 mil músicos no País, atuando em diferentes segmentos – como bandas sinfônicas, orquestras e na própria indústria fonográfica.

Na Marinha do Brasil, a música também ocupa um lugar especial. As bandas de música são uma tradição secular, participando de cerimônias,  contribuindo em eventos culturais, projetos sociais e turnês, promovendo ações de integração com a sociedade e atuando como instrumentos de diplomacia cultural, ao levar a música brasileira para diversos cantos do Brasil e do mundo, inspirando novas gerações. A Força Naval mantém várias bandas. O Corpo de Fuzileiros Navais, por exemplo, possui a Companhia de Bandas do Batalhão Naval, responsável por conjuntos como a Banda Sinfônica, em que tocam os Sargentos (FN-MU) Ramalho e Monique, e a Banda Marcial. Além delas e de outras bandas do próprio CFN, a Marinha também conta com outras bandas, como as dos diversos Distritos Navais e das Escolas de formação, como as da Escola Naval e do Colégio Naval.

Além do prestígio artístico, as bandas militares desempenham um papel educativo, recebendo escolas e comunidades para conhecerem o trabalho dos musicistas e o universo das Forças Armadas. Essas ações são fundamentais para despertar o interesse pela música, especialmente em um País onde o acesso a instrumentos e formação musical ainda é limitado.

A data, portanto, é uma oportunidade não apenas para celebrar os talentos que emocionam e inspiram, mas também para refletir sobre os desafios da profissão no Brasil. Seja no grandioso palco da Sala São Paulo ou em eventos comunitários, músicos como os da Marinha demonstram que a arte é um elo entre culturas, gerações e histórias.

Concursos em 2025

Para quem deseja seguir a carreira naval, em 2025 estão previstas diversas oportunidades  de ingresso na Marinha do Brasil. Entre concursos e processos seletivos, são mais de 20 portas de entrada. As seleções são voltadas para brasileiros de ambos os sexos, natos ou naturalizados, com idades entre 15 e 62 anos na data da incorporação. As vagas previstas englobam nível fundamental, médio, médio técnico ou superior, e atendem tanto aqueles que pretendem seguir a carreira até aqueles que desejam atuar temporariamente, ingressando pelo processo seletivo para o Serviço Militar Voluntário (SMV).

Os candidatos que desejam ingressar como Sargento Fuzileiro Naval Músico devem ter 18 anos completos e menos de 25 anos no dia 30 de junho do ano do curso, além de terem concluído ou estarem em fase de conclusão do Ensino Médio, ou curso equivalente, desde que em estabelecimento reconhecido oficialmente. Os concorrentes passarão por um Exame de Escolaridade constituído por uma Prova Específica de Música e por uma Prova de Expressão Escrita. Os candidatos aprovados na primeira etapa serão convocados para a Prova Prática de Música. O edital do último concurso foi publicado em fevereiro e a prova realizada em julho deste ano.

Imagem de Capa* :  SG Varejão/Marinha do Brasil

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