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GLUT 1

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O transportador de glicose 1 (ou GLUT1) é uma proteína de membrana composta por 492 resíduos de aminoácidos, a qual é codificada nos humanos pelo gene SLC2A1.[1] O GLUT1 faz a captação basal de glicose, por meio de difusão facilitada, através da membrana plasmática de células animais, sempre a favor do gradiente de concentração.[2] Tem como substratos predominantes a D-glicose, D-galactose, D-manose e L-glicose. Pode ainda ser inibido por meio da citocalasina B e da Phloretina.[3]

Estrutura proteica

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No plasma sanguíneo, onde a concentração de glicose se mantém perto de 5mM, o fornecimento constante da mesma é essencial para o metabolismo energético dos glóbulos vermelhos. Comparando com uma difusão transmembrana não-catalisada, a glicose entra no eritrócito numa taxa 50.000 vezes maior por meio de difusão facilitada graças a um transportador-específico. O GLUT1 é uma proteína integral do tipo III que contém 12 segmentos hidrofóbicos. Esses, por sua vez, formam uma conformação secundária de alfa-hélice. Os detalhes da estrutura do GLUT1 ainda são pouco elucidados, mas um modelo plausível propõe que o agrupamento lado a lado dessas alfa-hélices produz um canal iônico transmembrana alinhado com resíduos hidrofílicos, os quais podem se ligar por meio de pontes de hidrogênio com a glicose enquanto a mesma atravessa esse canal.[4]

O GLUT1 tem papel crucial na absorção da glicose cerebral, pois é o principal isoforma GLUT expressada nas células endoteliais do cérebro. Sob condições fisiológicas normais, o cérebro é dependente da glicose como combustível, e o transporte por meio da barreira sangue-cérebro age como um limitador da taxa de metabolismo cerebral da glicose. O GLUT1 também é expressado por astrócitos, os quais possivelmente fornecem lactato derivado da via glicolítica para os neurônios para servir como fonte de combustível. O transportador de glicose (GLUT1) realiza a mediação da transferência materno-placental de glicose em humanos e os níveis de GLUT1 placental são alterados sob condições patológicas que afetam o feto.[5]

Distribuição nos tecidos

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Responsável pela manutenção do nível basal de glicose na célula, o GLUT 1 está amplamente difundido pelo corpo, sendo que sua presença é mais acentuada em tecidos fetais e ao longo do período da infância (por estar relacionado ao crescimento do cérebro), apresentando aumento de expressão em quadros de hipoglicemia. Nesse caso, o transporte de glicose não é limitado pelo metabolismo da mesma e ocorre independentemente da presença de insulina.[6] A expressão se dá principalmente na membrana de eritrócitos humanos e células endoteliais com junções extremamente fortes, que desempenham função de barreira protetora entre o sangue e o cérebro, retina, placenta ou testículos. Apesar de apresentar uma constante de Michaelis (mM) variando entre 1 e 7 mM, está em alta concentração na membrana plasmática, representando cerca de 5% de todas as proteínas existentes nesse meio e promovendo uma estabilização rápida do nível de glicose celular.[7]

Importância clínica

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Distúrbios associados à deficiência em GLUT1

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O gene SLC2A1 é responsável por coordenar a produção da proteína transportadora de glicose tipo 1 (GLUT 1). Essa proteína atua na membrana externa das células, onde irá carregar o açúcar (glicose) para ser utilizado como combustível, principalmente no cérebro. Mutações ocorridas no gene SLC2A1 causam a síndrome de deficiência de GLUT1, na qual haverá redução ou eliminação da função da proteína transportadora. Sendo assim, a quantidade de glicose disponível diminui, afetando as células cerebrais e, consequentemente, a atividade do sistema nervoso.

Os principais sintomas associados a essa síndrome são neurológicos. É comum a presença de convulsões frequentes logo nos primeiros meses de vida, juntamente com movimentos oculares involuntários, rápidos e irregulares. Os indivíduos afetados podem ainda apresentar atraso no desenvolvimento ou deficiência intelectual. Entre outros sintomas pode-se citar o enrijecimento anormal dos músculos, dificuldade em coordenar movimentos e dificuldades na fala. A síndrome possui diferentes níveis de gravidade, podendo ser uma forma mais branda – caso em que não há convulsões.

A síndrome de deficiência de GLUT1 é uma doença rara, possuindo um padrão de herança autossômico dominante na maioria dos casos.[8] O tratamento consiste em uma dieta cetogênica, sendo ela restrita em carboidratos, adequada em proteínas e rica em lipídeos, o que irá induzir a produção de corpos cetônicos. Essas substâncias são capazes de adentrar nas células cerebrais através de um transportador específico e irão servir como fonte de energia alternativa, uma vez que não há glicose disponível. [9]

GLUT1 em situações de hipóxia e/ou isquemia

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Sabe-se que a proteína transportadora de glicose tipo 1 (GLUT 1) apresenta um modelo conformacional com 12 domínios transmembranares com terminais amina e carboxílicos citosólicos. Também possui três domínios de ligação a ATP, os quais são de extrema importância para sua conformação e afinidade já que a glicose é retida por esses domínios após a ligação de ATP nos mesmos. Além disso, o GLUT1 é dependente de pH para sua ativação, o que pode, então, influenciar na atividade dessa proteína.[10] Dessa forma, pode-se relacionar a baixa quantidade de ATP com a ativação do GLUT1. Nesse processo, a baixa quantidade de ATP pode causar hipóxia e/ou isquemia, levando as células a uma intensa atividade glicolítica anaeróbica e, consequentemente, reduzindo o pH citosólico. Com o meio mais ácido, a atividade da GLUT1 pode ser intensificada, gerando então um incremento dessa proteína próxima a regiões afetadas.[11]

Redução de GLUT1 e Alzheimer

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A doença de Alzheimer é caracterizada por distúrbios metabólicos e desordem neurodegenerativa progressiva, o que causa comprometimento cognitivo e demência nos pacientes, os quais são, em sua maioria, idosos. Em casos de doenças cerebrais como essa, observam-se anormalidades no metabolismo da glicose cerebral. A proteína responsável pela atividade transportadora de glicose para o cérebro é a GLUT1 (proteína transportadora de glicose tipo 1), a qual está presente na barreira hematoencefálica. [12] Os efeitos causados pela doença de Alzheimer podem comprometer a regulação neurovascular e a integridade da barreira hematoencefálica, afetando assim a expressão de transportadores de glicose, os quais ficam reduzidos. Dessa forma, o cérebro não recebe a quantidade necessária de glicose (sua principal fonte de energia), podendo contribuir para a progressão da doença. [13]

GLUT1 e câncer

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O transportador GLUT1 apresenta um papel, ainda não elucidado, na formação tumoral.[10] Sua expressão é encontrada alterada em diversos tipos de cânceres, como: de mama, do esôfago, do cérebro, do rim, do pulmão, do cólon, do reto, do ovário e do colo do útero.[14] Essas alterações ocorrem de forma a fornecer à célula neoplásica a glicose requerida pelo seu elevado metabolismo. Além disso, estudos sugerem a existência de um mecanismo pró-carcinogênico por trás desses elevados níveis de expressão e uma ligação entre a expressão de GLUT-1 e a resistência à quimioterapia.[15][16][17]

Por conta disso, a inibição desse transportador vem sendo estudada como possível alvo terapêutico para tumores primários do fígado, por meio de de inibidores competitivos deste transportador, como a quercetina e o gossipol, e também à inibição gênica do mesmo.[10]

  1. Mueckler M, Caruso C, Baldwin SA, Panico M, Blench I, Morris HR, Allard WJ, Lienhard GE, Lodish HF (September 1985). Sequence and structure of a human glucose transporter. Science. 229 (4717): 941–5
  2. Olson AL, Pessin JE (1996). Structure, function, and regulation of the mammalian facilitative glucose transporter gene family. Annual Review of Nutrition. 16: 235–56
  3. Salas-Burgos A, Iserovich P, Zuniga F, Vera JC, Fischbarg J (2004) Predicting the Three-Dimensional Structure of the Human Facilitative Glucose Transporter Glut1 by a Novel Evolutionary Homology Strategy: Insights on the Molecular Mechanism of Substrate Migration, and Binding Sites for Glucose and Inhibitory Molecules. Biophysical Journal. 87: 2990-2999
  4. Nelson DL, Cox MM (2014) Princípios de Bioquímica de Lehninger. 6ª Ed. Artmed, p. 405
  5. Zheng PP, Romme E, van der Spek PJ, Dirven CM, Williemsen R, Kros JM (Dezembro 2010) “Glut1/SLC2A1 is crucial for the development of the blood-brain barrier in vivo.” Ann Neurol 68; 835-844
  6. [1], Transportadores de glicose: tecidos dependentes e independentes de insulina
  7. Smith C, Marks AD, Lieberman M. Basic Biomedical Chemistry: A Clinical Approach, p. 505-507, Lippincott Williams & Wilkins
  8. https://ghr.nlm.nih.gov/condition/glut1-deficiency-syndrome#sourcesforpage
  9. http://epilepsia.org.br/artigo/dieta-cetogenica/
  10. a b c https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/26775/3/TD%20Ana%20Brito.pdf
  11. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4734893/
  12. https://www.nature.com/articles/s41598-017-17718-y
  13. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27858715
  14. Macheda, M. L., Rogers, S., & Best, J. D. (2005). Molecular and cellular regulation of glucose transporter (GLUT) proteins in cancer. Journal of Cellular Physiology, 202(3), 654–62.
  15. Amann, T., & Hellerbrand, C. (2009). GLUT1 as a therapeutic target in hepatocellular carcinoma. Expert Opinion on Therapeutic Targets, 13(12), 1411–27.
  16. Amann, T., Maegdefrau, U., Hartmann, A., Agaimy, A., Marienhagen, J., Weiss, T. S., Stoeltzing, O., Warnecke, C., Scholmerich, J., Oefner, P.J., Kreutz, M., Bosserhff, A.K., & Hellerbrand, C. (2009). GLUT1 expression is increased in hepatocellular carcinoma and promotes tumorigenesis. The American Journal of Pathology, 174(4), 1544–52.
  17. Evans, A., Bates, V., Troy, H., Hewitt, S., Holbeck, S., Chung, Y. L., Phillips, R., Stubbs, M., Griffiths, J., & Airley, R. (2008). Glut-1 as a therapeutic target: increased chemoresistance and HIF-1-independent link with cell turnover is revealed through COMPARE analysis and metabolomic studies. Cancer Chemotherapy and Pharmacology, 61(3), 377–93.