As dez seleções sul-americanas participantes das eliminatórias foram divididas em três grupos, A, B e C. O grupo B, no qual a seleção brasileira ficou, contava com quatro equipes, enquanto os demais contavam com três.
O Brasil foi treinado por João Saldanha. Estreou ganhando de 2 a 0 da Colômbia no Estádio El Campín em Bogotá. Jairzinho para Tostão. 1 a 0. Pelé para Tostão. 2 a 0. [2] Brasil 5 a 0 na Venezuela em Caracas. Todos os gols ocorreram no segundo tempo. Jairzinho chutou prensado, Tostão pegou o rebote, driblou dois e marcou. 1 a 0. Pelé em jogada individual. 2 a 0. Chute de Gerson, o goleiro deu rebote e Tostão conferiu. 3 a 0. Carlos Alberto cruzou e Tostão desviou. 4 a 0. Pelé tabelou com Tostão. 5 a 0. [3] Por fim, o Brasil fechou o primeiro turno com outra goleada fora de casa, 3 a 0 no Paraguai. A seleção reclamou que os paraguaios tocaram fogos e buzinas no hotel na madrugada antes do jogo. Edu cruzou e Mendonza fez contra. 1 a 0. Pelé para Jairzinho. 2 a 0. Tostão lançou Edu. 3 a 0. [4]
No returno, o Brasil venceu a Colômbia 6 a 2. Pelé para Tostão. 1 a 0. Mesa roubou de Gerson e empatou. 1 a 1. Pelé cruzou, Segóvia dominou, mas deixou escapar e Tostão roubou o couro e chutou de canhota. 2 a 1. Jairzinho sofreu falta e Edu guardou. 3 a 1. Piazza lançou Pelé. 4 a 1. Paulo Cesar serviu Rivellino. 5 a 1. Tostão para Jairzinho. 6 a 1. Gallego de fora da área. 6 a 2. [5] Brasil 6 a 0 na Venezuela. Pelé para Tostão. 1 a 0. Pelé chutou, o goleiro espalmou e Tostão. 2 a 0. Gerson lançou Tostão, que driblou de forma sensacional Sanchez e marcou. 3 a 0. Edu chutou e Jairzinho pegou o rebote. 4 a 0. Penalti em Tostão, Pelé cobrou e fez. 5 a 0. Pelé tabelou com Tostão. 6 a 0. [6] No último jogo, 1 a 0 no Paraguai. Edu chutou, o goleiro desviou e Pelé entrou rasgando. [7]
O técnico João Saldanha perdeu o cargo depois das eliminatórias. Uma das versões dá conta de que foi a briga com o general Emílio Garrastazu Médici, que queria ver o jogador Dadá Maravilha na seleção, que custou o emprego de Saldanha. Armando Nogueira noticiou no Jornal do Brasil que o presidente Médici era fã de Dadá e queria vê-lo na seleção. Saldanha respondeu, via imprensa, ao presidente: "Nem eu escalo ministério e nem o presidente escala time". [8] Outra versão dá conta que o desafeto de Saldanha, o treinador do Flamengo Dorival Knipel foi o motivo da demissão. Dias depois de garantir vaga na Copa, a seleção brasileira foi derrotada por 2 a 1 pela seleção mineira treinada por Dorival Knipel, que mandou seu time dar uma volta olímpica no Mineirão. Knipel foi contratado pelo Flamengo. Saldanha invadiu a concentração do time rubro-negro com uma arma para tirar satisfação, Knipel não estava no local, mas o caso gerou uma repercussão negativa.[9] Logo depois, em jogo treino no sábado, o Brasil empatou com o Bangu dirigida por Flávio Costa. Saldanha foi demitido na terça-feira e Zagallo assumiu na quinta-feira. [10]
O relacionamento entre Pelé e o técnico João Saldanha foi bastante conturbado. Saldanha queria que Pelé jogasse mais adiantado, como centroavante. Em entrevista na época, Pelé afirmou que não poderia, após tanto tempo jogando de uma forma, mudar sua maneira de jogar "de uma hora para outra".[11] Pelé jogava atrás de um centroavante como meia-atacante. Foi Vavá, nos bicampeonatos de 1958 e 1962. O treinador falava que Pelé estava míope para jogar, na época, Pelé respondeu: "Eu achei que foi talvez até de maldade da parte dele, mas ele teria que se apegar a alguma coisa, teria que justificar". Em documentário da Netflix em 2021, Pelé recordou: "Particularmente, se você perguntar para mim: ‘Ele entendia muito de futebol?’ Eu vou dizer: ’Ele não entendia muito de futebol’. Nós, jogadores, tentávamos argumentar: ‘João, vamos ver se a gente faz assim ou assim…”. Ele reagia: ‘Mas o treinador sou eu’. Insistíamos: ‘Vamos conversar, vamos conversar, porque tinha muitas decisões que a gente via que não ia dar certo’."[12]
Ao assumir, Zagallo declarou que Pelé e Tostão eram incompatíveis: "Nesse esquema que armei não posso escalar dois pontas de lança com as mesmas características. Tenho que ter pelo menos um jogador brigão dentro da área adversária, para finalizar as jogadas trabalhadas pelos outros. Por isso, não posso escalar Tostão e Pelé no mesmo time". Com o resultado dos amistosos, Zagallo reviu sua estratégia e Tostão voltou a ser o Falso 9. Uma inovação foi a colocação do centromédio de Saldanha, Wilson Piazza, como zagueiro. Tostão: "Zagallo recuou o volante Piazza para ser zagueiro e melhorar o passe da defesa, já que o reserva Fontana só dava chutões.".[13] O ponta esquerda Edu perdeu a posição para o meia esquerda Roberto Rivellino. Segundo Edu: "“Saiu o Saldanha, eu soube da chegada do novo treinador. Eu não cito muito o nome dele. Nós estamos reunidos no salão, o Rivellino do meu lado e eu falei: ‘Riva, eu não jogo mais, estou sentindo que não vou jogar mais. Ele só jogava assim, vai querer alguém que jogava da mesma maneira”. Ali, eu já senti que não ia jogar, porque ele não queria um ponta ofensivo. Queria alguém que pudesse compor o meio de campo, e eu não era muito de fazer isso. Eu ia até o meio de campo e aproveitava os contra-ataques, foi assim nas eliminatórias. Então, eu sabia.". [14]
Jogador mais jovem do elenco do Brasil, com apenas 19 anos, Marco Antônio Feliciano foi para o banco com Zagallo. Gérson e Carlos Alberto Torres disseram que Marco Antonio estava muito nervoso para ser titular da seleção brasileira. Segundo Marco Antônio Feliciano: "Um dia antes de eu ser sacado, estava eu e o Félix no quarto, ele fumava, eu também fumava, aí o Félix levantou, deve ser uma 19h da noite, eles tinha programado uma reunião, Félix, Brito, Carlos Alberto e Gérson, reunião com o Zagallo, eu falei, "eu também vou", e o Félix "não vai não", era o meu saque.".[15]Marco Antônio Feliciano negou que "tremeu": "O Everaldo não jogou porque era melhor do que eu. Na realidade, tínhamos um time muito ofensivo e uma defesa 'inventada' (o volante Piazza foi recuado para a zaga). Havia a necessidade de um lateral mais marcador. Eu atacava muito mais que o Everaldo, e ele marcava melhor do que eu. Por isso ele acabou como titular e eu como um reserva de luxo".[16] Segundo Gérson, Marco Antônio Feliciano se machucou e entrou o Everaldo e "deu certo". Gérson: "Isso tudo tem que ser discutido com todo mundo. Porque todo mundo ali é jogador. Quem tá dentro e quem tá fora. Todo mundo é jogador. Então você tem que discutir. Sua voz é forte, que vai ser analisada, que vai ser discutida. E se for a verdade, é essa a a verdade.".[17]
Reportagem da revista “Placar”, dizia que Pelé, Tostão, Gérson, Rivellino e Clodoaldo definiram que o tridente ofensivo teria Pelé pelo meio e Tostão pela ponta-esquerda, mas jamais fixos; o meio de campo teria Clodoaldo, Gérson e Rivellino. O volante Piazza se transformou em quarto zagueiro. Ele passaria a atuar ao lado de Brito. Joel Camargo, Roberto e Caju viraram reservas. Porém jamais os jogadores confirmaram o encontro. Clodoaldo negou que participou de um encontro para pensar no time.[18]
Zagallo afirmou que os mais de dois meses de trabalho dele com a Seleção tinham produzido uma drástica mudança tática na equipe: "Houve uma mudança total no esquema. O 4-2-4 está superado e ninguém joga assim no futebol moderno. Não pode ser jogada uma Copa do Mundo com o 4-2-4. (...) Tive que sacrificar o Edu na escalação da Seleção. Precisava de um meio-campista no time. Alguém que dê combate e diminua o espaço do adversário também. Não é característica do Edu. O Rivellino aprendeu a fazer isso".[19]
Quase 20 dias antes da estreia brasileira na Copa de 1970, Pelé deu uma entrevista aoCorreio da Manhã dizendo que a seleção daquele Mundial era superior ao esquadrão bicampeão. As únicas posições em que ele confessava ter dúvida eram as de defesas.[20]
Dois preparadores físicos da comissão técnica seriam treinadores do Brasil em futuras Copas do Mundo: Carlos Alberto Parreira e Cláudio Coutinho. Lamartine DaCosta, oficial da Marinha brasileira, desenhou o modelo de preparação que previa isolamento em cidades mais altas, menos bola e mais testes físicos. "Foram três semanas em Guanajuato. Foi um problemaço na época. Era pancada todo dia. Os jogadores não gostaram, a mídia também não. E ninguém sabia qual ia ser a reação do Zagallo, se ele ia concordar ou não. Mas Coutinho, Chirol e Parreira, que era mais novo, já era daquela comissão técnica, conseguiram convencê-lo. Não adiantava ter uma grande equipe se ia perder na preparação física."[21]
A apresentação dos jogadores em 1970 ocorreu em 12 de fevereiro de 1970, quase quatro meses antes da estreia contra a Tchecoslováquia em 3 de junho, em Guadalajara. Foram 92 dias de treinamento e 19 de folgas entre o Rio, Guadalajara e Guanajuato, a 350 km da sede principal do time no México e a mais de 2 mil metros de altitude. "A CBD contratou um dos maiores especialistas em esporte na altitude na época, um argentino. E ele disse que a única maneira de estar adaptado na Copa era ir pro local dos jogos de 20 a 30 dias antes. Foi o que fizemos, Guanajuato não tinha nada na época, hoje cresceu. Ficamos em uma estância. Não era nem um hotel, e deu certo".[22]
Foi João Saldanha quem visitou o México e escolheu a cidade de Guanajuato, que tinha altitude compatível com as partidas que o Brasil disputaria, o que serviria para condicionar melhor os atletas.[21]
Segundo Lamartine: "Os mexicanos têm experiência de 100 anos nisso, nessa preparação na altitude. É para Guanajuato que mandam tuberculosos, por exemplo. Ia ter menos bola e mais treino físico de longa distância. Parecia atletismo. Coutinho trouxe o método do Cooper, uma corrida de 12 minutos em que ele media tudo, o consumo de oxigênio, série de coisas. Deu certo. O time ganhava sempre no segundo tempo."[21]Carlos Alberto Parreira: "Nossa ideia ao avaliar cada jogador era propor atividades individualizadas. Cada jogador recebia uma carga de trabalho específica. Também tivemos bateria de testes, flexibilidade... O Cláudio Coutinho, que era do Exército, trouxe o "Teste de Cooper" para ser feito nos jogadores."[23] Os níveis de força e resistência de Brito o puseram como melhor preparo físico da Copa.[22]
Pelé tinha alguns problemas musculares. Isso o tirou de alguns treinos em Guanajuato e resultou em uma briga. Ao ouvir o zagueiro Fontana dizer que “o cara está bom pra jogar futevôlei e ruim pra treinar”, o camisa 10 quis brigar. Foi contido. O caso quase resultou no corte do defensor. Mas na reunião do grupo, Pelé disse que a rixa estava superada e que nada deveria atrapalhar o ambiente.[20]
Os trabalhos táticos foram quase todos realizados nos treinamentos pela manhã, seja na preparação ou já durante a Copa do Mundo. À tarde, o trabalho era físico e de recreação. O despertar ocorria entre 7h e 8h, os treinamentos normalmente começavam entre 10h e 11h e avançavam ao meio-dia para simular o horário de algumas das partidas daquele Mundial. Carlos Alberto Parreira: "Os jogadores compraram a ideia e isso foi fundamental. Dividimos em três fase: a primeira com carga mais forte, depois diminuímos a intensidade até chegar na fase de manutenção, durante a Copa". Os trabalhos táticos consistiam em minicoletivos, com times reduzidos. Muitas vezes a defesa titular enfrentava o ataque titular.[21] Para Tostão era uma novidade: "Zagallo foi, em 1970, um técnico revolucionário, pois já fazia treinamentos táticos diários para defesa e ataque."[24]
Na fase de grupos, o Brasil foi uma das duas equipes — a outra sendo a Alemanha Ocidental — a vencer todas as partidas. Na primeira partida, contra a seleção tchecoslovaca, a seleção brasileira virou o jogo, que teve o placar aberto por Ladislav Petráš, com gols de Rivellino, Pelé e Jairzinho (2). Este jogo ficou marcado por um lance que ficaria conhecido como "o gol que Pelé não fez", quando este chuta a bola em direção ao gol no meio de campo. O Jornal dos Sports estampou na manchete: "Brasil vence com a arte mais pura da bola". O meia tcheco Jozef Marko enalteceu Pelé: "Pelé é indiscutivelmente um jogador brilhante Ele esteve diabólico, impossível de ser marcado."[25]
A Inglaterra foi a segunda adversária do Brasil, vencida pelo placar mínimo, com gol de Jairzinho em jogada de Tostão. Machucado, Gérson não atuou (Paulo Cézar ficou com a vaga). A partida foi marcada por uma defesa considerada por muitos comentaristas, historiadores e futebolistas como antológica do goleiro inglês Gordon Banks que, debaixo das traves e rente ao chão, espalmou por cima do travessão uma bola cabeceada por Pelé.[26][27] O inglês Francis Lee declarou: "Nós poderíamos ter vencido. Muitos falam da defesa de Gordon [Banks], mas nós tivemos chances também. Foi o melhor jogo em que eu já estive envolvido. Eram duas equipes no auge mostrando um grande futebol".[28] Abraham Klein, juiz da partida disse que o apito de final de jogo não foi ouvido por nenhum jogador e, como a partida estava excelente, permitiu que ela continuasse. "Poucas pessoas sabem, mas quando apitei o fim do jogo os jogadores não ouviram e...deixei prosseguir por alguns minutos".[29]Carlos Alberto Torres considerou o jogo contra a Inglaterra o mais difícil. No primeiro tempo em uma jogada na área do Brasil, o goleiro Félix fez uma ótima defesa e, na sequência, foi atingido no rosto por Francis Lee. Carlos Alberto Torres: "Eu chamei o Pelé e falei: 'Pelé, tem que dar uma nesse cara aí pra ele sossegar'. E o Pelé: 'Deixa comigo, deixa comigo'. Na primeira bola dele (Lee), eu falei: 'Não vou esperar o Pelé'. Aí eu fui e dei." Deu forte, cometendo uma falta escandalosa, mas o árbitro israelense Abraham Klein relevou e não mostrou nem o cartão amarelo. Segundo Carlos Alberto, o lance foi um divisor na partida. "A partir dali eles sossegaram."[30] Segundo Tostão: "Dr. Roberto Abdala Moura, que me operou o olho e que assistiu a todos os jogos da seleção no estádio, convidado pela comissão técnica, conta, uma deliciosa e até então inédita história: "Estádio de Jalisco, Guadalajara. Meio-dia. Fazia um escaldante calor. O estádio era bom, mas só havia energia elétrica em um dos vestiários. À noitinha, com os jogadores recolhidos para o descanso, alguém disse: ‘amanhã, temos de chegar bem cedo ao estádio, para pegar o vestiário que tinha energia elétrica’. Outro perguntou: ‘e se os ingleses chegarem primeiro’? Nos entreolhamos, e alguém falou: ‘vamos agora’". Dr. Roberto continua: "Assim, quatro mosqueteiros foram, de madrugada, ao estádio. Acordaram os seguranças, que, após as explicações, nos deixaram ocupar o vestiário ideal, com a bandeira do Brasil e tudo mais. O resultado foi que, com o calor infernal, o time inglês não desceu para o vestiário, no intervalo do primeiro para o segundo tempo". O médico termina: "Brasil, 1 a 0. Dizem que a Copa do Mundo se ganha nos pequenos detalhes, e nós, orgulhosos, nos sentimos também um pouco vitoriosos.".[31]
O terceiro jogo foi contra a Romênia, vencido pelo Brasil por 3 a 2, com dois gols de Pelé e um de Jairzinho. Com Gerson (coxa) e Rivellino (tornozelo) com pequenas lesões, Zagallo decidiu poupá-los, e a seleção entrou em campo modificada, com Piazza no meio-campo e Fontana na quarta zaga. Paulo Cézar Caju permaneceu no time. Tostão: "O time perdeu a estrutura tática ofensiva, de toque de bola".[32] O técnico da Romênia, Angelo Niculescu, substitui o goleiro aos 27 minutos do primeiro tempo e explicou: “Um goleiro que leva dois gols em 25 minutos sofre sempre a influência negativa e, por isso, achando que poderia estar muito mais abalado, tirei-o do time. Estou convencido de que não me equivoquei nas substituições. Com isso, o time melhorou e ganhou mais confiança”.[33]
Nas quartas-de-final, o Brasil venceu o Peru, então treinado pelo campeão mundial Didi, por 4 a 2, com gols de Jairzinho, Rivellino e Tostão (2). Antes da partida, Pelé atrasou o início do jogo e se abaixou deliberadamente para amarrar os cadarços, em uma jogada publicitária da fabricantes de chuteiras Puma. Pelé recebeu US$ 120 mil pela ação.[34]Carlos Alberto Torres: "Quando nós fomos jogar contra o Peru, o nosso respeito, acima de tudo, era pelo Didi [brasileiro, treinador da seleção peruana]. O fato de o Didi ter colocado o Peru na Copa do Mundo. O fato de ele ter descoberto, e colocado pra jogar, jogadores como Perico León, Gallardo, Cubillas, Mifflin. Eles tinham um time, do meio-campo pra frente, que era muito bom. Já a defesa não era boa, o goleiro....". Gérson: "Nós entramos pra jogar o nosso jogo, e eles entraram pra jogar o jogo deles. Porque o Didi não era retranqueiro, como o Zagallo também não era retranqueiro. Nosso time se fechava, mas saía pro jogo. E o time deles também, a mesma coisa. Grandes jogadores de meio-campo, grandes jogadores de ataque, e nós também. Só que o goleiro deles [Rubiños] era ruim, o goleiro deles não era bom. Eles mesmos reclamavam do goleiro deles. E a defesa deles, o meio de área deles, o miolo de área deles, era fraco, não era bom.".[35]
Contra o Uruguai, nas semifinais, o Brasil venceu de virada pelo placar de 3 a 1. Os uruguaios reclamaram que o jogo estava marcado para a Cidade do México, mas na véspera da partida foi mudado para Guadalajara, onde foram os quatro jogos anteriores da seleção brasileira, por solicitação do Brasil.[36] Antes do jogo, os jornais lembraram que era o primeiro reencontro do Brasil contra o Uruguai em Copas do Mundo desde o Maracanaço. "A gente via os jornais: "E a forra?". Aquela coisa toda", lembrou Gerson. "Isso aí foi influindo negativamente no nosso emocional", reconheceu Carlos Alberto Torres.[37] De acordo com Clodoaldo, Carlos Alberto Torres teve um papel fundamental, após o primeiro gol dos uruguaios, ele pediu que Gérson, que sofria uma marcação individual, ficasse mais recuado e liberasse Clodoaldo para atacar. No final do primeiro tempo, Clodoaldo recebeu dentro da grande área e finalizou cruzado para empatar o jogo. No segundo tempo, Jairzinho e Rivelino marcaram os outros gols do triunfo. "Ele conversou com o Gérson e com o Zagallo, e decidiram por essa mudança, que foi essencial para vencermos o Uruguai".[38] A partida ficou marcada em outro lance famoso de Pelé, no qual ele aplica um drible de corpo sobre o goleiro Ladislao Mazurkiewicz, deixando a bola rolar à esquerda do adversário enquanto segue pela direita, e chuta para o gol vazio, mas a bola sai a poucos centímetros do gol. A jogada ficou conhecida como Drible de Pelé. Ao final do jogo, Pelé deu uma cotovelada no meia uruguaio Dagoberto Fontes. O meia reconheceu que deu um pisão em Pelé minutos antes e a jogada foi um "revide".[39] Fontes declarou em 2008: "Digo que os Mundiais eram batalhas entre aspas, porque não usamos armas. Quando estávamos na lateral, ele vai correndo, eu saio para marcar e vou por baixo, na bola, e ele, quando salta, dá a cotovelada e pega no meu olho. Não me joguei no chão porque não queria mostrar que doía. Mas a verdade é que meu olho foi parar na nuca". O árbitro espanhol José Ortiz Mendizabal não viu a cotovelada e ainda marcou falta a favor do Brasil. [40]
A final da Copa foi disputada pelas seleções brasileira e italiana, no Estádio Azteca. O Brasil entrou em campo como favorito. Embora a Itália fosse a campeã européia, fizera uma campanha sem brilho no México. A partida foi vencida pelo Brasil, pelo placar de 4 a 1, com gols de Pelé, Gerson, Jairzinho e Carlos Alberto Torres, sagrando-se como a primeira tricampeã mundial de futebol. O goleiro Félix usou luvas só na final.[41]Roberto Rivellino apresentou ao mundo o drible elástico, em cima do italiano Mario Bertini.[42] O técnico da Itália, Ferruccio Valcareggi, determinou marcação individual sobre os atacantes. Rosato contra Tostão, Facchetti contra Jairzinho, Burgnich e Bertini se alternando entre Rivelino e Pelé. O cansaço da longa partida contra a Alemanha e o elogiado preparo físico brasileiro se fizeram sentir na segunda etapa.[43] O quarto gol é considerado um dos grandes lances da história das copas.[44] Numa troca de nove passes entre quase todos os jogadores da seleção brasileira, com direito a Clodoaldo driblando quatro italianos, Rivelino passa para Jairzinho, que lança para Pelé, e este, avisado por Tostão para tocar à direita, sem olhar, serve com delicadeza ao capitão Carlos Alberto Torres, que entra na área em velocidade incrível para disparar um míssil teleguiado de precisão indefensável.
Por este feito, o país ganhou a posse definitiva da taça Jules Rimet, como estipulado pelas regras da FIFA, Zagallo tornou-se a primeira pessoa campeã de Copa tanto como jogador como quanto técnico e Pelé tornou-se o primeiro e único jogador a vencer três edições de Copa do Mundo.[45][46] A equipa brasileira venceu todos os jogos, tal como o Uruguai em 1930, a Itália em 1938 e o Brasil em 2002.
Após o torneio, os jogadores receberam diversos prêmios de políticos que se tornaram polêmico por serem financiados com dinheiro público e devido a condição financeira dos jogadores. O caso dos "Fuscas de Maluf" foi o mais famoso. Paulo Maluf, então prefeito de São Paulo, deu aos jogadores e à comissão técnica da seleção brasileira 25 Fuscas verdes-musgo, zero quilômetro, comprados com dinheiro público. Os automóveis se tornaram um processo judicial de 36 anos, com o Ministério Público considerando que o político lesou os cofres públicos sem beneficiar a cidade - depois de vários recursos, Maluf foi inocentado em março de 2006 com a tese da defesa de que a compra dos carros foi aprovado por lei municipal. Vários jogadores acabaram se desfazendo dos Fuscas de Maluf logo depois de receberem o agrado. Tostão: "Recebemos como um presente, como uma homenagem, na euforia de um título tão importante. Eu tinha 23 anos. Só depois soubemos que o dinheiro era da prefeitura e que havia um processo".[47] O valor de Cr$ 315.000,00, reservado para a compra dos carros, equivaleria em 2020 a R$ 3.937.500.00 milhões. Outro presente foi do governador de São Paulo, Abreu Sodré, que distribuiu miniaturas da estátua Jules Rimet feitas em ouro para os jogadores e a comissão técnica. O governo encomendou 50 miniaturas, mas só distribuiu 42. O valor de cada uma foi de Cr$ 2.800,00. Equivaleria em 2020 a R$ 1.750.000,00.[48]