Campos Neto vê saída extraordinária de dólares no fim do ano e diz que BC ‘vai atuar se for necessário’
O dólar fechou em queda nesta sexta-feira (20), na casa dos R$ 6,07, após mais um dia de leilões de dólar realizados pelo Banco Central do Brasil (BC) para aumentar a oferta da moeda no país e conter a desvalorização do real.
A moeda americana passa por uma sequência de fortes altas nos últimos dias, e chegou à casa dos R$ 6,30 na quinta-feira. O BC decidiu colocar US$ 8 bilhões em leilão para esfriar os ânimos do mercado. O dólar recuou e fechou aos R$ 6,1216.
Nesta sexta, o BC colocou mais US$ 7 bilhões à venda, sendo US$ 3 bilhões em leilão à vista (em que o valor não volta para o caixa da instituição) e US$ 4 bilhões em leilões com compromisso de recompra dos dólares (quando o valor volta ao caixa do BC). Na mínima do dia, o dólar chegou aos R$ 6,05.
O presidente do órgão, Roberto Campos Neto, avaliou em coletiva de imprensa nesta quinta que houve uma saída extraordinária de recursos do país neste fim de ano e, por isso, a instituição resolveu intervir com leilões de venda de dólares. Gabriel Galípolo, o futuro chefe da autoridade monetária, disse não ver "ataque especulativo" contra o real.
Em pouco mais de uma semana, foram leiloados quase US$ 28 bilhões. No ano, o dólar tem alta de 25%.
O mercado contina de olho no pacote de corte de gastos, com a tramitação dos projetos do governo federal no Congresso Nacional.
Investidores acompanham de perto o desenrolar das propostas. Há um temor de que as medidas anunciadas não sejam suficientes para equilibrar as contas públicas e conter o avanço das despesas do governo.
Já houve uma "desidratação" de algumas medidas — ou seja, pontos foram alterados e podem conter as despesas públicas em patamar menor que o esperado. (veja abaixo)
Nesta sexta, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou as mudanças no pacote. Segundo ele, o Congresso Nacional atendeu, dentro das suas possibilidades, "em um prazo curto de tempo", um resultado preliminar "muito interessante".
O titular da Fazenda também acenou ao mercado falando em novas medidas de redução de despesas no decorrer de 2025, sem detalhá-las.
O Ibovespa, principal índice da bolsa de valores, fechou em alta.
Veja abaixo o resumo dos mercados.
'Temos que corrigir essa escorregada que o dólar deu aqui', diz Haddad
Dólar
O dólar fechou em queda de 0,81%, cotado a R$ 6,0719. Na mínima, chegou a R$ 6,0515. Veja mais cotações.
Com o resultado, acumulou:
- ganhos de 0,62% na semana;
- alta de 1,19% no mês;
- avanço de 25,13% no ano.
Na véspera, a moeda norte-americana teve queda de 2,32%, cotado a R$ 6,1216.
Ibovespa
O Ibovespa fechou em alta de 0,75%, aos 122.102 pontos.
Com o resultado, acumulou:
- queda de 2,01% na semana;
- perda de 2,84% no mês;
- recuo de 9% no ano.
Na véspera, o índice teve alta de 0,34%, aos 121.188 pontos.
Dólar abre em queda nesta sexta (20); Daniel Sousa comenta
O que está mexendo com os mercados?
O pacote de corte de gastos proposto pelo governo federal continua andando no Congresso. A ideia inicial era economizar R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, e um total de R$ 375 bilhões até 2030.
Já na noite de quinta-feira, o Senado aprovou a proposta de emenda à Constituição (PEC) que cria novas regras para o abono salarial e prorroga a desvinculação de receitas da União, que libera recursos alocados anteriormente em outras áreas.
A PEC foi desidratada na Câmara. Os deputados mexeram em pontos que diminuem o impacto do corte de gastos. Os senadores mantiveram praticamente o mesmo texto da Câmara. So tiraram a possibilidade de o governo usar recursos do Fundeb para pagar merenda escolar. Veja o que muda com a PEC.
Ainda dentro do pacote de gastos, foi aprovado na Câmara o projeto que limita a alta do salário mínimo e exige cadastro biométrico de beneficiários de programas sociais. Os parlamentares agora analisam os chamados destaques — sugestões de alteração no texto. Finalizada esta etapa, a proposta vai ao Senado. Entenda aqui.
Na Câmara dos Deputados, foi aprovado também um projeto que adia o abatimento de bancos, no cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquida (CSLL), das perdas com empréstimos inadimplentes. O texto vai ao Senado.
A medida, segundo o Ministério da Fazenda, deve gerar uma arrecadação superior a R$ 16 bilhões em 2025. O projeto aprovado pela Câmara repete o teor de uma medida provisória, editada pelo presidente Lula (PT) em outubro, que está em vigor e perderá a validade em março do próximo ano. Saiba mais aqui.
Antes, na terça-feira, as primeiras medidas já tinham sido aprovadas pelos parlamentares: a Câmara dos Deputados aprovou o texto que proíbe a ampliação de benefícios tributários quando as contas públicas tiverem um desempenho negativo.
Além disso, quando o governo registrar déficit primário (situação em que as despesas são maiores que o dinheiro arrecadado), a proposta aprovada ativa um "gatilho" que limita o aumento de gastos do governo com pessoal.
O governo precisa reduzir os gastos porque tem uma meta de zerar o déficit público pelos próximos dois anos — ou seja, gastar o mesmo tanto que arrecada em 2024 e 2025. O arcabouço também estipula que o governo deve começar a arrecadar mais do que gasta a partir de 2026, para controlar o endividamento público.
Mas os agentes financeiros já não esperam grande eficácia das medidas para controlar o endividamento público, e declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Fantástico consolidaram a percepção de que o governo não pretende avançar muito na contenção de despesas.
O mercado tinha a expectativa de que o governo mexesse em gastos estruturais nesse pacote de corte de gastos — como a Previdência, benefícios reajustados pelo salário mínimo e os pisos de investimento em saúde e educação. Mas isso não aconteceu.
Segundo os analistas, essas despesas tendem a subir em velocidade acelerada e têm potencial de anular esse esforço do pacote em pouco tempo. O governo, contudo, é avesso às medidas, que mexeriam com políticas públicas e com promessas de campanha do presidente Lula.
Segundo o blog do Valdo Cruz, interlocutores do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avaliam que o governo precisa dar uma sinalização mais forte na área fiscal, incluindo o anúncio de medidas adicionais às já anunciadas, para reverter de vez o cenário negativo que reina no mercado neste fim de ano.
Os aliados de Haddad acreditam que a aprovação do pacote já enviado ao Congresso vai ajudar a acalmar os ânimos dos investidores, mas as medidas não serão suficientes para derrubar o dólar.
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Reflexos da decisão do Fed
Nos EUA, o principal dado desta sexta-feira é o índice de preços PCE, que aumentou 0,1% no mês passado, após um avanço não revisado de 0,2% em outubro.
No período de 12 meses até novembro, o índice de preços PCE avançou 2,4%, após alta de 2,3% em outubro. O aumento na taxa de inflação anual deveu-se em parte ao fato de as leituras baixas do ano passado terem sido excluídas do cálculo.
Excluindo os componentes voláteis de alimentos e energia, o PCE subiu 0,1%. Nos 12 meses até novembro, o chamado núcleo da inflação aumentou 2,8%, depois de avançar pela mesma margem em outubro.
"O PCE veio um pouco abaixo do esperado pelo mercado, confirmando um número benigno da inflação em novembro, após alguns meses de dados ruins que voltaram a preocupar", diz Andressa Durão, economista do ASA.
"Será importante observar os próximos meses para avaliar se houve mudança na dinâmica da inflação antes de possíveis tarifas do novo governo, que adicionam riscos e já preocupam algumas autoridades do Fed."
O Fed acompanha as medidas de preço do PCE para sua meta de inflação de 2%.
As ações de Wall Street subiam nesta sexta-feira e o dólar enfraquecia, com os dados de inflação mais fracos do que o esperado. Os mercados acionários ficaram sob pressão durante uma semana movimentada para os bancos centrais, liderados pelo Federal Reserve, que sinalizou que diminuirá o ritmo de redução da taxa de juros no próximo ano.
"O foco do mercado nos últimos dias foi o anúncio do Fed de que, embora estivesse reduzindo a taxa básica em 25 pontos-base, começaria a controlar (futuros cortes), o que certamente abalou os mercados", acrescentou Ghriskey. "O possível fechamento do governo é o outro grande foco. Os mercados nunca gostam disso."
Nesta quarta, o Fed decidiu cortar os juros do país em 0,25 ponto percentual, para a faixa de 4,25% a 4,50% ao ano. A decisão veio em linha com as expectativas, mas não foi unânime.
Esse foi o terceiro corte seguido da taxa. Na reunião de novembro, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) reduziu o referencial na mesma proporção, em 0,25 p.p., enquanto na reunião de setembro o corte foi de 0,50 ponto.
Em nota, o Fomc afirma que os indicadores econômicos dos EUA sugerem que a atividade econômica do país continuou a se expandir em ritmo sólido, mas com os riscos controlados.
"Desde o início do ano, as condições do mercado de trabalho se suavizaram, e a taxa de desemprego aumentou, mas permanece baixa. A inflação avançou em direção à meta de 2% do Comitê, mas ainda está um pouco elevada", diz o texto.
Essa foi a segunda reunião do Fomc após as eleições presidenciais norte-americanas, que voltaram a colocar o republicano Donald Trump como chefe de Estado da maior economia do mundo.
A nota do Fomc diz ainda que o comitê julga que os riscos para atingir suas metas de emprego e inflação estão aproximadamente equilibrados, mas que as perspectivas econômicas são incertas, e o Comitê está atento aos riscos.
"O Comitê estará preparado para ajustar a postura da política monetária, conforme apropriado, caso surjam riscos que possam impedir o alcance das metas do Comitê", diz.
Diante desse cenário, a leitura é de que a incerteza sobre quais serão os efeitos da gestão de Trump na economia dos Estados Unidos também podem afetar as decisões do Fed à frente.
A eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos já era precificada pelo mercado, mas aumentou as preocupações sobre os efeitos da agenda econômica conservadora e protecionista que o republicano deve carregar durante seu mandato.
Essas medidas são vistas como inflacionárias pelo mercado e podem — além de trazer impactos para a economia de outros países — obrigar o Fed a manter os juros elevados para conter um eventual aumento de preços.
Juros menores nos Estados Unidos podem ser positivos para o Brasil. Isso porque, com taxas menores, os títulos públicos do país (considerados os mais seguros do mundo) passam a entregar uma rentabilidade também menor.
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