Uma conhecida relação de confiança e entrega exige muito carinho e respeito, especialmente quando se trabalha no limite da vida. Alcides, 88 anos, vem todos os dias visitar Maria, 87, com quem é casado há 56 anos. Ela tem problemas circulatórios e está internada há dois meses.
"Eu achava que ela estava no fim. Agora estou cheio de esperanças, porque eles tratam bem as pessoas. Acho que o respeito aos seres humanos é a coisa mais importante na vida", comenta Seu Alcides.
A unidade de terapia intensiva (UTI) é lugar de dor, de medo e de morte, mas também de esperança e de luta pela vida. Nesse espaço, tão fundamental quanto os mais modernos aparelhos, é o que máquina nenhuma pode dar: a compaixão de uma equipe médica e a dedicação de quem tem como ofício cuidar da vida.
“É muito fácil viver nesse ambiente desde que você assuma seu papel de médico e de relação com as pessoas. O familiar não percebe a qualidade do monitor ou se um ventilador mecânico é bonito. Ele percebe se o médico está efetivamente se dedicando àquele paciente", afirma Marcos Knibel, chefe da UTI do Hospital São Lucas, no Rio de Janeiro.
A designer Luciana Fintelman hoje está curada e leva uma vida normal. Há 12 anos, ela enfrentou uma leucemia. “Quando eu recebi a notícia, parecia que meu mundo caiu. A partir daí, eu só fui forte. Não tinha o direito de ser nada diferente. Falei: ‘Se minha filha está levando a coisa numa boa e é ela que está com risco de vida, eu não posso me dar ao luxo de ficar me descabelando”, comentou a mãe de Luciana, Lourdes Fintelman.
“Hoje o que mais dói quando eu lembro aquela época é pensar o que as pessoas em volta de mim passaram. Naquele momento, eu estava anestesiada, levando as coisas e tudo mais. A reflexão disso hoje é muito mais dolorida”, disse a designer Luciana Fintelman.
Foi nesse momento difícil em que a família enfrentava a doença de Luciana que a irmã mais velha, Aline, se decidiu pela medicina e pela oncologia.
“Isso eu acho que tem um papel muito grande na minha formação e na minha escolha profissional: entender que ela precisava entender de tudo e saber de tudo que estava acontecendo para que isso fosse melhor para ela, para a cabeça dela e para o corpo dela. Isso, para mim, foi muito bom, porque hoje eu levo isso para meu trabalho. A gente conversa com o paciente, mesmo quando ele esta sedado. Aí a família pergunta: ‘Mas, doutor, ele entende?’. A gente não sabe se ele esta consciente ou não”, afirma Aline Fintelman.
O mistério do cérebro para o neurocirurgião é quase como o universo para o astrônomo. José Antonio Guasti é um dos neurocirurgiões mais experientes do Rio de Janeiro. Mesmo assim, na hora da cirurgia, não deixa de fazer suas orações e pedir ajuda.
“É a ajuda de médicos que já faleceram. Meu pai era médico, tenho certeza de que ele está lá apoiando. Meu chefe, com quem pude trabalhar 35 anos, doutor Paulo Niemeyer, sempre há quem olhe pela gente. É uma inspiração”, conta o neurocirurgião José Antonio Guasti.
Outro médico também procura, fora da medicina, alimento e inspiração. José Ribamar é cirurgião-geral no Rio de Janeiro há 48 anos. Todos os dias, quando volta para casa, ele se entrega a um momento em que a medicina encontra a música.
“O exercício da medicina precisa de sentimento. Ele precisa de envolvimento emocional. Quem compôs uma grande obra, como a ‘9ª Sinfonia’, obra de Mozart, eles têm de ter um grande sentimento”, afirma o médico José Ribamar.
Como é entrar em uma sala de cirurgia numa situação grave? “Eu entro sempre com respeito, sempre com determinação e sempre com a oração. Nós temos de nos cercar de uma equipe, de pessoas extremamente competentes e de alguma coisa além desta que nos dê força para nós continuarmos na missão de ajudar ao próximo. Essa coisa além é Deus, fé, é aquilo que nos leva a estender a mão na certeza de que estamos dando a esperança e está dando o cuidado. É o amor ao próximo e a compaixão”, completa o médico José Ribamar.
O paciente operado pelo doutor Ribamar com menos de 1% de chance de sobrevivência venceu e vai receber alta ainda esta semana.