É a primeira vez desde maio que Cléber Lima dos Santos, 51, vê tanto movimento no aeroporto internacional Salgado Filho, em Porto Alegre.
Engraxate no segundo andar do terminal há 25 anos, Santos havia voltado ao trabalho em julho, quando foram reabertas operações de embarque, desembarque e check-in, mas ainda sem voos.
As decolagens, apenas sete por dia, ocorriam na base aérea de Canoas, na região metropolitana da capital gaúcha. "Às vezes, eu vinha aqui e passava a manhã inteira sem atender ninguém", lembra.
Na última segunda-feira (21), o dia começou diferente. O avião da Azul que pousou às 8h04, vindo de Campinas (SP), marcou a reabertura para pousos e decolagens, 171 dias após a pista ter sido alagada durante as tempestades que atingiram o Rio Grande do Sul em maio.
Santos está otimista com a previsão de 9 mil passageiros diários no aeroporto. "Já atendi quatro pessoas hoje, espero que melhore ainda mais amanhã".
Morador de um prédio próximo ao aeroporto, o engraxate teve de sair do seu apartamento quando o edifício foi atingido pela enchente. "Eu fiquei desabrigado e sem trabalho, apesar de não ter perdido minhas coisas porque moro em terceiro andar", relata.
No período em que ficou sem renda, contou com a ajuda dos clientes que atendia no aeroporto. "Teve um cliente que me deu R$ 1.000", conta.
A reabertura também é motivo de alegria para Marcos André Ferraz Nunes, 51, chefe de uma cooperativa de táxis. Seu último dia de trabalho no Salgado Filho foi em 3 de maio, quando o alerta do risco de inundação veio acompanhado de equipes trazendo sacos de areia para tentar, em vão, erguer barricadas.
"Perdemos todo o mobiliário, todos os computadores. É tudo novo hoje", conta Nunes, mostrando a altura de 70 cm que a água atingiu no seu escritório. "Vamos tentar nos recuperar desse prejuízo até o final do ano", diz.
Com a reabertura da pista marcando uma nova etapa na retomada da normalidade no Rio Grande do Sul, Nunes espera que as medidas de reconstrução coloquem a capital gaúcha no mapa dos viajantes. "Porto Alegre precisa de um investimento na área de turismo", diz.
Ponto turístico emblemático de Porto Alegre, a estátua do Laçador fica perto do Salgado Filho. A imagem reproduz um gaúcho em trajes típicos. No saguão de desembarque, o ator Pablo Espíndola, 40, posava para fotos caracterizado como o monumento, pintado de cinza dos pés à cabeça.
"É uma honra, porque a estrutura esse ano faz setenta anos", conta Pablo. "A estátua retrata esse povo acolhedor que a gente é, e estar ali na frente recebendo as pessoas na volta do aeroporto foi muito gratificante".
O dia também foi de reencontros. O representante comercial Everton Fassbender, 50, deu um abraço longo e apertado no filho, o estudante Victor Coelho Fassbender, 20, a quem não via há dois anos.
A enchente atrapalhou os planos originais, e ambos contavam os dias para se ver de novo. "Estar aqui hoje é um alívio e ao mesmo tempo uma felicidade", conta Everton.
A felicidade é compartilhada por quem se preparava para embarcar. "Para nós, voltar é muito emocionante. Estávamos ansiosos, até com medo que o aeroporto não abrisse. Na sexta-feira (18) estávamos com aquela expectativa", diz a advogada Janete Carmona, 67.
Moradora de Torres, no litoral norte, ela e o marido, Juarez Simione, 77, embarcaram para a viagem originalmente prevista para agosto, rumo ao Canadá, onde encontrarão seus filhos.
"Parece o fim da pandemia, quando a situação está retomando ao normal. Como a gente viveu isso dois anos atrás, é mais ou menos a mesma coisa", conta Simione. "O trauma é igual", completa Janete.
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