Thomas L. Friedman

Editorialista de política internacional do New York Times desde 1995, foi ganhador do prêmio Pulitzer em três oportunidades

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Thomas L. Friedman
Descrição de chapéu The New York Times

Primeiro mandato de Trump foi fácil; no segundo, há mais desafios

Tornar 'EUA grandiosos novamente' demanda usos mais sutis e sofisticados da força e da diplomacia coercitiva de Washington

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tel Aviv | The New York Times

Não sei por que as pessoas dizem que o presidente eleito Donald Trump enfrentará desafios difíceis na política externa.

Tudo o que ele precisa fazer é convencer Vladimir Putin a se comprometer com a fronteira ocidental da Rússia. Fazer Volodimir Zelenski se comprometer com a fronteira leste da Ucrânia. Fazer Binyamin Netanyahu definir as fronteiras oeste e sul de Israel.

Fazer o líder supremo do Irã, Ali Khamenei, definir a fronteira ocidental de seu país —ou seja, parar de tentar controlar o Líbano, a Síria, o Iraque e o Iêmen. Fazer a China definir sua fronteira oriental até Taiwan. E fazer os Houthis no Iêmen definirem sua fronteira costeira como limitada a apenas alguns quilômetros da costa —sem o direito de impedir todos os navios no Mar Vermelho.

A imagem mostra um homem com cabelo liso e uma expressão séria, vestido com um terno escuro e gravata. O fundo é iluminado em tons de vermelho, com algumas luzes difusas visíveis. A iluminação cria sombras no rosto do homem, destacando suas características faciais
O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, durante evento em seu clube privado, Mar-a-Lago, na Flórida - Carlos Barria/14.nov.24/Reuters

Em outras palavras: se você acha que a única fronteira que preocupará Trump quando ele assumir o cargo em 20 de janeiro é a fronteira sul dos Estados Unidos, você não está prestando atenção.

Quando Trump deixou o cargo em 2021, antes da invasão russa na Ucrânia e da guerra entre Israel e o Hamas e o Hezbollah, pode-se argumentar que ainda estávamos na era pós-Guerra Fria, dominada pela crescente integração econômica e pela paz das grandes potências. A Rússia havia dado uma mordida na Ucrânia, mas nunca tentou devorá-la inteira. O Irã e Israel eram hostis, mas nunca tinham se atacado diretamente.

Israel ocupou a Cisjordânia, mas nunca teve um governo cujo acordo oficial de coalizão incluísse a anexação formal de toda ela e agora tem membros que defendem o mesmo para a Faixa de Gaza. Os Estados Unidos não se importavam com os houthis no Iêmen, mas nunca tínhamos enviado bombardeiros furtivos B-2 para lançar algumas das maiores cargas úteis do nosso arsenal sobre eles.

Em resumo, muitas linhas vermelhas brilhantes foram cruzadas desde que Trump ocupou a Casa Branca. E restaurá-las, e "tornar os EUA grandes novamente", quase certamente exigirá usos mais sutis e sofisticados da força e da diplomacia coercitiva do que o isolacionista Trump jamais contemplou em seu primeiro governo ou sugeriu em suas campanhas.

Em Israel, um dos membros mais à direita do governo de extrema direita de Israel, o ministro das Finanças Bezalel Smotrich, não perdeu tempo, declarando que a nova presidência de Trump apresenta uma "oportunidade importante" para "aplicar a soberania israelense aos assentamentos na Judeia e Samaria", usando os nomes bíblicos para as áreas da Cisjordânia. Ele acrescentou: "O ano de 2025 será, com a ajuda de Deus, o ano da soberania" nesses territórios ocupados.

Mas Trump pode ser muito mais um coringa para Israel hoje do que Smotrich espera. Ele é o primeiro presidente dos EUA que apelou abertamente e se beneficiou dos votos de americanos árabes e muçulmanos que estavam insatisfeitos com o apoio incondicional dos EUA a Israel em Gaza. Ele também chega com um mandato isolacionista tão forte quanto o de qualquer presidente desde o fim da Guerra Fria. Além disso, quando Trump era presidente antes, ele apresentou um plano de paz para uma solução de dois Estados em Israel, na Cisjordânia e em Gaza, embora um plano que favorecesse fortemente Israel.

Eu estive em um jantar em Haifa com judeus e árabes israelenses juntos. Os convidados disseram que muitos judeus israelenses acham que, pelo fato de um dos genros de Trump ser judeu, ele está pronto para ser duro com os palestinos, enquanto muitos árabes israelenses acham que Trump os beneficiará por ser o único suficientemente duro para enfrentar Netanyahu e porque seu outro genro tem pai libano-americano. Alguém vai ficar desapontado!

Quanto à diplomacia de Trump na Ucrânia, fazer com que Putin concorde com algum tipo de cessar-fogo ou acordo de paz que restaure a fronteira russa com a Ucrânia pode ser o maior desafio de todos, disse o especialista em Rússia Leon Aron, do American Enterprise Institute, porque "Trump quer paz na Ucrânia e Putin quer vitória".

Putin, acrescentou Aron, não pode se dar ao luxo de voltar para o povo russo depois que cerca de 600 mil de seus compatriotas tiverem sido mortos e feridos na Ucrânia e dizer: "Opa, desculpe, afinal não vamos controlar a Ucrânia". Putin não pode permitir que essa guerra termine em derrota. Mas Trump não pode aceitar uma paz que pareça uma derrota para o Ocidente. Assim, ele pareceria um perdedor.

O fato de Putin ter efetivamente contratado 10 mil combatentes norte-coreanos para ajudar em sua guerra imprudente na Ucrânia mostra duas coisas: como ele tem medo de parar sem uma vitória visível "e como ele tem medo de uma reação social negativa se for forçado a enviar para as trincheiras recrutas russos étnicos de 18 anos, especialmente de Moscou e São Petersburgo, onde vive a elite russa", disse Aron. "Putin não está em posição de ter uma guerra eterna", concluiu. "Ele está ficando sem pessoas."

Tudo isso quer dizer que, se Trump for capaz de manter a Ucrânia em sua posição atual no campo de batalha por mais 12 meses, ele poderá conseguir o acordo para acabar com a Guerra da Ucrânia em um ano —algo que ele prometeu na campanha entregar em um dia.

Um governo Trump poderia fazer com que um conjunto novo e muito diferente de linhas vermelhas fosse ultrapassado se ele se afastasse da Otan ou expressasse qualquer disposição menor de proteger aliados de longa data.

Japão, Polônia, Coreia do Sul e Taiwan têm vizinhos hostis com armas nucleares e a tecnologia e os recursos para construir armas nucleares. "Eles não fizeram isso porque acharam que não precisavam —porque acreditavam que os EUA os protegiam, mesmo no pesadelo final de uma guerra nuclear", disse Gautam Mukunda, o famoso especialista em estratégia e professor da Universidade de Yale.

"Pense nisso por um segundo: eles tinham uma fé tão total nos EUA como aliados que, durante décadas, apostaram literalmente a existência de seu país na palavra dos EUA." Ele acrescentou: "Considerando o que Trump disse sobre alianças, algum líder estrangeiro responsável poderia continuar fazendo essa aposta?"

Eles viram o que aconteceu com a Ucrânia depois que o país devolveu à Rússia as armas nucleares que lá estavam estacionadas após a queda da União Soviética. Se esses países perderem a fé na promessa dos EUA —ou se essa promessa for retirada— e desenvolverem suas próprias armas nucleares, isso seria o fim do Tratado de Não Proliferação Nuclear, que limitou a disseminação de armas nucleares desde a Segunda Guerra Mundial. Isso apagaria a mãe de todas as linhas vermelhas.

Esse é o problema do mundo: ele é sempre muito mais complicado do que parece na trilha da campanha, e hoje mais do que nunca. Ou, como o boxeador Mike Tyson teria observado: "Todo mundo tem um plano até levar um soco na cara".

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.