No palco da vida, somos ensinados a interpretar diversos papéis que não escolhemos. Todos têm algo a dizer sobre como devemos atuar e sobre o que devemos ser. Todos querem escrever uma parte do roteiro. E, se não tivermos cuidado, a vida que realmente valorizamos se esvai de nós, sendo substituída por uma existência voltada para atender às inúmeras demandas dos outros.
A busca por aprovação começa muito cedo. Em várias famílias, os filhos tendem a ser pressionados a seguir os caminhos desejados pelos pais, mesmo que essas trajetórias não reflitam suas paixões.
A profissão "respeitável", o casamento "ideal", a religião "verdadeira", a postura "adequada". Cada decisão passa a ser amplamente moldada por um desejo, mesmo que não consciente, de evitar a desaprovação. Porém, quando evitamos decepcionar os outros, não raramente estamos decepcionando a nós mesmos.
Esse contexto não acaba dentro de casa. Ele se estende até nossas amizades, relacionamentos e ao ambiente de trabalho. É comum ver pessoas gastarem anos de suas vidas em empregos que detestam, mas permanecem neles simplesmente pelo fato de estes apresentarem certo prestígio social.
Talvez ainda mais comum seja a quantidade de talentos sufocados pelo medo de seguir uma paixão por ser considerada arriscada demais ou irresponsável demais. Isso leva não só a uma perda do que poderíamos ser mas também ao contínuo sofrimento de viver uma vida que não nos pertence.
Na era digital, o outro, mesmo que distante, passou a aumentar a pressão de como devemos atuar. Hoje, em vários casos, somos avaliados não apenas por aqueles que conhecemos como pelos que não conhecemos. Cada postagem é um convite para um julgamento. Nesse novo palco da vida, a performance é incessante. Mesmo que, nos bastidores do espetáculo, se encontrem milhares de pessoas insatisfeitas e completamente perdidas.
Nesse contexto, aumentou-se não só a pressão para viver de acordo com as expectativas dos outros como, em muitos casos, parece que as pessoas passaram a deixar de se conhecer.
Quem somos quando ninguém está olhando? Quais são os valores que realmente importam para nós? Quais sonhos você deixou de lado porque eles não estavam encaixados no roteiro? Do que você realmente gosta? Essas são perguntas que raramente temos coragem de responder, porque elas nos convidam a confrontar o vazio deixado pela ausência de autenticidade.
No entanto, recuperar a vida que valorizamos não é fácil, pois requer, em muitos casos, a ousadia de ter que desapontar os outros. Nem todos aceitam bem quando decidimos romper com aqueles valores que são considerados corretos, mas que nos aprisionam por dentro.
Além disso, reconhecermos a vida que realmente valorizamos exige muita introspecção. Exige uma desconexão das vozes externas que estão dizendo a todo momento para onde devemos ir.
Em tal processo, é preciso ter em mente que isso não é uma escolha apenas no âmbito pessoal, mas também uma escolha política. Uma sociedade na qual todos vivem para atender às expectativas dos outros representa uma sociedade da conformidade, não do progresso.
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