A reputa��o do Supremo Tribunal Federal (STF) depende das decis�es de cada um dos ministros, tanto aquelas tomadas individualmente quanto as coletivas. Essa responsabilidade pesa mais nos ombros de um ou de outro, de acordo com as circunst�ncias. Nas �ltimas semanas, era do ministro Edson Fachin o �nus de decidir como os brasileiros olhariam para o Supremo. E, na ter�a (11), ele decidiu que, ao voltar os olhos para a Pra�a dos Tr�s Poderes, os cidad�os veriam uma Corte transparente. N�o poderia ter havido escolha melhor.

A decis�o de Fachin foi divulgar os pedidos de investiga��o feitos pela PGR (Procuradoria-Geral da Rep�blica) com base nas dela��es premiadas de executivos da Odebrecht, as portarias de instaura��o de 74 inqu�ritos para investigar crimes possivelmente praticados por detentores de foro especial e tamb�m os documentos e v�deos que instruem toda essa apura��o. O material, entregue em discos r�gidos para cada ve�culo de comunica��o, tem 310 gigabytes —o equivalente a cerca de 300 epis�dios do seriado "House of Cards", cuja trama, ali�s, empalidece perto de sua vers�o brasileira da vida real.

O fim do sigilo foi pedido pela pr�pria PGR. Afinal, em investiga��es criminais, o sigilo � importante durante um per�odo, para n�o atrapalhar a coleta de provas, mas depois deve ser restabelecida a regra geral da publicidade.

No caso de uma opera��o gigante como a Lava Jato, o respeito ao princ�pio da publicidade traz consigo desafios enormes tamb�m para imprensa. Nos �ltimos anos, nos acostumamos a ler reportagens com informa��es sobre investigados que "devem dizer algo" em suas "poss�veis dela��es" —uma esp�cie de jornalismo m�e Dinah. Quando uma cobertura � feita com base em informa��es fatiadas e em cen�rios poss�veis, ela pode gerar mais confus�o do que iluminar. Somente informa��es precisas e a transpar�ncia institucional podem ajudar a separar culpados de inocentes e a dimensionar crimes, gravidades e consequ�ncias. Isso � de interesse dos investigadores, dos investigados, dos ministros do Supremo, dos jornalistas e, mais importante, da sociedade coletivamente.

Atualmente, nas duas inst�ncias da Justi�a Federal do Paran�, no Rio de Janeiro e no Distrito Federal, no Superior Tribunal de Justi�a e no Supremo tramitam mais de 900 a��es ligadas � Lava Jato. Nenhuma Reda��o de jornal tem estrutura para acompanhar detidamente o andamento de cada caso, nem para vasculhar todos os arquivos ami�de em busca de conex�es, repeti��es e padr�es.

Como as inova��es surgem de necessidades concretas, o "JOTA" resolveu dar um passo � frente. Para que n�s, toda a imprensa e cidad�os interessados, tenhamos possibilidade de acompanhar melhor a maior opera��o de combate � corrup��o da hist�ria do Brasil, reunimos todas as a��es da Lava Jato em um �nico site e constru�mos um buscador integrado que permite pesquisar palavras-chave dentro de cada um dos documentos anexados aos processos. O nome do projeto � "Lava JOTA" e pode ser acessado pelo endere�o jota.info/lavajota.

Para se ter uma ideia, a Pol�cia Federal precisou construir softwares para ajudar os delegados da for�a tarefa da opera��o no processamento de dados. Como demonstrou reportagem de Marcio Falc�o no "JOTA", desde 2014, a for�a tarefa da opera��o coletou ao menos 1,2 milh�o de gigabytes, retirados especialmente de computadores das empresas e telefones celulares de envolvidos nas investiga��es. Para se ter uma ideia do volume disso tudo, seriam necess�rios 300 mil computadores com mem�ria b�sica de quatro gigabytes para arquivar tudo que j� foi coletado at� aqui.

O "Lava JOTA" permite pesquisar por nomes e palavras-chave em todos os documentos p�blicos da Lava Jato em todas as inst�ncias. Nem mesmo a Justi�a ou o Minist�rio P�blico t�m essas informa��es concentradas em uma �nica ferramenta, j� que a investiga��o e os julgamentos est�o divididos entre diferentes inst�ncias e varas. Com as informa��es agrupadas em um s� lugar, todos os cidad�os podem checar tudo o que se tem sobre qualquer pessoa citada na Lava Jato. Isso interessa muito � sociedade como um todo.

O STF, portanto, cumpre com um papel de garantidor de preceitos fundamentais e ajuda o pa�s em um momento delicado. Informa��es fragmentadas e de pouca confiabilidade —que circulam comumente quando o sigilo � a regra— levam � vis�o de que a pol�tica � uma atividade corrompida. Pol�ticos podem ser corruptos, mas n�o h� democracia sem partidos ou pol�ticos. Jogar tudo e todos no mesmo balaio abre espa�o para aventureiros que se apresentam como salvadores da p�tria. N�o faltam exemplos no mundo mostrando que esse caminho sempre acaba mal, com personalidades autorit�rias e riscos a direitos democr�ticos fundamentais. Como guardi�o desses direitos, o Supremo deu um passo not�vel ao trazer luz para esta significativa etapa da Lava Jato. Luz essa que iluminar�, inclusive, como e em que prazos a corte cumprir� seu papel de instruir os casos.

LAURA DINIZ e FERNANDO MELLO s�o s�cios do "Jota"