João Pereira Coutinho

Escritor, doutor em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa.

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João Pereira Coutinho

As utopias de hoje podem estar sofrendo de coito interrompido

Onde antes havia diagnóstico e ação, agora há apenas diagnóstico

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Progressistas são mais infelizes do que conservadores? Sempre foram: é da infelicidade que nasce a mudança. Mas o abismo entre os dois grupos tem aumentado, informa a revista The Economist. Basta olhar para os Estados Unidos, que funcionam como vitrine para o resto do globo.

Em geral, a população está mais "deprê". Em geral, mulheres estão mais "deprês" que homens. Em geral, solteiros estão mais "deprês" que os casados.

Mas é na ideologia, essa velha pestilência, que as diferenças assustam. Os progressistas —e, sobretudo, as progressistas— estão mais tristes do que os conservadores e apresentam uma saúde mental mais precária. Como explicar essa diferença?

Há teorias para todos os gostos. A teoria cínica faz lembrar uma velha frase do meu compatriota Victor Cunha Rego, antigo colunista desta Folha: "Só os medíocres estão sempre em forma".

Tradução: a felicidade dos conservadores é um produto direto da estupidez. Como acreditam que vivem no melhor dos mundos possíveis, eles são cognitivamente incapazes de entender a miséria ao redor.

Aliás, em versão ainda mais lunática, eles talvez se animem com essa miséria, gargalhando alto enquanto tomam seu vinho privilegiado.

A The Economist não compra essa versão. Prefere outras. Os conservadores tendem a ser mais saudáveis, mais patrióticos, mais religiosos —e isso pode ter impacto positivo nas suas cabeças.

Além disso, a infelicidade dos progressistas é particularmente sentida entre os mais jovens. Que aconteceu com eles?

Ross Douthat, no The New York Times, arrisca dois palpites: o declínio do cristianismo e do marxismo —não é contradição— entre a esquerda americana roubou aos camaradas um horizonte de otimismo e esperança. Resultado?

Desistência, morbidez, catastrofismo. Ou, desculpando o meu francês, é como se as utopias de hoje sofressem de coito interrompido: onde antes havia diagnóstico e ação, agora há apenas diagnóstico, em "loop" permanente.

Nenhuma ação.

Angelo Abu

Admito que exista uma centelha de verdade em cada uma dessas explicações. Exceto na primeira: os conservadores são mais felizes porque acreditam que tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis?

Depende de que tipo de conservadores falamos. Os clientes da escola cética, entre os quais me incluo, nunca tiveram o doutor Pangloss no seu panteão. Quando muito, e olhando para a história, eles sempre acreditaram que o mundo é o que é, um longo cortejo de barbáries pontuado por momentos de trégua salvífica.

Isso tem duas consequências no funcionamento neuronal da fauna.

A primeira consequência é a ausência de ilusões, ou seja, uma ausência de desencantos. Depressão é vaidade frustrada, já lembrava o doutor Sigmund. Quem não alimenta nenhuma vaidade sobre a espécie humana dificilmente ficará deprimido com ela.

Os jovens progressistas, para citar o poeta, não aguentam demasiada realidade —e, ao contrário dos velhos, rendem-se a ela sem luta. "Não entres tão gentilmente nessa noite boa", cantava Dylan Thomas. "Enfurece-te, enfurece-te contra o fim da luz"? Mas como fazer isso, se eles já vivem às escuras?

A segunda consequência do ceticismo conservador é que, como a tribo espera sempre o pior, há uma capacidade redobrada para festejar o melhor. Onde os jovens progressistas veem apenas migalhas, os conservadores céticos veem um banquete completo. São os últimos grandes românticos, como diziam os Prefab Sprout.

E digo eu também: camaradas, não interessa como vamos acabar! Interessa é como vamos lá chegar!

E eu prefiro ver um progressista de cara levantada e sonhos ao alto, rumo à derrota ou à vitória, do que um zumbi amedrontado com a própria sombra, que desiste antes mesmo de começar.

Aqui entre nós, até já pensei em inaugurar uma escola para progressistas deprimidos, com terapia de choque apropriada.

Ementa: os manuscritos de Marx de 1844 com o café da manhã; Rosa Luxemburgo ao almoço; as memórias de Victor Serge ao lanche; os poemas escolhidos de Bertolt Brecht ao jantar —isso só no primeiro dia.

Nos restantes, exercício físico ao som de "Bella Ciao" e Public Enemy; sessões de cinema com clássicos ("As Vinhas da Ira", de John Ford) e modernos ("Você Não Estava Aqui", de Ken Loach). E, ao serão, leituras em voz alta de Emma Goldman, Ernst Bloch e David Graeber.

Se nada disso resultar, não desanime: todos serão bem-vindos ao clube conservador.

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