Mudanças climáticas: o que são eventos superemissores e por que é crucial controlá-los

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Legenda da foto, O metano produzido durante a extração de petróleo normalmente é queimado, contaminando o meio ambiente
  • Author, Veronica Smink
  • Role, BBC Mundo

Quando o assunto é o aquecimento global, todos costumam apontar um único culpado: o gás dióxido de carbono (CO2), produzido quando queimamos combustíveis fósseis, como carvão, petróleo e gás.

Mas, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), mais de 25% do chamado “efeito estufa” tem como causa outro gás: o metano (CH4).

É possível que você tenha ouvido falar sobre o problema ambiental causado pelo arroto das vacas. O gás liberado é o metano, que também é o principal componente do gás natural, produzido pela decomposição ou putrefação de matéria orgânica.

Preocupar-se com o arroto das vacas pode parecer engraçado, mas o certo é que o CH4 é fonte de grande preocupação para os especialistas. Afinal, o metano é um gás muitíssimo mais prejudicial para o meio ambiente do que o dióxido de carbono. E, quando dizemos “muitíssimo”, não é exagero.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA, na sigla em inglês) afirma que “o metano é mais de 80 vezes mais potente que o dióxido de carbono na sua capacidade de aquecimento durante os 12 anos em que ele permanece na atmosfera”.

Segundo o organismo, o motivo é que, “devido à sua estrutura química, o metano captura mais calor por molécula na atmosfera do que o dióxido de carbono”.

Por isso, o IPCC destacou que, para atingir o objetivo de limitar o aquecimento global a não mais de 2 °C em comparação com a era pré-industrial, devemos reduzir urgentemente as emissões de CH4 em pelo menos um terço – e 121 países se comprometeram com esta meta na Conferência de Mudanças Climáticas em Glasgow, no Reino Unido, em 2021.

Embora a pecuária seja responsável por 33% das emissões de metano produzidas pelas atividades humanas, o arroto das vacas não é o único desafio para atingir este objetivo.

Segundo o PNUMA, a agricultura e os resíduos orgânicos geram outros 30%. Mas a maior fonte deste gás (35%) é a mesma que gera a maior parte do dióxido de carbono: os combustíveis fósseis.

E uma das formas de contaminação é através dos chamados “superemissores” de metano.

O que são os superemissores?

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Legenda da foto, Especialistas usam imagens de satélite para identificar grandes emissões de metano
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Os superemissores são equipamentos, instalações ou outras infraestruturas onde ocorrem fugas de metano em massa, geralmente devido a falhas estruturais.

Estas enormes fugas de gás podem chegar a durar semanas, liberando imensas quantidades de CH4 para a atmosfera.

E, embora a maioria das superemissões ocorra na indústria de petróleo e gás, elas também podem ser produzidas durante a extração de carvão e em aterros sanitários de maiores proporções.

Um estudo liderado pelo cientista Thomas Lauvaux, do Laboratório de Ciências Ambientais e do Clima da Universidade de Saclay, na França, publicado em 2022 pela revista Science, estimou que os superemissores liberaram cerca de 8 milhões de toneladas de metano por ano durante a produção de petróleo e gás, entre 2019 e 2020.

Este volume equivale a 8% a 12% das emissões globais anuais de CH4. Mas, apesar dos enormes danos causados ao meio ambiente, ainda é difícil reduzir essas imensas perdas.

Um dos principais motivos é que, para suspendê-las, é preciso primeiro detectá-las – e rastrear emissões de metano é complicado, pois se trata de um gás incolor e inodoro.

Para encontrar e catalogar as perdas de metano, o PNUMA lançou, em outubro de 2021, o Observatório Internacional de Emissões de Metano (IMEO, na sigla em inglês).

“O grande desafio é saber exatamente quanto [metano] está sendo emitido, de onde ele está saindo e por quanto tempo foi emitido, para então poder reduzir as emissões ao nível necessário”, segundo o diretor do IMEO, Manfredi Caltagirone.

Como detectar

Giulia Ferrini trabalha na formação do IMEO. Ela disse à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) que, para descobrir onde ocorrem as perdas, “estamos atualmente limitados a imagens de satélite, provenientes do espaço”.

Estas imagens são obtidas por sensores especiais capazes de detectar a presença de metano.

Os pesquisadores franceses e norte-americanos que publicaram o estudo sobre superemissores na revista Science utilizaram informações obtidas pelo satélite de observação terrestre Sentinel-5 Precursor, desenvolvido pela Agência Espacial Europeia (AEE).

O satélite levou ao espaço um sensor chamado Instrumento de Monitoramento Troposférico (mais conhecido como Tropomi), que conseguiu detectar cerca de 1,8 mil superemissões de metano entre 2019 e 2020. Mas Ferrini adverte que o uso de imagens de satélite tem suas limitações.

“É importante reconhecer que os satélites podem observar melhor algumas partes do mundo do que outras e, por isso, a detecção de superemissores pode ser prejudicada pela capacidade de observação dos satélites”, esclarece ela.

Mas Ferrini também ressalta que “à medida que a tecnologia avança sem parar, o limiar de observação é significativamente reduzido, o que significa que podemos detectar (e, portanto, combater) eventos de emissões menores. Com isso, ficamos aparelhados para progredir além dos grandes emissores”.

O objetivo do IMEO é “integrar dados de diversas fontes para, em última instância, fornecer ao mundo um conjunto de informações totalmente transparente”.

Para a especialista, “somente com a sólida compreensão de onde nos encontramos em termos de emissões de metano, podemos desenvolver um plano claro e sólido de combate para proteger nosso futuro”.

Ferrini destaca que, ao fornecer informações de livre acesso sobre onde são produzidas as grandes perdas de metano, “as partes interessadas em uma série de setores têm mais motivação para demonstrar seus efeitos de redução, como parte da luta global contra as mudanças climáticas”.

Ferrini administra a Associação de Metano de Petróleo e Gás 2.0 do PNUMA. Ela defende que este setor, onde ocorre a maior parte das superemissões, é o que detém maior potencial para corrigi-las “de forma eficiente e rentável”.

“Temos evidências de que muitas estratégias eficazes de redução de metano custariam apenas uma fração dos lucros da indústria”, afirma ela.

Crédito, PNUMA

Legenda da foto, Imagens de satélite ainda não permitem visualizar toda a superfície terrestre com a mesma precisão, o que dificulta a detecção de fugas de metano em algumas regiões.

Resultados em curto prazo

O fato de que o metano é muito mais prejudicial que o CO2 não foi o único motivo que levou os especialistas no combate às mudanças climáticas a se concentrarem em reduzir as emissões de CH4. A meta também foi estabelecida porque esta seria uma solução mais rápida.

Um aspecto positivo do CH4 é a sua vida atmosférica, que é muito mais curta que a do dióxido de carbono – cerca de 12 anos, em comparação com os séculos que o CO2 dura na atmosfera.

Por isso, se conseguirmos suspender as emissões de metano, devemos observar uma mudança bastante positiva em pouco mais de uma década. E, com esta perspectiva em mente, o IMEO propôs uma meta ambiciosa.

“Se reduzirmos o metano antropogênico [de origem humana] em 45% neste decênio, o aquecimento seria mantido abaixo do limite estabelecido no Acordo de Paris”, explica a organização, referindo-se ao limite de 1,5 °C.

“O metano é um fator determinante para a velocidade de aquecimento do planeta”, explica Ferrini. “O dióxido de carbono determina a quantidade total de aquecimento, mas o metano define a rapidez do aquecimento do nosso planeta.”

“Por isso, reduzir as emissões de metano é uma oportunidade fundamental para limitar a velocidade do aquecimento em curto prazo, enquanto prosseguem os esforços mais abrangentes de descarbonização”, conclui a especialista.