Queda de avião da Voepass em Vinhedo: o que se sabe sobre acidente

A imagem aérea mostra um gramado com destroços de um aviçao branco e do lado direito o telhado de uma casa

Crédito, Isaac Fontana/EPA

Legenda da foto, Imagem do local onde o avião caiu, ainda com os destroços da aeronave

Um avião da Voepass Linhas Aéreas com 62 pessoas caiu na tarde de sexta-feira (9/8) em uma área residencial da cidade de Vinhedo, a cerca de 80 km de São Paulo.

Inicialmente, a Voepass havia confirmado a morte de 61 pessoas, sendo 57 passageiros e quatro tripulantes. Mas, na manhã de sábado (10/8), a empresa confirmou mais um passageiro entre as vítimas.

Segundo a companhia, o nome da 62ª vítima não estava na lista de passageiros embarcados, divulgada na sexta, "por uma questão técnica identificada pela companhia referente às validações de check-in, validação do boarding [embarque] e contagem de passageiros embarcados".

O voo 2283 saiu de Cascavel (PR) às 11h46 com destino ao aeroporto de Guarulhos (SP). O acidente ocorreu às 13h25 — a duração do percurso é de aproximadamente 2h. Não houve sobreviventes.

A tragédia se tornou o mais letal acidente aéreo em solo brasileiro desde 2007, quando um avião da TAM matou 199 pessoas ao se chocar com um prédio ao tentar pousar no Aeroportos de Congonhas, em São Paulo

Vídeos que circulam nas redes sociais mostram a aeronave despencando enquanto girava no ar. Em seguida, as imagens mostram uma explosão e fumaça preta saindo do local.

Vinhedo é uma cidade formada por muitos condomínios e chácaras. A aeronave caiu no jardim de uma residência, que, no momento do acidente, estava vazia.

As investigações sobre a causa do acidente ainda estão em fase inicial e, segundo o brigadeiro Marcelo Moreno, chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), "tudo ainda é prematuro".

Ele classificou o acidente como "complexo" e "catastrófico".

A Voepass afirmou que a empresa está consternada e trabalhando com as autoridades para tentar descobrir as causas do acidente.

O CEO da empresa, Eduardo Busch, lamentou as mortes e afirmou que a tripulação do voo era experiente e muito competente. Ele reiterou que não tem informações sobre a causa do acidente e disse que tudo o que tem circulado nas redes sociais é especulação.

A empresa também disse que a operação da empresa foi afetada pelo "abalo psicológico" gerado pelo acidente.

"Nós ligamos para todos os tripulantes e os liberamos caso não estejam se sentindo bem o suficiente para trabalhar", disse Marcel Moura, diretor de Operações da Voepass.

Mapa mostra a localização de Vinhedo, próximo à cidade de São Paulo, e a de Cascavel, em direção ao sudoeste

Aeronave não reportou emergência

A Força Aérea Brasileira (FAB), por meio do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), informou que o voo "ocorreu dentro da normalidade até as 13h20".

No entanto, partir das 13h21 a aeronave não respondeu às chamadas do Controle de Aproximação de São Paulo, e também não declarou emergência, nem reportou estar sob condições meteorológicas adversas. A perda do contato com a aeronave ocorreu às 13h22.

"Não houve, por parte da aeronave, comunicação com os órgãos de controle de que haveria uma emergência", pontuou o brigadeiro Marcelo Moreno.

O DECEA informou também que o Salvaero, que coordena as operações de salvamento, foi acionado às 13h26 e encontrou a aeronave acidentada dentro de um condomínio.

O que viram as testemunhas do acidente

Mulher branca falando

Crédito, Vitor Serrano/BBC

Legenda da foto, Letícia diz que avião parecia "um papel" no momento em que caiu
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“Eu vi o avião parecendo um papel. Era nítido que o piloto tinha perdido o controle e que alguma coisa ruim podia acontecer. E, no fim, ele parecia realmente um papel e caiu. Foi bem próximo do bairro onde eu moro. Assim que ele caiu, só subiu a fumaça e ficou aquele silêncio”.

Foi dessa maneira que a estudante de administração Letícia Oliveira do Nascimento, de 25 anos, contou ter visto a queda de avião que deixou 62 mortos na cidade de Vinhedo.

A reportagem da BBC News Brasil foi ao local para acompanhar os desdobramentos do caso e ouvir os relatos dos moradores que presenciaram a queda. Horas após o acidente, centenas de pessoas, entre policiais, equipes de resgate e moradores da região se aglomeravam na entrada do condomínio Recanto Florido, onde o avião caiu.

Letícia conta que estava dentro de casa quando o avião, operado pela empresa Voepass (antiga Passaredo), fez um barulho alto ao passar pela região. Inicialmente, ela pensou que se tratava de aeronaves de pequeno porte fazendo manobras, mas o ruído começou a ficar cada vez mais alto.

“Eu estava me preparando para sair quando escutei um barulho muito estranho. Eu até achei que era um avião de fumaça, até que o meu vizinho da frente gritou: ‘vai cair o avião’”, relata.

Ela conta que, antes de despencar até o solo, o avião sobrevoou a região por três ou quatro minutos.

“Até que foi um longo tempo porque eu estava pedindo um Uber na hora. Faltavam quatro minutos e foi o tempo que ela (motorista) demorou para chegar. O barulho já existia, mas o avião estava entre as nuvens. Estava bem nublado. Quando ele sai das nuvens, ele cai”, lembra Letícia.

O mecânico João Vitor da Silva, de 21 anos, conta que estava almoçando quando ouviu barulhos muito altos. Naquele instante, ele pensou que o ruído fosse causado por um show da esquadrilha da fumaça

“Eu saí na janela e vi o avião caindo. Eu peguei minha moto e segui a fumaça, na direção onde ele tinha caído. Quando cheguei lá, a dona da casa (na frente do local da queda) já estava desesperada. Aí já vi as pessoas no chão, os corpos. Foi triste mesmo. Impactou”, diz.

Quem eram as vítimas?

Montagem mostram vítimas de acidente aéreo

Crédito, Reprodução redes sociais

A Voepass divulgou a lista com os nomes de todos os passageiros que estavam a bordo do voo 2283. Eduardo Busch, CEO da Voepass, afirmou que a maioria dos passageiros eram de Cascavel e São Paulo.

Um grupo de médicos que se dirigia São Paulo para participar de um evento estava a bordo. Pelo menos duas das vítimas eram médicas do hospital Uopeccan, em Cascavel, Arianne Albuquerque Estevan Risso e Mariana Comiran Belim, ambas residentes de oncologia clínica.

Entre os médicos que perderam a vida estavam também o professor José Roberto Leonel Ferreira, radiologista recém-aposentado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), e a pediatra Sarah Sella Langer, que atuava no hospital universitário.

A Unioeste lamentou em nota essas perdas e de mais seis pessoas ligadas à instituição, entre docentes e ex-alunos. Um deles era o árbitro de judô e professor do departamento de Educação Física, Edilson Hobold, que atuava em competições nacionais e internacionais.

Ao menos uma criança teve a vida interrompida pelo acidente. Segundo o portal de notícias Catve.com, de Cascavel, uma jornalista da empresa, Adriana Ibba, perdeu a filha de apenas três anos, Liz Ibba dos Santos. Ela viajava com o pai, Rafael Fernando dos Santos, que também faleceu.

Neste sábado, a Voepass confirmou a morte de mais uma vítima, Constantino Thé Maia, que não constava na lista inicial dos passageiros embarcados. Ele era natural do Rio Grande do Norte, informou a governadora do Estado, Fátima Bezerra (PT).

A tripulação era composta por Debora Soper Avila, Rubia Silva de Lima, Humberto de Campos Alencar e Silva e Danilo Santos Romano.

Problemas técnicos?

Em entrevista coletiva, Luiz Ricardo Nascimento, diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), afirmou que "a aeronave estava regular", assim como a tripulação, que estava com os certificados válidos.

Por meio de nota, a Voepass afirmou que a aeronave PS-VPB, ATR-72, do voo 2283, decolou "sem nenhuma restrição de voo, com todos os seus sistemas aptos para a realização da operação".

O CEO da empresa, Eduardo Busch, disse que a aeronave passou por uma manutenção de rotina na noite de quinta-feira (8), como é praxe, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, antes de alçar voo para Guarulhos.

Da capital paulista, o avião seguiu para Cascavel, sem intercorrências, ainda segundo o CEO.

O diretor de operações da Voepass, Marcel Moura, admitiu que esse modelo ATR voa "numa faixa onde tem uma sensibilidade maior ao gelo", mas que as condições meteorológicas de sexta-feira previam a presença desse elemento "dentro das características aceitáveis para o voo".

Na noite de domingo (11/8), o programa da TV Globo 'Fantástico' alegou que a aeronave enfrentou "várias paradas para manutenção desde 11 de março".

Naquele dia, segundo o programa, após um voo de Recife a Salvador, um relatório indicou problemas no sistema hidráulico e um impacto da cauda com a pista, causando danos estruturais.

O avião ficou parado na capital baiana por 17 dias até 28 de março, antes de ser enviado para reparos em Ribeirão Preto.

A aeronave só voltou a voar comercialmente em 9 de julho, mas sofreu uma despressurização no mesmo dia e precisou retornar a Ribeirão Preto para mais consertos, voltando a operar em 13 de julho.

O 'Fantástico' também ouviu um ex-comissário da empresa que fez críticas à manutenção das aeronaves.

"A empresa colocava a segurança em segundo ou terceiro plano. Visava mais o lucro e a gente tinha um avião que apelidava de Maria da Fé, para você ter ideia. Porque só voava pela fé. Porque não tinha explicação de como o avião daquele estava voando", disse o funcionário que pediu para não se identificar.

Questionada pelo 'Fantástico' sobre as manutenções da aeronave antes do acidente, a Voepass informou que detalhes da investigação serão restritos à Aeronáutica e outras autoridades.

A empresa também disse que cumpre e respeita as legislações trabalhistas, e que o esforço principal, neste momento de dor, está em apoiar e dar assistência às famílias dos passageiros e tripulantes que estavam a bordo.

A aeronave modelo ATR 72-500 é fabricada pela Avions de Transport Régional (ATR), uma empresa franco-italiana, e comporta até 78 passageiros.

Algumas horas após o acidente, a ATR publicou uma nota afirmando que "nossos primeiros pensamentos estão com todos os indivíduos afetados por este evento. Os especialistas da ATR estão totalmente empenhados em apoiar tanto a investigação como o cliente".

A Voepass é considerada a companhia aérea brasileira mais antiga em operação, fundada em 1995 em Ribeirão Preto (SP) com o nome de Passaredo Linhas Aéreas.

O avião tinha 14 anos de fabricação e era de um modelo conhecido no mundo da aviação por sua capacidade de operar em aeroportos de pista curta e de difícil acesso no Brasil e em outras partes do mundo, especialmente na Ásia.

Foi lá, inclusive, que houve outros acidentes envolvendo aeronaves semelhantes à da Voepass.

Caixas-pretas foram encontradas

As caixas-pretas são dois gravadores, um de voz e outro de dados, e são fundamentais para orientar as investigações sobre as causas do acidente.

De acordo com o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, a caixa preta foi encontrada e está preservada.

A informação foi confirmada pelo brigadeiro Moreno, que afirmou que o Cenipa já está com as duas caixas-pretas do avião.

Equipes do Corpo de Bombeiros, da Polícia Militar, da Defesa Civil e da Polícia Federal foram enviadas ao local do acidente para o primeiro atendimento. De acordo com a PF, foram enviados ao local especialistas em acidentes aeronáuticos, identificação de vítimas de desastres, entre outros, para auxiliar nas apurações.

Um gabinete de crise foi montado no aeroporto de Guarulhos, e outro, em Vinhedo, para o suporte das equipes mobilizadas.

Além das equipes estaduais, também compõe o gabinete de crise o Ministério de Portos e Aeroportos, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o Governo do Estado do Paraná e profissionais de assistência social.

Um posto de comando avançado foi montado a aproximadamente 100 metros da ocorrência. O combate às chamas do local da queda foi finalizado por volta das 16h. O Instituto de Medicina Social e Criminologia do Estado de São Paulo (IMESC) também vai auxiliar na identificação dos corpos, de acordo com nota do governo do Estado de São Paulo.

Os corpos das vítimas foram encaminhados ao Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo. Devido ao estado precário dos corpos, os peritos estão coletando amostras de DNA de familiares, bem como amostras dentárias e impressões digitais.

Autoridades lamentam a tragédia

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estava em um evento em Itajaí (SC) quando soube do acidente. Ele pediu um minuto de silêncio aos presentes e expressou "toda minha solidariedade aos familiares e amigos das vítimas".

O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que foi governador de São Paulo, foi às redes sociais nesta tarde para prestar solidariedade. "Transmito meus sentimentos aos familiares e amigos das vítimas da queda de um avião em Vinhedo. Que Deus conforte seus corações neste momento de dor", escreveu ele no X (antigo Twitter).

Já o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), estava em Vitória (ES), para reuniões do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) no momento do ocorrido.

Ele retornou para o estado de São Paulo e visitou o local do acidente para acompanhar os trabalhos das equipes.

O governador afirmou que o governo paulista "vai prestar todo o suporte e divulgar todas as informações necessárias". Disse ainda que acomodação e serviços de apoio psicológico serão disponibilizados para as famílias das vítimas em São Paulo durante o processo de exame dos corpos no IML.

"Minha solidariedade a todas as vítimas e afetados por essa tragédia."

A imagem mostra no primeiro plano desfocado um policial militar. Atrás, cones isolando o local com dois caminhões dos Bombeiros e algumas pessoas

Crédito, Isaac Fontana/EPA

Legenda da foto, Local onde o acidente ocorreu, com equipes da Polícia Militar e dos Bombeiros

Já o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), disse, também no X, que viajaria até Vinhedo para acompanhar as buscas.

"O Paraná está de luto", afirmou.

Em nota, a Voepass informou que presta informações a todos os passageiros da companhia, familiares e colaboradores pelo telefone 0800 9419712, disponível 24h.