Febre oropouche na Bahia: o que se sabe de mortes inéditas no mundo e riscos da doença

Mosquito maruim transmissor da febre Oropouche

Crédito, Conselho Federal de Farmácia/Reprodução

Legenda da foto, Mosquito maruim é o transmissor da febre oropouche

Duas mulheres morreram por febre oropouche na Bahia, confirmou o Ministério da Saúde nesta quinta-feira (25/7). Os casos, segundo a pasta, são inéditos. Elas não tinham comorbidades e apresentaram sintomas semelhantes a um quadro de dengue grave.

Há outra morte em investigação em Santa Catarina.

Segundo a Secretaria Estadual de Saúde da Bahia, a primeira pessoa a ter a morte confirmada pela doença foi uma mulher de 24 anos que morava na cidade baiana de Valença. Ela morreu em 27 de março.

A segunda morte, de uma paciente de 21 anos, ocorreu em 10 de maio no município de Camamu.

As pacientes, segundo a Secretaria de Saúde da Bahia, apresentaram um início abrupto de febre, dor de cabeça, dor retro orbital e mialgia, que rapidamente evoluíram para sintomas graves, incluindo dor abdominal intensa, sangramento e hipotensão.

Essas mortes foram confirmadas após investigação das autoridades de saúde.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que até então "não havia relato na literatura científica mundial sobre a ocorrência de óbito pela doença".

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Há seis casos de transmissão vertical (de mãe para filho) da infecção da febre oropouche sendo investigados pelo Ministério da Saúde. São três casos em Pernambuco, um na Bahia e dois no Acre.

Dois casos evoluíram para óbito fetal, houve um aborto espontâneo e três casos apresentaram anomalias congênitas, como a microcefalia.

As análises estão sendo feitas pelas secretarias estaduais de saúde e especialistas, com o acompanhamento do Ministério da Saúde, para concluir se há relação entre a febre oropouche e casos de malformação ou aborto.

A doença é transmitida principalmente pelo mosquito conhecido como "maruim" ou "mosquito-pólvora". Os sintomas são parecidos com os da dengue, mas no geral os casos são de baixa gravidade.

O Ministério da Saúde diz, em nota, que tem feito monitoramento intenso de possíveis casos da doença pelo país.

"A detecção de casos de febre oropouche foi ampliada para todo o país em 2023, após o Ministério da Saúde disponibilizar de forma inédita testes diagnósticos para toda a rede nacional de Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacen). Com isso, os casos, até então concentrados na região Norte, passaram a ser identificados também em outras regiões do país", diz nota da pasta.

Neste ano já foram registrados 7.236 casos de febre oropouche em 20 Estados brasileiros. A maior parte dos casos foi registrada no Amazonas e Rondônia.

Em março, o Amazonas declarou que estava passando por um surto da doença. No período, o Estado enfrentou um aumento de mais de 60% dos casos em comparação à mesma época de 2023.

Os riscos da febre oropouche no Brasil

O vírus que causa a febre oropouche tem sua circulação principalmente em áreas de florestas, como a região Amazônica, devido ao clima úmido. No entanto, ele vem se adaptando às áreas urbanas.

"O mosquito maruim, principal transmissor da doença, pode ser encontrado em vários Estados, a diferença é que ele não está infectado com o vírus. Se essa infecção acontecer, a doença pode se espalhar para outras áreas", diz o infectologista Luiz Tadeu Moraes Figueiredo coordenador do Centro de Pesquisa em Virologia da USP de Ribeirão Preto e membro da Sociedade Paulista de Infectologia.

A infectologista Carla Kobayashi, do Hospital Sírio-Libanês, explica que o vírus está mais presente na região Norte por causa das características do ambiente, como umidade e grandes áreas de mata.

"Para se ter um surto no país, como acontece com a dengue, esse vírus teria que se adaptar às outras regiões", disse Kobayashi.

Ainda segundo os especialistas, para que um surto aconteça em outras localidades é preciso a combinação de dois fatores como: ter a transmissão importada (vinda através de um paciente infectado na Amazônia) e falha no diagnóstico da doença.

A falta de diagnóstico pode fazer com que o vírus contamine os mosquitos saudáveis de outras localidades, fazendo com que o vírus se espalhe. O mosquito maruim pode ser encontrado em diversas regiões do país.

"O vírus vem se tornando cada vez mais comum na região Norte e vem migrando rumo ao Sudeste do Brasil com pacientes importados, como o caso do Rio de Janeiro. Por isso é necessário fazer o diagnóstico correto da doença para que o vírus seja identificado e isolado, evitando a proliferação dele", acrescenta Figueiredo.

"Embora um surto seja uma possibilidade, não é algo iminente", concluiu Figueiredo.

Entenda em quatro pontos o que é a febre oropuche e como preveni-la.

Mulher deitada na cama com febre

Crédito, GETTY IMAGES

1. O que é a febre oropouche e como é transmitida?

A febre oropouche é uma doença causada pelo arbovírus Orthobunyavirus, transmitido pela picada de mosquito e pode infectar humanos e animais.

A identificação do vírus no Brasil ocorreu pela primeira vez em 1960, a partir de uma amostra de sangue de uma preguiça capturada durante a construção da rodovia Belém-Brasília.

A doença é transmitida pela picada do mosquito Culicoides paraensis, conhecido popularmente como maruim ou mosquito-pólvora, que está presente tanto em áreas silvestres como em áreas urbanas.

Nas áreas urbanas, o mosquito Culex quinquefasciatus, popularmente chamado de pernilongo ou muriçoca, também pode transmitir o vírus ocasionalmente.

Surtos foram relatados, principalmente nos Estados da região amazônica.

Também já foram relatados casos e surtos da doença em outros países como Argentina, Bolívia, Equador, Peru e Venezuela.

Num dos surtos, em 2010, que atingiu o Brasil e outros quatro países, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) descreve que foram afetadas pessoas de ambos os sexos e de todas as idades.

Após picar uma pessoa ou animal infectado, o mosquito permanece com o vírus no sangue por alguns dias. Quando esse mosquito infectado pica uma pessoa saudável, ele transmite o vírus, causando a doença.

Segundo o Ministério da Saúde, existem dois tipos de ciclos de transmissão da doença: ciclo silvestre e ciclo urbano.

No primeiro, os animais como bichos-preguiça e macacos são os hospedeiros do vírus.

Já no ciclo urbano, os humanos são os principais hospedeiros do vírus.

O avanço do desmatamento e as alterações ambientais são identificados como fatores que contribuem para o aumento da incidência da doença, que está progressivamente afetando as áreas urbanas.

2. Quais os sintomas da febre oropouche?

Os sintomas da doença são semelhantes aos da dengue e incluem febre — temperatura entre 38 e 39.5°C —, dor no corpo e nas articulações, calafrios, dor de cabeça, náuseas, vômitos e diarreia. Eles duram, em média, uma semana.

"Apesar de os sintomas serem bem semelhantes ao da dengue, a febre oporouche é bem mais amena e melhora com o passar dos dias", diz Carla Kobayashi, infectologista do Hospital Sírio-Libanês.

Consequências mais raras incluem complicações neurológicas, como encefalite (inflamação do cérebro) e meningite (inflamação da membrana que reveste o cérebro).

O diagnóstico da doença é feito apenas por exame laboratorial através da coleta de sangue.

Mulher com febre

Crédito, Getty Images

3. Qual o tratamento?

Não há um medicamento específico para tratar a febre oporouche, então o tratamento é focado em amenizar os sintomas da doença.

Podem-se usar analgésicos, antitérmicos e medicamentos para enjoo. Não há remédios contraindicados para tratar os sintomas da doença.

Além dos medicamentos, é indicado também que o paciente faça repouso e cuide da hidratação.

Os médicos recomendam que a pessoa infectada use repelente para evitar ser picado por outros mosquitos no período de viremia - circulação do vírus no corpo – evitando que outros mosquitos se infectem com o vírus e a doença se espalhe.

4. Como controlar o avanço da doença?

Para frear o avanço da doença é indicado que se eliminem criadouros do mosquito como locais com água parada e também fazendo uso de repelentes.

Além disso, o Ministério da Saúde recomenda:

  • Evitar áreas onde há muitos mosquitos;
  • Usar roupas que cubram a maior parte do corpo;
  • Manter a casa limpa, removendo possíveis criadouros de mosquitos, como água parada e folhas acumuladas.

Se houver casos confirmados na região, siga as orientações das autoridades de saúde local para reduzir o risco de transmissão, como medidas específicas de controle de mosquitos.

Com reportagem de Simone Machado, de São José do Rio Preto (SP) para a BBC News Brasil