Como funciona a embolização da artéria meníngea, cirurgia complementar que Lula fez

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Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Lula teve uma hemorragia intracraniana e precisou ser operado

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou por uma embolização da artéria meníngea, um procedimento complementar após a cirurgia realizada na segunda-feira (9/12) para tratar a hemorragia intracraniana.

O cardiologista Roberto Kalil, médico de Lula, informou que a intervenção foi bem-sucedida e o presidente já está acordado e conversando.

"O procedimento foi feito às 7h da manhã, com sucesso. O presidente está estável e comendo. Não houve atraso na programação para os próximos dias e ele deve ter alta no começo da semana que vem", disse Kalil.

Um boletim médico divulgado na noite desta quinta-feira (12/12) informou que Lula, que tem 79 anos, permanece sob cuidados intensivos no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo (SP).

Um dreno intracraniano foi retirado de tarde "sem intercorrências".

"[O presidente] Permanece lúcido e orientado, conversando normalmente, alimentou-se bem e recebeu visitas de familiares", diz o boletim.

O objetivo da embolização da artéria meníngea é estancar sangramentos e evitar a formação ou o crescimento de hematomas na cabeça.

Entenda a seguir como funciona essa intervenção e por que ela é necessária em casos como o de Lula.

Lula

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Procedimentos aos quais Lula foi submetido estão relacionados com acidente doméstico que ele sofreu em outubro

O que é um procedimento endovascular

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Em resumo, o termo "procedimento endovascular" é usado para descrever qualquer intervenção feita a partir do interior de vasos sanguíneos.

A ideia é utilizar a rede de veias e artérias do corpo como "caminhos" para se chegar até o local que apresenta algum problema, com o objetivo de corrigi-lo ou tratá-lo.

Procedimentos do tipo usam fios e cateteres, que são inseridos num vaso sanguíneo através da pele.

Geralmente, os médicos fazem esse acesso pelo braço ou pela virilha.

Com ajuda de exames de imagem (como a tomografia, a ressonância magnética e a radiografia), esses profissionais de saúde guiam os cateteres até a região que apresenta um determinado problema.

Quando chegam no local desejado, eles podem "entupir" o vaso, para estancar uma hemorragia, ou instalar uma rede metálica, caso a ideia seja restabelecer a passagem de sangue ali.

Há também a possibilidade de usar esse acesso para aplicar medicações ou outros tratamentos específicos (como moléculas radioativas, calor ou frio).

Esses procedimentos minimamente invasivos são usados na Medicina há pelo menos cinco décadas e apresentam inúmeras vantagens.

As intervenções muitas vezes podem ser feitas em ambulatórios, fora de centros cirúrgicos, e, como precisam apenas de pequenos furos na pele (sem necessidade de grandes cortes e suturas), têm uma recuperação muito mais rápida e com menos complicações.

Em coletiva de imprensa, os médicos que fizeram a embolização em Lula confirmaram que ele foi apenas sedado e não precisou de anestesia geral. Logo após a intervenção, ele já estava acordado e conversando normalmente.

As técnicas e os materiais utilizados evoluíram muito nos últimos anos e hoje são usados para tratar uma série de condições — de infarto e AVC a dor, inchaço na próstata e até câncer.

No caso de Lula, o boletim médico mais recente destaca que ele passou por uma embolização de artéria meníngea média.

Em outras palavras, embolização significa justamente entupir um vaso sanguíneo — no caso do presidente, a artéria meníngea média, que passa pela cabeça — para interromper a passagem de sangue ali.

Os médicos costumam usar substâncias químicas específicas ou calor para fazer o fechamento desse tubo do sistema circulatório.

O radiologista intervencionista José Guilherme Caldas, que fez a embolização em Lula, explicou que o objetivo era justamente "reduzir a quantidade de sangue que chega perto do hematoma".

"Para isso, injetamos um material parecido com uma gelatina, para entupir esses vasos", detalhou ele.

"Usamos cateteres muito finos, pois esses vasos tem cerca de 1 milímetro de diâmetro", explicou Caldas.

Esse bloqueio é cuidadosamente avaliado por especialistas e não prejudica a chegada de suprimentos (oxigênio e nutrientes) para as células da região.

Equipe médica do Hospital Sírio-Libanês

Crédito, EPA-EFE/REX/Shutterstock

Legenda da foto, Equipe médica que acompanha presidente diz que ele está bem, fez fisioterapia e recebeu visitas de familiares na quarta-feira (11/12)

Por que Lula precisou de mais um procedimento?

Como explicado pelo boletim do Hospital Sírio Libanês, o procedimento endovascular é um tratamento complementar em casos como o do presidente.

Numa reportagem publicada pela BBC News Brasil na terça-feira (10/12), a neurologista Sheila Martins, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, já havia antecipado a necessidade dessa nova intervenção.

Para entender essa questão, precisamos recapitular pontos importantes do episódio.

No dia 19 outubro, Lula bateu a cabeça ao sofrer um acidente doméstico no Palácio da Alvorada.

Desde então, ele tem feito um acompanhamento com especialistas para avaliar se a pancada poderia ter alguma consequência mais grave.

Na segunda-feira, 9 de dezembro, o presidente apresentou um mal-estar e se queixou de dores de cabeça.

Ao passar por uma ressonância magnética em Brasília, os médicos diagnosticaram a hemorragia intracraniana.

Esse acúmulo de sangue aconteceu entre a dura mater (uma das meninges, as membranas que protegem o sistema nervoso) e a superfície do cérebro.

Segundo especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, esse quadro acontece frequentemente com indivíduos que sofrem batidas na cabeça — e pode demorar semanas ou até meses para dar sinais.

Após o choque, alguns pequenos vasos sanguíneos podem se romper e ficam gotejando sangue aos poucos.

O líquido vermelho se acumula numa determinada região e forma um hematoma — que a partir de um certo tamanho começa a pressionar o cérebro e gera incômodos (como dor de cabeça).

Lula foi então transferido para São Paulo, onde passou por uma craniotomia, um procedimento para drenar o hematoma.

A cirurgia foi considerada bem-sucedida pelos médicos e não houve qualquer sequela.

Mas a craniotomia serve apenas para drenar o hematoma que se formou.

Os pequenos vasos que se romperam após a pancada podem continuar a gotejar sangue — e gerar um novo hematoma depois de algum tempo.

É por isso que, nesses casos, os profissionais da saúde fazem o procedimento vascular para fechar alguns desses tubos do sistema circulatório.

Assim, é possível resolver o vazamento (a hemorragia) e evitar um novo acúmulo de sangue (o hematoma) no futuro.

Como mencionado anteriormente, Lula passou pela embolização na manhã desta quinta-feira (12/12).

Segundo o médico Rogério Tuma, que faz parte da equipe que prestou atendimento ao presidente, a embolização diminui bastante o risco de reaparecimento do hematoma.

"Hoje, após o procedimento, a probabilidade que o quadro se repita é menor que 5%", calculou ele.

"Claro que, em Medicina, não existe 0 ou 100%. Mas o risco de o hematoma se refazer é bem menor agora", complementou o especialista.

Kalil disse que Lula deve voltar à Brasília na segunda ou na terça-feira da semana que vem.

"Ele poderá retomar uma agenda de despachos do Palácio do Planalto e, aos poucos, vai retomar as atividades normalmente", contou ele.

"Em nenhum momento, o presidente teve alguma lesão cerebral. Ele está com os exames neurológicos normais", assegurou Kalil.