SETEMBRO
OUTUBRO
2021
www.revistademarinha.com
Ambiente,
Ciência
Tecnologia
&
Diretor: Alexandre da Fonseca
Nº 1023 - setembro/outubro 2021 - Preço Continente - 5,50 € - PERIODICIDADE BIMESTRAL
FICHA TÉCNICA
ANO: 84
Nº 1023
FUNDADOR
MAURÍCIO DE OLIVEIRA
ANTERIORES DIRETORES
MAURÍCIO DE OLIVEIRA
GABRIEL LOBO FIALHO
EDITOR/DIRETOR
ALEXANDRE DA FONSECA
DIRETOR ADJUNTO
JOÃO RODRIGUES GONÇALVES
LUÍS MIGUEL CORREIA
SÍTIO NA INTERNET
JOÃO RODRIGUES GONÇALVES
COLABORADORES PERMANENTES
ANTÓNIO BALCÃO REIS
ANTÓNIO PETERS
ARMANDO MARQUES GUEDES
ARTUR PIRES (Setúbal/Sesimbra)
AUGUSTO SALGADO
CARLOS ALBERTO TIAGO (Peniche)
ÉLVIO LEÃO (Porto Santo)
FERNANDO PAIVA LEAL (Leixões)
ISABEL PAIVA LEAL (Leixões)
ISABEL PEREIRA (Faro)
JOÃO BRITO SUBTIL (S. Miguel/Açores)
JOÃO FERNANDES ABREU (Madeira)
LUIS FILIPE MORAZZO (Sotavento/Alg.)
LUIS MONTEIRO (Barlavento/Alg.)
MANUEL OLIVEIRA MARTINS (Viana do Castelo)
MIGUEL VIEIRA DE CASTRO (Sines)
ORLANDO TEMES DE OLIVEIRA
PAULO GAMA FRANCO
REINALDO DELGADO (Póvoa de Varzim/Vila do Conde)
RUI MATOS
Os artigos publicados na Revista de Marinha e assinados
refletem as perspetivas dos seus autores. Os artigos e fotografias incluídos nesta edição não podem ser reproduzidos sem
autorização.
Capa: Mergulhando com jamantas, em agosto de
2021, em Santa Maria, nos Açores, um spot de
mergulho que atrai já, por ano, umas centenas de
turistas no nicho “turismo de mergulho”.
Obs: os créditos fotográficos são de Maria Póvoa
Pinto (myphtoprint), a quem muito agradecemos a
cedência da imagem.
ÍNDICE DE ANUNCIANTES
CLICK & BOAT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VERSO DA CAPA
CASA DA SENHORA DO OUTEIRO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 04
GALP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 05
SCMA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09
AVG . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
DOCAPESCA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
GRUPO SOUSA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
APSS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
DYRUP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
BITCLIQ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
TECNOVERITAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
PLANETÁRIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
UAVISION . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
ETE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
GOCLEVER . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
WEST SEA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
YACHTWORKS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
MOBILIFT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
INDRA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
BENSAÚDE MARÍTIMA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
INDUMA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
REBOPORT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
MYSTIC CRUISES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
XSEALENCE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
SUNCONCEPT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
LINDLEY . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
AVE ROWING . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
CONFORNAULUSA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91
LOJA DO MUSEU . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
EDIÇÕES REVISTA DE MARINHA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
SEAVENTY . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
RADIO HOLLAND . . . . . . . . . . . . . . VERSO DA CONTRA-CAPA
IH . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . VERSO DA CONTRA-CAPA
REPSOL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . CONTRA-CAPA
Prefácio
O número de set / out da vossa revista faz foco, como
habitualmente nesta edição, nos temas do ambiente, ciência e tecnologia; uma palavra de destaque para o ambiente
e para a sustentabilidade, cada vez mais importantes, até
porque o mar é determinante na evolução das alterações
climáticas e estas tudo condicionam.
A Guarda Nacional Republicana é uma prestigiada força de segurança que com
assinalável sucesso tem assegurado o patrulhamento das zonas rurais e suburbanas do nosso país. Contudo, o encalhe do patrulha costeiro BOJADOR no passado dia 1 de setembro, junto à praia de Carcavelos, suscita-nos o comentário
de que cada organização deverá fazer aquilo para que tem vocação. E, em nossa
opinião, a GNR tem vocação para operar em terra, o que faz há muito tempo, com
muita dignidade e profissionalismo.
A pandemia desorganizou as cadeias logísticas, fez aumentar os custos dos
fretes marítimos e disparar o preço dos contentores. O Baltic Dry Index em 7 set
estava nos 3.707 pontos, muito acima dos 1.200 pontos de nov 2020. Existem já
sinais de acalmia, mas ainda vai demorar algum tempo até a situação normalizar.
Os navios de cruzeiro estão também a recuperar, embora com alguma lentidão;
Funchal, Leixões e Lisboa já os aceitam de novo e o armador Mystic Cruises (Grupo
Douro Azul) tem unidades a operar no Mediterrâneo, Báltico e nos Fiordes da Noruega; de igual modo, vai demorar algum tempo até recuperar ao nível pré-pandemia.
Uma palavra para o novo porta-aviões da Royal Navy, o QUEEN ELIZABETH II,
equipado com aeronaves F-35 de origem americana, que iniciou o seu primeiro
cruzeiro operacional. Depois de participar em exercícios NATO e de operar com o
CHARLES DE GAULE no Mediterrâneo, o navio cruza agora o Pacífico, escoltado
por navios da Marinha da Austrália. Um regresso da Royal Navy ao Far-East, onde
a China e a Coreia do Norte fazem aumentar a tensão política.
Uma palavra para o IPMA, de aplauso, que depois de um prolongado período
de adaptações e reparações iniciou os cruzeiros científicos com o N.I. MÁRIO
RUIVO, uma plataforma com significativas capacidades, agora à disposição da
nossa comunidade científica.
Na área tecnológica registam-se iniciativas com muito potencial nas áreas da
energia eólica offshore, da energia das ondas, nos veículos autónomos aéreos
e submarinos e em aplicações digitais na gestão das pescas, na administração
e segurança marítimas, e na logística portuária. Na biotecnologia marinha existem iniciativas de valorização dos nossos recursos com significativo potencial.
Na aquacultura decorrem mais de 80 projetos, na maioria no Algarve, com investimentos da ordem dos 100 M€. A disponibilidade próxima de mais fundos
europeus tem vindo a aumentar as expetativas …
A fechar, uma referência ao Campeonato Mundial de “Remo de Mar”, que se
realiza em fins de setembro nas proximidades das praias de Oeiras. Votos de
muito sucesso para este evento, e para uma muito promissora modalidade desportiva!
Alexandre da Fonseca
[email protected]
Estatuto Editorial
A Revista de Marinha é uma publicação cujo título é propriedade da firma “Editora Náutica
Nacional, Lda”, sociedade por quotas, sendo seus únicos sócios o presente editor e diretor e sua
mulher.
O tema central da revista é o Mar, cuja importância na economia, na segurança, na cultura
e na identidade nacional é por demais evidente. Este tema será abordado nas suas múltiplas
facetas, com destaque para os assuntos relativos às ciências do mar, às atividades portuárias e
às Marinhas de Guerra, de Comércio, de Pesca e de Recreio, quer de Portugal, quer dos outros
Estados lusófonos.
A Revista de Marinha é uma publicação periódica, bimestral, independente, que se rege por
critérios jornalísticos rigorosos. Os artigos e as notícias que insere terão uma análise factual, a
procura do contraditório e quando aplicável, farão uma crítica construtiva. Os autores dos artigos
serão diversificados, acolhendo-se sobre o mesmo tema opiniões diversas, que possibilitem aos
nossos leitores – a nossa verdadeira razão de ser – formarem eles próprios a sua opinião.
Na orientação geral dos conteúdos da revista, no seu equilíbrio e no relevo dado aos vários
assuntos será tida em conta a opinião do Conselho Editorial.
Revista de Marinha (ERC nº 104351): Endereço da Sede e Redação - Av. Elias Garcia, Nº 20, 4º Esq. 1000 -149 Lisboa. Propriedade da ENN – Editora Náutica Nacional, Lda.,
NIPC 501 700 536. Tm. 91 996 47 38, Tel. 21 580 98 91, e-mail:
[email protected], www.revistademarinha.com; a ENN está inscrita no registo das empresas jornalísticas sob o
nº 211781; Depósito legal nº 18 573/87. O capital desta empresa está repartido por duas quotas iguais, de 50% cada, pertencentes a Henrique Alexandre Machado da Silva da Fonseca e Maria de
Fátima Rueda Cabral Sacadura Alexandre da Fonseca. Paginação, Impressão e Acabamento: Estria, Produções Gráficas, S.A., Rua Torcato Jorge, Nº 1, Sub-Cave, 2675-359 Odivelas, Tel.
21 938 56 69, E-mail:
[email protected]; Site: estria.wix.com/estria; Tiragem deste número: 2900 exemplares; Distribuição: VASP, Tel. 21 439 85 07.
84.O Ano
Sumário
ATUALIDADE NACIONAL
FREDERICO REZENDE PLANEIA
NOVO RAID EM MOTA DE ÁGUA .................................. 18
VIAGEM INAUGURAL
DO WORLD NAVIGATOR .................................................. 5
O RINM - MAR CRESCEU NO I SEMESTRE DE 2021 .... 19
Revista de Marinha VISITA A FIRMA EID ..................... 6
APS CELEBRA PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO
COM OS PORTOS DA GUINÉ-BISSAU ............................ 6
CADETES DA ESCOLA NAVAL GANHAM
PRÉMIO INTERNACIONAL ............................................... 6
CRUZEIRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL
DE CRUZEIRO - 2021 ....................................................... 7
IN MEMORIAM ANTÓNIO RUI ABOIM .............................. 7
FORMAÇÃO E TREINO
ENTREVISTA
DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
DA I&D USV - ENAUTICA1 ............................................. 50
Revista de Marinha ENTREVISTA OS
RESPONSÁVEIS PELA AVE ROWING BOATS ................ 20
HISTÓRIA MARÍTIMA
AMBIENTE MARÍTIMO
QUATRO SÉCULOS DE SERVIÇO,
NO MAR E EM TERRA ................................................... 65
REGENERAR O OCEANO .............................................. 22
CONSERVAÇÃO DOS MANGAIS EM ÁFRICA ................ 28
NOVO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
DA “PORTOS DOS AÇORES” .......................................... 8
AMEAÇAS ÀS AVES MARINHAS EM PORTUGAL .......... 30
APS CONCESSIONA A MARINA DE SINES ..................... 8
PLANETÁRIO CALOUSTE GULBENKIAN
– CENTRO DE CIÊNCIA VIVA ......................................... 58
EMISSÕES DE SHIPIING EM DEBATE
NO PARLAMENTO EUROPEU ......................................... 9
A RENOVAÇÃO AMBIENTAL DE NAVIOS
PRÉ-2000: M/S VASCO DA GAMA ................................ 60
CLUBE DE VELA DO BARREIRO INAUGURA
INSTALAÇÕES RENOVADAS ......................................... 10
HIGH SPEED BOAT OPERATIONS
FORUM 2021 ................................................................. 10
SECRETÁRIA DE ESTADO DAS PESCAS
DE ANGOLA VISITOU PORTUGAL ................................. 10
JORNADAS DO PROJETO GUAD 20 ............................. 11
EVOCAÇÃO DO NAUFRÁGIO
DO NAVIO NUMANCIA ................................................... 11
PORTOS 4.0, PORTOS MARÍTIMOS
COM UM NOVO MOTOR ............................................... 46
CIÊNCIA & TECNOLOGIA
DUAS UNIDADES NAVAIS DA KRIEGSMARINE
NA PARADA NAVAL DE 1938 ....................................... 68
O REGRESSO DA NAU VICTORIA E A CONFIRMAÇÃO
DA CIRCUM-NAVEGABILIDADE DA TERRA ................... 70
CULTURA MARÍTIMA
O GALEÃO MECÂNICO DE AUGSBURGO ..................... 72
CRÓNICAS
MADEIRA: A PESCA APOIADA
NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA .................................... 26
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NO DOMÍNIO
DOS SISTEMAS DE COMUNICAÇÕES NAVAIS:
DO PRESENTE AO FUTURO .......................................... 62
NAVIOS DO DESPACHO 100 ......................................... 74
TRANSPORTES & LOGÍSTICA ....................................... 76
SEGURANÇA MARÍTIMA ................................................ 78
O MAR E AS LEIS .......................................................... 80
MERGULHO ................................................................... 82
ENERGIAS RENOVÁVEIS MARINHAS ............................ 84
NAVEGAÇÃO, HIDROGRAFIA
E OCEANOGRAFIA
MODELISMO .................................................................. 86
VASCO DA GAMA
REMODELADO NA LISNAVE .......................................... 12
RADARES DE ALTA FREQUÊNCIA E SUA
UTILIZAÇÃO NA OCEANOGRAFIA
E NA MONITORIAZAÇÃO DE TSUNAMIS ....................... 31
PATRIMÓNIO MARÍTIMO ............................................... 90
LINDLEY EQUIPA INFRAESTRUTURA
NÁUTICA DO TERREIRO DO PAÇO ............................... 13
ROV LUSO À DESCOBERTA DO MAR PROFUNDO ...... 34
ESCAPARATE
RUBEN EIRAS ASSUME AS FUNÇÕES DE
SECRETÁRIO-GERAL DO FÓRUM OCEANO ................. 13
ECONOMIA DO MAR
A AÇÃO NAVAL E DIPLOMÁTICA PORTUGUESA
NA GRANDE CRISE DA CHINA (1826-28) ...................... 92
GRANDE REGATA DE BARCOS MOLICEIROS ............... 14
DIGITALIZAR, DESCARBONIZAR
E ‘CIRCULARIZAR’ O MAR ............................................ 37
FUZILEIROS ................................................................... 94
PORTO DE SETÚBAL SERVIDO
POR TERMINAL LOGÍSTICO AUTOMÓVEL..................... 14
REGRESSO AO MAR… A REMAR ................................. 53
NAVEGAÇÃO A VAPOR ENTRE
O CONTINENTE E OS AÇORES ..................................... 94
NOVA OCEAN: EM PROL DO OCEANO ......................... 12
RACING FOR THE PLANET RECEBE
A VISITA DO MINISTRO DO MAR ................................... 15
NOVO COMANDANTE
DO CORPO DE FUZILEIROS .......................................... 16
PORTO DE SETÚBAL REABILITA DOCAS
DE PESCA E DAS FONTAINHAS .................................... 16
ATLAS OCEAN VOYAGES ............................................. 16
FUNCHAL HOTEL FLUTUANTE ..................................... 17
SINES ENTRE OS 100 MAIORES
TERMINAIS DE CONTENTORES .................................... 17
DESPORTOS NÁUTICOS ............................................... 88
REVISTA MILITAR .......................................................... 93
A PIRATARIA MARÍTIMA ................................................ 96
PESCA, AQUACULTURA,
SALINICULTURA E ALGAS
REVISTA AGEPOR ......................................................... 96
“OCEANO FRESCO” — A INOVAÇÃO AO
SERVIÇO DA AQUICULTURA SUSTENTÁVEL ................ 40
ARQUIVO HISTÓRICO
A Revista De Marinha HÁ MAIS
DE OITENTA ANOS… Nº 77 ........................................... 97
PORTOS & ATIVIDADES
PORTUÁRIAS
JANELA ÚNICA LOGÍSTICA: INOVAÇÃO
E DIGITALIZAÇÃO DO SETOR
PORTUÁRIO NACIONAL ................................................ 43
ASSOCIAÇÃO “ECONOMIA AZUL
– UNIDOS PELO MAR”
O OCEANO EM MOVIMENTO,
A COOPERAÇÃO ENTRE POVOS ................................... 98
Apartamentos
Turísticos
TO
N
O
C
S
DE
OS
A
%
0
2
DE
S
4
Casa
da Senhora
do Outeiro
NTE
A
N
I
S
AS
ISTA
V
E
R
DA
INHA
R
A
M
DE
revistademarinha.com
• ALGARVE
• COLARES
• BEIRA ALTA
·
Outeiro de Matados
Chãs de Tavares – 3330-034 Mangualde
E-mail:
[email protected]
Tel.: Setembro/Outubro
215 809 891 / Tlm.:
964 738
1023
2021 919
· Revista
de Marinha
Viagem Inaugural
do WORLD NAVIGATOR
o dia 24 de julho de 2021, cerca
das 16h00, largou do Cais do Bugio
do Porto de Viana do Castelo com
destino ao Terminal de Cruzeiros do Porto
de Leixões, onde atracou no dia seguinte,
mais uma nova unidade do armador Mystic
Cruises, o M/S WORLD NAVIGATOR.
A cerimónia protocolar de “troca de placas” realizou-se no dia 23 estando presentes
Joaquim Gonçalves em representação da
Administração da APDL, Vitor Figueiredo,
representante do Estaleiro West Sea, construtor do navio, Comandante Hugo Bastos
em nome do armador Mystic Cruises, o Comandante do navio Cap. Filipe Sousa e, pela
N
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
ADETA, Agentes de Navegação, Pedro Batista, comemorando desta forma a viagem
inaugural deste novo navio de cruzeiros.
Esta unidade é a terceira da gama “EXPLORER”, de construção integralmente
nacional, fazendo parte de uma encomenda inicial de três unidades (EXPLORER,
VOYAGER e NAVIGATOR). O WORLD NAVIGATOR, tal como os anteriores da sua
classe, foram construídos com base no
Código Polar (classe gelo) e estão equipados com um sistema de propulsão híbrido.
Têm capacidade para 200 passageiros e
112 tripulantes, seguindo os mais elevados padrões de qualidade, conforto e se-
· revistademarinha.com
gurança e foram concebidos para o nicho
de mercado dos “cruzeiros de expedição”.
De acordo com o anúncio feito há cerca
de ano e meio pelo estaleiro “West Sea”,
irão ser construídas mais quatro unidades
para a Mystic Cruises, de expedição polar
da classe ‘ICE’ e da gama “EXPLORER”,
no valor unitário de 286,7 milhões de euros,
formando assim uma frota de 7 navios, que
serão autênticos embaixadores de Portugal, mostrando ao mundo por onde aportam as numerosas marcas de empresas
portuguesas utilizadas na sua construção.
Manuel de Oliveira Martins
5
FOTO: LUÍS MIGUEL CORREIA.
Atualidade Nacional
84.O Ano
Revista de Marinha VISITA A FIRMA EID
e estabelecidas as bases de uma colaboração aprofundada, sendo na ocasião
assinalado que as relações entre a EID e
a RM têm lugar há mais de uma década.
Após a reunião, acompanhados pela
Diretora de Marketing, Dra. Célia Cerdeira
e pelo Engº José Luis Reis, a delegação
da RM teve a oportunidade de visitar demoradamente as instalações da EID e de
tomar contacto com alguns dos seus mais
interessantes projetos.
No passado dia 1 de junho o Diretor
da RM, V/Alm Alexandre da Fonseca e
o Diretor-Adjunto, Cmg João Rodrigues
Gonçalves visitaram a firma “EID – Empresa de Investigação e Desenvolvimento de
Eletrónica, S.A.” na Charneca da Caparica.
No encontro que teve lugar com o CEO
da firma visitada, Engº Frederico Lemos,
que iniciou funções em 1 de dezembro de
2020, foram apresentados cumprimentos
APS CELEBRA PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO
COM OS PORTOS DA GUINÉ-BISSAU
dos Portos de Língua Portuguesa. Os domínios da cooperação centram-se, entre
outros, na permuta de informação e no Intercâmbio técnico, proporcionando a realização de estágios, consultadoria técnica e
formação com a participação de profissionais das duas entidades.
O reforço da imagem do Porto de Sines
junto da comunidade marítimo-portuária é
um vetor importante da estratégia da APS,
pelo que ações como esta contribuem para reforçar a notoriedade do Porto de Sines
no contexto internacional, particularmente
junto dos portos da CPLP.
A Administração dos Portos de Sines e
do Algarve (APS) celebrou um protocolo
de cooperação com a Administração dos
Portos da Guiné-Bissau (APGB) que tem
como objetivo o intercâmbio de conhecimentos e experiências profissionais no
domínio da atividade portuária entre estas
duas administrações.
Este documento, assinado em Sines no
dia 28 de julho, enquadra-se no relacionamento histórico e cultural entre Portugal e
a Guiné-Bissau, que no âmbito marítimo-portuário se materializa na cooperação
existente ao nível da APLOP – Associação
CADETES DA ESCOLA NAVAL GANHAM
PRÉMIO INTERNACIONAL
Os dois cadetes-alunos da
Escola Naval de Portugal, foram
premiados pelo “espírito desportivo mais positivo ao longo do
campeonato”, no 52º Campeonato Mundial Militar de Vela.
O Campeonato Mundial Militar
de Vela 2021 decorreu em Marín
(Pontevedra), Espanha, no período de 6 a 12 de junho, sob a
égide do Conselho Internacional
do Desporto Militar (CISM).
O programa de 12 provas foi
ganho pela equipa militar italiana,
que venceu oito etapas, disputadas todos os dias em ótimas condições climatéricas, com ventos
predominantes entre 8 e 18 nós. Cada equipa utilizou uma embarcação da classe snipe, sendo constituída por dois atletas (1
feminino e 1 masculino), representando nove países: Espanha,
Estados Unidos da América, Dinamarca, França, Grécia, Itália,
Portugal, Rússia e Ucrânia.
Portugal fez-se representar por uma comitiva da Escola Naval,
que incluiu os velejadores Cadetes-Alunos Francisca Maurício e
6
Miguel Ribeiro, acompanhados
pelo seu treinador, 2º Ten. Pedro
Frazão, e pelo chefe de missão,
o CTen. Pedro Dias.
A cerimónia de encerramento,
presidida pelo Almirante Fausto
Escrigas, Chefe do Pessoal da
Armada Espanhola, decorreu no
dia 16 de junho, tendo a equipa
portuguesa sido agraciada com
o prémio FAIR-PLAY, por ter
demonstrado … o espírito desportivo mais positivo ao longo do
campeonato.
A Revista de Marinha congratula a Marinha de Guerra e a Escola Naval pelo sucesso da
sua participação neste campeonato mundial de vela.
Caso algum dos leitores queira seguir os passos da Francisca
Maurício e do Miguel Ribeiro, e tenha a idade adequada, aproveite para concorrer à Escola Naval. Mais informações no site
https://escolanaval.marinha.pt/pt.
João Gonçalves
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
CRUZEIRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE CRUZEIROS - 2021
500 ANOS DA VIAGEM DE FERNÃO DE MAGALHÃES
Na manhã de 22 de julho, mais de 30 veleiros escoltados por
embarcações da Marinha do Tejo partiram da Doca de Alcântara
para a IV Travessia Lisboa – Andaluzia – Ceuta – Alcoutim. Iniciativa que pôde ser apreciada em direto nas margens do Tejo
e através da Webcam Tejo Live, no portal do Porto de Lisboa.
A IV Travessia da ANC insere-se nas Comemorações dos
500 Anos da Primeira Viagem
de Circum-navegação de Fernão
de Magalhães, com um programa de 3 semanas e passagem
por vários portos na Andaluzia e
Norte de África. A iniciativa terminou no dia 11 de agosto, em
Alcoutim, subindo o Guadiana
para festejar a primeira aventura marítima global, iniciada pelo
navegador português em 1519 e
terminada em 1522, pelo navegador espanhol Juan Sebastian
Elcano.
A organização da IV Travessia
foi da responsabilidade da Associação Nacional de Cruzeiros
(ANC) e da sua congénere espanhola, Association dos 500 Años Primera Circunnavegación a
Vela, que uniram esforços e levaram a cabo esta iniciativa, com
início em Lisboa e o apoio da Administração do Porto de Lisboa
(APL).
O programa formal de eventos das Comemorações (con-
dicionado às normas e planos de contingência de cada local
a que aportaram, face ao ambiente pandémico) tiveram início em Lisboa, no dia 20 de julho. Contudo, a partir de dia
19 teve lugar a chegada de dez veleiros de cruzeiro vindos
de Espanha, pela costa ocidental atlântica de Portugal, até
à Doca de Alcântara, onde se juntaram a mais de 20 veleiros
portugueses. Nos dias 20 e 21
de julho, os participantes na IV
Travessia foram contemplados
com visitas culturais em Lisboa,
com destaque para o salão Almada Negreiros (Rocha Conde
de Óbidos), nas instalações da
APL, onde se realizou a “Receção aos Participantes”, com
entidades oficiais, degustação
gastronómica e atuações de
guitarra portuguesa e onde a
RM esteve presente.
Além do apoio da APL, a organização da IV Travessia Lisboa
- Andaluzia - Ceuta – Alcoutim
contou com o apoio da Marinha
Portuguesa, da RM, da Marinha
do Tejo, da Associação Âncoras (Oeiras), das Câmaras Municipais de Lisboa, Sines, Portimão e de Alcoutim, da Associação
Turismo de Lisboa, Administração dos Portos de Sines e Algarve
e da Estrutura de Missão Comemorativa do V centenário da 1ª
circunavegação (EMCFM).
IN MEMORIAM ANTÓNIO RUI ABOIM
FOTO - MAR
Não é fácil encontrar neste país, que se
diz de marinheiros, mas voltou costas ao
mar, um estabelecimento cuja razão de
existência radica na sua ligação às atividades ligadas ao mar e aos navios e a quem
neles trabalha. Falo da “Foto – Mar”, de Matosinhos.
Curiosamente, desde há muito tempo
que travei conhecimento com este estabelecimento. Nos meus tempos de estudante
no fim das aulas, gostava de regressar a casa a pé, ao longo da margem do Douro, para poder apreciar o movimento dos navios,
as manobras das lanchas dos pilotos e das
embarcações de pesca. Estávamos nos
primeiros anos da década de 60 do século
passado. Aos domingos, era também meu
costume dar uma passeata, até Leixões.
Naqueles tempos não existiam as preocupações securitárias de hoje. Na passagem
pela rua Brito Capelo, em Matosinhos, a caminho das docas, parava sempre diante de
uma vitrina repleta de fotografias de todo o
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
tipo de barcos, desde traineiras, arrastões,
até cargueiros e navios de passageiros, enfim sei lá que mais! Essa vitrina estava junto
da porta nº 490, que pertencia à primeira
“Foto - Mar”. Este estabelecimento, fundado por António Emílio Coelho Dias Amorim,
abriu portas em 1948, tendo laborado naquele local até à sua transferência para as
atuais instalações, no nº 390 da mesma rua.
O seu último proprietário, António Rui Coelho Dias Aboim, começou, com a idade de
15 aos, a colaborar com o seu Pai, dando-lhe depois continuidade.
Foi uma vida inteira a
correr atrás dos navios! Foi
o levantar às 6 da manhã
para chegar ao cais e procurar os melhores ângulos
para as objetivas e disparar
na direção dos navios, sempre em movimento. Depois,
sem perda de tempo, era o
mergulhar na escuridão do
· revistademarinha.com
estúdio, analisar os negativos, promover a
revelação das imagens e observar o resultado no papel para voltar logo depois às
docas, para mostrar as fotos. Porque ofereciam muito boa qualidade, não faltavam
interessados. Foi assim que a “Foto-Mar”
reuniu um riquíssimo espólio, tornando-se
uma casa de referência no âmbito da fotografia marítima.
Frequentemente recorro à “Foto-Mar”
quando necessito de fotografias para trabalhos destinados à RM. Passou assim a ser o
António Rui Aboim não só um
bom amigo, como também
uma fonte de informações e
um precioso “banco de imagens”. O amigo António Rui
Aboim faleceu na manhã do
passado dia 30 de julho. Que
descanse em paz!
Texto: Arq. Paiva Leal - Colaboração: Reinaldo Delgado
7
84.O Ano
Novo Conselho de Administração
da “Portos dos Açores”
o passado dia 16 de junho foram
eleitos para o triénio 2021-2023
e tomaram posse os novos membros do C. A. da firma “Portos dos Açores, S.A.”, constituído pelo Cte. Rui Filipe
da Silva Pereira Terra, como Presidente,
Dr.º Luís Manuel Machado da Luz e
Dr.ª Maria Sousa Lima, como Vogais.
O atual Presidente, Rui Terra, nasceu na
Ilha do Faial. Licenciado em Ciências Militares (ramo Marinha), formou-se na Escola
Naval. Comandou a Lancha de Fiscalização
RIO MINHO e o Navio Patrulha CUANZA,
para além de ter integrado as guarnições da
SAGRES, ZAIRE, VEGA, ZARCO e POLAR.
Ao longo da sua carreira, teve oportunidade
de praticar todos os portos e marinas nacionais. Prestou ainda serviço em diversas
unidades em terra, nomeadamente na Escola Naval, Flotilha, Comando Naval, Capitania do Porto de Cascais e por último, no
Centro de Excelência NATO MGEOMETOC.
Presentemente, é doutorando em Relações
Internacionais, no ISCSP.
O Vogal, Luís Machado da Luz, nasceu
na Ilha de São Miguel. Licenciou-se em
Economia, pela Universidade Católica e é
mestre em Gestão Pública, pelas Universidades dos Açores e do Minho. Desde
1992 que integra os quadros da “Portos
dos Açores”. Integrou o C.A. da “Portos
dos Açores”, eleito para o triénio 20182020, como Vogal, em outubro de 2019 e
como Presidente interino, entre dezembro
de 2020 e junho de 2021. Atualmente, é
doutorando em Sistemas de Transporte,
pela Universidade de Coimbra.
A Vogal, Maria Sousa Lima, nasceu na
Ilha de São Miguel. Licenciou-se em Psicologia Aplicada pelo ISPA. O seu percurso
N
académico inclui o Mestrado em Gestão
de Recursos Humanos e o Doutoramento
em Gestão, ambos pelo ISCTE. Profissionalmente, destaca-se a sua colaboração
na empresa Deloitte, onde desempenhou
funções na área de Human Capital e com o
Grupo SATA, onde exerceu as funções de
Diretora de Recursos Humanos.
Na tomada de posse dos novos órgão
sociais, presidida pelo Presidente do Governo Regional do Açores, Dr. José Manuel
Bolieiro, foi entendida a heterogeneidade e
o grau de diferenciação do recém empossado C.A. como um investimento claro e
apolítico na competência para a prossecução do objeto da empresa “Portos dos
Açores”, que visa a administração dos portos comerciais daquela Região Autónoma
e o exercício de todas as competências
cometidas à autoridade portuária.
Os objetivos principais do C.A. são
a reestruturação da empresa com vista
ao aumento da flexibilidade de resposta
aos seus clientes, soluções inovadoras, e
desenvolvimento de estratégias que estimulem os trabalhadores. Com esta reorganização pretende-se que os valores e
missão da “Portos dos Açores” se mantenham, uma vez que a firma assume uma
importância ímpar no contexto empresarial
e social da Região, pois mais de 98% dos
bens que entram anualmente nos Açores
fazem-no através de infraestruturas portuárias.
Situada no meio do Atlântico, a “Portos dos Açores” distingue-se das restantes Administrações Portuárias pela sua
condição ultraperiférica, quantidade de
portos, marinas e núcleos de recreio que
gere, mas também pelo seu contributo e
relevância na economia regional e no apoio
aos desígnios estratégicos nacionais.
Rute Machado
APS CONCESSIONA A MARINA DE SINES
atividades ali desenvolvidas. Recorde-se que
em Sines está localizado o único porto de recreio na costa entre Setúbal e o Algarve, sendo por isso ponto de passagem ou de abrigo
das embarcações que percorrem a costa
portuguesa, contribuindo para o desenvolvimento turístico de Sines e área envolvente.
Apesar da concessão, a APS irá assumir este ano todos os compromissos previstos no âmbito da candidatura do Porto
de Recreio de Sines ao Programa Bandeira
Azul 2021, incluindo as atividades de educação ambiental.
A APS – Administração dos Portos de
Sines e do Algarve celebrou um Contrato
de Concessão do Porto de Recreio de Sines com a empresa “Mermaid Objective”,
pelo prazo de 10 anos, na sequência do
concurso público recentemente realizado.
Esta concessão, efetiva a partir de 1 de
julho, tem por objeto principal o direito de
exploração comercial do Porto de Recreio
de Sines, em regime de serviço público, e
implica a transmissão para a concessionária
de todas as situações jurídicas atualmente
na titularidade da APS relacionadas com as
8
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
Emissões do shipping em debate
no Parlamento Europeu
or iniciativa do Grupo ‘Mares, Rios, Ilhas e Zonas Costeiras’
do Parlamento Europeu teve lugar, no passado dia 15 de
junho de 2021, em Bruxelas, um colóquio subordinado ao
tema O que pode fazer o shipping para reduzir as suas emissões hoje e amanhã?
Este encontro visava discutir as perspetivas que se abrem no
âmbito do cumprimento dos objetivos traçados no quadro do
Green Deal e da Estratégia para
uma Mobilidade Sustentável, da
Comissão Europeia, que apontam
para 2050 como meta para se atingirem as emissões zero de CO2.
Os participantes neste evento
(representantes da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu,
de empresas do setor de turismo
de cruzeiros, de inovação tecnológica e de construção naval) tiveram oportunidade de salientar os
aspetos seguintes: a questão deve relevar de uma visão sistémica,
que abranja potencialmente todos
os sistemas de transporte, embora
se reconheça que se trata de um sector em que se torna difícil
a descarbonização e que está sujeito a forte concorrência; a
tecnologia e as parcerias com a indústria desempenham um
papel central nesta matéria; deve atentar-se nas fontes de financiamento, na discussão que tem lugar atualmente com a
OMI (Organização Marítima Internacional) sobre a utilização de
P
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
um fuel standard a médio e longo prazo, e na definição de um
quadro regulamentar que discipline a utilização de combustíveis
alternativos. Foi ainda referido que há projetos em curso relativos a métodos alternativos de propulsão com a utilização de
baterias, fuel cells, metanol, energias solar e eólica, para além
do denominado bio-GPL. Um problema que se levanta é o do
armazenamento dos combustíveis a bordo, nomeadamente
do GPL, do metanol, da amónia e
do hidrogénio, pelo que convém,
previamente, em relação a cada
tipo de navio, definir o combustível
adequado. Atentou-se igualmente na necessidade de adaptação
dos portos para se dotarem com
infraestruturas de fornecimento de
energia (shore power).
Como elementos importantes
no debate foram mencionados a
necessidade de financiamento e a
possibilidade de revisão das diretrizes comunitárias sobre auxílios nacionais relativas aos transportes por
forma a acomodar as iniciativas de
descarbonização nos orçamentos nacionais.
As conclusões do colóquio estiveram a cargo da Dra. Cláudia
Monteiro de Aguiar, Membro do Parlamento Europeu e Vice-Presidente do Grupo para as Regiões Ultraperiféricas.
Fernando Correia Cardoso
9
84.O Ano
CLUBE DE VELA DO BARREIRO
INAUGURA INSTALAÇÕES RENOVADAS
Em cerimónia presidida pelo Secretário
de Estado da Juventude e do Desporto,
João Paulo Rebelo, que contou com a
presença da Presidente da CCDR-LVT,
Arqª Maria Teresa Almeida, do Presidente
da Câmara Municipal do Barreiro, Frederico Rosa e do Coordenador Nacional do
Desporto Escolar, Rui de Carvalho, o Clube de Vela do Barreiro (CVB), presidido por
Duarte Romão, inaugurou em 4 de Junho
as suas requalificadas instalações desportivas.
Correspondendo a um investimento
global de 100 m€, co-financiados a 50%
pela CCDR-LVT, no âmbito do Programa
de Equipamentos Urbanos de Utilização
Colectiva 2018, a 25% pelo IPDJ, no âmbito do PRID – Programa de Requalificação de Instalações Desportivas de 2018, a
15% pela Câmara Municipal do Barreiro e
com os restantes 10% pelo próprio Clube,
a requalificação das instalações permite in-
troduzir melhorias significativas no espaço
social, na sala de formação e de reuniões,
nos balneários e nas áreas de parqueamento das embarcações.
O CVB, além de acolher o Centro de
Formação Desportiva de Actividades Náuticas do Desporto Escolar do Barreiro, com
sede no Agrupamento de Escolas Augusto
Cabrita, e de parquear as suas embarcações de Vela e de Canoagem, fica dotado
de um equipamento renovado que permite
reforçar os programas da sua Escola de
Vela e dar continuidade aos Sailing Camps
de verão, responsáveis pela captação de
40% dos novos velejadores.
Com créditos firmados na promoção
da Vela em Portugal, tanto ao nível da formação como da competição, o CVB está
de parabéns por ter sabido aproveitar as
oportunidades cruzadas de co-financiamento na renovação das suas instalações.
Um exemplo a replicar entre os muitos
Clubes Náuticos que possuem instalações
inadequadas.
Rui Abreu
OBSERVAÇÃO:
O autor não segue o novo A.O..
HIGH SPEED BOAT OPERATIONS FORUM 2021
A conferência internacional HSBO está
de volta em 2021!
O Fórum de Operações de Embarcações de Alta Velocidade foi realizado de
31 ago a 2 set 2021, em Gotemburgo, na
Suécia. A novidade deste ano é a cooperação do HSBO com a Royal Institution
of Naval Architects (RINA), fundada em
1860 em Londres para promover a ciência em torno do design de navios.
Este evento internacional reúne especialistas e profissionais do mundo náutico, incluindo representantes das mais
diversas agências governamentais ligadas à construção e operação de embar-
cações de alta velocidade, juntamente
com operadores profissionais, cientistas, médicos especializados, arquitetos
navais e engenheiros. A participação é
exclusivamente reservada a delegações
convidadas.
O programa em 2021 incluiu cerca de
30 apresentações sobre temas técnicos,
científicos, operacionais e regulatórios.
Os testes das embarcações presentes
no fórum serão efetuados à velocidade
máxima em águas abertas, independentemente das condições meteorológicas.
SECRETÁRIA DE ESTADO DAS PESCAS
DE ANGOLA VISITOU PORTUGAL
fileira do pescado, construção naval, polos
de investigação e indústrias associadas.
As relações entre Portugal e Angola são
já bastante intensas, mas existem oportunidades de aprofundamento da cooperação
importantes em termos do conhecimento
científico do mar, dos procedimentos, da
construção e reparação naval e do ordenamento e gestão dos recursos naturais.
As relações históricas e culturais e uma
língua comum facilitam a cooperação entre
as duas tutelas e permitirão aprofundar a
partilha de conhecimento e a modernização do setor das pescas nos dois países.
A Secretária de Estado das Pescas de
Angola, Esperança Eduardo da Costa,
foi recebida pela sua homologa nacional,
Teresa Coelho, tendo sido abordadas
as perspetivas de maior cooperação em
áreas relacionadas com o mar, seguida
de um conjunto de visitas a instituições e
empresas relacionadas com as pescas em
Lisboa, Nazaré e Peniche.
A DGRM, através do seu Diretor-Geral,
José Simão, em conjunto com representantes do IPMA e da Docapesca, integrou
a receção à comitiva de Angola, tendo
acompanhado as visitas a empresas da
10
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
JORNADAS DO PROJETO GUAD 20
GUADIANA, PATRIMÓNIO NATURAL NAVEGÁVEL
A Direção-Geral de Recursos Naturais,
Segurança e Serviços Marítimos (DGRM)
participou nas jornadas de encerramento do Projeto GUAD 20 – Guadiana, Património Natural Navegável, do Programa
INTERREG V-A 2014-2020 Espanha-Portugal, que decorreram em 7 de julho, nas
instalações do Porto de Huelva.
O Projeto GUAD 20 contemplou o estabelecimento da navegabilidade do rio Guadiana no troço Alcoutim-Pomarão, fazendo
parte do conjunto de intervenções:
• O estabelecimento de um canal navegável de 30 m de largura;
• A colocação de assinalamento marítimo;
• A construção de vários cais de acesso
e de amarração de embarcações;
• A produção das cartas náuticas em
todo o troço internacional do Rio Guadiana
entre Vª Real de Santo António e o Pomarão.
O evento contou com um painel inicial
de oradores, constituído pela Presidente
do Porto de Huelva, Pilar Miranda, pelo
Diretor-Geral da Agência Pública de Puertos da Andaluzia, Rafael Merino López,
pelo Diretor-Geral da DGRM, Engº José
Carlos Simão, e pelo Diretor-Geral do Ins-
tituto Hidrográfico (IH), Alm. Carlos Ventura
Soares.
Seguiu-se um conjunto de apresentações técnicas dos trabalhos realizados no
âmbito do projeto GUAD 20, nas quais se
destacam o projeto de navegabilidade e
assinalamento apresentado pela DGRM
e as novas cartas náuticas, apresentadas
pelo IH.
Foram também abordados os trabalhos
futuros, a desenvolver no próximo programa INTERREG, que passam pela navegabilidade no último troço entre Pomarão e
Mértola, pela realização de mais infraestruturas de acostagem e de acesso de pes-
soas ao rio, e ainda, pela necessidade de
uma nova intervenção ao nível da barra do
Guadiana. Deverão também ser realizados
esforços para promover este ativo natural e
cultural, que devem ser dinamizados com
requisitos de segurança e controlo, preservando igualmente os valores ambientais de
todo o vale do Guadiana.
Como mote geral das Jornadas, ficou
a mensagem de que o rio Guadiana será
cada vez mais um motivo de união entre
Portugal e Espanha e um motor para o desenvolvimento económico nos municípios
envolventes, designadamente atividades
de náutica de recreio e turismo.
EVOCAÇÃO DO NAUFRÁGIO DO NAVIO NUMANCIA
No dia 1 de julho, na Praia do Ouro em
Sesimbra, teve lugar uma curta cerimónia
de evocação do encalhe do navio NUMANCIA, a poucos metros daquele local,
ocorrido em 17 de dezembro de 1916.
Da classe das fragatas, o NUMANCIA foi
construído em França entre 1862 e 1863,
e entrou ao serviço da Armada Espanhola em dezembro de 1864. Com 96,08 m
de comprimento e 7,90 m de calado, com
uma propulsão de 1.100 CV que lhe permitia uma velocidade de 13 nós, o navio
era bastante sofisticado para a época, de
transição dos cascos em madeira para os
de aço, e da propulsão eólica para a mecânica, ou mista.
Nos primeiros dias do ano de 1865 rumou ao Pacífico, num cenário bastante
conturbado não apenas entre Madrid e as
suas antigas colónias americanas, como
entre estas entre si. Daqui o navio navegou
por todos os mares, tendo mesmo entre
1865 e 1867, completado a volta ao mundo. Seguiram-se muitas mais missões, e
algumas e sucessivas metamorfoses ocorRevista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
ridas em estaleiros, por forma a adaptá-la
aquelas missões, e finalmente, pejada de
glória, fundeou para descanso em Cádis,
onde pouco depois foi dada como sucata,
e vendida para desmonte em Bilbau.
Mas antes de lá chegar, a meio da viagem, encalhou em Sesimbra, e depois de
parcialmente desmontada no local, afundada. Os seus restos podem ser observados naquele mar transparente, havendo
por razões de segurança, que respeitar a
· revistademarinha.com
interdição de mergulho. Em complemento,
alguns objetos de maior interesse, podem
ser observados no excelente Museu Marítimo de Sesimbra, na Fortaleza de Santiago,
a par de descrições substanciais sobre a
ocorrência.
A Câmara Municipal de Sesimbra, 105
anos depois, na pessoa da Vice-Presidente, Drª Felícia Costa, em articulação com a
Embaixada de Espanha, decidiram recordar
o acontecimento, escolhendo apropriadamente o Dia Mundial do Salvamento, para
o perpetuar através de uma placa evocativa, em local próximo dos restos do navio.
Estiveram presentes o Adido de Defesa
Espanhol, o Capitão do Porto de Setúbal,
membros da APSS, a Autoridade Portuária,
e diversas individualidades interessadas no
assunto, com destaque para uma neta de
um dos sobreviventes do naufrágio, que
grato pelo auxílio prestado no salvamento
pela população local, acabou por se radicar
na belíssima Vila de Sesimbra.
Artur Manuel Pires
11
84.O Ano
NOVA OCEAN: EM PROL DO OCEANO
No âmbito do Dia Mundial do Oceano, a NOVA School of Law organizou o
workshop Internacional From Integrated
Maritime Policy to International Ocean Governance: the progressive development of
EU maritime policies, um evento paralelo
da Presidência Portuguesa do Conselho
da ONU, encerrado pelo enviado especial
do Secretário-Geral da ONU para os Oceanos, o embaixador Peter Thomson.
O evento permitiu uma reflexão sobre a
Política Marítima integrada da UE, versando temas, como o nexo Oceano-Clima e o
elo entre o European Green Deal e a Blue
Agenda.
Serviu ainda de mote para o lançamento do NOVA OCEAN Knowledge Centre, o
novo centro da NOVA School of Law, que
solidifica a aposta no estudo e investigação das questões relacionados com a governação do mar, já vigente no Mestrado
em Direito e Economia do Mar, o 4º melhor do mundo no ranking da Eduniversal.
Segundo a sua coordenadora, a Profª.
Assunção Cristas, o NOVA OCEAN foca-se em três grandes áreas - governação do
mar, direito do mar e economia sustentável
azul -, contribuindo para o cumprimento
do ODS 14 - Life below Water, em linha
com a adesão da NOVA School of Law à
United Nations Global Compact, a Agenda
Azul da ONU e a Estratégia Nacional do
Mar 2021-2030
O workshop contou com a Diretora da
NOVA School of Law Profª Mariana França
Gouveia e com o Prof. Armando Marques
Guedes (NOVA School of Law), bem como
a Secretária de Estado das Pescas, Teresa
Coelho, em nome do Ministro do Mar, que
destacou a importância do NOVA OCEAN
e o foco na Lei e na Sociedade enquanto
contributo para a necessidade do conhecimento aplicado à governação do mar e
elaboração de políticas.
Marcaram também presença os oradores Sofia Guedes Vaz (IFILNOVA - FCSH,
Univ. NOVA de Lisboa); Goran Dominioni
(Univ. de Dublin); Ana Peralta Baptista (Direção-Geral dos Assuntos Marítimos e das
Pescas); Antonio Leandro (Univ. de Bari);
Vasco Becker-Weinberg, (NOVA School of
Law); e Adelaide Ferreira (MARE–Univ. de
Lisboa).
A encerrar, Peter Thomson felicitou
Portugal pela dedicação ao Oceano, destacando-nos como um país da linha da
frente. O Embaixador distinguiu também
a NOVA School of Law no ecossistema
académico português, aproveitando para salientar que a Humanidade deve dar
atenção à ciência, investigação, inovação,
tecnologia e, naturalmente, ao papel das
Universidades, assinalando o trabalho crucial da NOVA School of Law e o passo ambicioso que é a criação do NOVA OCEAN.
VASCO DA GAMA REMODELADO NA LISNAVE
O maior e mais recente navio do armador
Mário Ferreira (Grupo Mystic) já tem estatuto de “amigo do ambiente”, após uma remodelação e manutenção geral de que foi
alvo, em tempo recorde, na Lisnave. Esta
unidade iniciou provas de mar, tendo antes,
no dia 2 de julho, sido visitada pelo Ministro
do Mar, Prof. Doutor Serrão Santos.
Os motores principais do navio, que tem
30 anos, foram equipados com catalisadores para reduzir as emissões de carbono
em mais de 70%. O projeto inovador da
firma tecnológica portuguesa Tecnoveritas
foi bem-sucedido tendo os resultados satisfeito os novos requisitos ambientais. Os
testes estão a ser feitos com um observador norueguês a bordo, para que o navio
obtenha a licença para operar nos Fiordes
da Noruega. A intervenção passou também pela instalação de uma estação de
tratamento de águas residuais.
Com estes fabricos, o VASCO DA GAMA cumpre não apenas as normas ambientais em vigor, mas também as que
estão previstas para depois de 2025. Está, por isso, em condições de operar em
águas que exigem requisitos mais exigentes, como é o caso do Mar Báltico.
Esta intervenção foi projetada e executada por empresas portuguesas o que
evidencia a capacidade nacional para a
12
modernização de navios; é uma oportunidade que o país deveria aproveitar, uma
vez que há muitos navios que precisam de
ser convertidos para as novas exigências
ambientais.
A tinta usada na pintura exterior geral foi
fornecida pela Hempel, empresa que tem
fábrica em Palmela e o luxuoso interior,
que inclui vários restaurantes, bares, ginásio, SPA e auditórios, foi melhorado, com
recurso a empresas e materiais portugueses. Os móveis, carpetes e roupas de cama são fabricados em Portugal.
A Revista de Marinha assinala com
revistademarinha.com
gosto a orientação para “comprar português” do Grupo Mystic, um exemplo para
os nossos empresários; bem-haja Dr. Mário Ferreira!
Concluída a reparação na Lisnave, o
navio vai seguir para a Alemanha, para o
porto de Kiel, para embarcar passageiros e
trabalhar na área do Báltico e da Noruega
durante o Verão.
O VASCO DA GAMA, a última aquisição
do Grupo Mystic, tem 210 m de comprimento, 30 m de boca, tem cerca de 550
tripulantes e capacidade para mais de
1.000 passageiros.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
LINDLEY EQUIPA INFRAESTRUTURA
NÁUTICA DO TERREIRO DO PAÇO
A Associação de Turismo de Lisboa
(ATL) inaugurou recentemente a renovação da zona ribeirinha junto à icónica Praça do Comércio de Lisboa.
A firma Lindley foi selecionada para este emblemático e delicado projeto,
nomeadamente para o fornecimento do
equipamento náutico da nova infraestrutura da Doca de Marinha. O principal
objetivo do projeto era reabilitar a zona
ribeirinha do centro da cidade, focada na
relação da cidade com o rio, criando cais
de acesso seguro e fácil para embarcações de turismo, contudo mantendo a estética e o charme daquela zona histórica
de Lisboa.
O primeiro projeto localizado em frente
à Praça do Comércio é um cais de de-
sembarque de 30 m de comprimento para
embarcações de turismo, construído com
um pontão de betão de 6 m de largura
com deck de madeira seguido por uma
passarela em aço de 20 m ancorada com
fingers reforçados de 20 m de raio. O segundo projeto, algumas centenas de metros rio acima, na Doca de Marinha, uma
antiga bacia agora convertida num pequeno porto para embarcações ligeiras,
tradicionais e de turismo. Este projeto envolveu o fornecimento de um quebra-mar
flutuante de betão e de pontões de aço
atracados em estacas. O projeto vai permitir aos visitantes desfrutar de passeios
no rio, uma vez que a Doca de Marinha
vai receber as típicas embarcações do rio
Tejo. Ambos os projetos foram equipados
com pedestais de luz, eletricidade e água,
além dos equipamentos de segurança necessários nestas infraestruturas.
RUBEN EIRAS ASSUME AS FUNÇÕES
DE SECRETÁRIO-GERAL DA FÓRUM OCEANO
O novo Secretário-geral da Fórum
Oceano – Associação da Economia do
Mar iniciou o seu mandato a partir do dia 1
de setembro.
É com elevada honra, motivação e empenho que abraço este novo desafio. Nos
seus 12 anos de existência, a Fórum Oceano tem vindo a desempenhar um papel cada vez mais efetivo no apoio à estruturação
de um cluster industrial da economia do
mar, competitivo e sustentável, em Portugal. Prova disso é o regular crescimento
do seu volume de associados, o crescente
número de projetos de relevância estratégica que a Fórum Oceano lidera ou está
envolvida, afirmou Ruben Eiras na ocasião.
Antes de assumir a função de Secretário-Geral, no último ano e meio, Ruben
Eiras exerceu a função de Coordenador
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
para a Economia Azul, Inovação, Investimento e Financiamento na Fórum Oceano. É mentor do Programa de aceleração
de start-ups Ocean Stream do Creative
Destruction Lab, sedeado no Canadá e
do Sustainable Ocean Accelerator, e ‘coa-
· revistademarinha.com
cher’ da Blue Invest Platform da Comissão
Europeia.
Ruben Eiras sucede a Rui Azevedo, que
assegurou a direção executiva da Fórum
Oceano ao longo dos últimos 12 anos e
que continuará a colaborar com a Associação, como consultor estratégico.
A Fórum Oceano - Associação da Economia do Mar gere o cluster do Mar Português, e é reconhecida pelo Governo.
Tem cerca de 125 associados dos diversos setores da economia do Mar, quer de
atividades consolidadas como a Pesca e
Aquacultura, Transformação e Comercialização do Pescado, Indústrias Navais,
Portos, Transporte Marítimo e Turismo
Náutico, quer das atividades emergentes
como as Energias Renováveis Oceânicas
e as Biotecnologias Marinhas.
13
84.O Ano
GRANDE REGATA DE BARCOS MOLICEIROS
Organizada pela Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro e integrada no
“Ria de Aveiro Weekend”, teve lugar no
dia 3 de julho, a “Grande Regata de Barcos Moliceiros”, que liga a praia do Monte
Branco, na Torreira, concelho da Murtosa,
à cidade de Aveiro, no canal das Pirâmides, junto à marinha de sal da Troncalhada.
Esta é a primeira das três regatas anuais
de barcos moliceiros, que navegam à vela
na sua conceção tradicional, seguindo-se,
em agosto, as regatas da Festa do Emigrante, no Bico, e em setembro, as da
Romaria de São Paio, na Torreira, ambas
nas águas da Murtosa e com organização
do seu Município, de onde são oriundos,
praticamente, todos os tripulantes, barcos
e construtores.
Pela manhã, antes da regata de 3 de julho, decorreu na Praia do Monte Branco o
já habitual concurso de “painéis” dos moliceiros, pintados pelo mestre pintor José
Oliveira.
Nesta regata, que teve a duração aproximada de 1h30m, com partida às 14h30,
participaram 9 barcos moliceiros com as
medidas tradicionais e 2 réplicas, de menores dimensões, sendo que apenas um
dos moliceiros não era originário da Murtosa.
O vencedor foi a embarcação MARCO
SILVA, da Torreira, cujo proprietário, com
o mesmo nome, foi também o seu cons-
trutor, somando a sua já oitava vitória. Para
além de possuir uma companha de pesca
de arte xávega na praia da Torreira, Marco
Silva é um exímio artesão de embarcações
de madeira tradicionais tendo já saído das
suas mãos muitos moliceiros, xávegas e
bateiras.
Em segundo lugar, a uma curta distância do vencedor, ficou a embarcação ZÉ
RITO, propriedade do arrais José Rito,
vencedor do ano passado, também ele
carpinteiro naval e construtor de embarcações no museu estaleiro do Monte Branco,
na Torreira, bem como pescador da comunidade local.
A classificação final foi a seguinte:
Classe A (medidas tradicionais)
1º - MARCO SILVA
2º - ZÉ RITO
3º - O CONQUISTADOR
Classe B (menores dimensões)
1º - O PEQUENITO
2º - SEMAR
Concurso de “Painéis” dos Moliceiros
1º - A. RENDEIRO
2º - MARCO SILVA
3º - UM SONHO
João Dias Cruz
PORTO DE SETÚBAL SERVIDO POR TERMINAL
LOGÍSTICO AUTOMÓVEL
O Porto de Setúbal passa a ter mais
uma solução logística, com a entrada em
funcionamento do TLA - Terminal Logístico
Automóvel, um novo projeto dos Grupos
SAPEC e BARRAQUEIRO. Para assinalar
a ocasião, no dia 21 de junho, o TLA convidou a APSS - Administração dos Portos
de Setúbal e Sesimbra para uma visita de
apresentação às instalações, que contou
ainda com a presença dos representantes
da Navipor, operador portuário Ro-Ro de
referência.
O parque automóvel, situado a 5 km
do Terminal Ro-Ro, dedicado à armazenagem, preparação e personalização de
veículos acabados, tem capacidade para
6.000 viaturas e irá criar 100 postos de
trabalho. Gilberto Quintas, Diretor-Geral
do TLA, afirmou que o principal objetivo
do parque é aproveitar e complementar o
grande potencial do Porto de Setúbal co14
mo porta de entrada ibérica, sem nunca
esquecer o seu grande potencial de buffer
logístico e de transhipment.
O TLA apresenta-se como uma solução
logística de última geração, com ligações
rodoviárias e ferroviárias. Construído a
pensar no futuro, está equipado com 64
postos de carregamento rápido para via-
revistademarinha.com
turas elétricas o que o torna num player
incontornável do mercado ibérico. O TLA
encontra-se a desenvolver ações comerciais junto das principais marcas do setor
automóvel com o fim de captar clientes.
O Porto de Setúbal é já um importante
porto ibérico, líder nacional no segmento
Ro-Ro, sendo ali movimentadas cerca
de 90% das viaturas novas que saem e
entram em Portugal por via marítima. É
uma carga de elevado valor, que aporta rendimentos e representatividade ao
porto quando suportada por uma oferta
logística moderna e competitiva. Neste
sentido, o início da atividade deste novo
parceiro na área logística automóvel é
mais um passo para o seu crescimento
sustentado, demonstrando a capacidade
da infraestrutura portuária para uma resposta competitiva às necessidades do
setor automóvel.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
RACING FOR THE PLANET
recebe a visita do Ministro do Mar
Ministro do Mar, Prof. Doutor Ricardo Serrão Santos, visitou na
manhã de 27 de agosto, em Cascais, a embarcação RACING FOR THE
PLANET, da equipa de vela “Mirpuri Foundation Racing Team”, que recentemente
trouxe a taça da The Ocean Race Europe
para Portugal.
O momento ficou marcado pela receção a bordo pelo Presidente da Fundação
Mirpuri, Dr. Paulo Mirpuri, também ele velejador, que manifestou … uma enorme
satisfação pela vontade do Sr. Ministro em
vir conhecer o triunfante barco VO65 RACING FOR THE PLANET, que deu a vitória
à equipa portuguesa na prestigiada regata
The Ocean Race Europe, e que colocou
Portugal nos holofotes da vela internacional.
A visita inseriu-se no âmbito da participação da equipa “Mirpuri Foundation
Racing Team” numa das maiores e mais
prestigiadas regatas realizadas em Portugal, a Cascais Vela, organizada pelo Clube
Naval de Cascais e que foi disputada, no
campo de regatas de Cascais, entre 27 e
29 de agosto. Bernardo Freitas, Frederico
Melo, Mariana Lobato e António Fontes
competiram em águas portuguesas, con-
O
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
tinuando a passar a mensagem da campanha da Fundação Mirpuri para a área
da conservação marinha, que pretende
sensibilizar para os graves problemas que
afetam os nossos oceanos e as alterações
climáticas que estamos a viver.
O Ministro do Mar, Prof. Doutor Ricardo
Serrão Santos, elogiou o trabalho, a competência e a dedicação dos velejadores
· revistademarinha.com
portugueses e acrescentou que … velejar
nesta embarcação constituiu uma excelente oportunidade para conviver no mar
com uma equipa que mantém Portugal na
vanguarda da vela de alta competição. A
Fundação que apoia este projeto tem uma
importante e inovadora agenda de combate às alterações climáticas e ao plástico
nos oceanos.
15
84.O Ano
NOVO COMANDANTE DO CORPO DE FUZILEIROS
ções impostas pela atual situação pandémica.
No ano em que se celebram os 400
anos da criação do Terço da Armada da
Coroa de Portugal, do qual o Corpo de Fuzileiros é o legítimo herdeiro, este foi um
momento de acrescido significado para
todos os Fuzileiros, uma vez que se tratou do primeiro oficial oriundo dos cursos
tradicionais da Escola Naval, da Classe de
Fuzileiros, a ser designado para comandar
este Corpo quadricentenário.
A cerimónia de rendição do cargo de
Comandante do Corpo de Fuzileiros realizou-se a 14 de julho de 2021, no Museu
do Fuzileiro, na Escola de Fuzileiros, e foi
presidida pelo Comandante Naval, V/Alm.
Silvestre Correia.
Nesta ocasião, o Comodoro Paulo Silva Ribeiro passou o testemunho ao Capitão-de-mar-guerra Fuzileiro Artur José
Figueiredo Mariano Alves, numa cerimónia que contou com um muito limitado
número de convidados, devido às restri-
PORTO DE SETÚBAL REABILITA DOCAS
DE PESCA E DAS FONTAINHAS
A APSS-Administração dos
Portos de Setúbal e Sesimbra,
S.A., concluiu em junho duas
intervenções nas infraestruturas das docas de Pesca e
das Fontainhas. Na primeira, a
pintura do pavimento do molhe nascente e, na segunda,
a reabilitação dos passadiços
interiores.
No molhe nascente da Doca
dos Pescadores a intervenção
consistiu na pintura da delimitação e numeração dos espaços para aprestos marítimos,
redes e contentores de aprestos de pesca, bem como na
delimitação das zonas de ganchorra e cerco, num investimento
total de cerca de 7,2 m€.
A obra de requalificação dos passadiços no interior da Doca
das Fontainhas, com um investimento de 175 m€, teve
como objetivo recuperar e/
ou substituir todo o conjunto de passadiços instalados
na doca, incluindo a recuperação das estacas, dos
flutuadores, dos fingers, do
tabuado do convés e dos
restantes elementos acessórios, como cunhos de amarração.
Estas ações, cujo objetivo
passa por assegurar o uso
destas infraestruturas em
plenas condições de ordenamento, operacionalidade
e de segurança, inserem-se na continuidade dos trabalhos efetuados pela APSS, no reconhecimento da importância das atividades da pesca e do turismo náutico.
ATLAS OCEAN VOYAGES
A viagem inaugural do novo navio de
cruzeiros WORLD NAVIGATOR, acabado
de construir no estaleiro de Viana do Castelo pela WestSea em julho, teve início no
Pireu a 4 de agosto e assinala o começo
de operações de mais uma empresa de
cruzeiros da MysticInvest Holding, de Mário Ferreira, a Atlas Ocean Voyages.
Baseada em Fort Lauderdale, na Florida, e vocacionada para o mercado de cruzeiros internacionais de expedição de luxo,
a Atlas Ocean Voyages estreou-se com
uma série de cruzeiros no Mediterrâneo, a
que se segue uma viagem de Lisboa para
as Caraíbas, em outubro, e uma série de
cruzeiros na Antártida no próximo Inverno.
O WORLD NAVIGATOR é o terceiro
navio da classe WORLD EXPLORER, e
16
apresenta melhorias assinaláveis face
aos seus dois irmãos WORLD EXPLORER e WORLD VOYAGER, com interiores
especialmente requintados concebidos
pela empresa de design “Oito em Ponto”. A frota da Atlas Ocean Voyages vai
ter 5 navios até 2023: para o ano juntam-se ao WORLD NAVIGATOR os gémeos
WORLD TRAVELLER e WORLD SEEKER,
e no ano seguinte serão introduzidos o
WORLD ADVENTURER e o WORLD DISCOVERER, todos com 9.900 GT e capacidade para 196 passageiros, construídos
em Viana do Castelo. A série poderá ser
ainda ampliada com mais duas unidades,
a totalizar 9 paquetes.
Em termos de destinos, a frota da Atlas
Ocean Voyages deverá privilegiar o Mediterrâneo, Ártico, Antártico, Fiordes da Noruega, Caraíbas e outras rotas exóticas.
LMC
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
FUNCHAL HOTEL FLUTUANTE
A história do carismático paquete FUNCHAL está a ser acrescentada de mais
um capítulo improvável. Investidores dos
Estados Unidos compraram o navio em
Inglaterra, em janeiro, e, entretanto, decidiram-se pela sua conversão para hotel
flutuante de luxo, em Lisboa. A venda do
FUNCHAL, por 1,9 M USD, derivou da falência do armador britânico SGL Cruises
(Signature Living), que por sua vez havia
comprado o paquete em Lisboa em dezembro de 2018, por 3,9 M€.
Os trabalhos de manutenção e adaptação foram iniciados na Matinha, e o FUNCHAL foi rebocado a 11 de julho último
para o estaleiro Navalrocha. Está a ser feita
a renovação geral do navio, com decapagem e pintura dos exteriores, remoção da
totalidade do amianto, alteração dos interiores por forma a serem montados camarotes mais espaçosos, para cerca de 250
hóspedes. Estão programados três meses
em doca seca, e o navio vai gerar 180
postos de trabalho. A previsão de acabamento da reparação aponta para 2022. O
FUNCHAL vai manter hélices e máquinas,
o que indicia uma probabilidade de um dia
voltar a navegar. Apesar de não ter manutenção técnica desde 2015, e o seu aspeto se ter degradado consideravelmente, o
casco do FUNCHAL mantém-se em muito
bom estado.
A capacidade do paquete FUNCHAL de
superar as adversidades da última década é
surpreendente, em especial desde que perdeu a proteção do armador George Potamianos, falecido em maio de 2012, quando
aumentaram significativamente os riscos de
ser vendido para sucata. Essa possibilidade
foi adiada em 2013 quando Rui Alegre comprou e modernizou o FUNCHAL, mas não
conseguiu obter sucesso com os cruzeiros
da “Portuscale Cruises”, e o navio acabou
por sobreviver a seis anos de imobilização,
com uma tripulação reduzida.
O FUNCHAL continua com bandeira
nacional, registado na Madeira. Apesar de
já ter sofrido alterações significativas, mantém grande prestígio internacional; em 60
anos nunca mudou de nome. Enquanto
foi português perdeu sempre dinheiro, foi
bem-sucedido nos cruzeiros internacionais, especialmente de 1985 a 2010.
Os novos proprietários pretendem
manter o navio atracado na zona da EXPO.
LMC
SINES ENTRE OS 100 MAIORES TERMINAIS DE CONTENTORES
O Porto de Sines ocupa a 98ª posição
do World Top Container Ports 2021 da
revista “Container Management”, registando uma subida de 7 lugares comparativamente ao ranking do ano anterior.
O Terminal de Contentores de Sines
(Terminal XXI) encerrou o ano de 2020
com um crescimento homólogo de 13%,
com um total de 1.611.963 TEU movimentados, o que lhe permitiu subir 7 posições
no ranking internacional, voltando a integrar o Top 100 mundial na 98ª posição.
No corrente ano, Sines mantém a senda
de crescimento e fechou o primeiro semestre com um crescimento homólogo
de 22,5%, prevendo-se, no final de 2021,
uma movimentação total muito próxima de
1,8 milhões de TEU.
Tendo em conta o contexto adverso
que a pandemia tem vindo a impor desde
o início de 2020, estes excelentes resultados atestam a resiliência de toda a Comunidade Portuária e Logística de Sines
em manter e reforçar as cadeias logísticas,
tendo o porto conseguido estar 100%
operacional durante todo este período.
Recorda-se que, no final de 2019, foi
assinado o aditamento ao contrato entre
a PSA Sines (concessionária do Terminal
XXI) e a Autoridade Portuária (APS), com
vista à duplicação da capacidade do Terminal para 4,1 milhões de TEU. O investimento privado de 660,9 M€, por parte
da PSA Sines, resultará na ampliação do
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
cais para 1.750 m, possibilitando a operação simultânea de quatro megacarriers.
Esta obra avança a bom ritmo, cabendo à
APS a obra da extensão da proteção marítima que abrange toda a parte leste do
porto. Em 2020, a PSA Sines continuou
a sua trajetória de investimentos, com a
conversão de seis RTG’s (pórticos de parque) em e-RTG totalmente automatizados.
Por outro lado, a PSA e a APS têm vindo
a promover o desenvolvimento da ferrovia
no acesso ao terminal, esperando-se a
duplicação da operação de comboios até
· revistademarinha.com
ao final do ano de 2021. Simultaneamente, o Governo continua a desenvolver a
ligação ferroviária entre Sines e a fronteira
espanhola, potenciando a capacidade do
porto para melhorar o serviço ao hinterland ibérico.
No seu Plano Estratégico para os próximos dez anos, a APS prevê que a carga
contentorizada continue a crescer de forma sustentada, sendo um dos objetivos
que o porto atinja 8% do mercado ibérico,
aumentando assim a quota de carga relativa ao hinterland.
17
84.O Ano
Frederico Rezende planeia
novo raid em mota de água
Engº Frederico Rezende tem previsto executar no mês de outubro
deste ano uma travessia em mota de água às Ilhas Selvagens, a partir do
Funchal, denominado “Raide Selvagens
2020”. E Selvagens 2020 e não 2021, porque era para ter sido feito no ano passado.
Não foi, como se compreende, devido à
pandemia COVID 19.
Como estamos em tempos de retoma,
felizmente, planeia-se sair da Baia do Funchal e num trânsito de 8 h chegar à Baía
das Cagarras, Selvagem Grande, nas Ilhas
Selvagens. A saída será de manhã, não
muito cedo, pois com a duração do percurso tal não se justifica.
A mota de água será a mesma que fez a
travessia de Ponta Delgada na Ilha de São
Miguel, Açores até à Cidade do Funchal
em 2018, objeto de um circunstanciado relato nesta revista (RM 1015). No entanto,
foi aumentada a sua capacidade de armazenamento de combustível para uma ainda
maior autonomia. A mota de água conta
neste momento com cinco depósitos suplementares de combustível e com trasfega através de bomba elétrica. Possui GPS
com chartplotter, AIS, Epirb, radio VHF,
além de uma mini farmácia, uma loca para
colocação de víveres, equipamento para o
piloto de proteção contra o frio e no painel
de popa tem colocadas as Bandeiras Portuguesa bem como a da Região, no seu
Azul e Amarelo.
Este projeto conta com o Alto Patrocínio da Presidência da Região Autónoma
da Madeira, bem como com o Alto Patrocínio do Episcopado do Funchal. Apoiam
O
18
também, como habitualmente, o Sanas
Madeira, designadamente através da cedência da mota de água, o Núcleo Regional da Liga Portuguesa Contra o Cancro,
o Diário de Notícias da Madeira e o Clube
Sport Marítimo.
As Ilhas Selvagens constituem o território português mais a sul, estão localizadas a sudeste da Ilha da Madeira e
são de origem vulcânica, constituídas por
duas ilhas: a Selvagem Grande, onde se
localiza a Estação principal de apoio à Reserva, e a Selvagem Pequena, e por uma
série de ilhéus, sendo o principal o Ilhéu
de Fora.
Estas Ilhas são as primeiras representantes de um leque de áreas protegidas na
Região Autónoma da Madeira e as primeiras a serem classificadas como Reserva a
nível nacional, em 1971. Integram a Rede
Natura 2000, como Zona de Proteção Especial e Zona Especial de Conservação, e
desde 1992, são distinguidas com o Diploma Europeu para Áreas Protegidas.
A criação da Reserva Natural das Ilhas
Selvagens está intimamente ligada à caça da cagarra. Esta foi a atividade mais
lucrativa na história destas ilhas e foi a
exploração desta ave marinha que originou os primeiros esforços para a criação
da referida Reserva. Face ao sucesso do
trabalho de conservação, desenvolvido ao
longo dos anos, apresenta hoje já mais de
30.000 casais nidificantes, constituindo
a maior colónia mundial desta espécie, a
espécie emblemática das Ilhas Selvagens.
Além da cagarra, outras aves marinhas visitam estas ilhas, sendo consideradas um
verdadeiro santuário de nidificação e estão
classificadas como Área Importante para
as Aves (IBA).
Estas Ilhas são visitadas anualmente por
centenas de pessoas, com autorização
prévia; a atividade principal do turismo de
natureza aqui desenvolvido é a visita guiada
por um percurso interpretativo, seguindo-se o mergulho e a observação e escuta de
vida selvagem. No Centro de Receção, os
visitantes podem enviar um postal do posto
de correios mais a sul de Portugal, levando
assim uma recordação da área. Todas as
ações desenvolvidas na Reserva são asseguradas por uma equipa de vigilantes da
natureza, presentes durante todo o ano.
A Revista de Marinha felicita o Engº
Frederico Rezende, nosso estimado colaborador e assinante, por mais esta iniciativa; que na travessia encontre ventos
bonançosos e de feição, mares calmos e
águas safas!
Atualidade Nacional
O RINM - MAR cresceu
no I semestre de 2021
s dados mais recentes revelam
que entre 31 dez 2020 e 30 jun
passado, se verificou um aumento
líquido de mais 56 unidades no Registo
Internacional de Navios da Madeira
(RINM - MAR), perfazendo um total de
786 registos. Ou seja, em percentagem e
em apenas 6 meses, assinalou um crescimento de 7,6%.
Em termos de ranking o Registo da Madeira ultrapassou o Registo Internacional
da Noruega (NIS), um registo de prestígio
mundial, no mercado há mais de 40 anos.
Desta forma, o MAR passou a ser o terceiro maior registo internacional europeu,
em número de registos.
O Vice-Presidente do Governo Regional da Madeira, Pedro Calado, sublinhou
recentemente que … o MAR é parte integrante e indissociável do Centro Internacional de Negócios da Madeira e o seu
crescimento é a prova de que quando
existem condições de competitividade
equivalentes a Madeira consegue concorrer em pé de igualdade com os grandes
“players” do mercado e até ganhar quota
O
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
de mercado. Por outro lado, Pedro Calado referiu ainda que o Governo Regional
se encontra a efetuar diligências junto do
Ministério do Mar no sentido de criar condições para que a Administração Marítima
possa dar uma resposta mais ágil e eficiente às solicitações dos armadores.
Corroborando a opinião de Pedro Calado, o Presidente do C. A. da SDM, Roy
· revistademarinha.com
Garibaldi, enfatizou que … esta performance resulta das alterações legislativas
há muito reivindicadas pela Região e concretizadas na Assembleia da República
em agosto de 2020, sendo também reflexo da expansão do MAR nos mercados
internacionais. Perspetivando os meses
que faltam até ao fim do ano, acredita que
o MAR continuará a consolidar a sua posição no mercado internacional na medida
em que irá manter uma postura pró-ativa
do ponto de vista comercial e promocional.
Importa notar que este crescimento é
alcançado com a manutenção da qualidade das novas unidades angariadas
para o Registo. Tal facto ficou patente
na mais recente Lista Branca do MoU
de Paris; o MAR contribuiu de forma
decisiva para que a bandeira portuguesa tivesse subido de posição em 2020,
continuando a rota ascendente dos últimos anos e transmitindo uma importante mensagem aos armadores que visam
a qualidade e a credibilidade no registo
das suas unidades.
19
84.O Ano
Revista de Marinha
entrevista os responsáveis pela
AVE ROWING BOATS
Vila do Conde, verdadeiro alfobre do desenvolvimento
do Remo de Mar a nível mundial
o último fim-semana de setembro
e no primeiro fim-semana de outubro de 2021 realiza-se em Oeiras,
na Praia da Torre, o Campeonato Mundial
de Remo de Mar que o nosso País acolhe
pela primeira vez.
É, por isso, uma oportunidade soberana para divulgar a modalidade entre nós, a
qual tem vindo a conhecer um crescimento assinalável nos últimos anos em toda a
Europa, atraindo cada vez mais jovens e
menos jovens para o Mar.
Pelas suas características geográficas, de que ressalta uma linha de costa
de 2.830 km, das quais 942 km no território Continental, Portugal apresenta um
potencial de crescimento da modalidade
assinalável. Para além disso, a modalidade
conta entre nós com um importante fabricante nacional de embarcações de “remo
de mar”, a AVE ROWING, sedeada em
Fajozes, Vila do Conde, com uma atividade marcadamente exportadora, e cujas
instalações a Revista de Marinha visitou muito recentemente e de que damos
o justo relevo neste mesmo número, sob o
título Regresso ao Mar… a Remar.
É neste quadro que damos a palavra
N
20
aos responsáveis da AVE ROWING, os Senhores José António Santos (JS) e Leandro
Gavina Fernandes (LF), para nos falarem
deste seu projeto empresarial, já hoje um
indiscutível sucesso, a que deram corpo
há 5 anos.
Revista de Marinha: Como apareceu o Remo de Mar no nosso País?
José Santos: O Remo de Mar surge
em Portugal no seguimento do desenvolvimento do Remo de Mar a nível internacional, de acordo com as normas da FISA
(Federação Internacional de Remo) e em
paralelo com o desenvolvimento desta vertente do Remo em países como a França
e Espanha que são a referência para Portugal sobretudo pela adesão e número de
praticantes. No entanto estamos ainda no
início e o Remo de Mar em Portugal tem
ainda uma grande margem de crescimento
e evolução, tal como na generalidade dos
restantes países, a nível mundial.
RM: Quais as razões que vos levaram
a criar a AVE ROWING?
JS: A AVE ROWING surge da paixão
pelo Remo dos fundadores da empresa
e porque acreditamos que estavam criadas as condições para avançarmos com
este projeto industrial na área específica
da construção de embarcações de Remo
onde fomos pioneiros em Portugal. O sócio Leandro Fernandes contribuiu com o
seu know-how das técnicas de produção
e o sócio José Santos com experiência
empresarial e capacidade de investimento. A inovação, o design e a utilização de
novos materiais foram princípios que nortearam a orientação da nossa empresa a
par da evolução tecnológica traduzida na
parceria estabelecida com o INEGI (Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia
Mecânica e Engenharia Industrial) que tornam os barcos da AVE ROWING únicos
no panorama do Remo nacional e internacional.
RM: Quais foram os principais objetivos que vos nortearam?
JS: O objetivo inicial da empresa foi o
de modernizar o panorama no que respeita às embarcações de remo em Portugal
e Espanha, que foram os mercados-alvo
no início da nossa atividade, apresentando
modelos inovadores e a preços competiti-
Entrevista
vos. Seguiu-se a internacionalização que é
o foco atual da nossa empresa.
RM: Quais os principais escolhos
que como empresa tiveram que ultrapassar?
JS: O mercado do remo é extremamente
conservador tanto a nível nacional, mas sobretudo a nível internacional, com as marcas alemãs e italianas no topo da cadeia de
valor e as marcas chinesas como opções
económicas. De início o mercado reagiu de
forma defensiva com a entrada de uma marca nova de origem portuguesa. Tivemos de
fazer o nosso caminho com embarcações
diferenciadas de produção portuguesa, fabricadas com matérias-primas portuguesas
e europeias. Chegámos a ser acusados de
produzirmos as nossas unidades na China,
e posteriormente de recorrermos a matérias-primas chinesas. A nossa perseverança
e a qualidade das nossas embarcações têm
contribuído para a afirmação da marca nos
mercados internacionais.
RM: Qual a importância do mercado nacional na consolidação da AVE
ROWING? E do mercado internacional?
JS: O mercado nacional é naturalmente
importante, embora muito limitado, sendo
o mercado internacional o nosso principal objetivo. Atualmente 90% das nossas
vendas são para o mercado internacional,
maioritariamente para Espanha, França, Itália, Alemanha, Holanda, Inglaterra, Irlanda,
Dinamarca e Estados Unidos da América.
RM: Quais são os modelos que têm
neste momento em produção? E quais
os novos modelos previstos lançar no
mercado?
Leandro Fernandes: Neste momento a AVE ROWING tem dois modelos; o
José António Santos (JS) é empresário há 25 anos na área dos trânsitos,
serviços aduaneiros e comércio internacional. A sua paixão pelo Remo é de longa
data, como dirigente desportivo, praticante e patrocinador. É sócio fundador e
principal financiador da AVE ROWING BOATS. (Obs.: o quarto a contar da esquerda, à esq. do Princípe Alberto de Mónaco).
Leandro Gavina Fernandes (LF) é remador há mais de 20 anos, detentor de
inúmeros títulos de Campeão Nacional em diferentes categorias e escalões. Tem
a sua especialização profissional na área do manuseamento de compósitos, com
uma experiência de quase 20 anos. Empresário há 5 anos é sócio fundador da
AVE ROWING BOATS. (Obs.: o segundo a contar da esquerda, à dir. do Princípe
Alberto de Mónaco).
Explorer, criado em 2016, do qual foram
criados os modelos C1X (embarcação individual) e C2X (embarcação dupla/2 pessoas). Entretanto, devido à nova distância
criada pela FISA, o sprint de 500 m, houve necessidade de criar um novo modelo
surgindo assim o Kaito. Este novo modelo
foi apresentado este ano na versão C4X (4
pessoas) e C1X (Individual). Até ao final do
corrente ano (2021) surgirá a versão C2X
(2 pessoas) que completará a gama do
modelo Kaito.
21
84.O Ano
Regenerar o oceano
por Jorge Oliveira e Carmo*
frase “longe da vista longe do coração” aplica-se também ao mar. Nem
todos têm o privilégio de viver junto
ao mar e uma parte importante da população não tem sequer ideia da importância
que o oceano tem nas suas vidas. Para
muitos, os mares são imensas lixeiras, minas inesgotáveis e lugares remotos e assustadores.
O conhecimento sobre o estado do
oceano é hoje cada vez maior. O oceano conta com recursos marinhos finitos,
um espaço físico limitado e as alterações
climáticas afetam o seu balanço energético. Sabemos hoje que a poluição não tem
fronteiras, que a maior parte da poluição
marinha tem origem em terra e os efluentes e resíduos acabam por ir parar ao mar,
e que ao largo, no fundo dos oceanos e
longe das costas, crescem continuamente
imensas zonas de acumulação de resíduos,
com baixos níveis de oxigénio dissolvido e
pouca vida marinha.
A exploração exaustiva dos recursos,
a pesca excessiva, a poluição, a pressão
das atividades humanas e as alterações
climáticas, são hoje uma ameaça ao futuro
do oceano. Com a indiferença da grande
maioria da nossa geração, o processo de
transformação progressiva dos mares em
imensas lixeiras vai já adiantado.
Arriscamos deixar às gerações futuras
um planeta doente, em que as temperaturas disparam, as calotes de gelo derretem,
criaturas marinhas dissolvem-se em águas
cada vez mais ácidas, metais solubilizam-se e tornam-se tóxicos e bioacumuláveis,
os plásticos e os micro-plásticos invadem
os mares e as descargas de hidrocarbonetos são cada vez mais frequentes.
Assiste-se a uma corrida descontrolada à
mineração submarina sem regras, ao excesso de pesca, ao arrasto e à pesca com
explosivos. Arriscamos deixar aos nossos
netos mares que são de facto lugares assustadores.
Muitos dos recursos vivos marinhos
são explorados acima da sua capacidade
de regeneração, alguns extinguiram-se e
outros, como os bancos de bacalhau do
Atlântico Norte, não vão recuperar.
A razia dos recursos vivos dos mares
aconteceu só muito recentemente. Antes
da industrialização da pesca as embarcações eram à vela e só raramente se aventuravam para muito longe da costa. Os
barcos eram pequenos e as pesadas redes
eram recolhidas à mão. O impacto da pes-
A
22
marinheiros e sabemos hoje
ca nos ecossistemas marique muitas dessas histórias
nhos era limitado. A mudança
foram mesmo reais. Peixes
começou com a construção
como o bacalhau podiam
de grandes navios a vapor
ser enormes, pescavam-se
e o uso de novas técnicas
exemplares com mais de 2 m
de pesca industrial. A pesca
de comprimento. Mesmo os
alastrou rapidamente a todos
maiores tubarões dos nossos
os mares, mesmo a zonas redias, com cerca de 6 m de
motas nunca antes exploracomprimento, parecem pedas. Os mamíferos marinhos
quenos quando comparados
foram alvo dos baleeiros e
com os seus antepassados.
as suas populações nunca
Jorge Oliveira e Carmo,
Na literatura dos séculos XVIII
Professor Convidado
vieram a recuperar. Durante
da Faculdade de Direito
e XIX são frequentes descrianos a captura de enormes
da Universidade Nova
ções de tubarões com 8 e 9
quantidades de cetáceos foi
de Lisboa.
m de comprido. Dizem que
muito lucrativa e como resuleram, em tamanho, comparáveis às batado o céu noturno das grandes cidades
leias. Também os cardumes de arenques
brilhou. A iluminação dos centros urbanos
e de sardinhas podiam ser imensos. Numa
era feita com óleo de baleia.
explosão sazonal de produtividade, escureExistem evidências de que a vida mariciam os mares em enormes áreas. Podianha dos nossos dias é apenas uma som-se navegar sobre eles durante dias a fio
bra do que já terá sido. No passado os
e alimentavam uma quantidade impressiomares foram habitados por animais realnante de aves aquáticas e de predadores
mente fantásticos que temos dificuldade
marinhos. Trata-se de um mundo marinho
em imaginar nos nossos dias. Muitos dos
fabuloso, que já acabou. Os tempos mudapeixes eram bem maiores e mais abundanram e nos mares, esta mudança foi muito
tes. São inúmeras as descrições antigas
recente. À medida que vamos aprofundande seres marinhos fantásticos. Durante
do o nosso conhecimento sobre o oceano,
séculos elas viveram no imaginário dos
Monstros marinhos do passado desenhados por Olaus Magnus (1490-1557) cartógrafo, escritor e eclesiástico sueco, pioneiro no desenvolvimento de trabalhos sobre a Suécia e os países
nórdicos. Foi o último arcebispo católico da Suécia, exilado em Roma, de 1524 até à sua morte
em 1557.
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Ambiente Marítimo
vamos constatando que a atividade humana já foi longe de mais.
Novos estudos sobre a genética das
baleias revelaram grande variabilidade,
compatível com um cenário de que as suas
populações eram bem maiores do que se
imagina. Sabe-se hoje que as baleias desempenhavam um papel muito importante
na produtividade do oceano. Eram um dos
principais agentes que promovia o transporte de nutrientes das profundezas do
oceano para junto à superfície. Esses nutrientes alimentavam organismos microscópicos, fitoplâncton, zooplâncton, peixes
e longas cadeias tróficas que sustentavam
a produtividade de ricos ecossistemas marinhos.
A partir de meados do século passado,
com a disseminação da pesca industrial,
de novos navios e novas técnicas infalíveis
de pesca e de deteção dos cardumes,
desapareceram grandes populações de
peixes. Eram bancos de pesca que sustentavam os principais mercados de pescado.
O aumento da pressão económica e industrial sobre as reservas naturais de peixe
levou ao desaparecimento dos exemplares
maduros e de maior dimensão, exatamente aqueles que asseguravam a reprodução
e a capacidade de autorregeneração das
populações. É a chamada tragédia dos comuns.
Na tragédia dos comuns, indivíduos
agindo de forma racional e independente,
de acordo com seus próprios interesses
pessoais, comportam-se contra o interesse de todos e o bem comum, e esgotam
recursos essenciais à sua sobrevivência e à
das gerações futuras.
A tragédia dos comuns, o excesso de
pesca, a pesca proibida e não reportada,
a incapacidade para tomar decisões sérias
de conservação e a captura de recursos
naturais comuns por interesses econó-
Corvina pescada em 2017 pelo Marcos Santo
em São Tomé e Príncipe (publicação autorizada pelo meu amigo Marcos).
micos particulares, são exemplos claros
da incapacidade das políticas públicas do
mar, onde as iniciativas são sobretudo de
curto prazo, inconsequentes e dependentes da agenda mediática.
Os peixes que pescamos e consumimos nos nossos dias são, na sua maioria
pequenos peixes ainda juvenis, capturados
muitas vezes antes de terem tido sequer
a possibilidade de se reproduzir. As suas
populações estão desequilibradas, são diminutas e encontram-se ameaçadas e com
futuro incerto.
Os efeitos da atividade humana descontrolada no oceano não se observam apenas na redução das populações de peixes
e dos grandes mamíferos marinhos. Muitos ecossistemas marinhos sensíveis são
afetados pela pressão humana com consequências inesperadas na degradação
ambiental e no desaparecimento de muitas
espécies. A atividade humana reflete-se
também na poluição marinha, com cada
vez mais efluentes, hidrocarbonetos, plásticos e outros resíduos sólidos a serem descarregados no mar.
Também a mudança climática é um outro efeito da atividade humana no oceano.
Na falta de controlo efetivo a pesca industrial intensiva compromete a
capacidade de renovação das populações de peixes e leva ao esgotamento dos recursos, à chamada tragédia dos comuns.
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
Ela decorre da queima dos combustíveis
fósseis, da libertação de gases com efeito de estufa e aumento da concentração
do dióxido de carbono na atmosfera e do
ácido carbónico na água do mar. A acidificação do oceano leva à perda de biodiversidade marinha.
Embora nos ecossistemas terrestres
exista já um conhecimento aprofundado da
forma como os gradientes globais de biodiversidade se relacionam com os fatores
ambientais, nos mares este conhecimento
é ainda relativamente escasso. Trabalhos
recentes têm vindo a estudar os padrões
de biodiversidade de muitas espécies marinhas, incluindo zooplâncton, peixes, tubarões e baleias, e permitiram constatar uma
forte correlação entre a temperatura do
oceano e os seus padrões de distribuição.
Parece que alterações futuras na temperatura do oceano, como as relacionadas com
as alterações climáticas, estão já a afetar a
biodiversidade marinha e a modificar a distribuição espacial das espécies.
Os investigadores têm focado uma atenção especial em regiões especialmente ricas onde habitam muitas espécies, muito
concentradas, com cadeias tróficas relativamente longas e com relações entre os
organismos mais ou menos complexas.
Pretendem compreender as causas e a
origem desses ecossistemas marinhos.
Encontraram dois padrões fundamentais
de concentração de biomassa e de biodiversidade. Por um lado, as espécies que
vivem junto à costa como corais e comunidades de peixes, que habitam especialmente nos mares do sudeste da Ásia, por
outro lado, espécies que vivem em oceano
aberto como peixes pelágicos, atuns e baleias, que apresentam concentrações altas
em mares situados a latitudes médias. Testadas diversas hipóteses de explicação dos
diferentes fatores ambientais que justificam
A criação de áreas marinhas protegidas garante a proteção do ambiente,
o aumento da biodiversidade marinha, as atividades económicas sustentáveis e a produtividade das áreas envolventes.
23
84.O Ano
estes padrões globais de distribuição, concluíram que a temperatura da água do mar
é a principal variável que justifica a distribuição dos diferentes grupos de espécies
marinhas.
Considerando a forma como a temperatura e a biodiversidade se relacionam, parece provável que no futuro o aquecimento
médio global do oceano, venha a ter efeitos
na alteração da distribuição da vida marinha.
Sabe-se que o oceano e a atmosfera
controlam o clima do planeta. Os mares
acumulam energia em excesso proveniente da radiação solar que fica aprisionada
nos gases da atmosfera. A composição
da atmosfera mudou e agora retém cada
vez mais calor. As alterações climáticas
têm vindo a modificar o balanço energético
do oceano. O armazenamento térmico do
oceano tem controlado a mudança climática e permitido reduzir o aquecimento dos
continentes. Mas os mares já aqueceram
em profundidade e é já possível detetar o
aquecimento de massas de água oceânicas abaixo dos 3.000 m.
A energia armazenada nos mares condiciona o clima nos continentes e está na
origem dos principais fenómenos meteorológicos. À medida que a temperatura média
do oceano aumenta, aumenta a evaporação à superfície, a intensidade e frequência
das tempestades tropicais, a formação de
ciclones, furacões e maremotos e aumenta a erosão costeira, bem como os fenómenos das secas prolongadas, cheias e
inundações. As chuvas e as tempestades
que se formam no horizonte, as correntes
que aquecem ou arrefecem os continentes
e o clima em geral, dependem muito do
efeito estabilizador das massas de água e
da distribuição de energia pelas correntes
oceânicas.
O aquecimento dos oceanos afeta os
campos de gelo situados junto aos polos e
nas altas montanhas, e a sua fusão origina
a subida do nível do mar. Com o aumento
do volume da água no oceano e o degelo,
o nível do mar sobe agora em média cerca de dois mm por ano, ameaçando zonas
costeiras e ilhas.
O aumento de temperatura provoca
também alterações na produtividade no
oceano. Uma camada de água quente e
cristalina à superfície dos mares tropicais
significa que as águas da profundidade,
mais frias e ricas em nutrientes, não conseguem ascender à zona fótica iluminada
pela luz solar, junto à superfície. Este fenómeno diminui a disponibilidade de alimento,
a produtividade dos mares e a biodiversidade marinha.
A vida marinha nas regiões tropicais
encontra-se geralmente bem-adaptada
24
Mergulho nas águas quentes do Ilhéu das Rolas em São Tomé 2019 (foto JOC).
a águas quentes, mas se a temperatura
continuar a subir podemos esperar consequências adversas para muitos organismos
marinhos. Muitas populações marinhas de
águas quentes têm vindo a migrar para
zonas que se situam a diferentes latitudes.
Este movimento é possível nos organismos
que nadam nas massas de água, mas para
outros, como os corais que não se deslocam facilmente, as consequências podem
ser dramáticas. E mais do que a intensidade, o ritmo a que se está a verificar a mudança climática dificulta a adaptação dos
corais, que acabam por desaparecer.
Os recifes de coral suportam ecossistemas delicados, com elevada produtividade,
e são sensíveis a períodos prolongados
com a água relativamente mais quente. Isto
porque muitos corais vivem associados a
algas que habitam no seu interior e que, por
fotossíntese, produzem alimentos que lhes
são indispensáveis. Quando a temperatura
da água aumenta a atividade das algas em
simbiose é muito acelerada e isso pode danificar os frágeis tecidos moles do coral. O
mecanismo de autodefesa consiste na expulsão das algas pelo hospedeiro. Ao libertarem as algas os corais baixam a atividade
metabólica, perdem cor e ficam esbranquiçados. O branqueamento dos corais pode
não ter grandes consequências se se verifi-
car por períodos curtos, mas temperaturas
demasiado elevadas durante semanas ou
até meses podem levar à sua morte. Ficam
apenas à vista esqueletos calcários completamente brancos e assiste-se à morte
de grandes extensões de coral em zonas
que já foram especialmente ricas. A morte do coral, com a degradação de todo o
ecossistema que lhes está associado, tem
consequências profundas para a vida marinha dos recifes e no povoamento de vastas
zonas oceânicas.
Importa intervir para enfrentar a degradação do oceano e acelerar a adaptação
às alterações climáticas. Parece que a mitigação, reduzindo as emissões de gases
com efeito de estufa, só por si, já não será suficiente para inverter a tendência de
aquecimento global do planeta. A concentração de dióxido de carbono da atmosfera
está já acima das 400 partes por milhão,
muito acima das 180 do tempo dos nossos
avós. Com a progressiva acumulação de
dióxido de carbono na atmosfera e ácido
carbónico dissolvido nos mares o oceano
está a acidificar.
Enfrentar a degradação do oceano
pressupõe criar condições para uma gestão mais equilibrada e sustentável das atividades humanas no mar. O sucesso da
sua gestão pressupõe um conhecimento
profundo de cada atividade em si e do
contexto e enquadramento em que ela se
desenvolve. No âmbito da economia do
mar não existe um sistema de gestão único
que sirva todos os diferentes modelos económicos. Alguns, como a governação geral
do oceano, respeitam uma escala mais global, mas muitos necessitam de escalas locais, nacionais ou regionais para gerir usos
múltiplos simultâneos numa área particular.
Importa abordar a gestão do oceano de
forma diferente. Ver o oceano como um
mar de oportunidades. Um sistema que
suporta a vida na terra com serviços essen-
Mergulho nas águas frias
das grutas da Atalaia
em Sagres 2018 (foto JOC).
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Ambiente Marítimo
ciais. Com milhões de novas formas de vida
marinha e moléculas únicas por descobrir.
O mar como a fonte de água do planeta.
A origem do oxigénio que respiramos. A
fotossíntese realizada pelo fitoplâncton do
oceano produz mais oxigénio do que todas
as florestas tropicais do mundo. O oceano
como sendo um potente sistema de regulação do clima. Lembrar que o oceano
fornece os serviços ecológicos essenciais
de regulação, proteção, preservação da vitalidade dos ecossistemas e reciclagem de
nutrientes, entre outros.
A nossa visão do oceano mudou muito recentemente. Nos últimos 10 anos
melhorou a nossa compreensão do papel
do oceano na regulação do clima e na resiliência das condições de estabilidade do
planeta. O combate à poluição com origem
em terra passou a ser uma prioridade. Os
serviços dos ecossistemas marinhos foram
sendo reconhecidos e avaliados. Uma rede
de áreas marinhas protegidas foi crescendo e articulando-se entre si e existe um reconhecimento geral da necessidade em se
gerir melhor o oceano.
Também as práticas mudaram. Existem
novos recursos provenientes do turismo
sustentável, da proteção ambiental. Novos
sistemas naturais de proteção da costa,
florestas de mangais e recifes de coral que
limitam os danos dos eventos meteorológicos extremos e da subida do nível do mar.
É hoje reconhecida a necessidade de gerir
de uma forma integrada os sistemas costeiros. Assistiu-se a um tremendo desenvolvimento tecnológico das energias renováveis
no mar. Acredita-se agora na evolução da
gestão participada dos recursos marinhos
com o envolvimento dos interessados e
das comunidades locais.
Trata-se apenas de alguns exemplos,
entre muitas novas iniciativas que demonstram a necessidade de uma maior integração entre as áreas social, económica,
ambiental e cultural por forma a alcançar
condições de maior equidade geográfica e
entre gerações.
No início da revolução industrial não imaginávamos que a atividade humana seria
capaz de alterar os equilíbrios que mantêm
a vida no planeta tal como a conhecemos.
Sabemos agora como estes equilíbrios são
frágeis, conhecemos que o planeta tem limites e que os recursos são finitos, e estamos convencidos que parte importante da
solução para os problemas da sustentabilidade virá do oceano.
É necessária uma nova abordagem,
com uma visão mais ambiciosa, baseada
na capacidade do oceano para mobilizar
a transformação da sociedade numa nova
realidade muito mais sustentável, onde estejam salvaguardados o bem-estar humano e a equidade nas nossas sociedades.
Uma nova abordagem económica, social
e tecnológica baseada nas oportunidades
tremendas que o oceano nos oferece em
novos recursos, soluções inovadoras e na
promessa de novas experiências positivas
para as gerações futuras.
Imaginemos o futuro no nosso oceano
comum. Um barco que usa a energia das
ondas na sua propulsão. Um reator biológico onde as microalgas retiram o dióxido de
carbono da atmosfera e o fixam na sua biomassa. Novas soluções de tecnologias renováveis onde o aproveitamento energético
é feito a partir dos gradientes de temperatura na água salgada a diferentes profundidades. Novos fármacos, com origem em
organismos marinhos para tratar novas
doenças. A construção de novas barreiras
de coral artificiais para proteção contra a
ondulação costeira e o reforço da biodiversidade marinha. Novas tecnologias de sistemas de intensificação de biomassa onde
bactérias e outros organismos marinhos
são usados em sistemas de tratamento de
águas, tratamento de efluentes da indústria
e reciclagem de nutrientes e resíduos.
Uma nova dinâmica na conservação do
oceano passa pela criação de mais áreas
marinhas protegidas. As áreas marinhas
protegidas têm sido um enorme sucesso
no repovoamento, regeneração das popu-
lações e aumento da biodiversidade local
com efeitos rápidos no enriquecimento
de muitas regiões em termos ambientais
e das atividades económicas ligadas ao
mar. Cada vez mais nos deparamos com
uma nova realidade em que um peixe vivo
vale mais do que um peixe morto. Muitas
das áreas marinhas protegidas foram criadas por decreto governamental. Muitas só
existem mesmo no papel. Mas hoje multiplicam-se as propostas de novas áreas
marinhas protegidas que não nascem já de
cima para baixo, apenas por decisão dos
governos, mas dos interesses convergentes dos protagonistas locais como pescadores, atividades turísticas, autárquicas,
universidades, associações desportivas,
indústrias, populações e utilizadores. Novas áreas protegidas, que nascem de baixo
para cima, e já com objetivos claros, planos
de gestão, financiamento e responsáveis
pela sua implementação.
Chegou ao fim o tempo da rapina dos
recursos naturais do oceano, da tragédia
dos comuns nas pescas, da indecisão relativamente à conservação dos recursos do
mar, da captura por interesses económicos, das políticas públicas de curto prazo
inconsequentes, da agenda mediática e
dos partidos.
Acreditamos no oceano como parte
importante da solução para ultrapassar
a atual crise ambiental global. Emerge do
mar uma nova consciência de que importa
proteger o ambiente a nível global. Não podemos ainda contar com instituições e regras supranacionais, mas parece evidente
que está em progresso uma nova dinâmica global de governação que permita lidar
com os imensos desafios ambientais que
se apresentam. Importa não perder esta
oportunidade, acreditar no progresso científico e tecnológico, no desenvolvimento
sustentável e em novas formas de governação, para regenerar o oceano.
* Professor Convidado da Faculdade
de Direito da Univ. Nova
[email protected]
Uma aposta
na Intermodalidade e na Logística
www.portodesetubal.pt
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
25
84.O Ano
Madeira: a pesca apoiada
na Investigação Científica
por Mafalda Freitas*
contributo da economia do mar
na criação de riqueza regional representa 10,3% do Valor
Acrescentado Bruto (VAB). Este dado,
conhecido publicamente pela primeira
vez à saída de 2020, é uma ferramenta
útil para a tomada de decisões políticas, por permitir projetar investimentos
que ajudem no crescimento do Produto
Interno Bruto (PIB) regional, através de
economias diversificadas e não apenas
do turismo.
É neste contexto que o mar ganha o
estatuto de um dos recursos mais importantes da Região para o crescimento da
economia azul, mas as políticas a incrementar têm de estar em conformidade
com os objetivos estratégicos definidos
pela União Europeia, que contemplam a
gestão eficaz das atividades marinhas e
a utilização sustentável dos recursos marinhos e costeiros.
Um dos projetos a que o Governo
Regional da Madeira, terá de dar seguimento obrigatório, é o Plano Nacional de
Recolha de Dados (PNRD). Este programa é de aplicação obrigatória no âmbito
da União Europeia. Quando se aproxima
a data para conhecer as quotas de pescado que serão atribuídas a Portugal em
2021 e, em consequência, à Madeira,
este programa acaba por ter influência
junto da entidade que decide a atribuição
de quotas, e daí a sua relevância para o
setor das pescas da Região.
No âmbito deste programa, desenvolvido pela Direção Regional do Mar, são
recolhidos dados pesqueiros, ambientais
e socioeconómicos no sector das pescas da Região, incluindo a monitorização
das principais espécies, designadamente
o peixe-espada preto, tunídeos, pequenos pelágicos e lapas, cujos parâmetros
biológicos são continuamente monitorizados.
Os dados recolhidos são utilizados
localmente na avaliação dos mananciais
explorados ou enviados no âmbito de
pedidos de dados efetuados pela União
Europeia e organizações internacionais
de investigação como o ICES (International Council for the Exploration of the Sea)
e ICCAT (International Commission for
the Conservation of Atlantic Tunas). Como já foi referido, a informação recolhida
O
26
na Região é de grande relevância, pois
integra o Sistema Europeu de Atribuição
de Quotas às principais espécies pescadas localmente. As informações recolhidas pelo PNRD são também importantes
para a obtenção de indicadores que integram a Diretiva Quadro da Estratégia Ma-
rinha e os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável da FAO.
A Região prepara-se em 2021 para aplicar, a curto prazo, no âmbito do
PNRD, um novo programa de observação científica a bordo de embarcações
de pesca da frota regional.
Trata-se de acompanhar a atividade
pesqueira a bordo das embarcações de
pesca da frota regional, contribuindo para a sustentabilidade das pescarias e dos
recursos vivos dos quais aquelas dependem, constituindo assim um instrumento
eficaz ao serviço da preservação ambiental no meio marinho. O programa de
observadores a bordo (OBSERVA-PESC)
incidirá sobre as principais pescarias da
Região, designadamente do peixe-espada preto, tunídeos, cerco e “peixe fino” e
é um projeto da Direção Regional do Mar
pertencente à nova Secretaria Regional
de Mar e Pescas.
* Diretora Regional do Mar
[email protected]
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
84.O Ano
Conservação dos Mangais em África
por Valentim Alberto António*
angais são ecossistemas naturais
tropicais, compostos por espécies de plantas que toleram água
salgada, geralmente localizados em áreas
costeiras, e considerados “ecossistema
de carbono azul”. São dez vezes mais eficientes em absorver e armazenar grandes
quantidades de carbono, em comparação
a ecossistemas terrestres, tornando-os
essenciais para o combate às mudanças
climáticas. São locais de reprodução para
milhares de espécies, funcionando como
berçário de 80% da vida marinha e provedores de proteção e alimento para peixes e
diversos invertebrados como crustáceos e
moluscos, dão suporte a muitas espécies
em risco de extinção como tartarugas, manatins e algumas aves, para além de outros
inúmeros benefícios ecológicos e econó-
M
28
micos na vida das comunidades costeiras.
Em África, existem mangais em várias
áreas costeiras, mas muitos destes encontram-se destruídos e a precisar urgentemente de restauração e proteção.
Com esta finalidade, foi levado a cabo uma conferência internacional sobre
“O Reforço dos Compromissos Políticos
na Conservação e Melhoria dos Mangais
em África” nos dias 3 e 4 de março para
assinalar o “3 de março”, dia Africano do
Ambiente e dia “Wangari Maathai”. Esta
Conferência, a primeira sobre o tema, foi
realizada inteiramente por webinar, e contou com a participação de ministros responsáveis pelos sectores do Ambiente,
Pescas e Economia Azul, de Angola, Cabo
Verde, Moçambique, Tanzânia, Quénia,
Congo, Camarões, Madagáscar, Gabão,
Guiné Equatorial, Guiné-Bissau, Senegal,
Guiné-Conacry, Nigéria, Costa do Marfim
e Gana.
Durante a Conferência o Presidente da
Comissão da União Africana sublinhou o
reconhecimento do empenho político de
Angola por se ter classificado em 1º lugar
na rota mundial de plantação de mangais
no sentido de se inverter a tendência de
degradação do ecossistema, com envolvimento dos decisores políticos, organizações não-governamentais e da sociedade
civil, e por também Angola ter realizado em
fevereiro ultimo um workshop sobre Zonas
Húmidas, com a participação de diferentes
sectores do governo, legisladores, académicos, representantes de organizações
ambientais nacionais ligadas à proteção
de mangais. Angola demostra assim, cla-
Ambiente Marítimo
ramente, que as questões ambientais que
no passado foram negligenciadas, hoje
ocupam um lugar na agenda política, no
quadro das organizações internacionais,
onde faz ouvir a sua voz, sobre os grandes
compromissos globais sobre o ambiente,
os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável e o Acordo de Paris sobre o Clima.
Foi neste ambiente que decorreu a Conferencia, sob o tema “Reforçar o Património
dos Mangais Africanos para uma Maior
Resiliência à Pandemia da COVID 19”,
sendo reconhecidas as contribuições dos
mangais e outros recursos costeiros como
pedras angulares para o desenvolvimento
socioeconómico e a sustentabilidade ambiental no continente.
No fim dos trabalhos a Conferencia produziu a seguinte Declaração:
Conscientes das origens zoonóticas da
COVID 19, do vírus Ébola e outras pandemias resultantes da destruição da biodiversidade e dos habitats naturais e da
importância de ecossistemas saudáveis
como soluções naturais para as pandemias e zoonoses.
Nós, Ministros dos estados costeiros e
das ilhas da União Africana, assim o exigimos:
1. Os Estados-Membros adotam uma
abordagem de gestão integrada dos ecossistemas costeiros para melhorar a proteção e conservação dos nossos mangais e
outros recursos costeiros;
2. Os Estados-Membros intensificam
os seus esforços de reflorestação e restauração de mangais, para além do restabelecimento de reservas de mangais para
manter a estabilidade das zonas costeiras
como zonas tampão contra marés e ventos fortes;
3. Os reforços dos procedimentos da
restauração como componente chave
tanto da adaptação e mitigação das alterações climáticas a nível nacional como de
reforço dos meios de subsistência através
da promoção de empresas de pesca artesanal, aquicultura, apicultura e ecoturismo;
4. Refortalecimento dos quadros institucionais, políticos e legislativos a nível nacional, bem como a criação de capacidades
das comunidades locais para assegurar
a gestão dos recursos sustentáveis dos
mangais e dos recursos costeiros e reduzir
todas as formas de poluição nas zonas de
mangais, incluindo o petróleo e o lixo;
5. A aceleração do processo de ratificação e implementação da Convenção de
Lomé sobre Segurança Marítima em África
para assegurar um tráfego de carga seguro e reduzir a incidência de derrames de
petróleo nos nossos cursos de água;
6. Solicitação aos Estados-Membros
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
para assegurar a responsabilização através de sistemas adequados de monitorização e informação para a conservação dos
mangais;
7. Solicitação aos Estados-Membros,
com o apoio dos parceiros, para que se
realizem inventários regulares dos recursos
de mangais com vista a assegurar o desenvolvimento de planos de gestão e projetos de restauração adequados;
8. A renovação do nosso compromisso
para a implementação da Convenção Africana sobre a conservação da natureza e
dos Recursos Naturais (Convenção de Maputo) para a sustentabilidade de todos os
ecossistemas, incluindo os mangais, em
colaboração de Convenções de Abidjan e
Nairobi e outros parceiros;
9. Mandatar a Comissão da União Africana para acolher o Secretariado da Convenção de Maputo e de igual modo facilitar
a organização da sua primeira Conferencia
das Partes em colaboração com os Estados-Membros da União Africana;
10. O desenvolvimento de um plano diretor continental para a gestão sustentável
dos mangais e recursos costeiros de Africa
pela Comissão da União Africana e seus
· revistademarinha.com
parceiros, em colaboração com os Estados-Membros da União Africana, como
parte da implementação do conceito da
economia azul, e
11. Exortar a Comissão da União Africana, parceiros e Estados-Membros da
União Africana a organizar conjuntamente
uma conferência a nível continental sobre
mangais e recursos costeiros para dar início à elaboração de um plano diretor continental sobre mangais e recursos costeiros.
Em Angola, tal como em vários países
costeiros africanos, existem mangais ao
longo de várias zonas da sua faixa costeira,
necessitando muitos deles, urgentemente,
de restauração e proteção. Contudo, a
Carta Magna Angolana consagra a responsabilidade do Estado em adotar medidas
de proteção ambiental e das espécies da
flora e da fauna, de manutenção do equilíbrio ecológico e de exploração racional de
todos os recursos naturais no quadro de
um desenvolvimento sustentável e de respeito pelos direitos das gerações futuras.
* Vice-Almirante (Marinha de Angola)
[email protected]
29
84.O Ano
Ameaças às Aves Marinhas
em Portugal
Centro de reabilitação de animais
marinhos cram-ecomare
por Rute Costa*
ilhares de animais marinhos são
feridos e mortos todos os anos
em toda a Europa. As causas antropogénicas mais comuns de mortalidade de aves marinhas incluem as capturas
acidentais, emaranhamento (Moore et al.
2009; Zydelis et al. 2013) e derramamentos de óleo e similares (Troisi et al. 2016).
Num estudo publicado em 2021 por
Costa et al. (Threats to seabirds in Portugal: integrating data from a rehabilitation
centre and stranding network, European
Journal of Wildlife Research 67:41), com
dados relativos ao centro de reabilitação
de animais marinhos CRAM-ECOMARE
nos anos compreendidos entre 2010 e
2016, destaca-se a importância dos centros de reabilitação de vida selvagem para
a conservação das aves marinhas e o alto
número de admissões de aves marinhas
devido a causas associadas à atividade humana (emaranhamento / captura acidental,
trauma). Este estudo foi a primeira tentativa
de avaliar em conjunto as principais causas
de admissão de aves marinhas num centro
de reabilitação e as causas de mortalidade
de aves marinhas com base na recolha e
análise de aves marinhas mortas na costa
de Portugal.
Neste estudo foram registadas 2.042
admissões de aves marinhas de 26 espécies diferentes. Os grupos mais comuns
foram gaivotas grandes, tordas, patolas,
cagarras e pardelas. A principal causa de
admissão foi emaranhamento / captura
acidental, seguido de trauma e toxicidade.
Entre as aves marinhas vivas inicialmen-
M
30
te admitidas, 39% foram libertados com
sucesso na natureza após a reabilitação,
31% morreram durante a reabilitação e
30% foram considerados irrecuperáveis
após o diagnóstico e foram eutanasiadas
ou transferidos para outros centros onde
são mantidas em cativeiro para fins de
educação e conservação.
Para além do esforço efetivo de reabilitação e posterior libertação dos animais
marinhos, muito importante para a conservação das espécies, é essencial salientar a importância da recolha de dados
consistentes e durante períodos de tempo
longos. Esta recolha de dados poderá aumentar a informação sobre a ocorrência
de aves em determinadas áreas, contribuir para a monitorização dos impactos
das atividades humanas nas populações
de aves marinhas fora das suas áreas de
reprodução e também revelar padrões de
população relacionados com mudanças
climáticas ou mudanças fenológicas.
*
[email protected]
NOTA:
O CRAM-ECOMARE é o maior centro de reabilitação de animais marinhos da Europa e tem
como principal missão o resgate, reabilitação
revistademarinha.com
e devolução à natureza de aves, répteis e mamíferos marinhos. O centro é coordenado por
uma parceria entre a Sociedade Portuguesa da
Vida Selvagem e a Universidade de Aveiro, está
localizado em Ílhavo e está disponível 24 horas por dia para o resgate de animais marinhos
(contato - 919 618 705).
REFERÊNCIAS:
Moore et al. 2009: A review of marine mammal,
sea turtle and seabird bycatch in USA fisheries.
Mar Policy 33(3):435–451
Zydelis et al. 2013: The incidental catch of seabirds in gillnet fisheries: a global review. Biol
Conserv 162:76–88
Troisi et al. 2016: Impacts of oil spills on seabirds: unsustainable impacts of non-renewable
energy. International Journal of Hydrogen
Energy 41(37):16549–16555.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Navegação, Hidrografia e Oceanografia
Radares de Alta Frequência
e sua utilização na Oceanografia
e na monitorização de tsunamis
Por Vânia Lima* e Carlos Santos Fernandes**
s sistemas de RADAR (acrónimo
de RAdio Detection And Ranging)
são sistemas que usam ondas eletromagnéticas no espectro de frequência
das ondas rádio (em modo contínuo ou
em pulso), para fazer a determinação do
alcance, direção azimutal e velocidade
de objetos. Os radares de alta frequência
(high frequency, HF) têm uma frequência
de funcionamento f entre os 3 e os 30
MHz e são utilizados para vigilância over
the horizon (OTH). Paduan & Washburn
(2013) consideram o intervalo 3 – 50 MHz,
em que o seu limite superior é designado de banda very-high-frequency (VHF).
Os radares OTH são um tipo de sistema
de radar que tem a habilidade de detetar
alvos a grandes distâncias, tipicamente entre as centenas a milhares de Kms,
para além do horizonte do radar – o denominado beyond the radar horizon, BTH,
que é a distância limite para os radares
vulgares. Apesar de pouco comum, os
radares HF podem também ser referidos
como os radares decâmetro, visto que os
seus comprimentos de onda λ estão compreendidos entre os 10 e os 100 m (sendo
determinados de acordo com λ=c/f, em
que c é a velocidade da luz).
O
Antena radar HF faseada com 500 m para vigilância militar, localizado em San Clement Island,
Califórnia, EUA (1971). O equipamento e cablagens faseadas estavam alojados em 4 reboques,
pesando cerca de 50 tons (in CODAR Newsletter, Fall 2016).
O surgimento destes sistemas foi impulsionado quando, aplicando os princípios
do eletromagnetismo propostos por James Maxwell (1865), Christian Hülsmeyer
(1904) desenvolveu um aparelho simples
de deteção de embarcações, com o intuito de evitar colisões em situações de nevoeiro. Os radares HF têm sido utilizados e
Mapa de correntes totais, com área de cobertura correspondente aos radares HF de São Julião e
Cabo Espichel.
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
foram amplamente desenvolvidos, desde
a II Grande Guerra Mundial, com o objetivo de fazer a deteção de todos os tipos
de objetos inimigos, marítimos, terrestres
ou aéreos. De modo independente, vários
países desenvolveram a tecnologia radar,
principalmente em meados dos anos 30
do século XX, tendo-se revelado como
uma tecnologia muito importante no conflito bélico. Porém, o desempenho dos radares encontrava-se comprometido pela
presença de eco generalizado de origem
desconhecida, dificultando a possível deteção. Este ruído foi identificado por Crombie (1955), que o relacionou com as ondas
do mar. Baseando-se no eco oceânico registado por um radar de 13.5 MHz, Crombie verificou que a frequência da principal
componente de doppler era aproximadamente constante, independentemente do
estado do mar, ao contrário do desfasamento expectável. Relacionou então estas
observações com um fenómeno de Bragg
scattering (dispersão de Bragg) em que,
como resultado de ressonância, os sinais
que regressam ao radar, após dispersão
do oceano, produzem por adição construtiva uma ampla assinatura espectral. Na
dispersão de Bragg ocorre a reflexão coerente da energia transmitida pelas ondas
da superfície do oceano, cujo comprimen31
84.O Ano
Rede nacional de radares de alta frequência
(HF). De norte para sul, oeste para este: Leça
da Palmeira, São Julião, Cabo Espichel, Sagres, Alfanzina e Vª Real de Santo António.
to de onda (λ) é metade do λ das ondas
de radar transmitidas (Paduan & Graber,
1997).
Tal achado impulsionou o interesse dos
oceanógrafos nesta tecnologia. Como
consequência, Donald E. Barrick desenvolveu os primeiros radares HF capazes
de efetuar medições ambientais (numa
versão compacta e económica) no Wave Propagation Laboratory da National
Oceanic and Atmospheric Administration
(NOAA). O nome dado ao sistema desenvolvido foi CODAR, que inicialmente
designava Coastal Ocean Dynamics Applications Radar, sendo também o acrónimo
usado para Compact Radar. Nos anos 80,
Barrick funda a companhia CODAR Ocean
Sensors, que concebe e fabrica sistemas
radar, sendo que o produto disponibilizado tomou a designação de Seasonde.
Durante os anos 80 e 90 foram desenvolvidos vários sistemas de high-frequency
surface wave radar (HFSWR). Atualmente,
são de uso mais generalizado 2 sistemas
específicos de radares de alta frequência:
o sistema WERA (WavE Radar), que foi
desenvolvido na década de 80 do século
passado na Universidade de Hamburgo, e
o sistema CODAR (referido anteriormente).
Estes sistemas de radar HF transmitem
ondas eletromagnéticas para a superfície
do oceano, recebendo em resposta um
sinal retro difundido repleto de informação
sobre as correntes de superfície e as ondas (Gurgel et al., 1999). Esta monitorização da superfície do oceano é feita a partir
de localizações muito perto da costa, existindo casos de utilização em plataformas
móveis (Yao et al., 2020). A conjugação
de informação de vários radares de alta frequência existentes numa dada área
permite-nos obter as componentes ne32
cessárias para gerar o vetor de corrente,
e assim obter mapas de correntes mais
completos. Deste modo, para uma dada
área, o panorama de superfície a 2 dimensões de correntes e agitação corresponde
à cobertura de pelo menos duas estações
de radar HF. As redes de sistemas de radares HF são capazes de mapear uma
ampla zona, com distâncias offshore entre
os 15 e os 200 km da costa, resoluções
entre os 300 m e os 12 km, dependendo
da frequência utilizada, obtendo mapas de
correntes horárias, com precisão de velocidades de corrente até 10 cm/s e 5° na
direção da corrente.
A rede nacional de radares de alta frequência é gerida pelo Instituto Hidrográfico (https://www.hidrografico.pt/radar.map).
É composta por 6 estações radar HF,
nomeadamente a estação radar de Leça
da Palmeira, as estações radar de São
Julião e Cabo Espichel iluminando a zona
de Lisboa e, as estações radar de Sagres,
Alfanzina e Vila Real de Santo António cobrindo a totalidade da faixa litoral Algarvia.
Um inventário europeu de radares HF foi
compilado na publicação de Mader et
al. (2016), em que é apresentado o mapa com a localização de 72 radares HF
na Europa (à data dessa publicação). Em
Roarty et al. (2019), os autores descrevem
e caracterizam a rede global de radares de
alta frequência.
A existência de uma vasta rede de radares de alta frequência no mundo, aliada à utilização e ao desenvolvimento de
metodologias de deteção de tsunami e
alerta, impulsionaram a utilização destes
sistemas de deteção e sua assimilação
nos sistemas nacionais e internacionais
de alerta de tsunami. A capacidade de
medição de velocidades de corrente superficiais, em tempo quasi-real, dos sistemas radar HF foi confirmada através de
observações do tsunami de 2011 do Japão e de eventos de meteotsunami rea-
a) Águas profundas
Radar HF localizado em Bodega Marine Lab.,
Califórnia,EUA (símbolo a vermelho) e mapa de
velocidades radiais medidas aquando do evento
de 2011 em Tohoku, Japão, notando-se o fluxo
reverso gerado pelo tsunami (in Lipa et al, 2011).
lizadas por estes sistemas. Atualmente,
e apesar de ainda existirem algumas limitações, a deteção de eventos de tsunami
poderá ser conseguida até 45 minutos
antes da sua chegada à costa, no caso
do limite da plataforma continental se encontrar a cerca de 100 km da linha de
costa (Gurgel et al., 2011). Tal tempo de
deteção permite a utilização desta informação para emitir um alerta antecipado
de tsunami. Porém, o alcance máximo de
deteção e o tempo de alerta são dominados pelo perfil batimétrico, em direção
à costa, da área de localização do radar
(Barrick et al., 2016).
Em Portugal, o sistema nacional de
alerta de tsunami implementado através
do North Eastern Atlantic and the Mediterranean Tsunami Warning System (ICG/
NEAMTWS), iniciou o seu funcionamento
em novembro de 2017 com o centro de
operações português sediado no Instituto
Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).
Nesse sentido, e com o propósito de do-
b) Águas intermédias
c) Águas pouco profundas
Figura 5 – Movimento orbital – Teoria linear
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Navegação, Hidrografia e Oceanografia
tar o sistema português de um sistema de
deteção precoce, foi instalado em setembro de 2018, sob a égide do projeto OCASO – Observatório Costeiro Ambiental do
SudOeste/Coastal Environmental Observatory of the Southwest, um módulo de
deteção de tsunami na estação Radar HF
de Sagres(1). Este módulo, desenvolvido
pela CODAR Ocean Sensors com tecnologia Seasonde, foi, entretanto, transferido
da estação Radar HF de Sagres para a
estação Radar HF de Alfanzina, Portimão,
onde se encontra atualmente instalado
e em funcionamento permanente. Esta
transferência ocorreu dada a complexidade da dinâmica oceânica na ponta de
Sagres o que gerava demasiados falsos
positivos e consequentemente falsos alertas.
De uma forma muito simplista, à luz
da teoria linear (Airy Theory), uma onda
no mar encontra-se em águas profundas
quando a profundidade é maior que 1/2
do seu comprimento de onda e em águas
pouco profundas quando a profundidade
é inferior a 1/20 do seu comprimento de
onda. Esta relação reflete-se no comportamento do movimento orbital que uma
partícula fará aquando da passagem de
uma onda. Em águas profundas esse
movimento é circular, passando a um
movimento elíptico na zona de transição
e praticamente retilíneo em águas rasas.
Como uma onda tsunami possui um
comprimento de onda de várias centenas
de Kms, esta encontrar-se-á sempre numa situação de águas rasas, fazendo com
que as partículas na superfície da água do
mar apresentem um movimento retilíneo,
de avanço (até à crista da onda) e de recuo (da crista até à cava).
É esta diferença de comportamento do
movimento orbital das partículas, aquando da passagem de uma onda dita normal
ou de um tsunami que desencadeará todo
o processo de identificação e deteção de
um possível tsunami.
Este sistema de deteção de tsunami
da CODAR, que efetua a deteção da onda incidente de tsunami através da sua
velocidade orbital (Roarty et al., 2019),
extrai o sinal de tsunami da corrente e ruído de fundo, através da aplicação de um
algoritmo de reconhecimento de padrões
(circular ou retilíneo) (Barrick et al., 2016).
Antes do algoritmo ser aplicado, os mapas
de velocidade radial são calculados e as
velocidades são divididas em bandas de 2
km paralelas aos contornos batimétricos.
As velocidades são depois resolvidas nas
suas componentes paralela (alongshore) e
perpendicular (onshore) aos contornos de
profundidade, sendo feitas as suas médias
para cada banda e criadas séries tempoRevista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Registos de Qfactor na estação radar HF de Sagres (SGTR), durante o mês de setembro de 2019.
Registos de Qfactor na estação radar HF de Alfanzina (AFTR), durante o mês de junho de 2020.
rais onshore e alongshore respetivamente
para cada banda considerada.
Finalmente, o algoritmo de reconhecimento de padrões é aplicado às séries
temporais calculadas, para efetuar a deteção de ondas de tsunami, procurando
uma correlação nas bandas adjacentes
em instantes de tempo próximos (Roarty
et al., 2019). Da aplicação do algoritmo,
obtém-se um parâmetro denominado de
Qfactor, proveniente do espectro Doppler
obtido a cada 2 minutos pelo módulo de
deteção. O Qfactor é um índice probabilístico de ocorrência de tsunami, que quantifica a presença de uma onda de tsunami.
Os picos observados nos dados de Qfactor registados indicam a possível presença
de ondas de tsunami (Lipa et al., 2016).
A deteção de ondas de tsunami feita pelo
módulo é expressa nas direções onshore
e alongshore: na direção onshore, o algoritmo procura as ondas que se propagam
perpendicularmente à costa; na direção
alongshore, o algoritmo procura as ondas
que se propagam paralelamente à costa.
Assim, a deteção de tsunami feita através deste módulo de deteção baseia-se
· revistademarinha.com
essencialmente na identificação de intervalos de valores de Qfactor e/ou valores
limite máximos de Qfactor, indicativos da
possível presença de ondas de tsunami e/
ou possibilidade de ocorrência de eventos
de tsunami.
O alerta é disseminado se o valor de
Qfactor for superior ao determinado como
limite seguro probabilístico.
Pretende-se assim adicionar esta capacidade ao sistema nacional de alerta
de tsunami, e consequentemente no ICG/
NEAMTWS, sendo que a integração desta informação no sistema nacional deverá tornar-se uma realidade até ao final de
2021.
*
[email protected]
Bolseira de investigação da Divisão de
Oceanografia, IH
**
[email protected]
Chefe da Divisão de Oceanografia, IH
CFR EH
NOTAS:
(1) Sagres foi o local eleito para esta instalação devido à sua proximidade à zona mais
tsunamigénica
33
84.O Ano
Image © Nuno Vasco Rodrigues /
CSIC / iMirabilis2. Navio oceanográfico
B/O SARMIENTO DE GAMBOA,
com o ROV LUSO a bordo,
no âmbito da campanha iMirabilis2
– Projeto Europeu iAtlantic.
ROV Luso à Descoberta
do Mar Profundo
por António Calado*
ão 00h44 e pela última vez, na campanha iMirabilis2, é comunicado ao
oficial de quarto na ponte do navio
que o ROV LUSO está de regresso a bordo, e em segurança.
Assim foi no passado dia 26 de agosto,
no âmbito da participação do ROV LUSO
da Estrutura de Missão para a Extensão
da Plataforma Continental (EMEPC) no
projeto europeu iAtlantic (iatlantic.eu), um
programa multidisciplinar de investigação
que se propõe avaliar de forma integrada o estado dos ecossistemas do mar
profundo e de águas abertas, ao longo
de todo o oceano Atlântico, assim como
a sua variabilidade espacial e temporal.
Esta foi a campanha mais abrangente
do projeto, coordenada pelo Instituto Español de Oceanografia (IEO), a bordo do
navio oceanográfico B/O SARMIENTO DE
GAMBOA, e incidiu sobre a região sudoeste do arquipélago de Cabo Verde, ao
redor das ilhas do Fogo e Brava, no monte submarino do Cadamostro (a sudoeste
da ilha Brava) e terminando nas planícies
abissais circundantes, mostrando a todos
S
34
a bordo o mundo desconhecido do oceano profundo da região.
Mas este não foi apenas mais um
mergulho, também para o ROV LUSO
e para a sua equipa de pilotos, foi um
mergulho especial. Este foi o mergulho
mais profundo alguma vez realizado pelo
ROV LUSO, atingindo a profundidade de
3.512 m, num mergulho que durou aproximadamente 9h e teve como objetivo recolher imagens e dados da zona abissal
em redor da área de estudo principal. As
operações a esta profundidade recorrendo ao ROV LUSO não estavam inicialmente previstas, mas tendo em conta os
problemas operacionais que afetaram os
equipamentos estipulados para a aquisição de dados nesta área cientificamente
relevante para a compreensão de toda
a dinâmica da região, o ROV LUSO e a
sua equipa avançaram para colmatar esta lacuna, aceitando o enorme desafio
de adaptar o ROV para obter os dados
e imagens tão importantes para a equipa
científica a bordo, indo além dos limites
até então alcançados. Depois de 24 h de
revistademarinha.com
trabalho intenso no ROV, para modificá-lo
instalando novos equipamentos, novas
câmaras e novas luzes para a iluminação
do fundo marinho, partimos à descoberta
desta zona abissal. Após cerca de 17 h
de operações, repartidas por 2 mergulhos bem-sucedidos, os objetivos foram
integralmente cumpridos nesta área de
interesse durante os 2 últimos dias de
campanha. Foi um feito muito celebrado
por todos a bordo com um reconhecimento especial à equipa de pilotos ROV
da EMEPC que, com a colaboração de
todos, tornaram possível alcançar um objetivo que tudo apontava não ser possível
atingir na campanha iMirabilis2.
Esta foi a última missão do ROV LUSO,
que durou 44 dias e incluiu 14 mergulhos
ROV: os primeiros dos quais numa primeira parte da campanha coordenada pela
EMEPC, entre Vigo e Las Palmas. O principal objetivo desta primeira parte consistia
em caracterizar o fundo marinho no topo
de um dos montes submarinos dispostos
ao longo da crista submarina da Biscaia,
bem como os diferentes tipos de ecos· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Navegação, Hidrografia e Oceanografia
All images © ROV Luso/EMEPC/iMirabilis2. Imagens adquiridas pelo ROV LUSO no âmbito da campanha iMirabilis2, decorrida ao largo de Cabo Verde
entre 31 jul e 4 set.
sistemas associados aos diferentes tipos
de substrato identificados pela equipa da
EMEPC a bordo. Os restantes 12 mergulhos decorreram já em águas cabo-verdianas, ultrapassando as 100 h de imagens
de alta-definição e ultra alta-definição do
oceano profundo praticamente desconhecido.
Equipamentos como o ROV LUSO são
atualmente uma das principais ferramentas para conhecermos detalhadamente o
oceano profundo, pois combina uma série
de valências, que juntas, permitem uma caracterização muito completa do ambiente
marinho alvo das operações. Assim, como
resultado dessas operações podemos obter não só dados de múltiplos parâmetros
físico-químicos, como imagens de ultra alta-definição, através de câmaras de vídeo e
fotográficas de grande resolução, complementadas com a capacidade de obtenção
de diversas amostras de organismos, rochas, sedimento e água que permitem ca-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
racterizar de uma forma bastante completa
o ambiente marinho, correlacionando toda
esta informação para melhor compreender
as interações entre estes diferentes componentes do ecossistema.
Foi exatamente para usufruir desta
capacidade de obtenção de amostras
e caracterização do ambiente marinho,
que Portugal decidiu adquirir este equipamento em 2007, numa primeira fase para
apoiar a recolha de amostras e caracterização geológica do fundo marinho para
suportar o Projeto de Extensão da Plataforma Continental (PEPC) de Portugal junto das Nações Unidas. Até 2014 o ROV
LUSO fez várias campanhas com esse objetivo principal, tentando sempre conciliar
a aquisição de informação para o PEPC
com a aquisição de informação para outros projetos nacionais que decorressem
nas mesmas áreas geográficas. Desde
2014 iniciou-se uma nova fase, em que o
ROV LUSO passou a participar em vários
· revistademarinha.com
projetos internacionais nas mais diversas
áreas das ciências do mar. Nesse ano, e
pela primeira vez a EMEPC estabeleceu
uma cooperação com o Instituto Geológico e Minero de España (IGME) e com
a Unidad de Tecnologias Marinas (UTM),
que lançou a base para uma cooperação
ibérica que permitiu juntar valências complementares existentes em Portugal e Espanha, para a realização de campanhas
conjuntas que colocassem à disposição
das suas equipas científicas as melhores
ferramentas disponíveis na busca de conhecimento do mar profundo. Desde a
primeira campanha, os resultados foram
amplamente benéficos para todas as instituições envolvidas, tendo igualmente permitido que o ROV LUSO e a sua equipa
tenham ganho uma projeção internacional
importante pelo trabalho apresentado,
que tem feito com que esta colaboração
tenha sido replicada em diversos projetos
portugueses, espanhóis e europeus com
35
84.O Ano
Image © Monica Albuquerque / EMEPC /
iMirabilis2 ROV LUSO pronto a iniciar
a primeira operação da campanha,
coordenada pela EMEPC.
enorme sucesso. E com os resultados
recentes desta colaboração, certamente
continuará a existir uma forte vontade em
fazer com que mais operações conjuntas
ocorram no futuro.
No que diz respeito ao veículo, no ROV
LUSO encontram-se instalados diversos
equipamentos que pretendem otimizar cada operação do ponto de vista científico,
nomeadamente maximizando a recolha
de dados, amostras e imagens do fundo marinho. Dos diversos equipamentos
podem destacar-se: dois manipuladores
robóticos, uma câmara de alta definição
para gravação de imagens UltraHD (4K),
uma máquina fotográfica com flash, um
Doppler Velocity Logger – DVL para medição de correntes marinhas de fundo, dois
CTD’s, para medir a densidade, temperatura e pressão da água, com sensores
de fluorescência, oxigénio dissolvido, turbidez, pH, e potencial oxidação-redução,
sensores de CH4 e CO2, caixas de amostras para armazenar amostras de geologia
e biologia, um amostrador biológico por
sucção com 5 câmaras de amostragem, 4
garrafas de niskin para recolha de amostras de água, suporte para corers para recolha de sedimentos, lasers de escala, 4
luzes de alta intensidade, sonar, altímetro,
girobússola e posicionamento acústico.
36
Nesta campanha foi ainda testado o novo
sistema de navegação inercial, que se pretende que sirva de sistema de posicionamento mais preciso, bem como de sensor
de movimento, para correção de dados
de levantamento da morfologia do fundo
marinho obtidos através de um sondador
multifeixe.
Recorrendo a estes equipamentos instalados, podem realizar-se diversos estudos fundamentais em diferentes disciplinas
das ciências do mar como a geologia, a
biologia, a química ambiental, a geofísica,
a oceanografia física e química, em diferentes ambientes morfológicos; estes permitem ainda a avaliação de recursos minerais
submarinos (recursos utilizáveis na indústria de biotecnologia azul), inventariação de
biodiversidade e estudos de ecossistemas
pelágicos e bentónicos.
Ao longo dos últimos anos o ROV LUSO, operado por uma equipa de pilotos
altamente treinados e especializados, composta totalmente por pilotos nacionais, tem
trabalhado em projetos em muitas destas
áreas, tendo já efetuado um total de 255
mergulhos, a que correspondem mais de
1.200 horas de operação e mais de 600
dias de campanha.
Para além disso, um projeto como este, acaba igualmente por servir de âncora
revistademarinha.com
para que outros projetos surjam, e que se
apoiem nesta tecnologia e na experiência
operacional entretanto adquirida para se
desenvolverem, nomeadamente projetos
tecnológicos de desenvolvimento de equipamentos, sensores e outros veículos de
investigação ligados ao oceano ou mesmo
à exploração do espaço, que muitas vezes
usam o oceano, e em particular o oceano
profundo, como um ecossistema propício
ao desenvolvimento de ferramentas e equipamentos aplicáveis para lá das fronteiras
do nosso planeta.
Deste modo, Portugal é hoje um país
com uma capacidade operacional muito
relevante nesta área tecnológica altamente especializada, capacidade esta que se
encontra disponível não só para ser aplicada em qualquer área marítima sob sua
jurisdição - incluindo a futura área de soberania resultante do Projeto de Extensão
da Plataforma Continental – mas também
como elemento de projeção internacional
das suas capacidades de operação e obtenção de conhecimento científico sobre
o mar profundo, uma área amplamente
desconhecida mas recentemente alvo de
um crescente interesse da comunidade internacional.
*
[email protected]
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Economia do Mar
Digitalizar, Descarbonizar
e ‘Circularizar’o Mar
Uma estratégia para alcançar 10% do PIB
de economia azul sustentável até 2030
por Ruben Eiras*
Mar foi, é e sempre será o ativo
territorial que assegura a sustentabilidade de Portugal como nação
independente e com autonomia estratégica.
Se é verdade a existência de um relativo
consenso social e político quanto ao pressuposto anteriormente enunciado, o mesmo não se pode afirmar quanto à forma da
sua concretização política e empresarial.
Com efeito, o permanente “pendular” das
elites entre uma estratégia marítima e outra continental é parte integrante do ADN
histórico de Portugal. Neste respeito, é
necessário frisar, que mesmo durante a
vigência do ciclo do Infante D. Henrique,
na era quinhentista, houve um hiato de
pelo menos duas décadas em que a Coroa portuguesa se focou na conquista de
território no Norte de África em detrimento da aceleração da exploração marítima
da nova rota de navegação da Índia. E,
mais tarde, quando D. João II, tomou as
rédeas do país, Portugal enfrentava uma
crise económica e financeira profundíssima. Foi nessa altura de crise que se deu
o definitivo impulso estratégico para o Mar
se tornar o centro da estratégia económica
e geopolítica de Portugal.
O
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Volvidos 500 anos, num contexto em
muito diferente em todas as dimensões,
Portugal encontra-se numa nova encruzilhada estratégica: ou permanece na
presente estagnação económica, a voar
baixinho com o mesmo modelo económico de há quase 50 anos ou resolve apostar de novo no Mar como o motor da sua
prosperidade económica,
social e geopolítica.
E vale a pena apostar
na economia do Mar? Vejamos os números e alguns
factos. Segundo os últimos
dados da conta-satélite
do Mar, publicados pela
Direção-Geral da Política
do Mar, é previsível que
em 2019 a economia azul
tenha atingido 5% do PIB.
Em 2013, esta era 2,1% do PIB, em 2016
representava 3,1%. Ou seja, estamos perante um crescimento anualizado médio
regular de 0,48%, mesmo durante a época
de intervenção da troika.
Mas qual a principal fonte deste crescimento? Mais de 70% centra-se no turismo
costeiro. E quando se compara a produtividade do trabalho do turismo com a do
· revistademarinha.com
setor portuário, mais uma vez, os números
falam por si: 24.000€ face a 55.000€ per
capita. A atividade portuária gera mais do
dobro do valor acrescentado do que a atividade turística.
Vamos analisar outros factos. Por exemplo, o registo de conveniência do shipping
da Região Autónoma da Madeira. Em menos de uma década, passou da segunda metade da
tabela dos maiores registos
europeus para agora ocupar um destacado 3º lugar.
Outro exemplo é o setor de
processamento de pescado, que nos últimos três
anos, em média, tem exportado mais valor do que
o do vinho: 1,1 mil M€ face
a 800 M€/ano.
Tendo em consideração este substancial, embora incompleto, caleidoscópio de
informação sobre a economia azul portuguesa, é honesto inferir que o seu potencial de crescimento não é um lirismo, é
efetivo, mas que o perfil de especialização
económica tem de mudar substancialmente. Por outras palavras, Portugal na economia do Mar sofre de uma dependência
37
84.O Ano
extrema do turismo, quando não tem de
ser assim. Portugal é um país oceânico
com uma posição geoestratégica relevante, com riqueza e abundância de território
e recursos, que lhe são conferidos pelos
seus arquipélagos atlânticos: as Regiões
Autónomas da Madeira e dos Açores.
Então perguntar-se-á o leitor: como
alavancar a materialização do crescimento
económico dos outros setores da economia azul, para aumentar a geração de valor
acrescentado e diminuir a extrema dependência do turismo? E como concretizar
este objetivo estratégico no atual contexto
das Alterações Climáticas, cumprindo a
sustentabilidade ambiental e social, ou seja, proteger, conservar e restaurar os ecossistemas marinhos e, em simultâneo, criar
empregos locais? A resposta reside em
aplicar a Agenda DDC do EU Green Deal à
economia azul portuguesa, a qual está no
coração do novo regulamento financeiro
ESG (Environmental, Social and Governance) mandatório europeu, a taxonomia da
UE: Digitalizar, Descarbonizar e Circularizar
os modelos de negócio dos diversos setores da economia do Mar, para que estes
sejam lucrativos e com um desempenho
ESG elevado.
Na pesca, isto significa investir fortemente no aumento da eficiência operacional e energética das embarcações para
que as empresas do setor aumentem a
sua margem de lucro, não por pescarem
mais, mas por pescarem melhor. Apostar
em novas propulsões elétricas gera descarbonização e menos gastos com ener-
38
gia. Investir na inovação tecnológica digital
para operações de pesca mais eficientes e
sustentáveis significa menos danos à biodiversidade e mais valor para o pescador.
Por exemplo, já existem soluções de sensores que se integram nas redes de pesca
e que diminuem o bycatch com eficácia.
Ou até mesmo a utilização de drones na
pesca artesanal que pré-identificam a localização dos cardumes, evitando desta forma o desperdício energético e diminuindo
o risco da operação.
Na indústria do processamento de pescado, isto significa usar a Agenda DDC
para não só aprofundar a eficiência e descarbonização das operações fabris, mas
sobretudo para conhecer melhor os mercados exportadores e criar novos produtos
alimentares. É necessário aplicar a Inteligência Artificial no estudo dos mercados
revistademarinha.com
exportadores para melhorar os circuitos de
distribuição e aumentar a base de clientes
fidelizados. Por sua vez, nesta década, devido às alterações climáticas, assistir-se-á
a uma migração do consumo de proteína
de base terrestre para a de base oceânica: com efeito, a intensidade carbónica da
proteína marinha é próxima de zero, quando a proteína animal de base terrestre não
só emite carbono, como também metano.
Esta tendência leva-nos à aposta no
setor da aquacultura, em que a biotecnologia azul vai desempenhar um papel
estratégico crucial. Investir em soluções
de aquacultura multitrófica integrada e
regenerativa, continuar a exploração do
potencial do offshore e catalisar o crescimento da aquacultura de recirculação de
pescado, bivalves, crustáceos e algas são
todas frentes em que Portugal pode liderar. Liderar uma nova geração de produtos alimentares ESG, sustentáveis, criando
uma marca DOC correspondente. Ou seja,
jogar no “campeonato” das exportações
de qualidade e não da quantidade: conseguir mais valor cobrado por cada produto
vendido e não pelo volume.
Quanto aos portos, a Agenda DDC
deverá traduzir-se mais uma vez na sua
vanguarda da eficiência operacional (aprofundar a sua automação e robotização) e
da transição energética (disponibilizar infraestruturas de abastecimento de energia
limpa como o hidrogénio e a amónia). Mas
podem ir mais além. Os portos podem
explorar o potencial de se tornarem hubs
de inovação empresarial, tecnológica e de
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Economia do Mar
start-ups de setores que os usam para as
suas operações. Por exemplo, a aquacultura e as energias renováveis oceânicas.
Uma estratégia integrada de desenvolvimento dos portos portugueses na vanguarda da conetividade marítima e como
centros de inovação da economia azul irá
valorizar geoestrategicamente o país, com
a captura de novas rotas de comércio de
mercadorias e passageiros.
A energia renovável do oceano é uma
área com elevado potencial para a autonomia estratégica de Portugal. Os primeiros dados de desempenho do Windfloat
Atlantic no offshore de Viana do Castelo
mostram um desempenho produtivo 45%
acima do esperado. Isto significa que,
muito provavelmente, iremos assistir ainda nesta década a um custo de produção
de eletricidade na casa dos 35€/Mwh, o
valor-chave a partir do qual é viável economicamente a produção de hidrogénio verde. Tendo em conta que a energia eólica
flutuante tem uma disponibilidade média
de 90%, isto abre o horizonte para que
Portugal se torne num mega-produtor de
hidrogénio verde a partir do Mar.
Na construção naval, a Agenda DDC
abre a oportunidade da indústria nacional
se renovar e se reposicionar na cadeia de
valor global. Podemos voltar a ser competitivos se apostarmos os nossos esforços
na criação de um cluster exportador de
tecnologias navais ESG: soluções digitais
de navegação baseadas em realidade aumentada, soluções de propulsão elétrica,
a hidrogénio, novos materiais hidrodinâmicos, etc. E no shipping, a Agenda DDC
abre a oportunidade de criar um dos primeiros registos e ratings que premeiem
o desempenho ESG, atraindo a indústria
financeira pioneira neste domínio.
Por fim, as necessidades da tripla transição digital-energética-climática vão mudar
o racional do sistema energético baseado
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
em minerais de hidrocarbonetos para minerais como o cobre, o manganésio, o cobalto e metais raros. A vasta área oceânica
portuguesa encerra muito potencial a este
nível. Contudo, a mineração marinha é um
tema controverso, devido à ainda escassez de conhecimento sobre os ecossistemas do Mar profundo onde estes recursos
se encontram. Mas esta também é uma
oportunidade para desenvolver o conhecimento e a tecnologia ESG, assente no
digital e na robótica, que irão permitir a
extração destes importantes recursos com
o menor dano possível, assim como estabelecido na taxonomia da UE.
Em suma, se Portugal investir na Estratégia DDC de diversificação sustentável da
· revistademarinha.com
economia azul, é possível prever que o Mar
aumentará para 10% o seu peso no PIB
nacional, conferindo maior sustentabilidade e relevância geopolítica à nação portuguesa. Poderá ser o dealbar de uma nova
era quinhentista, em que Portugal explora
o Mar com retorno de lucro, mas também
com propósito ambiental e social.
É este o desiderato que move a ação
dos 125 associados da Fórum Oceano,
Cluster do Mar Português: fazer cumprir
Portugal concretizando o potencial económico sustentável do nosso oceano continental e arquipelágico!
* Secretário-Geral da Fórum Oceano
– Associação para a Economia do Mar
[email protected]
39
84.O Ano
“Oceano Fresco” – a Inovação
ao Serviço da Aquicultura Sustentável
por Andreia Cruz, Bernardo Carvalho e Rodrigo Clímaco* e José Miguel Silva**
Centro BioMarinho da Oceano Fresco
localizado na Nazaré que acolhe uma
maternidade de bivalves, laboratórios e
escritórios. ´
Oceano Fresco é uma empresa de
aquicultura de bivalves que tem como objetivo desenvolver e produzir
variedades de bivalves de qualidade superior, respeitando a sustentabilidade ambiental e a segurança para o consumidor
final.
Especificamente, a Oceano Fresco
dedica-se à produção de amêijoas que
possuem características únicas: são uma
fonte de proteína animal de baixo nível
trófico, muito nutritivas, ricas em vitaminas e minerais essenciais, baixo teor de
gordura, uma boa fonte de ácidos gordos
ómega-3 e são muito apreciadas pelo
A
40
consumidor devido ao seu excelente sabor. As amêijoas são assim consideradas
um super-alimento: são sustentáveis,
saudáveis e saborosas.
Criada em 2015, a Oceano Fresco, nasceu da visão do seu CEO, Bernardo Ferreira de Carvalho, que possui uma formação
de base em gestão e que durante muitos
anos trabalhou no Departamento de Investigação & Desenvolvimento de empresas como a Novartis ou a Syngenta, entre
outras. Foi da sua experiência anterior que
surgiu a ideia de que … é possível combinar a sustentabilidade económica com a
sustentabilidade ambiental. Com esta ideia
revistademarinha.com
em mente, Bernardo Carvalho formou a
sua equipa inicial, incluindo dois especialistas no cultivo de bivalves e uma especialista em Genética e Biologia Molecular.
Juntos visitaram diversos aquicultores,
centros de depuração e comercialização,
entidades de gestão aquícola e de investigação científica, em diferentes países onde
a aquicultura já estava bem estabelecida,
nomeadamente Portugal, Espanha, Itália,
China, Coreia do Sul, Noruega e Estados
Unidos da América.
Durante este estudo de mercado, que
durou cerca de seis meses, a equipa
identificou os principais obstáculos para
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Atualidade Nacional
o crescimento da produção de amêijoa,
nomeadamente: i) mentalidade a curto-prazo, conduzindo a falta de estratégias
de crescimento a longo-prazo; ii) receitas
baixas por hectare, devido ao cultivo de
espécies de baixo valor comercial; iii) base
não científica e incapacidade de melhorar
a taxa de sobrevivência e crescimento
de maneira sistemática; iv) escassez frequente de semente como consequência
da degradação da qualidade da água e de
métodos de cultivo ineficientes; e v) produção fragmentada e em pequena escala,
levando a capacidade limitada de investimento e internacionalização.
Após esta abordagem inicial e até aos
dias de hoje, a Oceano Fresco tem definido o rumo da empresa: aplicar a ciência, a
técnica e a gestão do século XXI em espécies nativas europeias de amêijoa de forma
sustentável e cultivá-las em escala para
alimentar o mundo. Assim, a atividade da
empresa assenta nas seguintes características: i) visão de longo prazo, com execução
passo a passo e bem fundamentada; ii) altas receitas por hectare, através do cultivo
de espécies de alto valor comercial; iii) negócio integrado ao longo da cadeia de valor
desde a produção de semente ao tamanho
comercial; e uma iv) abordagem escalável,
recorrendo a grandes áreas de cultivo em
mar aberto abastecidas por semente produzida numa maternidade escalável.
A Oceano Fresco está focada na produção de duas espécies de amêijoa autóctones da Europa, amêijoa-boa ou
amêijoa-rainha (ruditapes decussatus) e
amêijoa macha ou amêijoa-judia (venerupis corrugata), que apresentam um valor
económico e gastronómico elevado.
A Oceano Fresco suporta a sua atividade numa forte componente em I&D.
Apesar de já serem bem conhecidas
dos aquicultores e do consumidor, a
produção destas amêijoas tem sido severamente afetada por fatores bióticos
(infeções causadas por bactérias, vírus ou
protozoários, como o parasita Perkinsus
olseni) ou fatores abióticos (como variações bruscas de temperatura, salinidade,
acidificação, entre outras), que regularmente levam a mortalidades massivas.
Ciente deste desafio, a Oceano Fresco
tem apoiado a sua produção numa forte
componente de investigação e desenvol-
vimento, aplicando métodos e tecnologias
de última geração para o melhoramento seletivo das amêijoas. Na Oceano Fresco não
se desenvolvem espécies geneticamente
modificadas. Pelo contrário, são usadas
ferramentas avançadas de genómica que
permitem selecionar mais rapidamente
e com melhor precisão os reprodutores
que darão origem aos filhos com melhor
desempenho, ou seja, que apresentam
melhores taxas de sobrevivência e de crescimento. Este trabalho tem sido realizado
pela equipa interna da Oceano Fresco que
Embarcação Oceano Fresco II
numa das linhas de produção
do viveiro do Algarve.
Amêijoa cultivada no viveiro da Oceano Fresco
no Algarve com cerca de 25 mm.
41
84.O Ano
conta com a colaboração de várias entidades de investigação nacionais e internacionais. Na área da genética e patologias
tem colaborado com o CIIMAR (Porto), a
Universidade de Santiago de Compostela,
a Universidade da Corunha e o CIMA (em
Espanha) e com duas entidades norueguesas, o instituto de investigação Nofima e
a empresa VESO. Nas áreas do melhoramento e cultivo, a Oceano Fresco tem colaborado com o IPMA (Olhão) e a Shellfish
Breeding Technologies (EUA). Na área das
plataformas digitais, tem colaborado com
a Digidelta Software (Leiria), a Aqualgae e
a BAUP, sedeadas em Espanha e mais recentemente, com a empresa norueguesa
Maritech.
Além disso, o trabalho de I&D realizado tem ainda contado com a colaboração
de vários aquicultores nacionais e internacionais que vão partilhando as suas
experiências de largos anos no setor. A
atividade de I&D desenvolvida nas diferentes áreas, desde a implementação de
um programa de melhoramento seletivo,
ao desenvolvimento de ferramentas de
seleção genómica e de metodologias de
produção inovadoras, tem sido publicada
em revistas científicas internacionais. Mais
ainda, recentemente, a União Europeia reconheceu a atividade de I&D desenvolvida
pela Oceano Fresco com um ‘Selo de Excelência’.
Atualmente a Oceano Fresco possui
um Centro Biomarinho (incluindo uma
maternidade, laboratórios e escritórios)
na Nazaré. É aqui que a semente é produzida até atingir cerca de 1,5 a 2 mm e
depois é transportada para o viveiro. Este
está localizado em pleno Oceano Atlântico, a 3,5 mi ao largo da barra de Alvor,
no Algarve. É o primeiro viveiro de amêijoa em mar aberto do mundo, com cerca
de 100 hectares. No viveiro está instalado
um sistema de linhas (cabos estruturais
ancorados ao fundo que é mantido à superfície por meio de boias. Nas linhas são
dispostas as chamadas lanternas onde
são colocadas as amêijoas até atingirem o
tamanho comercial. Sendo animais filtradores, aproveitam a enorme quantidade
de microalgas existentes no mar do Barlavento Algarvio para se alimentarem de
forma natural. As linhas, o sistema de ancoragem e de flutuação acabam por servir de refúgio e substrato para inúmeras
espécies, criando um efeito de santuário
devido, também, à interdição da pesca
comercial nesta área.
Seguindo o princípio original e de forma a dar escala à produção, a Oceano
Fresco contratou a construção de uma
nova embarcação, com projeto e construção nacional, que deverá ficar pronta no
42
Trabalho de corte no tubo do impulsor de proa.
início de 2022. A construção desta embarcação está a cargo da firma “Penimar,
Reparação e Construção Naval, Lda”. A
Penimar é uma empresa de Peniche com
vasta experiência na área do mar, tanto
na reparação naval como na construção e
montagem de equipamentos hidráulicos.
Essa experiência foi também consolidada
pela vertente de construção naval, área a
que a empresa se dedica há quase duas
décadas, na sua maioria de embarcações
de trabalho.
Esta nova embarcação de 22 m de
comprimento e 8 m de boca, projetada
e construída especificamente para esta
atividade será o culminar da estratégia da
Oceano Fresco com vista à sua autonomia de produção, não estando dependente de terceiros, controlando o fluxo desde
a criação da semente ao crescimento em
viveiro e colheita seletiva. A embarcação
estará equipada com as ferramentas que
a habilitam a estar presente em todas a
fases da produção da amêijoa em mar,
desde a colocação das long-lines e das
poitas de 7 tons à criação e escolha da
amêijoa.
A Oceano Fresco conta com uma
equipa multinacional de 18 pessoas que
combina uma profunda experiência técnica com uma mentalidade empreendedora
e uma paixão pelos oceanos. A empresa
perspetiva contratar mais 40 pessoas já
no próximo ano.
As primeiras ameijoas produzidas pela
Oceano Fresco chegarão ao mercado no
final de 2021. A empresa iniciará as suas
vendas em Espanha e Portugal e, posteriormente, noutros mercados consumidores europeus de bivalves.
O compromisso da empresa aos seus
clientes é um fornecimento confiável de
amêijoas durante todo o ano e uma parceria comercial sólida, com o objetivo de
restabelecer o consumo de amêijoas premium, dentro e fora de casa.
A empresa tem sido financiada pelos
seus fundadores, fundos públicos e investidores de capital de risco, que compartilham a sua visão de mudança de
paradigma de uma verdadeira “economia
azul” para a Europa e o mundo.
* www.oceano-fresco.pt
**
[email protected]
Soldadura do revestimento da embarcação Oceano Fresco I.
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Portos & Atividades Portuárias
Janela Única Logística:
Inovação e Digitalização do Setor
Portuário Nacional
por Claudio José Pinto*
no início da primeira década do século XXI que Portugal assume como
prioridade a aposta na conceção de
uma sociedade de informação e conhecimento, que adivinhava o acelerar do desenvolvimento tecnológico nos diferentes
setores de atividade da economia nacional. No setor marítimo-portuário, a par da
importância tradicionalmente atribuída à
melhoria das infraestruturas portuárias, a
capacitação do setor com uma info-estrutura ágil e simplificada, capaz de responder
às crescentes exigências do mercado, principalmente ao nível da carga contentorizada, começa a tornar-se imperativa, tendo
como objetivo o aumento da competitividade dos portos nacionais. As tecnologias de
informação começam então a posicionar-se como variável fundamental com vista
à modernização do setor, privilegiando a
integração dos diferentes atores públicos
e privados numa mesma plataforma digital,
uniformizando e padronizando procedimentos, dados e informação.
O estabelecimento de procedimentos
simplificados e paperless começam a tomar forma no âmbito dos projetos PCom
- Plataforma Comum Portuária, e PIPe
É
- Procedimentos e Informação Portuária
Eletrónica, desenvolvidos em sede da APP
– Associação dos Portos de Portugal, e liderados pelos três principais portos nacionais – Sines, Lisboa e Leixões.
Ambos os projetos se afiguraram determinantes e complementares para o
desenvolvimento tecnológico do sistema
portuário nacional, uma vez que enquanto
o PCom previa essencialmente disponibilizar aos agentes económicos o despacho
aduaneiro eletrónico das mercadorias e
navios numa plataforma comum, de forma ágil e simplificada, o PIPe promoveu a
análise de procedimentos manuais e informatizados e requisitos de informação em
todos os portos nacionais (contemplando
também um benchmarking das melhores
práticas internacionais), resultando numa
reengenharia total de processos e fluxos
de informação nos portos que permitiu elaborar um modelo de referência nacional.
Desta forma, o alinhamento de ambos os
projetos constituiu o impulso necessário
para o desenvolvimento da JUP – Janela
Única Portuária, integrando nesta filosofia
de “balcão único virtual” a DGAIEC - Direção Geral de Alfândegas e Impostos
Especiais sobre o Consumo e restantes
autoridades envolvidas no despacho de
navios e mercadorias – Autoridade Marítima, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
e Autoridade Fitossanitária, contemplando
desta forma todos os fluxos informacionais.
Assim, a JUP - Janela Única Portuária
constituiu-se no inicio de 2008, como o
sistema de informação ao serviço do porto
e da comunidade portuária, permitindo, a
par do incremento da competitividade do
porto, obter um nível superior de relacionamento (eletrónico) entre atores, com vários
aspetos pioneiros e inovadores, integrando
agentes de navegação, despachantes oficiais, operadores de transporte marítimo,
terminais, carregadores, recebedores,
prestadores de serviços e todas as autoridades presentes no porto.
Por outro lado, a JUP permitiu ainda disponibilizar um conjunto de dados da maior
importância para a análise do negócio
portuário, reforçando, também, por esta
via, a importância desta ferramenta. Como
ganhos efetivos de produtividade, de realçar a antecipação na tramitação de todo o
processo inerente à escala do navio, permitindo que cerca de dois dias e meio antes
43
84.O Ano
Janela Única Logística.
da chegada deste ao porto e cerca de 12
horas antes da largada, todas as autorizações fossem efetivadas no sistema. Por
outro lado, também de assinalar a redução
dos tempos de despacho aduaneiro de 3
a 4 dias para 1 a 2 horas. Acresce ainda o
controlo efetivo da informação de suporte
ao combate à fraude e evasão fiscal, bem
como a desmaterialização dos processos
administrativos e completo rastreio das
mercadorias.
Em 2009 a JUP foi, primeiro no Porto de
Sines e depois nos restantes portos nacionais, alvo de uma importante evolução em
termos de interface homem-máquina, que
permitiu uma melhor usabilidade da ferramenta, aumentando ainda mais o índice de
produtividade na sua utilização. Face ao
forte incremento no número de utilizadores
e de informação a tratar, foram também
melhoradas as Infraestruturas de alta disponibilidade e de suporte aos utilizadores,
disponível 24 horas por dia, todos os dias
do ano.
44
Será inquestionável considerar que no
constante processo de digitalização do
setor portuário, foram determinantes os
contributos resultantes da implementação
da JUP para o incremento da competitividade dos portos nacionais, nomeadamente numa redução significativa de custos e
tempos administrativos, enquanto aportava
fluidez a todo o processo, antecipando prazos, eliminando redundâncias, eliminando
papel, simplificando procedimentos e aumentando a transparência dos processos.
A EVOLUÇÃO DA JUP II PARA
A JUL – JANELA ÚNICA LOGÍSTICA
As orientações estratégicas definidas
pelo Governo para o setor marítimo portuário nacional, no horizonte temporal
2007-2015, previam como um dos objetivos primordiais que os portos nacionais
conseguissem concretizar um forte incremento da movimentação de mercadorias.
revistademarinha.com
Para o cumprimento deste objetivo, as
mesmas orientações estratégicas definiam
como fundamental a prossecução do processo de simplificação de procedimentos
e integração modal nos fluxos informacionais, fomentando a integração dos portos
nacionais nas AEM – Auto-Estradas do
Mar, promovendo o acesso às rotas marítimas internacionais e ainda reforçando o
TMCD – Tráfego Marítimo de Curta Distância. Constituía também objetivo primordial
alargar o hinterland portuário na Península
Ibérica, garantindo que os portos nacionais
se afirmassem como infraestruturas de referência nas cadeias logísticas da fachada
atlântica. Torna-se então imperativo desenvolver uma plataforma capaz de alargar o
âmbito da Janela Única Portuária ao longo
do hinterland e integrando os meios de
transporte terrestres – rodovia e ferrovia. A
Janela Única Logística, tem a sua génese
na lógica de modernização e simplificação
de procedimentos da Janela Única Portuária, integrando, no entanto, o modo terrestre e os portos secos; a JUL consubstancia
na transformação digital e criação de valor
nas redes portuárias e logísticas, com o
objetivo de colocar os portos e as redes logísticas nacionais na liderança do estado-da-arte dos processos de digitalização a
nível mundial. Assim, a JUL alarga substancialmente o âmbito de operação da Janela Única Portuária, incorporando diversas
inovações na digitalização dos processos de negócio. Evolui-se das operações
portuárias para corredores multimodais,
integrando o transporte terrestre, ferroviário e também as plataformas multimodais
e operações de última milha, estando a
plataforma preparada para suportar processos digitais inerentes a esta evolução,
em forte alinhamento com as autoridades
no sentido de agilizar e desmaterializar pro· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Portos & Atividades Portuárias
cessos. Este elevado grau de partilha de
informação permite assegurar um nível de
colaboração sem precedentes entre toda a
rede de transportes e sincronização global
de operações multimodais.
Deve ainda ser referido que a JUL
corresponde a um processo de desenvolvimento evolutivo, de forma a cobrir,
completamente, toda a cadeia de transporte no hinterland, estando, não obstante
em preparação a ligação ao foreland, nomeadamente através da partilha de eventos com outras plataformas eletrónicas e
sistemas de comunidades portuárias, com
o objetivo de, no futuro, disponibilizar visibilidade total porta-a-porta sobre os fluxos
logísticos.
Acima de tudo, os princípios base da
JUL promovem uma total convergência entre os diferentes atores, para que no futuro
a gestão dos processos logísticos seja feita
numa perspetiva de otimização das redes
como um todo (inteligência colaborativa da
rede), substituindo gradualmente o modelo
tradicional de otimizações pontuais ao nível
de cada nodo da rede.
FUTURO
O futuro afigura-se desafiante para os
portos nacionais, e para o shipping internacional. A crescente globalização, a forte
competitividade dos mercados, e as exigências impostas pelo Pacto Ecológico
Europeu que estabelece, já para 2030,
uma redução de 55% na emissão de GHG
– Gases Efeito de Estufa, para o setor marítimo-portuário, impõem que o progresso
continue a suportar-se na digitalização e
inovação como ferramentas suporte ao desenvolvimento do setor.
Neste contexto, ferramentas como a
JUL assumem uma relevância ainda maior
se tivermos em linha de conta o seu papel
para a concretização de cadeias logísticas
mais eficientes e sustentáveis, contribuindo
desta forma para o processo de descar-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Roadmap de inovação e digitalização.
bonização do setor portuário e logístico.
Por outro lado, o futuro passará pela interoperabilidade e interconetividade entre
plataformas ao nível global, promovendo o
intercâmbio de dados e informação entre
portos e restantes atores no âmbito internacional, promovendo parcerias, fomentando novas oportunidades de negócio e
abrindo caminho para cadeias de abastecimento onde globalidade se torna sinónimo de competitividade, sustentabilidade,
inovação e progresso para o shipping internacional.
Desta forma, para o horizonte 2030, o
próximo passo no processo de transformação digital do setor, passará por evoluir
a JUL, por forma a que se constitua como referência internacional em termos de
inovação em ecossistemas digitais para a
logística, potenciando de uma forma substancial o valor criado através de uma lógica
de ecossistema aberto. Pretende-se, de
igual modo, desenvolver a partir da plataforma JUL um conjunto de produtos e serviços tecnológicos altamente inovadores e
um ecossistema de empresas tecnológicas
nacionais fortemente exportadoras.
Estes objetivos serão concretizados
através do desenvolvimento de um modelo de open data e de um ecossistema
aberto, privilegiando a sincronização de
· revistademarinha.com
processos e a partilha de eventos de planeamento e gestão de execução entre os
operadores da rede – sincromodalidade,
disponibilizando tracking e visibilidade total
sobre a cadeia porta-a-porta, numa ótica
de desenvolvimento de soluções predictive
e perscriptive.
Neste âmbito, e se até aqui o foco foi
essencialmente dado aos atores que
constituem os nodos e elos de ligação da
cadeia de transporte, no futuro será dada
atenção especial aos exportadores, importadores, transitários, 3PL e 4PL, contribuindo para o aumento da competitividade
do setor portuário e logístico nacional e do
seu posicionamento face ao mercado internacional.
Neste enquadramento, compete aos
portos a desafiante tarefa de impulsionar
esta mudança, de fazer acontecer o processo digital e de inovação, de promover
parcerias entre os diferentes stakeholders,
posicionando-se como o epicentro do desenvolvimento que se quer sustentável,
cumprindo os desafios da transição energética e da descarbonização da economia
em prol de um futuro green, smart e sustentável, do ponto de vista ambiental, energético, digital e económico.
*
[email protected]
45
84.O Ano
Portos 4.0, Portos Marítimos
com um Novo Motor
por António Patricio* e Denisa Beres**
UM NOVO PARADIGMA:
PORTOS INTELIGENTES
Automação, inteligência artificial (IA),
interconectividade e dados em tempo-real são os elementos-chave da nova
revolução industrial, a Indústria 4.0. Para
além de criar ecossistemas conectados
e mais eficientes, esta nova abordagem
vem redefinir o modo de operar das diferentes indústrias e permitir novos modelos de negócio.
Com a pandemia COVID 19, surgiram desafios que requerem novos tipos
de colaboração, e todo o processo de
digitalização foi acelerado. Há agora a
consciência de que novos ganhos de
eficiência e geração de valor serão conseguidos pelas novas possibilidades de
digitalização das operações, e não serão
mais pelo investimento em infraestrutura
física pesada.
Nos portos marítimos os desafios
de digitalização são significativos, mas
também grandes são as oportunidades. Na sua maioria, os processos são
ainda manuais e obsoletos, e resultam
em ineficiências de custo e na ausência
de dados de qualidade para endereçar a
mudança pretendida.
A indústria marítima chegou com atraso a esta nova era, mas já existem exemplos de boas iniciativas em autoridades
portuárias, operadores, prestadores de
serviços e em companhias de logística.
O processo está ainda numa fase inicial
e, para que se atinjam os Portos 4.0 (os
Smart Ports), é importante um compromisso com a jornada da digitalização,
para que esta não se reduza a iniciativas
pontuais e desconectadas. Só com um
verdadeiro comprometimento se conseguirá chegar a numa nova era de competitividade do sector marítimo-portuário, e
obter-se o efeito catalisador da digitalização.
Através da união de várias inovações
tecnológicas, nos portos 4.0 será possível criar redes de dados e conectar
pessoas, máquinas e sistemas. Estas
soluções tecnológicas possibilitarão uma
maior integração do homem com as máquinas, ajudando a prever e evitar falhas,
e potenciando planos de contingência
mais eficientes. Com esta nova dimen46
Processo de digitalização de contentor de resíduos da goclever.
são e abrangência de dados recolhidos
em contínuo, 24 horas por dia, todos os
dias do ano, e com a sua disponibilidade
em tempo real, abrem-se novas possibilidades de otimização de operações, mas
também novas oportunidades de geração de valor.
A diminuição da dependência humana
será resultado de serviços em self-service, interfaces online, e regras de decisão
automatizadas. Com a redução de falhas
humanas, serviço ininterrupto, e informação acessível a diferentes stakeholders, é
potenciada a eficiência dos vários atores
do ecossistema portuário, aumentando-se, transversalmente, a competitividade
do setor.
SUSTENTABILIDADE:
UM POTENCIADOR,
NÃO UM PESO
Com o Pacto Ecológico Europeu e os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, com grande peso na agenda política atual, as questões
de sustentabilidade estão também no topo das prioridades dos portos. Esta nova
era tecnológica traz grandes benefícios
associados, não só ligados às operações
em si, mas, também, ao nível de melhorias de sustentabilidade.
revistademarinha.com
A inovação ligada à indústria 4.0 potencia grandes ganhos de sustentabilidade, conectados com os grandes
ganhos de eficiência. A automatização
e robotização, ligados à IA, simplificam
e otimizam processos, fazendo-se uma
utilização mais inteligente e eficiente dos
recursos.
Com estas novas tecnologias digitais,
podem-se tomar decisões mais acertadas com base em medições e num
conhecimento baseado em dados reais
recolhidos, em vez de baseadas na intuição. Com uma qualidade e estrutura
de dados adequada, a IA tem o poder
de automatizar, ou ajudar a tomar essas
decisões em tempo real, alterando os
processos tradicionais. A decisões passam a ser mais rápidas, mais inteligentes
e mais incisivas.
É aqui que a digitalização, e os
ecossistemas digitais, podem fazer a
diferença. Os diferentes atores ficam capacitados para trabalharem em conjunto,
partilhando informação, para escalar ainda mais o conhecimento, desenvolvendo
novas soluções e resolvendo os desafios
de eficiência e sustentabilidade.
A indústria marítima não é exceção, e
existe já a perceção de que sustentabilidade pode estar ligada a ganhos económicos. Está aberto o caminho para
uma verdadeira economia circular e uma
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Portos & Atividades Portuárias
indústria marítima mais verde (ou mais
azul, no caso).
GOCLEVER: INOVAÇÃO
PORTUGUESA A PENSAR
EM PORTOS
A goclever é uma startup tecnológica
portuguesa, focada no setor marítimo-portuário, que digitaliza o ambiente físico
em busca de ganhos económicos. Pela
utilização de sensores remotos e algoritmos de IA, a goclever deteta anomalias,
remove ineficiências e permite operações
otimizadas.
É reconhecido que os navios são responsáveis por cerca de 20% das descargas globais no mar (32% em mares
europeus) de poluição marítima, e com
as exigentes disposições da Convenção
Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (MARPOL), a goclever
desenvolveu o seu primeiro produto na
área da medição precisa e classificação automática de resíduos produzidos
por navios ou embarcações.
Através da utilização de sensores remotos, em particular sensores LIDAR, os
resíduos são digitalizados e são criados
gémeos digitais dos mesmos, com todas
as suas características disponíveis em
bases de dados próprias. Estabelece-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Perspetiva do gémeo digital do Terminal de Graneis Sólidos do Porto de Aveiro.
-se uma comunicação bidirecional com
bases de dados oficiais já implementadas, como as janelas únicas logísticas,
automatizando o processo de reporting
e faturação para todos as entidades envolvidas.
A solução de medição de volumes e
classificação de resíduos surgiu do desafio lançado pelo Porto de Barcelona
· revistademarinha.com
(no Smart Catalonia Challenge), que procurava uma solução eficiente para dar
resposta às necessidades de gestão de
resíduos descarregados por navios. Na
altura, existia um processo dependente
de recursos humanos, que tornavam o
processo pouco eficiente, com horários
de funcionamento limitados e intrinsecamente impreciso, resultando num custo
47
84.O Ano
excessivo de tratamento dos resíduos e
em disputas morosas entre os intervenientes no processo. Ao vencer o concurso com a sua solução CLEVER-Volume,
a goclever instalou os seus sensores no
Porto de Barcelona, que gere mais de
100.000 m3 de resíduos anualmente,
passando a solução a ser inteiramente
adotada para a medição de resíduos.
A digitalização de resíduos da goclever
capacita as instalações de receção portuárias para fazer cumprir os requisitos
da convenção MARPOL de forma mais
eficiente, com um impacto direto na redução do lixo marinho. A solução está
alinhada com a “Estratégia para os plásticos”, do Plano de Ação para a Economia
Circular, onde é dada grande importância
ao registo e troca de informação de resíduos entre meios portuários, gerando, a
goclever, um fluxo de dados digital interoperável e confiável.
Atualmente, para além do Porto de
Barcelona a solução estende-se a nível
ibérico, e começou, em julho de 2021, a
comercialização nos países do Norte da
Europa.
A goclever desenvolveu também uma
solução de medição e classificação de resíduos para portos de menor dimensão,
a partir do piloto para o Porto de Aveiro,
que possui caraterísticas muito próprias
e diferentes dos grandes portos, criando
uma solução móvel e flexível. Atualmente,
através de redes de drones e sensores
fixos, a goclever, para além de digitalizar
os resíduos, passou a digitalizar todo o
porto, criando um gémeo digital tridimensional do porto e processando grande
volume de informação em tempo-real, o
48
que permite um conhecimento detalhado
de tudo o que se passa no porto. Com
recurso a algoritmos de reconhecimento
espacial tridimensional e geolocalização,
a goclever consegue perceber a evolução de ocupação do terminal, sabendo
o porto efetivamente que o que se está
a passar em cada momento e em cada
local do terminal, como saber qual a área
que está ocupada, com que mercadoria,
e a que cliente ela pertence. Alcança-se
uma maior rentabilidade do terminal e
evitam-se soluções problemáticas, com
a geração de alertas automatizados para
revistademarinha.com
situações indesejadas, que previnem, por
exemplo, gastos em futuras reparações.
A demonstração da solução de digitalização de todo o terminal, testada no Porto de Aveiro, recebeu o reconhecimento
da aceleradora 5G da NOS e da Amazon
Web Services, com um júri constituído
por experientes empreendedores, técnicos e investidores de capital de risco.
Recentemente a goclever recebeu
também o investimento do fundo espanhol Ports 4.0, reconhecendo-se o valor
da solução comercial. O investimento de
mais de €500k servirá para continuar o
desenvolvimento das soluções de digitalização e automatização, reforçar a capacidade de produção e para fazer crescer
a equipa comercial da goclever. Este investimento vem-se juntar ao investimento
a nível nacional de €170k, para investigação e desenvolvimento, no âmbito do
programa Crescimento Azul dos EEA
Grants, um fundo gerido pelo Direção-Geral de Política do Mar, que resulta de
um Memorando de Entendimento entre a República Portuguesa e a Islândia,
Noruega e Liechtenstein, principalmente
dedicado à área do negócio e inovação.
A goclever segue focada em tornar os
portos mais inteligentes, seguros e fáceis de gerir, possibilitando portos mais
competitivos e uma indústria marítimo-portuária mais eficiente.
* COO GOCLEVER
[email protected]
** Market Researcher GOCLEVER
[email protected]
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
84.O Ano
Desenvolvimento do Projeto de I&D
USV-enautica1
por Mário Assunção*, Victor Franco*, Rosa Marat*, Pedro Teodoro*,
Pedro Fazenda**, Carlos Gonçalves**
á dois anos publicamos, aqui na
Revista de Marinha, o anúncio
da linha de projetos Sea2Future
que visa a Inovação, Investigação e Desenvolvimento (II&D) em robótica marítima
aplicada. Os projetos desenvolvem-se
em torno das mais diversas embarcações não tripuladas autónomas ou de
controlo remoto USV (Unmanned Surface
Vehicle). Desta linha, a Escola Superior
Náutica Infante D. Henrique (ENIDH) está
a desenvolver o projeto da embarcação
USV-enautica1. Neste projeto encontra-se envolvida uma equipa multidisciplinar de estudantes e docentes de várias
licenciaturas da Escola, abrangendo as
áreas técnicas da Engenharia Eletrotécnica Marítima; da Engenharia de Máquinas
Marítimas; dos cursos técnicos profissionais em Eletrónica e Automação Naval;
Manutenção Mecânica Naval; e Redes e
Sistemas Informáticos. Há ainda lugar para o desenvolvimento de atividades de navegação e de gestão, visando a aquisição
de competências e o desenvolvimento de
futuros trabalhos de Inovação, Investigação e Desenvolvimento (II&D) aplicados
em diversas áreas:
H
• Projeto e construção do casco em
materiais compósitos reforçados com fibras;
• Propulsão elétrica;
• Instrumentação e robótica;
• Comunicações de dados Terra-Mar;
• Sistemas de navegação e posicionamento;
• Algoritmos para otimizar rotas e evitar
colisões;
• Embarcações com sistemas autónomos.
Boat Communication
Android BoatCOM
Sistemas de Bases
de Dados de Navegação
Logotipos das aplicações desenvolvidas nos projetos.
Multimédia e teses do curso de Mestrado em Engenharia Informática e Computadores, ambos do ISEL e ancorados no
Departamento de Engenharia Eletrónica
e Telecomunicações e de Computadores
(DEETC). Os resultados obtidos têm permitido a criação de soluções tecnológicas
desenvolvidas pelos estudantes, com
aplicação direta nos sistemas da embarcação.
Salientam-se os projetos finais de curso da Licenciatura em Engenharia Informática e Multimédia (LEIM) do ISEL:
– O projeto “Boat Communication
- BoatCOM”, no âmbito do qual foi realizado o desenvolvimento do sistema de
controlo remoto para a embarcação USV-enautica1. Este sistema é uma aplicação
desenvolvida em Java que corre num
computador portátil com acesso WiFi à
rede da embarcação;
– O projeto “Android BoatCOM”, onde
foi desenvolvida uma aplicação móvel para dispositivos Android, de forma a existir
uma leitura dos dados da telemetria rece-
bidos da embarcação, tal como o controlo
da mesma através de um joystick virtual;
– O projeto “Sistemas de Bases de
Dados de Navegação – Sea2Future”, sistema de recolha e armazenamento dos
dados dos sensores numa base de dados
para a cloud. No contexto deste projeto
foi igualmente desenvolvida uma aplicação web que permite a posterior análise
das missões realizadas pela embarcação.
De referir também os projetos de teses
de dissertação para o curso de Mestrado
em Engenharia Informática e Computadores (MEIM) do ISEL (ambos em fase de
execução):
– O projeto “Virtualização da embarcação USV-enautica1", que consiste na
virtualização, rendering e simulação da
embarcação, através da integração de:
ferramentas de ambiente gráfico; sensores inerciais (IMU); e da simulação física
de fluídos SPH (Smoothed Particle Hydrodynamics);
– O projeto “Design de firmware de
PARCERIAS DE I&D EM TORNO
DA EMBARCAÇÃO USV-ENAUTICA1
O projeto do desenvolvimento da embarcação USV-enautica1 proporcionou
uma série de parcerias científico-pedagógicas com o Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL). Estas parcerias
culminaram em projetos finais de curso da
Licenciatura em Engenharia Informática e
50
Fases da construção do casco USV-enautica1.
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Formação e Treino
controlo da embarcação marítima USV-enautica1”, que consiste em desenvolver
um sistema para monitorizar e gerir o hardware dos sistemas da embarcação USV-enautica1.
Encontra-se prevista outra parceria de
teses de mestrado para estudantes do
Instituto Superior Técnico (IST), a arrancar
no ano letivo 2021-22, com duas propostas de trabalhos sob os temas:
– Design the BMS for an Autonomous
Small Vessel;
– Design of the Electric Powertrain System of a Fully Autonomous Small Vessel.
Primeira colocação da embarcação em água.
Através destas parcerias, a ENIDH estabelece laços de cooperação com outras
instituições de ensino superior e potencia, por isso, sinergias na implementação
de soluções técnico-científicas em torno
deste projeto.
A EMBARCAÇÃO USV-ENAUTICA1
Construção do casco da embarcação
Atualmente o casco (de tipologia catamaran) da embarcação encontra-se
praticamente terminado. A sua construção – que utiliza compósitos de resina de
polyester reforçada com fibras de vidro
– compreendeu várias fases: Laminação
por hand-lay-up dos dois cascos simétricos através da utilização de molde (1);
Construção dos reforços internos em cada casco através de estruturas sandwich
com núcleo de espuma de poliuretano e
faces de compósitos de fibra de vidro
(2); Interligação entre os cascos através
da construção de reforços em sandwich
utilizando a moldação por vácuo (3); Criação de plataformas também em sandwich
para os componentes elétricos e baterias
(4); Criação da estrutura para fixação dos
motores utilizando pinho marítimo reforçado com fibra de vidro (5); A cobertura
de topo também em pinho marítimo reforçado com fibra de vidro, assim como as
escotilhas de acesso ao interior (6); Manufatura aditiva das orlas para as escotilhas
em policarbonato e impermeabilização final do casco através da aplicação de topcoat e tinta de esmalte de poliuretano (7).
A fase seguinte prende-se com a criação de uma estrutura tubular para fixação
de antenas e sensores, assim como as
pinturas e adereços finais.
Testes em água
Em dezembro de 2020 foi colocado pela primeira vez o casco da USV-enautica1
na água. Os testes foram realizados na piscina com a equipa que desenvolveu o casRevista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Teste de manobra da embarcação.
co. No primeiro teste em água, apenas foi
colocado o casco com o seu peso próprio,
que ronda os 15 kg (1). O casco apresentou um calado de cerca de 8 cm, sensivelmente igual na proa e popa e a estibordo
e bombordo, permitindo a validação dos
cálculos teóricos e de simulação computacional previamente realizados.
No final, colocaram-se pesos até prefazer o peso total de 162 kg (2). O calado nesta situação foi de 24-25 cm, muito
próximo do calado calculado teoricamente de 25 cm para 150 kg de peso do projeto da embarcação.
Em março de 2021 foram realizados os
testes de propulsão e do comando remoto (3). Foi testada a manobrabilidade da
embarcação tendo-se verificado um comportamento bastante suave e consistente
nas operações de marcha avante, marcha
à ré e nas manobras da embarcação com
os dois motores elétricos (4). A velocidade
máxima alcançada foi de 3 nós.
Desenvolvimento dos sistemas eletrónicos da embarcação
Em paralelo com a construção do casco têm vindo a ser desenvolvidos os vários sistemas eletrónicos da embarcação.
Os diferentes sistemas estão interligados
entre si através de um computador principal (microprocessador).
Sistema computador principal: Tem
por base um microcomputador Rasp-
Sistemas da embarcação USV-enautica1 e suas interligações.
· revistademarinha.com
51
84.O Ano
• Fichas de ligação dos sensores para a
fácil ligação ou substituição;
• Circuitos elétricos para condicionamento de sinal dos vários sensores;
• Circuitos integrados para conversão
analógica-digital;
• Circuitos eletrónicos para acionamentos das bombas de fundo do casco;
• Fichas de ligação das bombas de
água;
• Luzes LED indicadoras de cada sistema;
• Ficha para o flat-cable de ligação ao
computador principal.
Placa circuito impresso para interligação dos sensores e eletrónica.
BerryPi com o sistema operativo Linux.
Neste computador funciona um servidor
Robot Operation System (ROS) que permite uma fácil gestão da comunicação
de dados entre os sistemas ligados ao
computador. Mais concretamente, foram
desenvolvidos vários códigos (scripts)
em Python que publicam no ambiente do
ROS as informações dos vários sensores
e sistemas. Desta forma, a aplicação para o controlo remoto pode obter toda a
informação por subscrição no ambiente
do ROS. Os sensores estão ligados fisicamente ao computador principal por
diferentes bus de comunicação. Por conseguinte, os sensores fazem parte do sistema do computador principal. O sistema
de propulsão recebe instruções para o
acionamento dos motores com comunicação por USB.
Sensores de navegação e orientação: Atualmente composto por recetor
AIS (Automatic Identification System), recetor GPS (Global Position System) e sensor IMU (Inertial Measurement Unit).
Sensores das baterias: Compostos
por dois sensores de tensão, dois sensores de intensidade de corrente e quatro
sensores de temperatura, para medir o
comportamento elétrico e físico das baterias.
Sistema de propulsão: Constituído
por uma placa controladora de motores
com dois canais (RoboClaw 2x60A) e dois
motores de 250 N cada. O acionamento
dos motores é feito por ligação USB ao
computador principal, ou por controlo de
rádio.
Sistema de controlo remoto: Foram
desenvolvidas duas aplicações para o
controlo remoto da embarcação. Uma
52
delas funciona num computador portátil e
a outra num smartphone. Ambas as soluções permitem visualizar os dados de telemetria da embarcação e o acionamento
remoto do sistema de propulsão.
Sistema de gestão de energia elétrica: A energia elétrica disponível a bordo
é disponibilizada através de duas baterias
de 12 V e 100 Ah. Está ainda em desenvolvimento o sistema que fará uso dos
sensores das baterias para obter o estado
de carga das mesmas e assim indicar a
energia disponível.
Sistema microcontrolador: Pretende-se que o sistema baseado num microcontrolador efetue o controlo de baixo nível do
hardware usado pela embarcação.
Instrumentação da embarcação
Foi desenvolvida uma placa de circuito
impresso para receber todas as ligações
dos vários sensores para acionamento
das bombas de fundo e para indicação
luminosa sobre o estado de cada sistema.
Esta placa está ligada por um flat-cable
ao computador principal e funciona como
uma extensão do próprio.
A placa de circuito impresso é composta pelos seguintes módulos:
revistademarinha.com
Próximas etapas
Os passos futuros serão desafiantes
devido à montagem dos sistemas eletrónicos no casco e à realização dos testes
funcionais da embarcação. Esta será uma
fase crítica, na medida em que os vários
sistemas desenvolvidos em laboratório irão
funcionar na embarcação. Realizar-se-á a
montagem da instalação elétrica e a ligação de todos os sensores e interligações
entre os sistemas, sob o lema “ligar, testar
e validar”. Por fim, levaremos a cabo os
testes de comunicação e controlo remoto. Numa primeira fase será na piscina, na
segunda fase será na costa junto à praia,
com teste de maior durabilidade e fiabilidade.
EMPRESAS FINANCIADORAS
O projeto USV-enautica1 é financiado
de forma ativa por um conjunto de empresas e outras instituições através de apoio
de carácter financeiro e/ou técnico ou ainda fornecendo os materiais necessários ao
projeto. Não podemos deixar de agradecer os apoios das empresas: AssisteMar;
Atron; Direção de Faróis (Marinha Portuguesa); Douroazul; Fillment3D; MRDinis;
MSC; Nautel; Nautiradar; PortLine; Projeto.Detalhe; PTRobotics; Robert Mauser e
Tecnisata.
* Escola Superior Náutica Infante D. Henrique
[email protected]
** Instituto Superior de Engenharia de Lisboa
[email protected].
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Economia do Mar
Regresso ao Mar… a Remar
O Campeonato do Mundo de Remo de Mar de 2021
na Praia da Torre, Oeiras
Um Ponto de Viragem e de (Re)afirmação
do Remo Nacional
por Eduardo de Almeida Faria
Entre 24 de Setembro e 2 de outubro de 2021 teve lugar na Praia da
Torre, em Oeiras, o Campeonato do
Mundo de Remo de Mar, o qual decorreu
sob a designação de World Rowing Coastal Championships and Beach Sprint Finals
2021 Oeiras, numa iniciativa da Federação
Portuguesa de Remo (FPR) apoiada pela
Câmara Municipal de Oeiras (CMO) e pela
AVE ROWING, empresa nacional fabricante de embarcações de Remo de Mar.
De acordo com a FPR durante os dois
fins-de-semana inscreveram-se cerca de
1.300 atletas, entre os quais 5 medalhados
dos recentes Jogos Olímpicos de Tóquio,
em representação de 30 países. O custo
total da organização da prova está estimado em €500.000 (Meio milhão de euros),
entre custos diretos e indiretos.
Como facilmente se percebe por estes
números trata-se de uma oportunidade
soberana, quase única diríamos, para promover a modalidade entre nós, nas suas
vertentes de lazer e de competição, entre
os jovens, mas também entre aqueles que
1.
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
são jovens há mais tempo, e na vertente
económica.
Com efeito, um grande número de embarcações presentes no evento são fabricadas em Vila do Conde pela AVE ROWING,
empresa que está já a exportá-las com
grande sucesso para todo o mundo, como
a Revista de Marinha teve oportunidade
de constatar numa visita que recentemente
fez às suas instalações em Fajozes, a convite dos seus responsáveis.
O evento decorreu em 2 modalidades,
os chamados Beach Sprint Finals, num
percurso de 500 m executado em slalom
numa pista de 250 m. Os atletas competem em formato de match racing, duas pistas, duas equipas, a competir uma contra
a outra em que uma equipa se apura e a
outra é eliminada, com partida e chegada
na praia. Uma prova bastante rápida e por
isso emocionante com uma corrida final na
areia que termina com um salto para um
botão de chegada.
Já os chamados Coastal Championships
serão percursos de 4 kms durante as eli· revistademarinha.com
minatórias e de 6 kms nas finais A. Este
percurso será feito a rodear o Forte de São
Julião da Barra, indo em primeiro lugar em
direção à Barra do Tejo e virando depois
para Carcavelos.
Os atletas conseguirão usufruir de uma
navegação em mar aberto e ao mesmo
tempo de um enquadramento paisagístico
único, como é o caso da Barra do Tejo. Partem 20 embarcações ao mesmo tempo da
praia e todas elas terão de rondar as boias
do percurso. As imagens de drone serão
certamente imperdíveis e serão também de
esperar colisões entre as embarcações. O
vencedor será o primeiro a chegar à meta,
localizada também na Praia da Torre.
As inscrições serão ilimitadas para remadores a representar as suas nações, ou clubes. Num conceito de masters, este evento
enquadra-se numa perspetiva Sports For
All e procura oferecer aos amantes de Remo a participação numa prova mundial ao
lado dos melhores da modalidade. É, como
facilmente se percebe, um evento com um
enorme potencial de turismo desportivo.
53
84.O Ano
Mas o que é o Remo de Mar e como se diferencia do remo dito tradicional, o qual entre nós teve no
passado uma grande adesão? Façamos
então um pouco de história para situar os
nossos leitores.
O Remo de Mar estreou-se em Portugal
em 2014 através de uma iniciativa conjunta da FPR em colaboração com a Câmara
Municipal de Peniche. A primeira prova foi a
Travessia da Berlenga realizada nesse mesmo ano. Para essa regata e uma vez que
não havia barcos de Remo de Mar em Portugal a FPR teve necessidade de ir buscar/
alugar embarcações em Valência, Espanha.
Para este primeiro evento foram também
convidados atletas para participarem com o
intuito de posteriormente servirem de “embaixadores” da modalidade. Em 2015 teve
lugar o primeiro Circuito Nacional de Remo
de Mar que está já hoje fortemente enraizado
no Calendário Nacional da modalidade e que
oferece provas de sprint, realizadas junto à
praia, ou em sistema de travessias longas,
com distâncias de entre 6 Kms a 15 kms.
O Remo de Mar é uma forte aposta da
Federação Internacional de Remo (FISA)
para captar novos países e praticantes
para a modalidade e que já hoje é um forte candidato a tornar-se uma modalidade
olímpica num futuro não muito distante,
porventura já nos Jogos Olímpicos de
2028, a realizar em Los Angeles. É neste
contexto que a FPR organizou em setembro o Mundial de Remo de Mar na Praia da
Torre, em Oeiras.
O crescimento da modalidade em Portugal tem estado intimamente ligado à aquisição de embarcações por parte dos clubes.
Contudo, até 2019 a FPR foi a principal
investidora nestas aquisições, entregando-as aos clubes nacionais. Após a vitória na
candidatura ao Campeonato do Mundo e
a integração do Circuito de Mar no ranking
2.
54
Nacional, mais clubes estão a adquirir estas embarcações e a preparar os seus atletas para uma nova vertente de remo.
Há que referir que fruto das regras impostas pela FISA as embarcações de remo de mar são bastante diferentes das
embarcações de remo tradicionais. Os
seus cascos são mais largos e achatados,
oferecendo uma maior estabilidade no momento da remada e mesmo parado. São
embarcações desenhadas para oferecer a
maior segurança possível nas condições
adversas que encontramos no mar. Dito
isto, para além de ótimas embarcações para navegar no mar como o próprio nome
indica, são também ótimas para iniciação e
lazer, para todas as idades, ou seja, embarcações muito polivalentes.
Mas se o Remo de Mar é uma modalidade de implantação recente
entre nós, já o mesmo não se po-
3.
revistademarinha.com
derá dizer do Remo dito tradicional que
começou a ser praticado no início do sec.
XIX.
O Remo em Portugal tem um historial
riquíssimo iniciado há cerca de 170 anos,
facto que o próprio autor destas linhas desconhecia por completo. Trata-se de uma
história porventura única entre as modalidades ditas amadoras.
Com efeito, a prática do Remo em Portugal, enquanto desporto organizado, começou em 1828 com a fundação do Arrow
Club pela mão de Abel Power Dagge, os
irmãos Pinto Basto e mais alguns elementos da colónia britânica então residentes no
nosso País.
Do acervo documental da família de Abel
Dagge, o qual foi membro fundador da Real
Associação Naval e do Clube Naval de Lisboa, e que porventura terá sido o primeiro
desportista náutico a existir em Portugal,
constam não só as atas de fundação de
várias associações náuticas, as deliberações das diferentes Assembleias Gerais
em que participou, a sua correspondência,
bem como as suas memórias, é possível
perceber a importância que a partir de
1852 tiveram as Regatas promovidas pelo
Conde das Alcáçovas e por um grupo de
aristocratas ligados à Casa Real, por ocasião dos festejos anuais de Paço de Arcos.
A título de curiosidade refira-se que a regata de 1853 foi presidida pelo infante D.
Luiz que se fez conduzir a bordo do vapor
CONDE DE TOJAL da Marinha de Guerra
Portuguesa. Do programa de 1854 constava a participação de duas guigas de 4
remos, tripuladas… por curiosos.
Na sequência destes eventos foi fundada em 1855 a Real Associação Naval, atual
Associação Naval de Lisboa, uma das mais
antigas agremiações da Península Ibérica e
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Economia do Mar
do mundo. O clube foi fundado sob a proteção do Rei D. Pedro V no Arsenal de Marinha, numa reunião presidida por D. Luís
ainda como Duque do Porto. Por influência
dos ingleses o seu nome seria Real Yacht
Club mas o futuro Rei escolheu um nome
bem mais português.
O interesse despertado pelo divertimento das regatas, associado ao gosto e
predileção da Família Real pelos passeios
a remos no Tejo, deram lugar em 1861 à
formação de dois grupos de remadores.
O primeiro grupo era composto na sua
maioria por ingleses e alguns portugueses, entre os quais Abel Dagge e Augusto
Pinto Basto. O segundo grupo era constituído por indivíduos da colónia alemã.
Estes dois grupos de amadores remavam
também em guigas de 8 remos, construídas propositadamente para esse fim pelos
construtores Luís Silvério de Faria e I. C.
Dangebau, que se denominavam respetivamente LUSITÂNIA e GERMÂNIA. A guiga LUSITÂNIA, construída em 1862, tinha
12,8 m de comprimento e 1,83 m de boca,
e custou 201,600 reis. Segundo os registos
esta guiga terá sido a primeira embarcação
desportiva de remo construída em Portugal
e por um mestre português. Destes acalorados desafios resultou então a fundação,
em Lisboa, do Clube Tagus Rowing Club e
do Club dos Remeiros Lusitano, dois dos
primeiros clubes de Remo instituídos em
Portugal.
Por sua vez, numa época em que o remo desportivo era a modalidade de eleição
praticada pela elite inglesa residente na
região norte, é fundado em 20 de junho
de 1866 o Oporto Boat Club e em 1868
o Clube Naval Portuense. Em 1876 é criado o Club Fluvial Portuense ainda hoje em
atividade, o que faz desta coletividade desportiva a mais antiga do Norte de Portugal.
É também no Porto, mais precisamente
em Avintes, em que pela primeira vez há
conhecimento de provas de Remo feminino, isto na Regata de 1863, conforme descrição da prova no Jornal do Porto que nos
informa acerca duma regata entre “mulheres de Avintes”, as barqueiras, que faziam
a ligação entre as duas margens e vendiam
também a famosa “Broa de Avintes”.
Em 1878 com a introdução, dos primeiros outriggers, embarcações de 4 remos
construídas em Inglaterra para o Clube
de Remeiros Lusitano, o Remo entra num
período de notável incremento. Logo em
1884, ainda pela mão de Abel Dagge, foi
criado o primeiro Campeonato de Remo
que se realizou em Portugal.
Estas provas realizaram-se em Lisboa
e Cascais. Como competidores estiveram
os ingleses Hickei e Mitchel e o futuro Barão de Almeirim, Manuel Braamcamp, que
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
venceu e conquistou o Título de Campeão
do Tejo, ganhando uma medalha de ouro
que usava com orgulho na corrente do seu
relógio.
É durante o ano de 1884 que as regatas passaram a ser sempre em linha reta
na distância de uma milha. Em 27 de Janeiro de 1892, são aprovados os estatutos do Club Naval de Lisboa. Com o seu
aparecimento os desportos náuticos, e o
Remo muito em particular, ganham um notável incremento, em grande parte porque
o recém-criado Clube imprime um grande
dinamismo à sua atividade, razão pela qual
o Rei D. Carlos lhe concede logo em 1893
o título de Real Clube Naval de Lisboa.
Em 1888 é criado por decreto o Clube
dos Aspirantes de Marinha, posteriormente
denominado CNOCA – Clube Náutico dos
Oficiais e Cadetes da Armada. No dia 1 de
maio de 1893 é fundada na Figueira da
Foz, a Associação Naval 1º de Maio, a primeira coletividade de cariz eminentemente
popular instituída em Portugal. Na cidade
de Aveiro, em 1894, o Ginásio Clube Aveirense organiza também uma secção de
Remo. A 1 de Janeiro de 1895 é fundado o
atual Ginásio Clube Figueirense.
Para comemorar os aniversários do Rei
D. Carlos e da Rainha Dª. Amélia, o Real
Club Naval de Lisboa decide realizar as
Regatas de Cascais em 29 de setembro
de 1901. Aproveitando o apoio e beneplácito do seu Comodoro, S. M. El Rei D.
Carlos, o Real Clube Naval de Lisboa cresceu e difundiu os Desportos Náuticos pelo
país abrindo secções e Postos Náuticos
na Azambuja, Cascais, Trafaria, Portimão,
Lagos, Pedrouços, Funchal, Luanda e
Lourenço Marques. Estas delegações evoluíram mais tarde para os atuais clubes aí
existentes.
· revistademarinha.com
No alvorecer do século XX despertavam
grande interesse as regatas em guigas
de quatro e de seis remos. No entanto, a
falta de uniformidade nas características
das embarcações, a que se juntava uma
deficiente regulamentação, suscitavam
frequentes conflitos os quais, em alguns
casos, conduziram mesmo à quebra de
relações entre as principais agremiações
náuticas. Em 1898, por ocasião do Centenário da Viagem de Vasco da Gama à Índia,
devido a um empate numa regata de Remo
os atletas da Real Associação Naval e os do
Real Clube Naval envolveram-se numa zaragata que destruiu a Cervejaria Jansen, no
Cais do Sodré, em Lisboa. Em 1906 houve
mesmo um duelo à espada, em Cascais,
entre Alberto Totta e Carlos Sá Pereira devido a uma regata da Taça Lisboa.
Ao longo de todo o Séc. XX a modalidade conheceu um crescimento imparável
que não é possível dar conta num artigo
com estas características dadas as naturais limitações de espaço. Contudo, valerá a pena referir alguns dos aspetos mais
relevantes.
No Congresso Náutico Nacional realizado no Porto, em abril de 1920, por iniciativa
do Clube Fluvial Portuense com o apoio do
Sport Clube do Porto, a Associação Naval
de Lisboa e o Clube Naval de Lisboa apresentaram as bases da Federação Nacional
de Remo. No mesmo congresso foram
também instituídos e regulamentados os
Campeonatos Nacionais.
Em 1922 a Federação Portuguesa do
Remo inscreveu-se na FISA, o que lhe permite fazer-se representar nos campeonatos da Europa em Como, Itália, em 1923 e,
em 1926, em Lucerna, na Suíça.
Os Campeonatos Nacionais de Remo
de 1931, organizados pelo Clube Fluvial
Portuense e pelo Sport Clube do Porto,
realizados no Porto, destacaram-se pela
forte adesão do público que acorreu a ambas as margens do rio Douro, para assistir
àquele que foi o maior evento desportivo
realizado em Portugal até aquela data, estimando-se uma assistência superior a 50
mil pessoas.
No ano de 1948 a modalidade inicia a
sua participação nos Jogos Olímpicos.
Em 1952, 1960, 1972, 1992, 1996 e mais
recentemente em 2008 e 2012 volta-se a
marcar presença no evento. Os anos 60 do
século passado destacaram-se pelo início
da competição dos Jogos Luso Brasileiros
e em 1966 foram criados os escalões etários para os mais jovens, como categoria
de remadores.
Com a Revolução do 25 de Abril de
1974 dá-se início a uma nova etapa no
desenvolvimento do Remo nacional, apostada na democratização da modalidade,
55
84.O Ano
desta feita em Itália, esta dupla conseguiu
ainda um 2º lugar nos Europeus. No mesmo ano a remadora Filomena Franco participou nos Jogos Paralímpicos de Londres;
– Em 2013 o remador Pedro Fraga
venceu duas provas da Taça do Mundo
tornando-se o primeiro português a alcançar este feito, sagrando-se ainda Vice-campeão da Europa em Sevilha. No ano
seguinte em Belgrado, mais um feito para
este atleta. Na Sérvia subiu ao mais alto
degrau do pódio sagrando-se Campeão da
Europa em skiff peso ligeiro;
– Em 2016, contudo, nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro o
Remo não esteve representado, embora
tivesse atletas e material à altura de assegurar a representação nacional.
conforme definido na política governamental da época que visava a massificação do
desporto.
No âmbito desta política, a Direção Geral
dos Desportos implementou Planos de Desenvolvimento da Modalidade. Em 1976,
iniciou-se o processo de formação de treinadores, sistematizado e em vários graus.
É estabelecido um intercâmbio com a Polónia com a vinda da equipa olímpica polaca
durante todo o mês de fevereiro, tendo, no
âmbito desse intercâmbio sido dada formação a um elevado número de técnicos
nacionais. Paralelamente, assistiu-se à criação de Escolas de Remo da Direção Geral
dos Desportos por todo o país.
Na entrada do século XXI o Remo Nacional continuou a sua senda de progresso
com um vasto e importante conjunto de
vitórias e realizações, de que importa destacar:
– Em 2010 na Pista de Montemor totalmente renovada teve lugar o Campeonato
da Europa de Remo organizado pela FPR,
avançando também a construção dos
Centros de Alto Rendimento de Montemor
e do Pocinho, locais que permitiram um aumento da qualidade de treino aos atletas da
Seleção Nacional;
– Neste mesmo evento a dupla constituída por Pedro Fraga e Nuno Mendes
sagrou-se Vice-Campeã da Europa em
double skull Peso Ligeiro e a paralímpica
portuguesa Filomena Franco conquistou a
medalha de bronze na prova de skiff dos
Campeonatos do Mundo de Remo;
– Em 2012, nos Jogos Olímpicos de
Londres, a dupla de Peso Ligeiro constituída por Pedro Fraga e Nuno Mendes conseguiu uma prestação notável apurando-se
para a Final A onde conseguiram um relevantíssimo 5º lugar. Neste mesmo ano,
– Em 2001 é organizado o Congresso
Extraordinário da FISA na cidade do Porto
com a presença de 200 delegados de 60
países;
– Em 2002, na pista de Montemor, então inaugurada, realiza-se a Coupe de la
Jeunesse, competição onde estiveram
presentes 400 participantes de 10 países
europeus;
– Em 2003, uma tripulação de Remo
Adaptado de Soure conquista a primeira
medalha num Campeonato do Mundo;
– Em 2004 teve lugar a Lisboa Classic
Regatta, uma disputa inédita entre as Universidades de Oxford e Cambridge nas
águas do estuário do Tejo;
– Em 2008 a tripulação de double skull
Peso Ligeiro conseguiu o apuramento para os Jogos Olímpicos de Pequim onde
teve uma brilhante prestação conseguindo
chegar às Meias-Finais e ficando em 8º na
Final;
56
revistademarinha.com
Embora de uma forma muito resumida,
por aqui se percebe que a história do Remo
em Portugal é um caso de relevante sucesso, porventura grandemente desconhecido
da maioria da população e mesmo dos
seus praticantes veteranos.
Em resumo, se na sua génese o Remo foi o desporto das elites nacionais,
rapidamente ganhou a adesão de amplas
camadas da população, inserindo-se de
uma forma indelével na história do desporto nacional, o que lhe dá uma legitimidade
histórica indiscutível para reclamar o lugar
que já foi seu por mérito próprio e em que o
próximo Campeonato do Mundo de Remo
de Mar a realizar em Oeiras terá certamente um papel muito importante a desempenhar.
Nos nossos dias a implantação e
o desenvolvimento de uma qualquer modalidade desportiva tem
que assentar numa sólida base económica
e tecnológica para poder ser sustentável
a prazo. E o Remo de Mar nacional tem
já hoje as condições mínimas para que a
sua base económica e tecnológica não só
se consolide como prospere com o tempo, fazendo desta modalidade um caso
de sucesso, não só a nível nacional, mas
também internacional, com uma dinâmica exportadora significativa, como já hoje
acontece com a canoagem. Vale a pena referir que 70% das medalhas conquistadas
pelos atletas da canoagem dos diferentes
países nos recentes Jogos Olímpicos de
Tóquio foram obtidas com recurso a embarcações concebidas, projetadas e construídas em Portugal, por uma empresa que
é líder mundial do sector.
Dito isto, há que referir que o esforço no
sentido de voltar a fazer do remo um desporto de eleição como já foi no passado
não seria possível sem o concurso da AVE
ROWING, uma empresa portuguesa funda-
4.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Economia do Mar
da há 5 anos e sedeada em Fajozes, Vila
do Conde, responsável pela construção de
grande parte das embarcações de remo de
mar que competiram na Praia da Torre, em
Oeiras,
A AVE ROWING BOATS, LDA foi fundada em janeiro de 2016 por Leandro Fernandes, sócio-gerente, juntamente com José
Santos e Pedro Ramos, cuja fábrica e escritórios se localizam nos arredores de Vila
do Conde, que a Revista de Marinha
visitou com muito agrado recentemente
a convite dos seus responsáveis, com os
quais conversou demoradamente, e de que
resultou a entrevista que publicamos neste
mesmo número da RM e para a qual chamamos a atenção dos nossos leitores.
A empresa foi criada com uma filosofia
bem estruturada que visa apoiar os clubes
a apetrecharem os seus hangares com
material de qualidade e a um preço justo,
algo que até então não era possível, apostando no Remo Olímpico como a sua área
de excelência. O ano de 2016 foi, por isso, o ano das primeiras criações, de onde
saíram os primeiros produtos da empresa.
Durante o ano de 2016 ocorreu também a
primeira abertura da empresa ao mercado
externo, inicialmente para Espanha, e depois para o Reino Unido. Neste último caso
apoiada por um antigo remador do Clube
Fluvial Vilacondense, Gualter Graça, que ali
reside. Mas na abordagem ao mercado externo a empresa não se ficou por aqueles
países expandindo-se para França, República Checa, Alemanha e para Itália, tendo
fabricado 76 embarcações contando então
com 7 colaboradores.
Em 2017 a empresa expandiu-se para a
Escandinávia, tendo como principal mercado a Dinamarca, em parceria com Thomas
Ebert, antigo remador e campeão Olímpico
pela equipa nacional dinamarquesa e também para a Irlanda. Neste ano a empresa
produziu 99 embarcações, ou seja, mais
23 embarcações do que no ano anterior.
Em 2018 e com o crescente aumento
no interesse pelos barcos da Ave Rowing,
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
a empresa desenhou um novo modelo de
embarcação com linhas e características
direcionadas para a competição, o qual foi
batizado de “Suso”, em homenagem ao
remador espanhol Jesus Gonzalez, mais
conhecido por “Suso”, como forma de
agradecimento pelo seu apoio incondicional ao longo dos anos. Neste ano a empresa focou-se na França, República Checa e
na Alemanha.
Em 2019 a empresa ultrapassou pela
primeira vez as 100 unidades produzidos
com um total de 101 embarcações, e alargou o seu portfólio de embarcações com
a criação da embarcação individual para
crianças designada de Big Kid’s. O seu
número de colaboradores era então de 10.
Apesar do surto pandémico que tem
assolado o mundo desde há ano e meio,
2020 foi o melhor ano de sempre da Ave
Rowing. Foram construídas 113 embarcações, contando a empresa no seu quadro
com 14 colaboradores, 3 dos quais no escritório, nas áreas dos recursos humanos,
vendas e inovação e desenvolvimento.
Devido às contingências impostas pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) o
ano de 2020 foi um ano com muito poucas saídas para o estrangeiro, pelo que a
empresa esteve apenas presente em duas
regatas, uma em França e a outra em Espanha. Contudo, foi o ano em que a empresa enviou o seu primeiro contentor para
os EUA, mercado que se apresenta muito
promissor.
Em 2021 a empresa conta com um portfólio de 14 modelos diferentes, sendo a
sua criação mais recente o “Kaito”, skiff de
mar de uso individual, cujas primeiras 6 unidades estavam a ser preparadas para serem exportadas para a Dinamarca aquando
da visita realizada pela RM. Tudo Isto sem
contar com todas a peças complementares, que são também produzidas na Ave
Rowing. Durante o primeiro semestre de
2021 foram produzidas 62 unidades, o que
permite antecipar um novo número recorde
de embarcações produzidas.
· revistademarinha.com
Valerá a pena referir que fruto do investimento em I&D que a Ave Rowing
tem vindo a realizar desde a sua criação,
o fabrico dos seus produtos conta já com
a inclusão de materiais tradicionais na sua
construção, como é o caso da cortiça, que
reveste o casco das novas embarcações
“Kaito”, num esforço que se aplaude e
que é dirigido ao objetivo assumido pela
empresa de ser marca líder mundial do
sector até 2028, ano dos Jogos Olímpicos
de Los Angeles. Isto porque a Inovação, o
design e a aposta na utilização de novos
materiais foram objetivos que nortearam a
orientação da empresa desde o seu início,
apoiada numa parceria estabelecida com o
INEGI (Instituto de Ciência e Inovação em
Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial da Universidade do Porto), numa feliz
combinação de esforços entre a Universidade e a Empresa, facto que faz das embarcações da AVE ROWING um produto
único no panorama do Remo nacional e
internacional.
Como decorre de tudo o que aqui referimos, estamos certos de que o Campeonato do Mundo de Remo de Mar de 2021 na
Praia da Torre, Oeiras, será um Ponto de
Viragem e de (Re)afirmação do Remo Nacional e como tal será olhado daqui a uma
década quando visto retrospetivamente.
A Revista de Marinha deseja aos organizadores e a todos os atletas os maiores sucessos durante o World Rowing
Coastal Championships and Beach Sprint
Finals 2021 Oeiras.
Por último, um sincero agradecimento
a todos quantos contribuíram para a elaboração deste artigo. Desde a Federação
Portuguesa de Remo, na pessoa do seu
Presidente, Dr. Luis Ahrens Teixeira, e da
Profª. Joana Freire, do Senhor Carlos Gomes Henriques pela preciosa informação
histórica e pelas fotos que nos facultou, à
Ave Rowing, nas pessoas dos Senhores
José Santos, Leandro Fernandes e Rodrigo Romão. A todos, o Muito Obrigado da
Revista de Marinha!
57
84.O Ano
Planetário Calouste Gulbenkian
– Centro de Ciência Viva
2021 - Uma nova visão do espaço
por João Silva Ramos*
noção do tempo desaparece. O espaço adquire outras perspetivas.
Durante uma hora somos espetadores, de todas as latitudes e longitudes,
do surpreendente espetáculo da abobada
celeste. Esta frase, que descreve os primeiros suspiros da vida do Planetário Calouste
Gulbenkian (PCG), teve o destaque de ser
publicada na primeira página do “Diário de
Notícias” no dia 20 de julho de 1965, o dia
da sua inauguração. Desde então, os portugueses, com especial incidência no público escolar, passaram a dispor de um novo
espaço cultural, proporcionando uma experiência até então desconhecida, as sessões
de astronomia projetadas numa cúpula.
A
ORIGEM
A ideia da construção de um planetário
em Lisboa, surgiu do fascínio e entusiasmo pela astronomia de um oficial da Marinha de Guerra Portuguesa (MGP), o Cte.
Eugénio Conceição Silva, quando visitou
o planetário de Nova Iorque. Ao longo da
sua vida, Conceição Silva desenvolveu várias atividades relacionadas com este seu
passatempo favorito, desde a construção
engenhosa de telescópios, que utilizava
nas suas observações, passando pela fotografia de astros, fotografias essas ainda
hoje expostas na galeria do Planetário. A
genialidade deste projeto reside na sua
grandiosidade, ainda hoje o PCG é o segundo maior planetário da Europa, com
58
uma cúpula de 23 m de diâmetro, e 320
lugares sentados.
Duma parceria entre a MGP e a Fundação Calouste Gulbenkian, que custeou
o sistema de projeção ótico, o modelo
UPP 23/4 da marca Zeiss, o sonho do
Cte. Conceição Silva tornou-se realidade,
Lisboa iria ter um Planetário. A obra do
edifício, da autoria do arquiteto Frederico
George, iniciou-se em setembro de 1963,
sendo inaugurada em 20 de julho de 1965,
dia onde se assinalava o décimo ano da
morte do próprio Calouste Sarkis Gulbenkian.
Iniciava-se assim um ciclo de “viagens”
pelo espaço, inéditas na altura. As sessões
de planetário, através da recriação do céu
noturno cintilante, onde se projetavam figuras de constelações e se explicavam fenómenos celestes, como eclipses e chuva de
estrelas, apresentados com uma voz radiofónica, contagiava o visitante a ficar fascinado pelos mistérios da astronomia. Assim, o
PCG passou a constar na lista das famílias e
de escolas, como lugar de visita obrigatória
em Lisboa.
DESENVOLVIMENTOS
A cidade de Lisboa passava a dispor de
um equipamento cultural por excelência, tal
como as principais capitais europeias, onde
eram divulgadas de um modo didático as
ciências astronómicas.
O sistema de projeção de origem, era de
funcionamento manual e durou cerca de 40
anos de operação ininterrupta.
Entretanto, em março de 2002, o Ministério da Ciência e da Tecnologia e a Marinha
Portuguesa estabeleceram um protocolo
que tinha por objetivo a dinamização, ampliação e renovação do PCG, nomeadamente a aquisição, em 2004, de um novo
sistema de projeção. Veio a ser escolhido
o projetor ótico da Zeiss - Universarium
modelo IX, ainda hoje um dos melhores
projetores do mundo. Esta parceria conferiu
ao PCG o estatuto de Centro Ciência Viva,
passando-se a designar Planetário Calouste Gulbenkian – Centro Ciência Viva (PCG-CCV).
UM NOVO CONCEITO
PARA O PLANETÁRIO
No mundo atual, fervilhante de novas
tecnologias cada vez mais sofisticadas e
impactantes, disponibilizando novos produtos de multimédia, com conteúdos nas diferentes áreas do conhecimento, habituaram
Ciência & Tecnologia
o público a ser cada vez mais exigente e
ávido de novas experiências e sensações.
Assim, chegou o momento de o conceito
das sessões do Planetário ser repensado,
com o intuito de causar ao espetador a satisfação das suas expetativas.
Em 2016 a Direção do PCG iniciou uma
serie de diligências pela Europa, visitando
outros planetários tendo como objetivo obter conhecimentos a nível funcional e dos
produtos em exibição ao público. Participou-se também em eventos da especialidade a nível mundial, como a Conferência
da Sociedade Internacional de Planetários
(IPSC - International Planetarium Society
Conference) em 2016 em Varsóvia e 2018
em Toulouse. Participou-se também, em
2017, na feira Internacional do Cinema
Imersivo (IMERSA), nos Estados Unidos.
Para a implementação deste novo conceito, optou-se por um sistema de projeção
híbrido. Esta nova arquitetura é constituída
por uma projeção ótica, assegurada pela
continuidade do Universarium e por um sistema de projeção digital fulldome, da Zeiss.
Estando já a decorrer as obras, prevê-se a
inauguração do “novo” Planetário para o final do corrente ano.
A réplica do céu estrelado verdadeiramente brilhante que fascina e inspira o
visitante, continuará a ser produzido pela projeção ótica do Universarium, sendo
suplementados e sobrepostos de forma
síncrona pelo conteúdo digital do sistema
fulldome.
Tendo em conta que o ponto essencial
para os visitantes é a qualidade de imagem
na cúpula, foi escolhido um sistema digital
fulldome com 8 projetores LED VELVET,
que corresponde a uma configuração de 8
canais de imagens projetados sectorialmente na cúpula. Estas 8 projeções são contro-
As entidades oficiais na inauguração do Planetário. De assinalar a presença do Cte. Conceição e
Silva, por detrás do Presidente Américo Thomaz.
ladas pelo software da Zeiss, que assegura,
durante a projeção uma transição impercetível entre os canais de imagem (blending),
exibindo assim uma imagem completa sem
quaisquer vestígios de separação.
A imersão multimédia, apresentada numa experiência fulldome, sendo fruto da
evolução tecnológica, permite a associação
da realidade ao virtual. O visitante dispondo-se a imergir, é cercado pela projeção de
vídeo em toda a cúpula, com uma imagem
única e coerente. A cúpula preenchida na
totalidade com animações em tempo real,
dá a sensação ao visitante de fazer parte
dessa experiência.
Nesta nova realidade o visitante descobre o universo como se estivesse embarcado numa nave espacial a viajar através do
espaço. Poderá aterrar na Lua, seguir pelo
trilho de Neil Amstrong, penetrar nos anéis
de Saturno onde evitará colidir com rochas
e gelos e sair da nossa galáxia viajando pela
imensidão do cosmos.
Apesar da astronomia continuar a ser o
tema principal, agora o PCG – CCV com
o sistema de projeção fulldome, estará
capacitado para proporcionar ao visitante, espetáculos e apresentações, exibindo
conteúdos de outras áreas como as ciências da vida, o desporto, a história ou mesmo espetáculos abstratos de música. De
realçar que atualmente existe toda uma
panóplia de filmes de realidade virtual, que
podem ser adaptados à exibição no Planetário, com toda a espetacularidade inerente.
UM NOVO MODO
DE VIAJAR PELO UNIVERSO
Uma viagem pelo cosmos ao alcance do
lisboeta. Foi a manchete do Diário de Notícias anunciando a Portugal a inauguração
do PCG.
Passados 56 anos, desde a sua inauguração, o PCG volta a proporcionar uma outra viagem pelos cosmos. Não só destinada
aos lisboetas, mas a todas as pessoas que
visitem o planetário. Não só uma viagem
pelo cosmos, mas muito mais do que isso,
uma experiência fantástica, emocionante
e inesquecível reforçada pela capacidade
do cinema imersivo. 2021 será um ano na
história do planetário, marcando o início de
um novo modo de viajar pelo Universo e
de abordar outros temas, afinal comunicar
ciência criando emoções.
Como outrora, o planetário voltará a ser
uma das dez principais atrações da cidade
de Lisboa.
*
[email protected]
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
59
84.O Ano
A renovação ambiental de navios
pré-2000: M/S VASCO DA GAMA
O Primeiro Exemplo de Sucesso de Economia
Circular (realizado por TecnoVeritas)
por Jorge Antunes*
M/S VASCO DA GAMA é um navio
de cruzeiro luxuoso com 27 anos.
O atual armador, “Mystic Ocean”,
decidiu manter o navio em serviço nos
destinos mais desejados, como os fiordes
históricos da Noruega e do Báltico, onde
estão em vigor as normas mais rigorosas
de poluição do ar.
Considerando os futuros regulamentos
de poluição do ar no âmbito da MARPOL,
nomeadamente no que diz respeito às emissões de NOX e com a introdução do índice
de design de eficiência energética (EEXI) ao
MARPOL anexo VI, foi decidido realizar um
estudo sobre como isso pode ser alcançado nos próximos 10 a 15 anos. Como consequência, o navio recebeu uma série de
melhorias de alta tecnologia: a nível de emissões de forma a cumprir com NOX TIER III, a
nível de estação de tratamento de águas sujas/esgotos de forma a poder operar no Mar
Báltico, compatível com MEPC.227 (65), a
nível de esquema de pintura, tornando o
casco mais liso e consequentemente mais
eficiente e a nível de sistemas IT de forma
a monitorizar e gerir, com a maior precisão
possível, os consumos energéticos
Estando o navio em conformidade com
os novos regulamentos da MARPOL, nomeadamente o código NOx, é aberta uma
nova oportunidade para a sua operação
bem-sucedida em qualquer porto do mundo, tendo recebido uma nova notação da
classe EGCS (SCR), isto mesmo não existindo certificado IAPP.
O M/S VASCO DA GAMA chegou a
Lisboa em dezembro de 2020, e a 1 de
janeiro de 2021, foi para doca seca, nos
Estaleiros LISNAVE. Imediatamente, apesar das restrições do COVID 19, o projeto
foi iniciado. A casa de máquinas foi analisada a laser e os estudos de acessos iniciados enquanto os cálculos baseados no
fluxo dos gases de escape dos motores
ocorriam em paralelo. Definidos os cinco
alojamentos independentes para a colocação dos invólucros do catalisador, iniciou-se a construção do sistema principal que
implicou a substituição de toda a tubagem
de escape existente. Foi ainda necessário
O
60
implementar um sistema de ar comprimido
dedicado assim como todo o sistema de
armazenamento e distribuição de ureia.
A implementação do armazenamento
de ureia exigiu adaptar um tanque de lastro existente no navio e a criação de duas
novas estações de abastecimento. Por
fim, foi implementado o sistema de digitalização da informação, desenvolvido pela
TecnoVeritas, para monitorização de desempenho, o software baseado na cloud
- BOEM.
Enquanto as obras dos catalisadores
estavam em andamento, os três motores
do navio foram revistos, recebendo os
componentes que precisavam ser substituídos pelo código NOx, componentes
de tipo aprovado, bem como dois novos
turbo-alimentadores.
A 22 de Junho o navio voltou a entrar
na água e decorreram as provas de mar,
durante os 6 dias de viagem de Setúbal a
Amesterdão.
Os sistemas e o projeto foram pesqui-
Simulações de otimização de contrapressão de gás de exaustão (antes e depois).
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Ambiente Marítimo
sados e aprovados pelo “Lloyd’s Register
of Shipping”, e as emissões foram testadas pela empresa ECOxy da Noruega,
credenciada pela Autoridade Marítima
Norueguesa, que seguiu com o navio para
monitorizar os níveis efetivos de emissão
de NOx do TIER III.
Foi facilmente encontrado no estudo
de viabilidade que o tempo de retorno do
investimento é inferior a um ano, desde
que a pandemia o permita. O presente
projeto é uma novidade em termos de
Economia Circular e sua dimensão. Os
sistemas instalados foram capazes de
atingir valores de NOx bem abaixo do
limite TIER III, nos motores originais do
navio (pré-2000).
Todos os cinco catalisadores são, por si
próprios, peças únicas, o seu design foi feito para atingir emissões de NOx extremamente exaustivas, ao mesmo tempo que
mantém a queda de pressão dos gases de
escape ao mínimo, e o seu funcionamento é controlado remotamente com base
em inteligência artificial, para que os cinco
reatores catalíticos seletivos, sejam continuamente otimizados em termos do seu
desempenho individual para minimizar o
consumo de ureia, cumprindo assim com
os futuros regulamentos de deslizamento
de amônia, o que constitui uma inovação.
O funcionamento dos catalisadores é otimizado considerando a temperatura do ar
de admissão, a carga do motor, a qualidade do combustível e é apoiado por um
circuito de controlo de feedback que ajusta
de forma dinâmica e otimizada as operações dos reatores.
O desmantelamento de navios existentes deixará uma enorme pegada de
carbono, não apenas na atividade de
desmantelamento por si, mas também no
derretimento de todos os materiais nas
siderúrgicas. Com o tema da descarbonização na ordem do dia, as decisões de
desmantelamento têm sido tomadas, principalmente, com base nas considerações
ambientais, nomeadamente fazendo com
que os armadores acreditem que os seus
navios não podem ser ambientalmente
competitivos, sendo esta instigada pela
construção naval, bancos e fabricantes de
motores.
Este projeto, provou que a MARPOL
TIER III pode ser alcançada por um navio
de 27 anos, a custos controlados, e que o
seu desempenho ambiental pode ser tão
bom, ou até melhor, que muitos navios
construídos recentemente.
No presente projeto, nenhum EIAPP
será emitido, embora os regulamentos
NOx, nomeadamente TIER III, tenham sido alcançados e oficialmente confirmados
pela Autoridade Marítima Norueguesa,
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
comprovando que os certificados EIAPP
também devem ser atribuídos a navios
equipados com sistemas de limpeza de
gases de escape, como o M/S VASCO
DA GAMA.
Este projeto prova que os navios existentes não estão condenados à sucata,
mas sim a serem renovados em todos
os aspetos ambientais, nomeadamente
emissões, esgotos, consumo de energia,
mas também no conforto dos passageiros,
podendo competir com os mais recentes
· revistademarinha.com
navios, resultando numa atividade de navegação de cruzeiro mais sustentável:
• A eficiência de combustível aumentou
6%, sendo responsável por uma redução
das emissões de CO2 em cerca de 6%.
• As emissões de NOX (conforme TIER
III) sofreram uma redução de 82% em relação às emissões originais.
• As emissões de SO2 diminuíram 81,5%.
* CEO Tecnoveritas, Lda
[email protected]
61
84.O Ano
Inovação Tecnológica no Domínio
dos Sistemas de Comunicações Navais:
do Presente ao Futuro
por José Luís Reis*
ivemos num mundo tecnologicamente avançado e continuamente
ligado em rede. Mas nem sempre foi
assim, demorou tempo a chegarmos aqui!
A título de exemplo, a primeira comunicação “digital” (entenda-se radiotelegráfica, via código Morse), no domínio da
Marinha de Guerra Portuguesa, ocorreu
a 16 de fevereiro de 1910, originada no
posto radiotelegráfico de Vale de Zebro e
recebida na Casa da Balança, no Arsenal
de Marinha, na altura situado em Lisboa.
O teor foi “Queira fazer o obséquio de me
mandar dizer se ahi em Lisboa está a chover”. Passados dois anos, em 1912, afundava-se o paquete TITANIC, solicitando
socorro com aquela tecnologia …
Nos dias de hoje dispomos do acesso
constante à informação e a uma perma-
V
62
nente consciência situacional do contexto em que estamos inseridos, de forma
rápida, fácil e económica, não só para o
público em geral, mas também para as
comunidades de segurança e defesa. Tudo suportado por redes de comunicações
heterogéneas, com tecnologias e origens
que muitas vezes o utilizador final pode
desconhecer.
A única constante é a mudança, e o
mundo está a mudar rapidamente com as
necessidades dos mercados de defesa a
avançarem ainda mais rápido. Também na
indústria de defesa existe a necessidade
de adaptação constante por forma a garantir que as nossas soluções integradas
de comunicações são adequadas para
atender às exigências atuais e futuras.
A inovação é a chave para enfrentar o
revistademarinha.com
futuro. Não surpreendentemente, na era
digital deparamo-nos com um novo conjunto de tecnologias emergentes e disruptivas, talvez sem paralelo no passado, em
termos de intensidade, tempo de amadurecimento e complexidade, tanto para o
humano como para comunicações entre
máquinas. Isso irá conduzir ao desenvolvimento de novas soluções de comando
e controlo, análise e fusão de dados, de
suporte à decisão, maiores níveis e meios
disponíveis de automação, bem como
à constante necessidade de adaptação
às ameaças sistémicas emergentes. Tal
cenário exige que na EID, para além de
modernizarmos continuamente as nossas
soluções C4I, maduras e comprovadas
pelos utilizadores finais, estejamos atentos às chamadas “tecnologias disruptivas
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Ciência & Tecnologia
emergentes” (EDT) também sob a ótica
dos mercados de defesa e segurança. A
EID continua a investir cerca de 10% da
sua faturação anual em atividades internas de I&D, e cada vez mais temos parcerias com outras empresas e centros de
investigação que nos permitem em modo
colaborativo ter soluções mais completas
para oferecer aos nossos clientes, ao nível
do C4ISTAR (Comando, Controlo, Comunicações, Computadores, Informação /
Inteligência, Vigilância, Aquisição de Alvos
e Reconhecimento). Abordagens cooperativas e interoperabilidade também serão
a chave para o sucesso.
A EID está empenhada em promover e
aumentar ainda mais o investimento em
tecnologias inovadoras para apoiar as capacidades da defesa de última geração,
explorando também a dupla natureza do
desenvolvimento tecnológico (os sistemas
não tripulados são um exemplo). Precisamos de novas maneiras de combinar
sinergias entre as indústrias de defesa,
espacial e civil.
No passado a defesa era um setor
impulsionador de tecnologia para o mercado civil (por exemplo, internet, links
de micro-ondas, satélites, etc.). Hoje
em dia, o mercado civil está a lançar as
bases dessas novas tecnologias ... um
tempo de mudança na forma como definimos, gerimos e alavancamos soluções
de orientação nacional e internacional
para a indústria; empurrando-nos para
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Soluções integradas de comunicações nos 5 domínios.
um diálogo mais estreito e colaborativo
com os nossos parceiros da indústria, no
sentido de estabelecer relações frutíferas
e duradouras com os nossos parceiros
de negócios e lidar também com o lado negativo, disruptivo, dos EDT’s. Os
EDT’s têm o potencial de mudar completamente a forma como as forças militares
operam.
Precisamos ter a certeza de que as
novas tecnologias serão benéficas e não
uma ameaça. Há também o desafio de
encontrar um equilíbrio entre as possibilidades permitidas pelas tecnologias dis-
· revistademarinha.com
ruptivas e as reais necessidades de defesa
das Forças Armadas.
A EID tem como objetivo continuar a ser
um parceiro de segurança responsável e
um fornecedor de confiança na indústria
de defesa. As necessidades dos nossos
clientes devem continuar no centro dos
nossos requisitos de desenvolvimento fundamentais. A EID teve sucesso no
lançamento e desenvolvimento de novos
sistemas de comunicações militares (C4I),
adequados para todos os ramos das forças armadas, atualmente ao serviço de
mais de 35 países.
63
84.O Ano
C2 de comunicações.
No caso concreto da Marinha Portuguesa, a EID tem um histórico de 38 anos
de cooperação frutífera, alicerçada por
fornecimentos de diversos sistemas de
comunicações, para o âmbito marítimo,
terrestre e anfíbio. Alguns exemplos são
os Sistemas Integrados de Comunicações
- SIC (para navios de superfície e submarinos), rádios navais VLF/LF/MF/HF e rádios táticos PRC-425/GRC-525, sistema
de mensagens militares MMHS STANAG
4406 (ed. 1 e 2) e Most4Ships (ACP-127),
implementação do Sistema BRASS e simuladores de comunicações, entre outros. Muito importante também, é o nosso
apoio de proximidade na gestão de ciclo
de vida e suporte logístico integrado.
Desde a década de 80 do século passado a Marinha Portuguesa é a principal
referência da EID, aos níveis EU, NATO
e em geral. A EID foi pioneira, em cooperação com a Marinha Portuguesa, na
criação do SIC, que permite a integração,
configuração, controlo e monitorização de
todos os equipamentos de comunicações
a bordo, sejam atuais ou futuros. Nos
anos 80 e 90 do século passado os navios
portugueses ao serviço da SNFL (Standing Naval Force Atlantic) eram tipicamente os responsáveis pelas comunicações
da Força Naval, por terem o SIC da EID
a bordo. Isto permitiu-nos ter visibilidade
internacional e chegar a novos mercados,
dos quais advém a maior percentagem do
nosso volume de negócios. Mantemos as
relações de longo prazo com todas essas
Marinhas, constituindo-se também como
referências credíveis para a expansão das
nossas atividades internacionais.
64
O domínio da defesa apresenta um
caráter transversal e integrador de diversos setores tecnológicos e representa um
mercado de elevada exigência e intensidade tecnológica. A EID é um caso de sucesso, no âmbito da inovação da indústria
nacional com aceitação global. Trazemos
valor para Portugal a vários níveis: alta
tecnologia, soberania nas comunicações,
celeridade na resposta a necessidades
não planeadas, capacitação e retenção
de talento altamente qualificado, apoio à
economia circular ao nível de fornecedores nacionais que contribuem com 70%
na cadeia de valor dos produtos e soluções da EID, promoção internacional de
soluções portuguesas, etc. Do presente
para o futuro, no contexto específico das
comunicações de âmbito naval, a EID está a desenvolver novas soluções, adaptadas para utilização em diversos cenários
de operações. Além dos novos sistemas
completos de comunicações evoluídas
e seguras para navios, com soluções de
redes multinível incorporadas, a empresa
detém já também outras soluções alargadas para diversos domínios, no sentido de
oferecer soluções completas de comunicações integradas aos níveis estratégico,
operacional e tático.
A título de alguns exemplos, sistemas
integrados e completos de comunicações
digitais multinível e multidominio (com capacidade de incorporação federativa) para
diversos cenários, desde forças anfíbias, à
sua integração “sistémica” com os navios,
evoluções de estações de comunicações
em terra, sistemas portáteis de suporte à
edificação de comunicações autónomas
revistademarinha.com
a forças destacadas, sistemas de intercomunicação para viaturas blindadas e lanchas de assalto rápido, sensores (sonares
rebocados e de casco, eletro-óticos, controlo de tiro, etc.), lançadores de torpedos,
sistemas de comunicações subaquáticas,
etc.
Detemos as capacidades e conhecimentos para integrar todos os níveis de
forças da Marinha Portuguesa, também
sua interligação/integração com o Exército e Força Aérea, EMGFA e MDN (digitalização end-to-end), bem como em forças
multinacionais e federativas, garantindo
sempre a interoperabilidade, segurança e
resiliência das comunicações.
Estamos fortemente empenhados em
sermos parte do sucesso dos nossos parceiros, atuais e futuros. As Forças Armadas Portuguesas, em particular, podem
contar inteiramente com este compromisso, incluindo no trabalho conjunto no planeamento de processos de aquisição de
capacidades nacionais.
A EID é um caso de sucesso da indústria de Defesa em Portugal. Daqui fomos
descobrir o mundo e conquistámos novos
mercados. Temos orgulho neste percurso
e no elevado nível de satisfação dos nossos clientes a nível global.
SOBRE A EID
A EID – Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Eletrónica, S.A. - é uma
empresa privada fundada em 1983, uma
das principais indústrias de alta tecnologia
em Portugal. Com um registo comprovado
e sólido know-how nas áreas de eletrónica
e comunicações, a EID projeta, fabrica e
fornece equipamentos e sistemas avançados e de alto desempenho, principalmente
para a comunidade de defesa mundial.
Temos orgulho em alcançar e entregar excelência, daí a razão de investirmos
10% do nosso volume de negócios em
I&D, realizado por engenheiros de eletrónica, software e comunicações altamente
qualificados.
A empresa forneceu vários sistemas e
equipamentos ao longo dos anos, tanto
no país como no exterior. A exportação é
a principal componente do volume de negócios da empresa, devido aos produtos
competitivos e inovadores, bem como à
flexibilidade para fornecer soluções à medida das necessidades específicas dos
nossos clientes. Mais de 35 países usam
as nossas soluções de comunicações.
* Relações Institucionais da EID, S.A.
Mestre em Eng.ª de Eletrónica
e Telecomunicações
[email protected]
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
História Marítima
Quatro Séculos de Serviço,
no Mar e em Terra
O Terço da Armada da Coroa de Portugal
por Jorge Semedo de Matos*
o passado dia 18 de abril, completaram-se quatrocentos anos
sobre a data da criação do Terço
da Armada, instituindo-o com carácter
permanente, como requerera D. António
de Ataíde, conde da Castanheira e Capitão
Geral da Armada de Portugal. D. António
foi nomeado para o cargo, por Filipe III, em
1618, pelo período de três anos; e desde
então que propunha a criação desta força de infantaria, para guarnecer os navios
que garantiam a segurança da costa portuguesa e a rota dos Açores. No princípio
do ano de 1621, deslocou-se a Madrid
levando um conjunto de propostas para
a armada desse ano. E, entre elas, insistia
com a criação de um terço de infantaria,
que sempre merecera a relutância do Conselho de Guerra, que via com maus olhos a
existência de uma força militar permanente
de portugueses.
Porém, a utilização da infantaria a bordo
dos navios tornara-se uma componente
indispensável do poder naval, ganhando
crescente importância com o desenvolvi-
N
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
mento do armamento portátil. Os soldados
guarneciam os castelos, as vergas e os
cestos dos papafigos, assolando o inimigo até à abordagem, quando saltavam no
convés adversário, organizados em esquadras, que combatiam corpo a corpo, com
espadas, piques, pistolas e outras armas
adequadas. Todas as armadas de guarda
costa – e elas existiam desde o reinado
de D. Manuel I – embarcavam forças de
infantaria, organizadas em companhias,
cujo comandante era o próprio capitão
do navio, que assumia uma função dupla,
merecendo a designação de “Capitão de
Mar-e-Guerra”. Conduziam o navio no
combate e comandavam a infantaria na
abordagem ou nos combates em terra. O
grave problema que tinham estas unidades
de infantaria era o seu recrutamento sazonal, que os desmobilizava todos os anos,
quando a armada invernava em Lisboa.
Nessa altura esses soldados, privados de
soldo e com prática de combate, deambulavam sem rumo, dedicando-se à pilhagem
e envolvendo-se em constantes distúrbios.
· revistademarinha.com
E quando era necessário o recrutamento
para nova armada, era sempre difícil encontrar pessoal treinado e suficientemente
disciplinado, para a missão espinhosa que
tinha de desempenhar.
Por isso D. António de Ataíde propôs repetidamente a criação do Terço de Infantaria, esperando que isso pudesse acontecer
quando foi a Madrid em 1621. Na verdade,
levava um plano detalhado, com os custos
e com o financiamento dessa empresa,
que apresentaria ao Rei quando tivesse lugar o despacho sobre a armada. Sucede
que Filipe III morreu no derradeiro dia do
mês de março, ficando todas as decisões
para o seu filho, que se mostrou muito diligente em todas as questões que diziam
respeito ao mar e às suas armadas. Esperava terminar a trégua que, há 12 anos,
mantinha com a Holanda, de forma que
sabia bem como os conflitos se iriam multiplicar dentro em breve. E certamente que
eles iriam afrontar as possessões ultramarinas, requerendo o uso de meios navais.
Dizem-nos os apontamentos do Conde
65
84.O Ano
da Castanheira que el-rei o recebeu a 18
de abril, dando provimento a tudo o que
lhe foi requerido. D. António foi reconduzido no cargo de Capitão Geral da Armada – agora a título perpétuo – e recebeu
instruções para levantar um “batalhão de
oitocentos soldados” para a Armada, a
serem pagos de verão e inverno. Nascia
assim o Terço da Armada da Coroa de
Portugal, que seria a primeira unidade militar constituída com carácter permanente,
em Portugal. A Infantaria de Marinha, que
tinha uma organização própria, adaptada
ao combate a bordo e em terra, dando início a um percurso que foi atravessando os
séculos e do qual os nossos fuzileiros se
consideram legítimos descendentes.
Naturalmente que o recrutamento de
1621 já foi feito nos novos termos, com
a nomeação de D. Francisco de Almeida
como Mestre de Campo, para comandar o
Terço e desempenhar as funções de Almirante da Armada da Coroa de Portugal – o
segundo cargo mais importante da estrutura naval. A sua primeira grande missão,
contudo, só viria a ter lugar em 1624, quando foi organizada a grande expedição de
socorro a S. Salvador da Bahia, conquistada pelos holandeses. Filipe IV mandou
organizar uma grande armada de socorro
– que ficou conhecida como a “jornada
dos vassalos” – cujo comando entregou
66
a D. Fradique de Toledo Osório, Marquês
de Villanueva, onde se integrou a Armada
de Portugal, comandada por D. Manuel
de Meneses. Os navios saíram de Lisboa
a 22 de novembro de 1624, juntando-se
ao contingente espanhol em Cabo Verde
e seguindo para o Brasil, onde chegaram
a 27 de março de 1625. Fundearam em
frente da cidade ocupada, formando uma
meia-lua que impedia todos os reforços ou
fugas e começaram o desembarque no dia
30, Domingo de Páscoa. O Terço foi para
terra no dia seguinte e tomou posição junto
à porta de Santa Luzia, onde teve o seu
primeiro combate, quando os holandeses
tentaram forçar uma saída, que foi repelida com grande êxito. Seguiram-se cerca
de 30 dias de intensas operações, onde
revistademarinha.com
os soldados conduzidos por D. Francisco de Almeida defrontaram o inimigo com
brilhantismo, até à sua rendição a 30 de
abril. A jovem unidade da Marinha cobria-se de glória na sua primeira intervenção
além-mar, encetando um percurso que se
repetiria em múltiplas ocasiões em que foi
necessário socorrer as terras brasileiras.
Na data de 1640, quando os conjurados
aclamaram, em Lisboa, D. João IV como
Rei de Portugal, o Terço da Armada estava no Brasil, para onde tinha viajado no
princípio do ano com o Conde de Castelo
Novo, que foi ocupar o cargo de Governador. A notícia dos acontecimentos chegou
pouco tempo depois, e os portugueses da
Bahia aclamaram o Duque de Bragança,
como novo Rei de Portugal, com o Terço
da Armada formado na praça de armas do
Paço do Governo. Um acontecimento notável que, certamente, foi do agrado geral,
mas que significava o começo da Guerra
da Restauração, que iria reclamar constantemente a intervenção dos soldados da
Marinha. E assim aconteceu desde os primeiros momentos, num conflito muito duro
que teve lugar no mar e nas fronteiras do
Alentejo e da Beira.
O Terço esteve presente nas mais duras batalhas daquela guerra onde o país
defendia a sua independência e o direito a
ter um soberano português. Esteve na Ba· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
História Marítima
talha do Montijo, logo em 1644; na defesa
de Elvas, em 1645; no ataque a Badajoz,
em 1646; de novo na defesa de Elvas em
1659, desta vez num encarniçado e decisivo combate, cuja decisão desfavorável
podia significar a abertura do caminho ao
inimigo até Lisboa; depois disso esteve
presente no Ameixial e na retomada de
Évora, de 1663; e, finalmente, na derradeira batalha de Montes Claros, que marcou
o término da guerra que consolidava a dinastia de Bragança, no trono de Portugal.
E alternou sempre estas campanhas junto
à fronteira, com os embarques anuais na
armada – porque era no mar que se garantiam os meios essenciais para poder continuar a guerra –, com duas deslocações
ao Brasil e participando numa operação
naval luso-francesa, contra uma posição
espanhola na ilha de Elba (Mediterrâneo).
D. João IV morreu em 1556, deixando
à rainha viúva, D. Luísa de Gusmão, a responsabilidade de conduzir a guerra com
Espanha, até à maioridade do futuro Rei
D. Afonso VI. E foi contra a sua vontade
que cedeu uma parte do seu poder, em
1662, por pressão de alguns sectores da
nobreza e do próprio príncipe. Morreu em
1666, sem ter presenciado o final do conflito e a assinatura do Tratado de Lisboa,
em fevereiro de 1668, onde foi reconhecida a nova dinastia portuguesa. Porém,
pouco tempo depois de assinada a paz,
dar-se-ia o golpe palaciano que afastaria
Afonso VI do trono, acusado de incapacidade física e mental. A regência era assumida pelo príncipe D. Pedro que incumbiu
o Terço da Armada da sua guarda pessoal, guarnecendo o paço e as armadas.
Por esta razão começa a ser chamado de
Regimento do Príncipe, mas não é nome
que alguma vez tenha sido oficializado, só
perdendo a designação de Terço da Armada, com a reforma militar de D. João
V, em 1707. Nessa altura teve, de facto
uma reestruturação profunda, passando a
designar-se Regimento da Armada e integrando-se num novo modelo de estrutura
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
militar, que seria o do século XVIII. Aliás,
este Regimento de Infantaria, viria a multiplicar-se durante as décadas seguintes e,
no final do século, a Marinha portuguesa
tinha dois regimentos de infantaria e um
de artilharia.
Com quase um século de existência, iria
agora entrar numa nova era, com significativas alterações nas características dos
navios e da organização para os combates
navais. Mas não perdia importância a utilização da infantaria, mantendo as funções
que lhe cabiam anteriormente, no combate
naval e no desembarque, quando o poder
dos navios tinha de ser projetado para terra. No final deste século, esta organização
de vários regimentos foi unificada na Brigada Real de Marinha, criada em 1797. Foi
o seu primeiro Inspetor o grande almirante
Marquês de Nisa, que partia para o Mediterrâneo, poucos meses depois desta
nomeação.
Não vou detalhar a história da Brigada
Real de Marinha, nem das unidades que
lhe sucederam, no século XIX, limitando-
· revistademarinha.com
-me a dizer que ele espelhou o declínio que
a Marinha veio a ter depois das invasões
francesas e das guerras liberais. A Brigada Real de Marinha foi formalmente extinta
em 1836, sendo criado um Batalhão Naval
que, em 1851, dava lugar ao Corpo de Marinheiros Militares. Foi desta unidade que
saíram todas as forças expedicionárias da
Marinha que estiveram nas campanhas
de ocupação e pacificação africanas e na
Grande Guerra. Mas o fio condutor que
vinha do tempo de D. António de Ataíde
diluiu-se por diversas vezes, só voltando a
ser retomado em 1961, com a reativação
dos fuzileiros. Agora preparados e treinados para as guerras que começavam nos
teatros africanos de Angola, Moçambique
e Guiné. São os mesmos fuzileiros que a
Marinha ajustou ao novo contexto político-militar posterior a 1974, prosseguindo a
capacidade de projeção do poder naval
português, do mar para a terra, determinante em qualquer marinha do mundo.
*
[email protected]
67
84.O Ano
Duas Unidades Navais da
Kriegsmarine na parada naval de 1938
por António Abreu*
1. INTRODUÇÃO
A Marinha do III Reich, designada por
KRIEGSMARINE, teve o seu “Despacho
100” em 1935 pela “Lei para a reconstrução das Forças Armadas Alemãs”. Ao
abrigo dessa lei a Marinha Alemã foi reconstruída e em agosto de 1938 realizou
uma parada naval em Kiel, em que participaram as unidades navais construídas ao
abrigo dessa Lei.
O bilhete postal ilustrado alemão, apresentado abaixo, apresenta um aspeto do
desfile Naval então realizado. No lado onde se escreve a mensagem o postal apresenta duas marcas postais: uma circular,
a marca do dia “-6.12.43.??”; e a outra
retangular “Feldpost”, que garantia o direito do remetente à isenção de taxa postal,
comprovando que era alguém colocado
no Serviço Militar. Estas duas marcas correspondiam ao que se pode designar por
selos postais militares fixos.
A imagem, no verso apresenta uma fotografia em que se vê ao fundo um navio a
desfilar, da esquerda para a direita, com o
número “51” pintado no flanco direito; em
primeiro plano e num outro navio, temos a
guarnição, de costas, com o fardamento
de verão da Marinha Alemã, e que se encontra perfilada a assistir ao desfile naval.
2. AS MARCAS POSTAIS
E O REMETENTE
2.1. “Feldpost”
Durante a II Grande Guerra Mundial, as
internet “http://www.militaria-datenbank.
com/”. Foi assim possível identificar os dizeres da inscrição, que correspondem, a
Kommando 1.Schiffsstammabteilung (Comando Centro de Instrução Naval n.º1) na
parte superior; e a Briefstempel (Carimbo
postal) na parte inferior.
Insignia da Kriegsmarine.
unidades militares do III Reich, estavam
dotadas com uma marca de carácter postal que, quando aplicada na correspondência, garantia o direito do remetente à
isenção de taxa postal, comprovando que
era alguém colocado no Serviço Militar.
São inúmeros os modelos e as variedades
com diferentes dizeres, pois, para meu espanto, não estavam normalizadas.
O modelo aplicado neste postal consta
de um retângulo ao alto, de 49 x 35 mm,
com cantos arredondados, contendo no
seu interior, na parte superior, a palavra
“Feldpost” (correio de campanha) em letras góticas; e na parte inferior, ocupando
cerca de dois terços de toda a área, um
elemento circular, de 29 mm de diâmetro,
com a águia alada no centro, segurando a
suástica nas garras. Inscrito no interior do
círculo está a identificação do estabelecimento militar bem como o tipo de marca
postal, tudo também escrito em letras góticas.
Dada a pouca nitidez da marca aplicada neste postal, confirmei a identificação
da inscrição, com um exemplar mais nítido
do selo fixo postal militar, obtido no site da
Frente do Bilhete Postal Ilustrado com marca postal “Feldpost” e marca
do dia.
68
2.2. A marca do dia
A marca do dia é muda (não tem identificação do local por questão de segurança),
de duplo círculo com a data inserida num
retângulo inscrito no círculo interior de 19
mm de diâmetro, sendo o do círculo exterior de 28 mm. A data é toda numérica do
tipo “dia.mês.ano.hora”, com dois dígitos
para cada elemento, indicando no postal
em apreciação “-6.12.43.-??” (a palavra
manuscrita “Feldpost” não permite distinguir os dígitos da hora).
2.3. O Remetente e o texto
O Remetente identifica-se (na parte
superior direita e invertido) como “Matrose Hans Rottner“, com a direcção
“3./1.S.St.A.” isto é, “3./ 1. Schiffs. Stamm.
Abteilung (3.ª Companhia do Centro de
Instrução Naval n.º 1). O postal foi escrito
de “Kiel, Fried.ort”, isto é, Friedrichsort (em
Friedrichs), (quebra da segurança) onde se
situava o Centro de Instrução, no dia 5 (de
dezembro de 1943), e é dirigido ao Pai,
Schütze Heinz Rotter, em Emmerich.
Também manuscrito, mas fora do texto principal (no lado direito e na vertical),
é feito o pedido “Bitte, Karte aufheben!!!”
(Por favor, guardar o Postal!!!), o que se
verificou.
Guarnição perfilada, assistindo ao desfile do destroyer nº 51.
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
História Marítima
3. O DESFILE NAVAL DA
KRIEGSMARINE EM 22 AGO 1938
Embora o bilhete postal tenha as margens aparadas, consegui a identificação
da imagem, após uma pesquiza na net.
Considerando o fardamento e a postura
dos marinheiros identifiquei o Desfile Naval de 22 de agosto de 1938, efectuado
no dia do lançamento à água do cruzador
pesado PRINZ EUGEN. Nesta ocasião
Adolf Hitler visitou o futuro navio almirante, o couraçado GNEISENAU. Contudo, o
Fürhrer assistiu ao desfile naval a bordo do
yacht governamental, o GRILLE, que ficou
ancorado num local abrigado.
3.1. O navio n.º 51 (destroyer)
Na lista de destroyers da Kriegsmarine
que participaram na parada naval em apreço, consta um com o número 51 pintado
na amura, o DIETHER VON ROEDER.
O navio só entrou formalmente ao serviço em 29 de agosto de 1938, isto é, na
semana seguinte à parada naval. Da curta
e ativa história desta unidade regista-se o
seguinte:
DIETHER VON ROEDER
Início const.: 09 – 09 -1936
Lançamento: 19 – 08 - 1937
Entrada ao serviço: 29 - 08 - 1938
Eventos:
Oct.1939. Patrulhamento no Atlântico
numa força conjunta com o Couraçado
GNEISENAU e outros navios.
8 abr 1940. Participa na invasão da Dinamarca e da Noruega.
Destino final:
13 abr 1940. É afundado por destroyers
ingleses com a perda de 16 tripulantes.
Comandante (único): Erich Holtorf de
ago 1938 a abr 1940.
O nome foi atribuído em memória do
Capitão-Tenente Diether von Roeder, Comandante da 13ª Flotilha de Torpedeiros,
morto em combate a 10jul1918, a bordo
torpedeiro S66.
3.2. O couraçado GNEISENAU
Para o desfile, o couraçado GNEISENAU fundeou no Fiorde de Kiel. A bordo
esteve a assistir à parada naval o regente
da Hungria, Almirante Nikolaus von Horthy
que se encontrava de visita oficial á Alemanha.
Este couraçado e o navio gémeo
SCHARNHORST foram construídos no seguimento da aprovação da “Lei para a reconstrução das Forças Armadas Alemãs”,
de março de 1935.
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
O GNEISENAU foi construído pelos Estaleiros Deutsche Werke, de Kiel, e o navio
gémeo SCHARNHORST pelos Estaleiros
Kriegsmarine Werft, de Wilhelmshaven.
Da curta história destes dois couraçados regista-se o seguinte:
Comandante inicial: KzS Otto Ciliax
de 07-01-1939 a set 1939.
Durante o seu período de vida, os dois
navios atuaram em conjunto na maior parte do tempo, tendo realizado, com sucesso, operações no Atlântico Norte e foram
GNEISENAU
os únicos couraçados que afundaram um
Início const.: 06/ 05/1935
porta-aviões em operações (o HMS GLOLançamento: 08/12/1936
RIOUS).
Entrada ao serviço: 21/ 05/1938
Os nomes atribuídos a estes dois couraEventos:
çados recordavam a memó– Submetido a alterações
ria de dois brilhantes oficiais
significativas, em jul - ago 1939.
prussianos do período das
– Participou na invasão da
Guerras Napoleónicas:
Noruega em 1940.
August Wilhelm Anton
– A 8 jun 1940, em comGraf Neidhardt von Gneisepanhia do SCHARNHORST
nau, Comandante Supremo
afundou o porta-aviões britâdo Exército Prussiano; nasceu
nico HMS GLORIOUS.
a 27 de outubro de 1760, em
– Na noite de 27 fev 42,
Schildau, perto de Torgau, na
em Kiel foi severamente
actual Alemanha; e morreu a
bombardeado, nunca sendo
23 de agosto de 1831 em PoA. W. von Gneisenau.
concluídos os trabalhos de
sen, na atual Polónia.
recuperação.
Gerhard Johann von
Destino final: Afundado
Scharnhorst, Ministro da
para o bloqueio do porto de
Guerra; nasceu a 12 de noGdynia em mar 1945
vembro de 1755, em BorComandante inicial: KzS
denau, Hanover na actual
Friedrich Förster de 21-05Alemanha; e morreu em 28
1938 a nov 1939.
de junho de 1813, em Praga,
capital da atual República
SCHARNHORST
Checa.
Início const.: 14/ 02/1934
*
[email protected]
G. J. von Scharnhorst.
Lançamento: 03/05/1936
Entrada ao serviço:
07/01/1939
OBSERVAÇÃO:
Eventos:
Adaptação de artigo publicado no n.º 435 da
Revista do Clube Filatélico de Portugal.
– Submetido a alterações significativas,
em jul - ago 1939.
– Participou na invasão da Noruega em
BIBLIOGRAFIA
1940.
Internet
– Wikipedia, the free encyclopedia
– A 8 jun 1940, em companhia do
– http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_Kriegsma
SCHARNHORST afundou o porta-aviões
rine_ships
britânico HMS GLORIOUS.
– http://www.scharnhorst-class.dk/gneisenau/
Destino final: Afundado pelo Inimigo
gallery/gallgneisefleetparade.html
em 26 dez 1943.
– “http://www.militaria-datenbank.com/”.
O destroyer Z17 - “Diether Von Roeder”.
· revistademarinha.com
69
84.O Ano
O Regresso da Nau VICTORIA
e a Confirmação da
Circum-Navegabilidade da Terra
por José Manuel dos Santos Maia
ernão de Magalhães é o mais conhecido navegador da História universal.
Apesar do seu nome ter ficado ligado
à primeira circum-navegação do globo terrestre, importa referir que este facto nunca
foi o objetivo da sua viagem, nem sua intenção demonstrar a esfericidade da terra.
Após o regresso a Portugal de Magalhães, que durante a sua comissão na Índia
viajou até Malaca, e lá assistiu à partida da
primeira Armada portuguesa para uma expedição a Maluco, juntou-se a Rui Faleiro e
foram para Sevilha oferecer-se à Casa de
Contratación de Castela, após recusa dos
seus seviços pelo monarca português.
Quando a frota de cinco navios, comandada pelo português Fernão de Magalhães, partiu de Sanlúcar de Barrameda, a
19 de setembro de 1519, tinha como objetivo provar que as Ilhas de Maluco não
tinham caido dentro do hemisfério reservado a Portugal, pelo Tratado de Tordesilhas
(1494), mas sim a Castela e, sobretudo,
descobrir a passagem que liga o Atlântico
ao Pacífico, provando a circum-navegabilidade dos oceanos sem cruzar águas portuguesas, cumprindo assim as ordens de
Carlos V.
O extraordinário mérito de Fernão de
Magalhães está na fantástica travessia
do Pacífico, por ninguém antes tentada.
Enquanto Vasco da Gama beneficiou, na
descoberta do caminho marítimo para a
Índia, do apoio de pilotos muçulmanos depois de dobrar o Cabo da Boa Esperança,
Magalhães só dispunha de conhecimento
até ao rio da Prata. A partir daí percorreu
um larguíssimo mar desconhecido, que
chamou de Pacífico, até atingir as ilhas de
São Lázaro, mais tarde conhecidas como
Filipinas, tendo usado a experiência e o
método racional, partindo do princípio que
o regime de ventos deveria ser semelhante
ao do Atlântico.
A viagem de regresso a Espanha deveria
ser de volta pelo Pacífico mas, na sequência da morte de Magalhães nas Filipinas(1),
foi praticamente em desespero de causa
que Sebastián Elcano, Comandante da
nau VICTORIA, uma das duas que restavam das cinco que partiram de Sanlúcar
de Barrameda, decidiu que o regresso de
F
70
Nau VICTORIA.
Maluco a Espanha seria feito pela rota portuguesa (Cabo da Boa Esperança).
A nau capitânia, TRINIDAD, sob o comando de Gonzalo Gomez de Espinosa,
ainda tentou atingir o Panamá, sem sucesso, sendo obrigada a regressar a Maluco e
a render-se aos portugueses.
Com 60 homens e um porão carregado
de cravinho, a VICTORIA aportou na ilha de
Timor, que ainda não era protetorado português. Elcano tinha o desafio de chegar a
Espanha sem ser intercetado pelos portugueses. Assim, em fevereiro de 1522, parte
rumo ao cabo da Boa Esperança.
Especiarias como o cravinho e a noz-moscada eram mercadorias preciosas na Europa. As árvores
tropicais nativas das Molucas eram as únicas fontes.
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
História Marítima
(Espanha); Nicollo Napolés (Itália); Francisco Rodrigues (Portugal); Juan Rodríguez
de Huelva (Espanha); Miguel Sánchez de
Rodes (Rodes); Juan de Arratia (Espanha);
Juan de San Andrés (Espanha); Diego
García (Espanha) e Juan de Zubileta (Espanha).
Um mapa de 1545 onde está traçada a rota da viagem de Magalhães.
Após nove semanas de navegação em
zona de influência portuguesa, dobraram o
Cabo das Agulhas, o ponto mais meridional
de África, entrando no Atlântico Sul. Cinco
meses após saírem de Timor, chegaram a
Santiago, em Cabo Verde, com o intuito
de adquirirem alimentos, forçados pelo escorbuto. Elcano enviou homens a terra sob
o pretexto de que era um navio espanhol
que foi apanhado por uma tempestade e
se desviou, no regresso das Antilhas. A
farsa durou pouco tempo pois a VICTORIA
foi identificada como sendo da frota de Magalhães, o que o levou a zarpar, deixando
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
em terra uma dúzia de companheiros. Finalmente, a 6 de setembro de 1522, ao fim
de dois anos, onze meses e dezassete dias
de atribulada viagem, aportaram a Sanlúcar de Barrameda 18 homens a bordo da
VICTORIA. Sobreviveram à grande viagem:
Juan Sebastián Elcano (Espanha);
Antonio Pigafetta (Itália); Francisco Albo
(Rodes); Miguel de Rodes (Rodes); Juan
de Acurio (Espanha); Martín de Judicibus
(Itália); Hernando de Bustamante (Espanha); Juan Martín (Espanha); Diego Gallego
(Espanha); Antonio Hernández Colmenero
· revistademarinha.com
É de salientar que, além do erro de um
dia, que causou grande admiração a Elcano em Cabo Verde, resultado das navegações terem sido feitas de Este para Oeste,
ficou desvendado o mistério de que seguindo para Ocidente um navio atrasa uma hora a cada 15º de longitude.
Em suma, torna-se importante salientar que se a Magalhães foi dado o mérito da travessia do Pacífico, a Elcano foi
destacado o talento de ter conduzido a
nau VICTORIA por uma rota, também ela
desconhecida, que não cruzasse qualquer
posição dos portugueses no Índico e no
Atlântico.
Com a chegada a Sevilha deu-se por
concluída a primeira volta ao mundo da
História da Humanidade e com este feito
ficava confirmada a circum-navegabilidade
da Terra.
NOTA:
(1) Luís Filipe Thomaz, “O Drama de Magalhães” e “Fernão de Magalhães e Sebastião de
el Cano”, O drama de Magalhães e a volta ao
mundo sem querer. Seguido de um Museu dos
Descobrimentos: porque não?, 2ª Edição, Lisboa, Gradiva, 2019, pp. 9-32.
71
84.O Ano
O Galeão Mecânico de Augsburgo
por João Rodrigues Gonçalves*
sta peça de relojoaria, um nef, era
um artefacto verdadeiramente mágico para a época em que foi construído. Nef deriva duma palavra francesa que
se referia a uma “nau”, era um ornamento
de mesa em forma de um navio, extravagante e rico, normalmente em metais preciosos, provido de automação e relógio.
Com a forma dum galeão medieval, foi
concebido em 1585 por Hans Schlottheim
(1545-1625), em Augsburgo, no sul da
Alemanha e era uma maravilhosa peça de
relojoaria, uma máquina espetacular, que
servia para chamar para o jantar os convidados da corte de Augusto I, Eleitor da
Saxónia.
O pequeno espetáculo começava com
uma música produzida por um órgão miniatura guardado dentro do casco, toques
de tambor e um cortejo de figuras animadas desfilava junto ao castelo de popa. No
cortejo estavam representados Augusto e
outros seis príncipes-eleitores a apresentarem-se ao imperador Romano-Germânico
Maximiliano II.
O navio deslocava-se sobre umas rodas
invisíveis ao longo da mesa, parando com
grande alarde final, quando um tiro de canhão era dado automaticamente, enquanto incendiava um rastilho que provocava o
disparo dos restantes canhões.
No seu interior existiam três mecanismos de relojoaria, movidos a corda de
mola. Um operava o relógio, o segundo
fazia funcionar a música e a percussão,
e o terceiro mecanismo de relojoaria impulsionava o galeão sobre a mesa. Toda
a animação era controlada por um grande
tambor preso lateralmente ao casco. Uns
foles forneciam ar ao órgão que produzia
a música.
O nef teve vários donos e no séc. XIX
foi parar às mãos dum antiquário, historia-
E
72
dor e político britânico, muito apreciador
de mecanismos e automatismos, Octavius
Morgan, que foi um dos maiores benfeitores do Museu Britânico, e que ofereceu o
nef ao Museu em 1866.
revistademarinha.com
Esta maravilhosa obra de arte e relojoaria pode hoje ser admirada no Museu Britânico, em Londres.
*
[email protected]
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Vessel Traffic
Services (VTS)
Segurança e Monitorização em tempo real no Controlo
de Trafego Marítimo.
indracompany.com
84.O Ano
O cargueiro MADEIRENSE (1962)
por Luís Miguel Correia*
navio de carga e passageiros MADEIRENSE, de 1962, foi o segundo com este nome a integrar a
frota da ETF – Empresa de Transportes
do Funchal / ENM – Empresa de Navegação Madeirense, e um dos mais populares navios mercantes construídos para
servir a ilha da Madeira no século XX.
Durante 28 anos assegurou a linha
Funchal – Lisboa, transportando carga,
bananas e outras frutas de exportação local para o Continente. De Lisboa, o navio
regressava com carga geral e automóveis,
O
andando sempre com a lotação de 12
passageiros completa. Era um navio muito elegante, com construção robusta, desenhado à medida das necessidades do
mercado madeirense, concorrendo com
sucesso com os bananeiros da Empresa Insulana GORGULHO e MADALENA,
os quais, juntamente com os FUNCHALENSES (o de 1953 e depois de 1968,
o novo), asseguravam a linha da Madeira
conhecida como Banana Line.
De 1990 a 1996 serviu a carreira do
Porto Santo, sendo modificado com a
ampliação da lotação para passageiros.
Este belo grande pequeno navio marcou
uma época, tanto em Lisboa como em
àguas insulares, e descansa desde há
21 anos no fundo do mar frente a Vila
Baleira, Porto Santo, transformado num
recife artificial muito apreciado para mergulho.
* Historiador Naval e Fotógrafo
Diretor da EIN-Náutica
Apartado nº 3115 1302-902 LISBOA
[email protected]
http://lmcshipsandthesea.blogspot.com
MADEIRENSE (1962 – 2000)
Características técnicas: Navio de
carga refrigerada e passageiros a motor,
construído de aço, em 1961-1962. Nº
Lloyd's: 5216587. Nº oficial: A 551. Indicativo de chamada: CSLB. Porto de registo:
74
Funchal (registado na Capitania do Porto do Funchal a 17-07-1962). Arqueação
bruta: 1.308 tons; Arqueação líquida: 859
tons; Porte bruto: 916 tons; Deslocamento
máximo: 1.665 tons; Deslocamento leve:
revistademarinha.com
749 tons. Capacidade de carga: 3 porões
servidos por 2 escotilhas, com 2.432 m3,
incluindo 53 m3 em câmaras frigoríficas.
Comprimento ff.: 70,30 m; Comprimento pp.: 62,60 m; Boca: 11,00 m; Pontal:
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Despacho 100
6,05 m; Calado: 4,10 m. Máquina: 1 motor
diesel Werkspoor de 8 cilindros, modelo
TMABS 398, com 1450 bhp a 250 rpm;
1 hélice. Velocidade: 12,3 nós (13,3 nós
de velocidade máxima). Passageiros: 12
em 6 camarotes. Tripulantes: 17. Navio
gémeo: FUNCHALENSE (1968). Custo:
18.490.000$00.
História: O MADEIRENSE foi construído
pelos Estaleiros Navais de S. Jacinto, em
S. Jacinto, Aveiro (construção nº 56) com
projeto do Engº c. n. Fernando Campos
de Araújo, por encomenda da Empresa
de Transportes do Funchal, para a carreira
Funchal – Lisboa, transportando bananas,
carga geral e passageiros. O contrato de
encomenda foi assinado a 14-05-1960. A
quilha foi assente na carreira de construção
a 26-04-1961, e a 5-04-1962 procedeu-se ao lançamento do MADEIRENSE à
água. Entrega ao armador a 11-07-1962,
em Aveiro, de onde largou, a 13-07, para
o Funchal, onde entrou pela primeira vez a
16-07. O MADEIRENSE recebeu a 18-071962, a visita do Presidente Americo Tomás, e do Ministro da Marinha, Fernando
Quintanilha. A 21-07, o MADEIRENSE fez
uma viagem do Funchal ao Porto Santo
por ocasião da visita oficial do Presidente
da República àquela ilha, a 22-07-1962,
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
largou do Funchal na primeira viagem a Lisboa (estadia de 24 a 29-07), substituindo o
MADEIRENSE (I), que em 1961 se passara
a chamar ILHA DA MADEIRA. Utilizado em
viagens regulares com rotação quinzenal e
saídas semanais de Lisboa e do Funchal,
em conjunto com o FUNCHALENSE (II) até
1968, e com o seu gémeo FUNCHALENSE (III) a partir de 1968 e até 1984, sempre
com passageiros, carga geral e frutas, com
destaque para as bananas. Anualmente
eram feitas cerca de 26 viagens redondas
a Lisboa, exceto em 1978 quando o MADEIRENSE só completou 22 viagens por
ter imobilizado, de 16-07 a 23-09-1978, na
sequência de uma greve da tripulação durante 69 dias. De 1964 a 1975, o MADEIRENSE fez ainda viagens Funchal – Porto
Santo – Funchal, nos meses de Verão, às
quartas-feiras, para transporte de passageiros, no total de 35.193 pax. De 1962 a
1982, inclusive, o MADEIRENSE completou 522 viagens a Lisboa, transportando
577.024 tons de carga e 10.255 passageiros. A partir de 1983, com a utilização dos
porta-contentores PICO DO CASTELO (I)
e PICO RUIVO, o serviço de carga e passageiros perdeu importância passando a
periodicidade quinzenal em 1984, com o
MADEIRENSE e o FUNHALENSE a faze-
· revistademarinha.com
rem, cada um, uma viagem mensal. De
7-02-1987 a 24-06-1988, o MADEIRENSE
permaneceu em Lisboa (Doca de Alcântara) em situação de imobilização comercial,
após o que recomeçou as viagens regulares ao Funchal, até que, de 18-12-1989 a
3-03-1990 voltou a ficar imobilizado em Lisboa. De 3 a 19-03-1990, o MADEIRENSE
completou as últimas viagens na linha Funchal – Lisboa. A 12-03-1990 foi vendido à
Porto Santo Line – Transportes Marítimos,
Lda., por 25.000 contos (registado na Capitania do Porto do Funchal a 28-06-1990.
Nº oficial: A 851), inaugurando a carreira
Funchal – Porto Santo a 5-04-1990. De 2204 a 1-06-1991, o MADEIRENSE esteve
pela última vez em Lisboa, em reparação
e modernização (Lisnave Rocha), sendo a
lotação de passageiros aumentada para
120. A 26-06-1992 o MADEIRENSE alterou o registo para navio de passageiros
(navegação costeira nacional, Nº oficial: A
856), fazendo a carreira do Porto Santo até
16-10-1996, data em que ficou imobilizado
no Funchal até 19-01-1999, quando seguiu
para o Porto Santo, onde foi preparado
para ser afundado, tornando-se um recife
artificial e atração turística, após ser afundado a 21-10-2000, tendo o registo sido
cancelado nesta data.
75
84.O Ano
A Inteligência Artificial
e os Transportes Marítimos
por António Balcão Reis*
Parque de contentores do Terminal XXI (Sines).
presença dos sistemas informáticos
na logística dos transportes marítimos e a confiança com que são
usados os mais variados programas informáticos na sua gestão são dados adquiridos.
Já constitui uma experiência normal seguirmos no nosso computador ou telemóvel
a derrota do voo de familiares ou amigos,
bastando normalmente identificar o nº do
voo e com idênticos procedimentos podemos visionar a posição de um navio e a sua
derrota. Possivelmente ficaremos surpreendidos pela elevada concentração de navios
em determinados pontos de passagem ou
nas entradas e saídas de portos. Para evitar
eventuais incidentes ou acidentes e auxiliar
as tripulações já existem serviços especiais
que em tempo real, e em regime permanente, monitorizam todo o tráfego marítimo.
A nível nacional a Autoridade Nacional
de Controlo de Tráfego Marítimo - DGRM,
munida do Sistema de Controlo de Tráfego
(VTS - Vessel Traffic Service), acompanha
o tráfego marítimo, permitindo-lhe … acautelar situações de aproximação excessiva
entre navios, aproximação excessiva de navios à costa ou a outros perigos, potenciais
incumprimentos dos sistemas de roteamento implementados, acompanhamento
de navios em situação de avaria, ou em
operações especiais, etc. O sistema presta
ainda inestimável auxílio, entre outras, em
A
76
operações de Busca e Salvamento, combate à poluição, monitorização de atividades
ilícitas e investigação de acidentes.
A MONITORIZAÇÃO DOS
CONTENTORES
A sofisticação alcançada nos sistemas
de gestão dos parques de contentores é
enorme. Em rigor a gestão começa na implantação do parque e na organização e racionalização do espaço disponível, nalguns
casos dramaticamente escasso, uma constante nos portos mais antigos, encravados
e limitados pela adjacente área urbana.
A posição dos contentores, bem como
as entradas e saídas do parque e as movimentações no seu interior podem ser seguidas em tempo real, com base na aquisição
e registo dos dados relativos à localização
geográfica, podendo ter associada informação sobre os meios de movimentação
disponíveis.
O posicionamento dos contentores no
parque é tudo menos aleatório. Ao serem
posicionados, entre outros fatores, terá que
ser ponderada a sua futura movimentação,
eliminando ou reduzindo ao mínimo os “reposicionamentos” (reshuffles), movimentações em cadeia em que para alcançar um
contentor se torna necessário movimentar
outros (quantos?). O problema repete-se no
revistademarinha.com
posicionamento a bordo com a agravante
da necessidade de assegurar a estabilidade
do navio. A posição mais conveniente (de
mais fácil acesso e movimentação) e a mais
segura poderão ser antagónicas. Terá que
ser dada sempre prioridade à segurança,
designadamente à estabilidade do navio.
A localização dos contentores e o seu
seguimento ao longo da viagem, seja ela
de simples transferência de um porto para
outro ou a complexa derrota de uma afastada origem para um longínquo destino com
uma ou mais baldeações (transhipments)
podem ser assegurados fixando no contentor um pequeno circuito eletrónico (constituído por chips e outros componentes), que
nos dê em tempo real as coordenadas do
contentor.
Mas a localização do contentor, poderá ser só uma parte do que necessitamos
conhecer. Quais as condições e a situação
da carga, especialmente com contentores
frigoríficos e cargas perecíveis? Circuitos
eletrónicos um pouco mais complexos permitirão adquirir dados, tais como por exemplo a temperatura e a humidade.
Importante seria ter informação que
acompanhasse o evoluir da situação e
prevenisse o degradar da situação, interpretando as variações e a evolução das
temperaturas, e outras variáveis, criando
espaço para uma eventual intervenção
atempada ou, em termos de segurança,
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Transportes & Logística
antecipar condições propícias a fraudes,
ao desencaminhamento de contentores, a
avarias intencionalmente provocadas ou a
roubos do conteúdo ou do inteiro contentor.
Aqui já poderá haver espaço e justificação para falarmos de Inteligência Artificial
(IA) ou (Artificial Intelligence – AI)
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL (IA)
Não é fácil definir o que seja inteligência,
mas se não entendemos o que seja inteligência, teremos dificuldade em alcançar
o significado de IA e, mais ainda, fazer a
ligação desta ao nosso exemplo dos contentores. Numa definição clássica, entende-se inteligência como …a faculdade de
conhecer, compreender, raciocinar, pensar
e interpretar. Também podemos definir inteligência como … a capacidade de alcançar
novos resultados através da ponderação de
dados conhecidos. Por isso dizemos que
só tendo memória, e sabendo usá-la, se é
inteligente.
Em 1983, Howard Gardner, estabeleceu
a Teoria das Múltiplas Inteligências, considerando diferentes tipos de inteligência,
que o senso comum identifica, entre outras, como lógico-matemática, musical ou
corporal-cinestésica.
A IA é uma categoria de inteligência diferente, pertencendo à ciência informática.
Através de mecanismos e dispositivos tecnológicos tende a simular o raciocínio humano. A IA, entre outras, tem a capacidade
de prever comportamentos e processos.
Com base na análise de um conjunto de dados organizados é possível identificar comportamentos tipo e estabelecer previsões,
ou seja, com base em dados históricos, antecipar situações e acontecimentos futuros.
Consultando registos, são identificados
parâmetros que estando presentes em
anteriores casos conduziram a determinadas situações. Conhecendo os dados,
compreendendo-os, raciocinando e inter-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Terminal de contentores de Leixões.
pretando, ou seja, num ato de inteligência,
é possível antever que se venha a verificar
uma determinada situação.
A primeira dificuldade está na correta
escolha dos dados e parâmetros associados a que se seguirá a correta dedução ou
interpretação da cadeia de consequências.
É fácil entender como seja importante a
recolha de dados. Assim nasce o conceito de big data, que podemos traduzir por
mega dados, mas que ultrapassa em muito
a noção de grande volume de dados. Big
data é já uma … área do conhecimento que
estuda como tratar, analisar e obter informações, a partir de enormes conjuntos de
dados. Não chega ter dados. É essencial
saber processá-los para obter informação.
Na posse de um enorme volume de dados,
a big data, ordenando-os, relacionando-os, interpretando-os, consegue não só
tirar conclusões como antecipar situações.
Com parâmetros certos e os algoritmos
adequados e corretos, a IA vai dar-nos as
respostas desejadas, em tempo útil, eventualmente até em tempo real.
· revistademarinha.com
A vantagem da IA reside na capacidade
de gerir uma enorme massa de dados e de
estabelecer as relações lógicas suscetíveis
de conduzir em intervalos de tempo mínimos a previsões crescentemente robustas
e fiáveis.
Concluindo, e voltando aos contentores,
usando a IA podemos identificar riscos e
prevenir acidentes, em particular para cargas frigoríficas, ou se assíduas e injustificadas movimentações nas imediações do
contentor antecipam ações ilícitas, e quais.
Com os grandes desenvolvimentos computacionais anseia-se que os computadores possam "pensar" exatamente como os
humanos, ou mesmo reproduzir emoções
e sentimentos. António Damásio, ao considerar as emoções e sentimentos, como
pertencentes a uma diferente categoria, é
cético em relação a uma tal conquista. Pessoalmente espero que tenha razão.
* António Balcão Reis
C/ Alm. Eng. Const Naval, ref
Membro da Secção de Transportes da SGL
[email protected]
77
84.O Ano
O que mais Poderá a Contecer no Mar?
Parte II
por OTO*
último ano, como se sabe, trouxe
graves inconvenientes ao negócio
marítimo, decorrentes da pandemia COVID 19 que se tem vivido, nomeadamente para efetuar as rendições das
tripulações dos navios e plataformas de
exploração petrolífera. Contudo, não poderá deixar de ser notória a quantidade de
acidentes marítimos que por este mundo
se tem verificado. Muitos, variados e alguns bem estranhos; nesta Parte II julgo
que será interessante listar uns quantos.
E aqui ficam bem expressas questões
que têm a ver com a obtenção de maior
rentabilidade do negócio marítimo, mas
que em nada ajudam a melhorar a segurança a bordo.
O
78
A 3 de Junho de 2021, no porto de Kaohsiung, em Taiwan, o navio OOCL DURBAN, um grande porta-contentores de 316
metros de comprimento, sem qualquer
carga a bordo, que estava em manobra de
aproximação ao cais nº 66, ao passar em
frente ao cais nº 70 descai para cima do
navio nele atracado, o YONG HUNG, em
operação de carga e descarga de contentores, e desliza raspando o seu costado.
Como resultado deste movimento o navio
OOCL DURBAN embate na lança de uma
das duas gruas em operação no navio
YONG HUNG e arrastando-a provoca o
seu colapso para cima do cais, assim como provoca sérios danos na segunda grua.
Para além do pânico e confusão gerados
revistademarinha.com
no cais, e danos materiais nas duas gruas,
30 a 50 contentores ficaram danificados.
Contudo o navio YONG HUNG não sofreu
danos significativos assim como não houve trabalhadores sinistrados, a não ser um
com ferimentos ligeiros numa perna.
Mas, para que não se diga que em Portugal nunca nada acontece de insólito, será
de referir que, no dia 31 de Março de 2021,
o M/S IONIC HAWK, navio de 34 mil toneladas, com 180 metros de comprimento e
registado nas ilhas Marshall, navegando no
Rio Tejo, cerca das 17H00 locais embateu
no pilar Sul da Ponte 25 de Abril raspando
a sua proa na base do pilar. O acidente /
incidente terá ocorrido quando o navio manobrava para fundear num ancoradouro a
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Segurança Marítima
jusante da ponte. A comunicação social não
deu mais detalhes deste evento, que acabou por passar quase despercebido. Felizmente deste incidente não há … a registar
vítimas nem aparentes danos estruturais
na ponte, de acordo com o comunicado
da Autoridade Marítima Nacional, tendo o
navio ficado fundeado para vistoria técnica.
São exemplos de acidentes e incidentes que ocorreram com navios. Claro que
é indiscutível que isto só acontece a quem
anda no mar. Mas teremos de concordar
que são casos insólitos e que numa primeira análise poderiam ter sido evitados. E em
todos eles estão presentes questões que
tem sido abordadas e analisadas nestas
crónicas, e que terão certamente responsabilidade na origem destes acontecimentos. E será de relembrar:
– as consequências de acidentes com
navios de grande ou mesmo excessiva dimensão;
– as reduzidas tripulações dos navios
com os inerentes baixos tempos de descanso;
– as tripulações com nacionalidades
e línguas diferentes, e com preparação e
conhecimento dos equipamentos do navio
por vezes duvidoso;
– a confiança excessiva que está im-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
plantada na maioria dos tripulantes, de que
todas as inovações tecnológicas, só por si,
resolvem os problemas a bordo;
– ou a pressão existente para que os
navios tenham o menor tempo de estadia
possível nos portos com a consequente
necessidade de rapidez na estiva da carga.
Enfim, todas estas são questões que
tem a ver com a obtenção do maior rendimento no negócio marítimo, que se
· revistademarinha.com
compreendem numa óptica apenas economicista. Mas que como se pode verificar nestes exemplos não ajudam nada a
melhorar a segurança de tripulantes e de
navios operando no mar.
*
[email protected]
NOTA:
O autor não segue o novo A.O.
79
84.O Ano
O Mar e as Leis
por Pedro Carvalho Esteves*
território português, constitucionalmente delimitado … abrange
o território historicamente definido
no continente europeu e os arquipélagos
dos Açores e da Madeira, encontrando a
sua extensão territorial no Mar, garantindo
a Portugal - enquanto país costeiro dotado de uma extensa costa marítima - um
conjunto de poderes de jurisdição e soberania sobre as águas do mar que lhe são
afetas por força do Direito Internacional
Público.
“A lei define a extensão e o limite das
águas territoriais, a Zona Económica Exclusiva e os direitos de Portugal aos fundos
marinhos contíguos.” – Assim reza o Artº
5º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, numa norma constitucional delimitadora dos limites das águas territoriais, a
Zona Económica Exclusiva (ZEE) e os direitos de Portugal aos fundos marinhos contíguos, desenvolvida pela Lei nº 34/2006, de
28 jul – lei esta que se encontra inalterada
desde a sua publicação. O Artº 2º desta
Lei dispões que “são zonas marítimas sob
soberania ou jurisdição nacional as águas
interiores, o mar territorial, a zona contígua,
a Zona Económica Exclusiva e a plataforma
O
80
continental”, desenvolvendo, nas normas
seguintes, os conceitos.
Mas, o legislador português, ciente da
dificuldade que é a gestão de um espaço
amplo e aberto, remeteu a interpretação das
disposições da referida lei para uma interpretação conforme aos princípios e normas do
direito internacional público, designadamente os previstos na Convenção das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM). A
propósito, o Direito Internacional Público,
constante de convenções internacionais
regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna portuguesa após
publicação em Diário da República.
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, na gíria conhecida
como Convenção de Montego Bay, ficou
concluída em 10 dez 1982 e foi assinada
por Portugal na mesma data, tendo entrado na ordem jurídica internacional em 16
nov 1994. A CNUDM foi só ratificada pela Assembleia da República – nos termos
dos exigentes preceitos da ratificação para
aprovação de convenções internacionais
– em 3 abr 1997, tendo a Resolução da
Assembleia da República n.º 60-B/97 sido
publicada em 14 out do mesmo ano. Porrevistademarinha.com
tanto, o mais importante instrumento de
organização do Mar foi ratificado 15 anos
após a sua conclusão e assinatura e 3 anos
após ter entrado em vigor no ordenamento
jurídico internacional. Justifica-se, e bem,
a delonga: a Assembleia da República formulou 13 declarações à CNUDM (que parecem ter cariz de Reservas mas que não
estão assim expressamente qualificadas)
no sentido de proteger aquilo que já era
Portugal – sendo, para mim, a mais importante a inscrita no ponto 7) A ratificação
desta Convenção por Portugal não implica
o reconhecimento automático de quaisquer
fronteiras marítimas ou terrestres, naquilo que é uma abnegada defesa do Artº 8º
da Constituição, e num claríssimo sinal de
reforço à declaração ínsita no ponto 1) Portugal reafirma, para efeitos de delimitação
do mar territorial, da plataforma continental
e da Zona Económica Exclusiva, os direitos
decorrentes da legislação interna portuguesa no que respeita ao território continental
e aos arquipélagos e ilhas que os integram.
Se o território de Portugal tem uma configuração geográfica heterogénea, composta por terra e mar, então as questões
do mar têm, por imperativo civilizacional,
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
O Mar e as Leis
de estar juridicamente enformadas. É sobre questões jurídicas que dedicaremos
as crónicas “O Mar e as Leis”, que vamos
desenvolver nesta Revista de Marinha.
No prefácio ao livro “Diplomacia Azul –
O mar na política externa de Portugal” de
Duarte Bué Alves, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sintetiza,
dizendo: [A presente obra] (…) versa sobre
um tema prioritário para Portugal. E que,
além disso, o é para o mundo neste século
XXI.
Nestes últimos anos, Portugal tem assistido a um “regresso ao mar”. Os desígnios
marítimos de Portugal convidaram a classe
política e a comunidade em geral a repensar a posição de Portugal perante o Mar, e
como dele tirar proveito. Explorar o Mar, enquanto fonte de recursos úteis à vida na terra faz com que os interesses do Homem no
mar fiquem cada vez mais aguçados. Este
novo desígnio para o Mar faz surgir aquilo a
que eu chamo de “Nova Economia do Mar”.
Portugal, que é historicamente uma nação marítima, teve com os “Descobrimentos” a afirmação da sua vocação – quer na
exploração das rotas marítimas, quer na
descoberta de “novos mundos”, quer ainda
no impulso que deu às relações comerciais
através do transporte marítimo de mercadorias e especiarias vindas do Oriente rumo à Europa. Aqui, o Mar, como meio de
comunicação para as trocas comercias – o
Comércio Marítimo. Tendo em consideração a proximidade ao Mar, este sempre foi
também explorado pelas populações ribeirinhas para o suprimento de bens alimentares – a arte da pesca. Portanto, ainda não
estávamos no Séc. XX, ainda não havia a
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
consciência do desígnio marítimo de Portugal e já existia, pelo menos desde o Séc.
XV uma forte Economia do Mar. Porém,
há que se dizer, desde 1974 que houve
um tendencial abandono do Mar, com os
abates das frotas de comércio e de pesca,
num manifesto desinvestimento neste concreto nicho da economia.
Desde os princípios do Séc. XXI, Portugal começou a preocupar-se com as
questões do Mar, nomeadamente em matéria de territorialidade e soberania, tendo,
através da Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC),
procedido aos estudos técnicos e científicos que permitissem, junto da Comissão
dos Limites da Plataforma Continental,
justificar o interesse e a legitimidade de
Portugal na fixação da soberania daqueles fundos marinhos. Esta, alavancada no
projeto de alargamento da plataforma continental para as 350 mi, com todos os poderes de soberania sobre os fundos e leitos
marinhos fez surgir a necessidade de repensar a potencialidade do mar como ente
competitivo português perante os demais
vizinhos europeus – desde logo, Espanha,
o mais próximo, e a Alemanha o maior e
mais pesado - e o grande vizinho oceânico
– os Estados Unidos da América. Portanto, afirmar o direito sobre parcela do mar
junto da vizinhança mais próxima parece
ser missão dos dias de hoje. Todavia, não
basta ser “dono da coisa”; há que conseguir gerir a “coisa” com os instrumentos necessários para a prossecução dos fins que
se pretendem. E, desde logo, surgem dois
handicaps: a) a falta de legislação interna,
moderna e atual; e b) a falta de cultura
· revistademarinha.com
jurídico-maritimista nas universidades portuguesas. Iremos abordar minuciosamente
estes temas, lançando propostas.
No que a este artigo nos importa, por
ora nos ocupa o Direito e o Mar. Será todo
ele Direito do Mar? Ou será todo ele Direito
Marítimo? Vejamos:
Conceptualmente – na minha visão – o
Direito ligado ao mar pode e deve ser especializado da seguinte forma (não ordenada):
Direito do Mar (law of the sea) que é o Direito Administrativo do Mar – Direito Público,
Internacional e Interno – que se dedica à
gestão do Mar; o Direito da Navegação –
distinto de todos os demais, visa regular e
regulamentar a circulação harmoniosa de
todos os navios e embarcações que se
movimentem no mar, salvaguardando os
aspetos ambientais, da segurança da navegação e do socorro; o Direito da Náutica – onde se regulam e regulamentam as
questões ligadas à náutica de recreio; o
Direito Marítimo – a área de Direito privado
– internacional e interno – que se dedica à
regulação das relações jurídico-privatísticas
entre utilizadores do Mar – onde incluiremos
o Direito Comercial Marítimo, na aceção do
Código Comercial Português; o Direito da
Pesca – onde se regulam as questões ligadas à gestão dos recursos piscícolas; e,
por fim, o Direito Portuário. A cada um iremos dedicar uma ou mais crónicas.
* Advogado
[email protected]
OBSERVAÇÃO:
Muito se agradece à EMEPC a cedência a imagem do Mar Português.
81
84.O Ano
Mergulho Recreativo e Descompressão
por Paulo Franco*
Os computadores de mergulho
são a ferramenta de excelência
para o controlo de vários parâmetros
do mergulho, nomeadamente:
a velocidade de subida, o intervalo
de superfície e o tempo necessário para
poder voar. (Fonte: SSI – Scuba Schools
International).
Doença de Descompressão já foi
tema de anteriores crónicas de
mergulho da RM. Nestes textos foi
abordada esta paradigmática patologia
através da descrição dos seus mecanismos fisiológicos, sinais, sintomas, fatores de risco e cuidados para evitar a sua
ocorrência. Na crónica que agora se inicia,
pretendo enquadrar esta patologia em termos de Mergulho Recreativo e detalhar um
pouco os cuidados e riscos que lhe estão
associados.
Genericamente falando, a designação
“Mergulho Recreativo” enquadra as actividades de mergulho com recurso a escafandro autónomo (S.C.U.B.A.) realizados
até à profundidade máxima de 40 m e
dentro dos designados “limites não descompressivos”. Este conceito é, de modo
geral, aceite pelas principais agências de
certificação internacionais.
A designação “limite não descompressivo” refere o máximo tempo que um mergulhador pode permanecer em imersão a
determinada profundidade sem incorrer
na obrigatoriedade de cumprir paragens
de descompressão no seu regresso à
superfície para não ter risco acrescido
A
82
de contrair Doença de Descompressão.
Por esta razão muitas vezes diz-se que
o Mergulho Recreativo é mergulho “não
descompressivo”. Mas será de facto?
Não têm os mergulhadores recreativos
Cumprir uma velocidade de subida de 9/10 m/
min é a principal obrigação descompressiva
dos mergulhadores recreativos, sendo fundamental para mitigar os riscos de Doença de
Descompressão. (Fonte: Maria Póvoa Pinto –
MyPhotoPrint)
revistademarinha.com
nenhuma obrigação descompressiva? Na
realidade todos os mergulhos, por mais
simples que sejam, têm riscos associados
à absorção e libertação de gases inertes,
no âmbito “recreativo” o gás em cauda é
o Nitrogénio. Consequentemente existem
sempre obrigações descompressivas que
devem ser cumpridas para mitigar este
risco. No caso de imersões dentro dos
“limites não descompressivos” esta obrigação é o cumprimento da velocidade de
subida, que nas principais agências de
certificação é de 9 ou 10 m/min. O cumprimento desta obrigação é, sem dúvida,
o mais importante cuidado para qualquer
mergulhador que queira manter a sua segurança em termos de Doença de Descompressão.
Para controlo da velocidade de subida de forma simples, prática e segura o
melhor é, sem dúvida, a utilização de um
computador de mergulho. Esta função é
transversal a todos os equipamentos modernos, pela sua importância para a segurança dos mergulhadores, podendo ser
apresentada de diversos modos em função do modelo em causa, variando entre
formas gráficas, escalares ou numéricas.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Mergulho
Outra regra habitualmente ensinada e
aplicada em termos de mergulho recreativo
é a denominada “Paragem de Segurança”.
Esta paragem, feita na subida final dos mergulhadores para a superfície, acontece em
regra aos 5 m e tem uma duração de 3 a
5 minutos. Esta paragem não é uma obrigação descompressiva propriamente dita,
como é o caso das “Paragens de Descompressão”, mas uma paragem que tem por
objectivo aumentar a margem de segurança dos praticantes da atividade em relação
à libertação do Nitrogénio absorvido durante a imersão. Muitos computadores modernos auxiliam também os mergulhadores no
controlo desta paragem, permitindo definir
o seu início automático quando se atinge a
profundidade pretendida.
Em termos recreativos, um dos factores
que deve ser considerado para garantir a
segurança em termos descompressivos
é o grau de conservadorismo definido no
computador de mergulho. Este parâmetro
presente na maioria dos equipamentos,
permite ao mergulhador definir o nível de
conservadorismo associado ao cálculo do
limite não descompressivo feito pelo seu
computador de mergulho em função de
ter, ou não, factores de risco acrescido em
termos de Doença de Descompressão, por
exemplo: obesidade, fraca condição física,
idade, desidratação, hábitos tabágicos,
mergulhos fisicamente mais exigentes, mergulho em águas muito frias, etc.
Um dos procedimentos importante e
muitas vezes pouco cuidado em termos
de mergulho recreativo é o respeito pelo
intervalo à superfície antes de voar e/ou subir a altitudes superiores a 300 m. Embora
muitas referencias bibliográfica indiquem
18 e até 12 horas para mergulhos simples
não descompressivos, é recomendação da
DAN (Divers Alert Network) respeitar um intervalo mínimo de 24 horas. O controle deste intervalo é também feito pela maioria dos
computadores de mergulho que indicam
A “Paragem de Segurança”, não sendo uma obrigação descompressiva, é um procedimento de
segurança recomendado para diminuir os riscos de ocorrência de Doença de Descompressão.
(Fonte: Maria Póvoa Pinto – MyPhotoPrint).
o impedimento do mergulhador de voar,
através de símbolos ou de forma numérica,
considerando o término do último mergulho
registado.
Uma conduta também importante, para
ser tida por todos os praticantes desta atividade é o respeito pela regra básica de que
os computadores são equipamentos individuais e não devem ser partilhados durante
ou após os mergulhos, especialmente se
forem feitos mergulhos sucessivos, isto é,
mergulhos em que seja necessário considerar o Nitrogénio absorvido em mergulho(s)
anterior(es) para o cálculo dos limites não
descompressivos.
Cumpridas estas regras, embora nunca
exista risco zero, pode considerar-se o mergulho recreativo praticado de acordo com
as tabelas disponibilizadas pelas principais
agências de certificação internacionais ou
os computadores disponíveis no mercado,
muito seguro, sendo o risco de ocorrência
de incidentes descompressivos muito baixo. Ainda assim é importante ter consciência que este risco nunca é nulo e será tanto
maior quanto mais perto dos limites indicados se mergulhar.
Não procurando ser demasiado exaustivo, pretendi com esta crónica associar a
teoria da Doença de Descompressão a
questões práticas ligadas ao Mergulho Recreativo, referindo as mais importantes considerações que cada mergulhador deve ter
para mergulhar em segurança e disfrutar,
sem preocupação, das suas imersões em
lazer.
*
[email protected]
ESPECIALISTAS EM
SOLUÇÕES DE COMANDO
E CONTROLO DE
OPERAÇÕES MARÍTIMAS
www.xsealence.com
Monitorização, Controlo e Vigilância Marítima | Gestão Integrada das Pescas | Coordenação de Missões de Fiscalização
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
83
84.O Ano
Mar, Sol e Vento: Acelerar a Expansão
da Energia Renovável Offshore
por Ana Brito e Melo, Francisco Correia da Fonseca*
oje, o consumo anual de eletricidade a nível mundial ronda os 21,000
TWh, estimando-se que este valor
venha a duplicar até 2050.
De forma a atingir as ambiciosas metas
de redução de emissões de gases de efeito de estufa e alcançar uma economia de
carbono zero, a União Europeia reconhece, na sua estratégia a longo prazo “Um
Planeta Limpo para Todos”, o papel fundamental das tecnologias renováveis offshore. Apenas para a energia eólica offshore,
as projeções indicam que até 2050, a capacidade instalada irá aumentar entre 10 a
20 vezes, relativamente aos valores atuais.
Contudo, este crescimento das energias
renováveis offshore exigirá avanços consideráveis no que diz respeito à eficiência,
confiabilidade, escalabilidade, sustentabilidade, circularidade e custos dos sistemas.
Tendo sido recentemente aprovado pela Comissão Europeia, o projeto europeu
EU-SCORES propõe responder ao desafio da expansão a grande escala da produção de energia renovável em alto mar
através de parques híbridos. O projeto tem
como objetivo demonstrar, à escala real,
a complementaridade de diferentes fontes
de energia renováveis offshore – ondas,
eólica e solar – proporcionando aumentos
de fiabilidade e promovendo o amadurecimento das tecnologias de energia das
ondas e fotovoltaica offshore, em conjunto
com o eólico flutuante.
A abordagem seguida neste projeto,
cobrindo o planeamento, desenvolvimento, instalação e operação de parques híbridos, permitirá avaliar diferentes aspetos
de natureza técnica, socioeconómica,
ambiental e legal destes parques em alto
mar. As principais vantagens e desafios
serão quantificados, nomeadamente relativamente ao efeito de equilíbrio da rede
elétrica (contribuindo para o fornecimento
de energia elétrica de uma forma segura
e a custos competitivos), à inovação nas
estratégias de inspeção, manutenção e
monitorização ambiental, tal como a nível
das cadeias de fornecimento, dos impactos socioeconómicos nas comunidades
locais e nos desafios regulatórios gerais.
O consórcio reúne 17 parceiros industriais e académicos europeus, incluindo os
principais fornecedores de energia das ondas e tecnologia solar fotovoltaica flutuan-
H
84
te (CorPower Ocean e Oceans of Energy).
Em Portugal, conta com a participação
da EDP LABELEC, do INESC TEC e do
WavEC, sendo que este último irá liderar
tarefas relativas ao estudo da manutenção dos parques híbridos, entre outras. O
projeto é coordenado pelo Dutch Marine
Energy Centre e conta com um orçamento
global de 46 milhões de euros, financiados
pelo programa europeu Green Deal em 35
milhões de euros. Grande parte da atividade de demonstração decorrerá em duas
zonas geográficas: na costa portuguesa e
no Mar do Norte.
Este projeto mereceu o seguinte comentário de Francisco Correia da Fonseca, Engenheiro Sénior no WavEC … hoje
é claro que a transição energética a nível
global passará pela exploração eficiente e
sustentável do oceano, possivelmente o
recurso mais importante em Portugal. O
projeto EU-SCORES apresenta uma excerevistademarinha.com
lente oportunidade para demonstrar conceitos inovadores que poderão alavancar
a indústria renovável offshore na Europa e
em Portugal.
SOBRE O WAVEC:
O WavEC - Offshore Renewables é uma
organização privada sem fins lucrativos
com vasta experiência em I&D na área da
engenharia dos oceanos, com a missão
de desenvolver soluções sustentáveis para a economia azul através da inovação,
transferência e disseminação do conhecimento. O WavEC é líder na prestação
de serviços profissionais de engenharia e
consultoria na área das energias renováveis marinhas, aquacultura offshore e engenharia dos oceanos.
* https://www.wavec.org/
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
84.O Ano
Criatividade e versatilidade
ou uma “surpresa” a 1/700
por Rui Matos*
em Torres Vedras(1). Fruto destes contactos
e com a necessidade de inovar, apostaram
nas várias vertentes do Modelismo, sendo
uma delas os jogos de guerra/estratégia. E
porque menciono isto? Porque este trabalho foi a adaptação e melhoramento substancial de uma destas peças dedicadas aos
jogos de guerra para uma representação
mais fiel e enquadrada num cenário, como
se de um qualquer kit se tratasse.
A base deste trabalho foi um dos navios
que compõem o starter set da série “Master & Commander” da Warlord Games(2). Irei
apenas mencionar o trabalho desenvolvido
nesta fragata, dado que a caixa ainda contém mais duas fragatas, seis brigues e mais
uma série de complementos para realizar
um jogo de guerra básico entre Ingleses e
Franceses.
mbora já tivesse sido mostrado na
reportagem feita sobre a XXIV Exposição Anual da Associação de Modelismo de Almada (RM 1018) chegou a altura
de explorar um pouco mais este diorama da
autoria de João Mota.
Conhecendo o autor quase desde o início deste século, ele sempre ficou fascinado
com os trabalhos à escala 1/700 apresentados nos eventos modelísticos, desde a
minúcia dos detalhes e pormenores, à possibilidade de uma narrativa de uma história
apresentada num curto espaço físico, com
a representação de vários tipos de cenários
náuticos – e sempre disse que um dia iria
experimentar “uma coisa destas”.
A vida dá muitas voltas e passados uns
anos, o João e a sua esposa Carla, decidiram arriscar abrindo uma Loja de Modelismo
E
86
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Modelismo
Como uma das suas primeiras aventuras náuticas, o João Mota pegou numa
das fragatas Inglesas contruiu-a, pintou-a
como qualquer outro dos seus modelos,
mas substituiu os brandais (que no kit vinham impressos em acetato transparente)
por uma rede cortada e adaptada, perfurou as bocas-de-fogo das peças de artilharia, manteve todo o velame recolhido
(havia a opção das velas enfunadas, o que
neste caso não se aplica, dado que o navio
está fundeado), e colocou um massame
muito genérico e simples – só para dar a
ideia. Acrescentou mais alguns detalhes,
como os remos da embarcação, adaptou figuras genéricas em fotogravação,
acrescentando-lhes volume e pintando-as
de acordo com as suas necessidades (Oficiais, Marinheiros, Fuzileiros Navais). No
cenário, a criação da praia e a sua vegetação, com as palmeiras feitas de raiz, a zona de rebentação, com recifes, rochedos
e a suave transição de um azul profundo
para transparente, levam-nos de imediato
às memórias de praias desertas e paradisíacas – muito apropriado a estes tempos
de férias.
A minha descrição é breve, mas deixo-vos algumas imagens deste “HMS SURPRISE - Far side of the World” do João
Mota, que revela que, com algum esforço,
paciência e dedicação se consegue fazer
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
um trabalho apelativo e fora do vulgar. Não
sendo um modelista novato, mas com este
a ser um dos seus primeiros trabalhos a esta escala e nesta temática, há espaço para
melhorias – o truque é … persistir!
Muitos Parabéns João!
BONS MODELOS!
*
[email protected]
· revistademarinha.com
NOTA:
O autor não tem quaisquer interesses comercias ou outros, relacionados com a loja de modelismo referida nesta crónica.
REFERÊNCIAS
(1) https://www.facebook.com/linhasdetorresmodelismo
(2) https://eu.warlordgames.com/collections/
black-seas/products/master-commander-starter-set
87
84.O Ano
Jogos Olímpicos de um
país à beira-mar
por António Peters*
Melhor ciclo olímpico de Portugal.
Medalhas foram quatro: uma de ouro,
outra de prata e duas de bronze.
Talvez o futuro da preparação exaustiva desportiva venha a ser equacionado em parâmetros mais humanos e em
consonância com os limites da aptidão
física e mental.
Nos últimos 60 anos na Vela, Portugal
só conseguiu uma medalha de bronze?
O que falha?
O Governo já prometeu melhores ajudas financeiras para o próximo ciclo.
uma modalidade faz sobressair o mais
apto, não só entre os países como entre
atletas do mesmo país, enquanto a presença nos JO é sempre uma escolha da
responsabilidade da tutela da modalidade
de um país e com presença limitada às vagas disponibilizadas. Seja como for o expoente da vida de um atleta é a presença
numas olimpíadas, e o apogeu a conquista
de uma medalha. A medalha olímpica é
sempre o objectivo mais ambicionado e
recordado.
inevitável a alusão ao acontecimento que marca o palco mais visionado
do mundo desportivo. É ele, por excelência, a realização dos Jogos Olímpicos
(JO), a referência de aferição do melhor
entre os melhores, mesmo que possa não
ser o critério mais “fidedigno” de avaliação,
pois qualquer campeonato do mundo de
É
88
revistademarinha.com
2020, melhor, 2021 foi um ano sui generis pelas indecisões e atribulações provocadas pela pandemia COVID 19, sendo
imprevisível até à última hora a realização
dos JO. Contudo realizaram-se com os
habituais acontecimentos mediáticos marcantes, tanto no campo desportivo como
no de análise comportamental da conduta da preparação do apelidado desporto
amador. O exemplo marcante que fica para
a história de Tóquio 2020 foi sem dúvida a
coragem de Simone Biles ter desistido da
sua final individual geral de ginástica, atitude que surpreendeu o mundo desportivo e
espantosamente não foi encoberto com a
tentativa de camuflar a verdade assumida
pela atleta. Talvez o futuro da preparação
desportiva venha a ser equacionado em
parâmetros mais humanos e em consonância com os limites da aptidão física e
mental. Aguardemos o futuro breve.
Como vai sendo peculiar, os factos po· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Desportos Náuticos
líticos fazem também parte do cardápio
olímpico e Tóquio 2020 não foi excepção,
desde atletas coagidos pelos seus próprios
países a regressarem, até a ameaças a outras penalizações, o que começa a ser um
hábito encoberto, sustentado na defesa de
interesses “patrióticos”. Para além disso,
intensifica-se e banaliza-se o exemplo das
“transferências futebolísticas”, pela cada
vez mais constante formalização de cidadania, dissimulada no chavão da globalização/internacionalização/integração de
atletas de diferentes nacionalidades/raças/
origens a protagonizarem o simbolismo da
bandeira de outras pátrias(1).
Para além destas já “normais” vicissitudes, outras interrogações começam a surgir no contexto da presente generalizada
globalização. Perguntamos, haverá razão
na existência de recordes intercontinentais (europeu, americano, africano, etc) ou
mesmo nacionais, quando a integração humana é já um facto adquirido em todos os
estados, mais ainda nos países que conseguem oferecer melhores condições aos
atletas de origem em países menos desenvolvidos economicamente?
Sim, porque se tomarmos bem atenção,
essas circunstâncias só se verificam nas
modalidades mais propícias ao aproveitamento das aptidões genéticas e geográficas que se adaptam ao meio ambiental
onde os indígenas são originários, normalmente aptidões genuínas, como é o caso
na modalidade atletismo. Bom exemplo
disto verificou-se na queda do recorde
mundial do triplo salto feminino, protagonizado pela venezuelana Yulimar Rojas, na
marca de 15,67 m, que os especialistas
consideram que se a atleta possuísse as
adequadas técnicas de execução, a marca
ainda mais espantosa seria.
Algum país consegue motivar nadadores
americanos ou de países similares a correrem pela sua bandeira? Dá que pensar!
Portugal compareceu em Tóquio com
92 atletas divididos por 17 modalidades,
com um investimento global de 18,55 M€
(2017-2021). Esperavam-se duas medalhas e 12 diplomas, os resultados superaram as previsões, medalhas foram quatro:
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
uma de ouro, outra de prata e duas de
bronze. O mérito reparte-se pelo próprio
Comité Olímpico de Portugal, federações,
clubes e principalmente pelos atletas intervenientes. Foi um ciclo olímpico acima das
expectativas, dos resultados ambicionados. Parabéns aos intervenientes. O melhor
ciclo olímpico de Portugal.
Particularizando e analisando as modalidades da nossa especialidade náutica, dos
92 atletas presentes a Tóquio, 25 pertenciam à náutica, ou seja mais de 25% da
comitiva, as modalidades foram cinco (Canoagem, Natação, Remo, Surf e Vela), 30%
das modalidades. Resultado, traduziu-se
numa honrosa medalha, correspondente
também a 25% do espólio de medalhas
alcançado por Portugal.
O mérito da prestação foi de Fernando
Pimenta em K1 1000, facto que vaticinámos como alcançável e merecido pelo seu
magnífico ciclo de preparação e excelentes êxitos conquistados ao longo destes 5
anos, confessamos que o ouro estava no
horizonte possível, as suas marcas e trabalho o previam. Pimenta, após uma anterior
medalha de bronze em Londres, transportava o trauma da medalha merecida e não
atingida no Rio 2016, a vingança e o trabalho acumulado desta vez eram merecedores do ouro, mas não o alcançou, honrou
com bronze. Obrigado, Fernando Pimenta,
obrigado COP, obrigado Victor Félix(2) e toda a sua equipa da Canoagem, a comunidade náutica agradece pela dignificação
feita ao Mar de Portugal, por este não ficar
completamente ignorado.
Após este marco de realce no desporto olímpico português, o Governo, através
dos responsáveis do Ministério da tutela, já
prometeu melhores ajudas financeiras para
o próximo ciclo. Que se cumpra a promessa, nós acreditamos que a actual liderança
do COP a sabe usufruir e aplicar. Por curiosidade, o governo do Reino Unido após o
excelente comportamento da sua comitiva,
que se destacou como o 4º país da tabela,
melhor que na prestação dos seus JO de
2012 em Londres, já prometeu £232 milhões de investimento para Paris 2024. Dá
que pensar!
· revistademarinha.com
Em tom de balanço e esperança no
futuro, deixamos o pedido da vossa ponderação para uma reflexão sobre algumas
considerações:
– Porquê, sendo Portugal um país à
beira-mar, sendo o país bastião dos Descobrimentos e detentor de um passado
que floresceu com o desenvolvimento da
sua litoralidade, como foram as indústrias
navais, frotas comercias, pescas, turismo e
outras tantas actividades com relação próxima à sua geografia, onde a náutica complementa essa proximidade, porque nos
deixamos atrasar quando fomos pioneiros?
– Porquê, se é sabido que o desporto
já vinga como sendo um dos melhores
embaixadores promocionais de um país,
e Portugal é um país náutico, porque não
utiliza essa sua mais-valia para mais se afirmar?
– Porquê nos últimos 60 anos de uma
modalidade carismática como a Vela, Portugal só conseguiu uma medalha de bronze? O que falha? Dá que pensar!
Nós, Revista de Marinha pela idoneidade adquirida da sua vivência, para além
de pensar, aguardamos acções que vão
ao encontro de soluções para um melhor
desporto. Ganha o país, ganha o Mar de
Portugal. Que os ventos soprem de feição!
*
[email protected]
NOTAS:
(1) O autor faz referência à situação sem qualquer juízo de valor discriminatório ou reprovativo, somente cita a circunstância pela “ordem
do dia” que foi referida pela comunicação social
nacional e internacional e pelas reações consequentes vindas a lume no país, por atletas e
organizações intervenientes responsáveis, que
muito bem foram clarificadas e devidamente
reprimidas pelo organismo de tutela, o COP.
Coragem que se aplaude, e congratula-se por
haver testemunho na reposição dos valores intrínsecos desportivos e patrióticos. Obrigado,
José Manuel Constantino!
(2) Presidente da Federação Portuguesa de Canoagem
OBSERVAÇÃO:
O autor não cumpre o novo Acordo Ortográfico.
89
84.O Ano
Era uma vez...
por Augusto Salgado*
Uma das maiores peças
de artilharia do naufrágio,
com cerca de 3 m
de comprimento (foto do autor).
bordo do navio mercante britânico
BLACK HAWK, avistavam-se as luzes de Lisboa, capital do Reino de
Portugal, cujo apoio a Inglaterra era fundamental para fazer frente ao terrível “corso”,
que tinha colocado a Europa numa guerra
global.
No porão do navio iam, para além de
duas dezenas de peças de artilharia em
ferro, a maioria de grande calibre, também
muitos milhares de pelouros de ferro, fundamentais para manter em operações no
mar os navios britânicos e reforçar as defesas do porto de Lisboa. No entanto, toda
essa pesada carga, apesar de se encontrar bem arrumada no interior do navio, tornavam o navio muito pouco manobrável. E,
A
90
o facto de, ao largo da costa de Portugal,
também ter sido fustigado durante vários
dias por mar alteroso, que tinha provocado
várias entradas de água no porão, não facilitava a manobra do navio.
Apesar da proximidade da salvação, o
desânimo de terem visto ao longo de uma
extensa língua de areia, a Norte da Figueira
da Foz, 32 dos seus infortunados companheiros de viagem encalhados em terra,
dos 68 que tinham largado em finais de
março de 1804, incluindo também a fragata HMS APOLLO, parecia que tornava a
situação ainda mais complicada.
Perto do meio do dia, e com o vento
a soprar fresco de Norte, o navio cruzou
as proximidades da vila de Cascais, avanrevistademarinha.com
çando pela denominada barra do Canal do
Norte, com terra a bombordo e o banco de
areia a Sul, habitualmente denominado de
Cachopo Norte.
Infelizmente, e apesar de ser início de
abril, a força do vento aumentou e começou a empurrar o navio em direção a
Sul e ao banco de areia. De imediato, o
navio largou duas das suas âncoras para
tentar aguentar a posição, mas a força da
amarra, no já danificado casco do navio,
provocou mais entradas de água, e o navio acabou por se afundar. Felizmente, o
acidente foi visto de terra e todos os tripulantes foram salvos por pequenas embarcações ou chegaram a terra pelos seus
próprios meios.
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Património Marítimo
Um conjunto de peças “arrumadas” a meio-navio (foto do autor).
Esto “conto” poderia ter sido, perfeitamente, a história do navio cujos destroços
a equipa do SUNK (Naufrágios Modernos
da Barra do Tejo), que integra o Município
de Cascais, a Marinha e a Autoridade Marítima Nacional, a Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas da Universidade Nova
de Lisboa e a Direcção-Geral do Património Cultural, guiados pelos dados do Projeto COSMOS da APA, financiado pela UE,
localizou a cerca de uma milha da costa
de Cascais, mais concretamente na zona
da Parede, logo no início da campanha de
2021.
Num fundo de areia, a cerca de 12 m
de profundidade, e apesar da má visibilidade, os mergulhadores puderam identificar, de imediato, cerca de uma dezena
de canhões de ferro, “arrumados” a meio
navio, e depois grandes concreções. Essas concreções, que tinham espaços entre
elas, como se inicialmente tivesse havido
algo que as tinha mantido separadas, mais
tarde percebeu-se que eram constituídas
por milhares de pelouros, ou projéteis de
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
Uma vista das concreções
composta por pelouros
(balas) de ferro; (foto do autor).
artilharia, em ferro. Os espaços vazios
eram onde, inicialmente, se encontravam
as anteparas do navio que, por serem de
madeira, entretanto desapareceram.
Até este momento, não foi possível encontrar qualquer objeto que permita avançarmos, sequer, com uma hipótese sobre
de que navio se trata ou de que época. No
entanto, as peças de artilharia indiciam a
possibilidade de se tratar de um navio da
denominada época Napoleónica.
Mas, voltamos a frisar, neste momento
· revistademarinha.com
são tudo suposições, como é a “estória”
que inicialmente vos contámos...
Como qualquer trabalho científico, ainda
há um longo percurso a realizar, quer em
termos de investigação nos arquivos, quer
em termos de pesquisa subaquática.
Naturalmente que manteremos os leitores da RM a par da evolução das nossas
investigações.
* Oficial da Armada e Investigador
do CH e do CINAV
91
84.O Ano
A AÇÃO NAVAL E DIPLOMÁTICA PORTUGUESA
NA GRANDE CRISE DA CHINA (1925-28)
O livro cativa o leitor desde o início. Escrito numa prosa fácil, elegante e muito clara, meticulosamente documentada, faz
transparecer no autor, o Prof. Doutor João Freire, o homem das
ciências exatas, o Oficial de Marinha, por detrás do eminente Sociólogo.
A ação decorre principalmente no imenso e lodoso delta do
Rio das Pérolas, cujos escolhos emersos lhe dão o nome, onde
a Marinha de Guerra Portuguesa teve um papel determinante no
relacionamento de Macau com os chineses da Província de Cantão, desde que os portugueses ali se estabeleceram em 1557. O
autor leva-nos a compreender a complexidade da teia de interesses em presença no Extremo-Oriente, na sequência das duas
“Guerras do Ópio” entre uma
China Imperial debilitada e as
potências navais, que duraram
nove anos, terminando a última
no início da segunda metade do
Século XIX, gerando os profundos agravos sentidos pelo País
do Meio, que designou por “Tratados Desiguais” o de Nanquim,
que cedeu Hong Kong ao Reino Unido e o de Tientsin e, em
1862, o “Tratado de Amizade e
Comércio Sino-Português”, que
viria a ser renegociado em 1928,
ratificado em 1930 e mais tarde
alterado. Como muito bem documenta o autor, estes acontecimentos geraram no dealbar do
Século XX a revolta dos Boxers,
a oposição à presença dos estrangeiros nas Concessões, potenciando a cultura e identidade
chinesas e o surgimento em torno da Província de Cantão, do
Movimento Político Nacionalista, anti-imperialista, Kuomitang,
liderado por Sun Yat Sen, que
viria a ser o primeiro Presidente
da República da China (residiu
em Macau, onde a sua casa
está preservada). O autor não
deixa de referir o importante papel desempenhado pela extinta
União Soviética no apoio à instauração do regime comunista
na China.
No período em análise (1925-28), durante a intervenção naval das Potências Ocidentais na China, entre as quais Portugal,
para garantir a segurança dos seus nacionais, o autor consegue
entremear habilmente as descrições da atuação dos Governadores de Macau, dos diplomatas portugueses em Cantão, Pequim,
Xangai, Hong-Kong, Londres e Washington, com as dos Comandantes dos navios de guerra portugueses na área, também eles
exercendo diplomacia, dos Ministros da Marinha, das Colónias
e dos Negócios Estrangeiros em Lisboa, no conturbado período
politico-financeiro que incluiu a revolta militar de 28 de Maio de
1926, com a posterior subida de Salazar ao poder.
92
Das descrições dos Comandantes das unidades navais e do
Centro de Aviação Marítima de Macau sobre as suas laboriosas
fadigas no período analisado, expressas nos relatórios e nas
apreciações elogiosas que receberam, constata-se não só o seu
patriotismo, elevado nível intelectual e competência profissional
mas também a compreensão da geopolítica e o bom senso e
capacidade de liderança que caracterizaram a sua atuação, conseguindo superar as dificuldades das comunicações, a ausência
de diretivas superiores precisas, as inclemências do clima, as
más condições de alojamento das guarnições, os tufões, a deficiente cartografia disponível, a costa baixa e muito recortada, a
pouca profundidade dos canais navegáveis, a complexidade e a
variação da localização dos baixos provocada pelo acentuado
assoreamento no delta.
Decorrido quase um século
desde o período relatado no
interessantíssimo livro de João
Freire, constata-se hoje que a
Superpotência Asiática emergente recuperou quase totalmente a sua face e, no Mar do
Sul da China, parece querer
impor unilateralmente os limites do Mar Territorial segundo
“a linha dos nove traços” que
definiu, aparentemente à revelia
da Convenção da ONU sobre o
Direito do Mar e dos interesses
dos Estados vizinhos. Afigura-se querer regressar à época
de Grotius, quando a largura
do mar territorial de um Estado
correspondia ao alcance das
armas. Atualmente, no Mar do
Sul da China a situação enfrentada pelas Potências Marítimas
Ocidentais é agora muito diferente do que a descrita nos
idos de 1925-28. A China, além
de ser uma Potência nuclear e
espacial, dispõe de significativo
poder aeronaval, embora não
tenha experiência de combate
no mar.
Hoje, a Marinha Portuguesa
não tem responsabilidades de
segurança no Extremo Oriente, mas, tal como sucedeu no período descrito no livro, continua a ser um instrumento indispensável
para a ação externa do Estado, quer na defesa dos cidadãos e
interesses nacionais, como aconteceu na Guiné-Bissau (1998),
quer no combate à pirataria marítima, agora na Somália e no Golfo da Guiné. Evidentemente, Portugal tem de continuar a modernizar os meios navais, privilegiando o seu “duplo uso”.
Esta obra tem um preço de capa de 15€ e está à venda em
Lisboa na Loja do Museu de Marinha tel 93 531 8996 / 21 097
7387, e-mail
[email protected] .
José Manuel Nobre de Carvalho
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Escaparate
REVISTA MILITAR
Trata-se de uma revista muito antiga, fundada em 1848, de
periodicidade mensal. É editada pela firma “Revista Militar”, que
tem como sócios oficiais das Forças Armadas e da GNR e cujos
corpos gerentes são encabeçados pelos Generais Luís Valença
Pinto (Assembleia Geral), José Luís Pinto Ramalho (Direção) e
Major-General Luís Augusto Sequeira (Conselho Fiscal).
Os temas tratados incluem a Estratégia, as Operações, a Logística, a História e as Relações Internacionais, sendo militares a maioria
dos autores. A tiragem são 600
exemplares, relativamente reduzida,
embora os seus leitores sejam a elite
das Forças Armadas e os dirigentes
políticos que se interessam pelos temas de Defesa Nacional.
O exemplar que comentamos, referido a jun / jul de 2021, abre com
um editorial, assinado pelo seu Diretor, General Pinto Ramalho. Aborda
a cimeira da OTAN, de 14 de junho
(Bruxelas), onde o Presidente Joe
Biden reafirmou o seu empenho na
Aliança, classificando a Rússia como
a principal ameaça e elegendo a China como o principal desafio sistémico
de caracter económico e tecnológico. Pinto Ramalho referiu-se igualmente à aprovação pela Assembleia
da República da nova estrutura superior das Forças Armadas (FA’s), em
25 jun, discordando da forma … a
tónica foi sempre a urgência e o procurar silenciar opiniões críticas, e do
seu conteúdo.
Seguem-se 9 textos de autor, dos
quais 8 se referem à reforma da estrutura superior das FA’s, escritos
por Oficiais-Generais da Força Aérea
(3), Exército (3) e Armada (2). Sem estranheza, são todos críticos
da reforma a que aludimos, pois não temos conhecimento de nenhuma posição favorável de militares a esta reforma; na comunicação social foi indicado que um antigo CEMGFA seria favorável,
mas não se conhece nenhum seu escrito recente nesse sentido.
Uma referência breve aos 2 textos de marinheiros, “Custa a
crer …”, do V/Alm Reis Rodrigues e “A Reforma das Forças Ar-
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
madas – outra perspetiva”, do V/Alm Monteiro Montenegro. Reis
Rodrigues, num escrito curto e assertivo, refere-nos que … custa
a crer que se tente avançar com uma reforma que ignora estes aspetos básicos do funcionamento da Instituição Militar e se
baseia numa análise muito parcial das situações existentes em
alguns países aliados e amigos. Por outro lado, Monteiro Montenegro analisa a oportunidade e a metodologia adotadas, de que
discorda. E conclui referindo … porque o calor do debate público está a
pender para juízos mais emocionais
do que racionais, consideramos que
o mais prudente seria que o processo parlamentar desse tempo para
promover um debate alargado, franco e construtivo. Sabemos hoje que
não foi assim, com a promulgação da
legislação em apreço pelo Presidente
da República.
Um artigo adicional, “200 anos da
morte de Napoleão Bonaparte (15
ago 1769 – 5 mai 1821)”, assinado
pelo Dr. Pedro Avillez, recorda-nos
os traços biográficos e a obra da personalidade mais abordada na literatura depois de Jesus Cristo.
Diplomado em Ciência Política e
em Sociologia Económica (Sorbonne), diplomado pela ENA, Pedro Avillez conhece bem a cultura francesa.
Recorda-nos que … em França, da
saga criativa napoleónica ficaram as
bases da reorganização racional e
elítica do Estado francês, que ainda
hoje perduram.
A fechar, o longo comunicado da
Cimeira da OTAN de Bruxelas, reproduzido na integra, em língua inglesa.
Esta revista pode ser adquirida em
número avulso (7€), ou objeto de assinatura anual com o custo
simbólico de 10€ (militares) ou 15€ (civis). Aos interessados indicamos os contactos da redação, tel 21 887 0754, e-mail rm@
revistamilitar.pt, endereço postal, Campo de Santa Clara, nº 62,
1100-471 Lisboa.
A.F.
93
84.O Ano
FUZILEIROS
400 ANOS DE MEMÓRIAS
Os autores desta obra são Paulo Santos e José Manuel Cabrita.
Paulo Santos é licenciado em Ciências Políticas pela Faculdade
de Ciências Económicas e Sociais da Universidade de Genebra e
possui várias pós-graduações. É membro efetivo da Academia de
Marinha. Desde 2004 tem-se dedicado ao estudo da iconografia,
pintura e simbologia naval. É também autor de vários livros sobre
temas navais como sejam “O Botão de Âncora da Marinha Portuguesa”, “Espadas e Sabres da Marinha Portuguesa” e mais recentemente “À mesa com a Marinha”. José Manuel Cabrita possui
formação na área do design gráfico e iniciou-se como desenhador
litógrafo em 1981. A sua relação com a Marinha já conta mais de
20 anos. Foi responsável gráfico de obras do Cte. Manuel Gonçalves como sejam “Creoula-Tradição e Juventude” e “Sagres-símbolo de Portugal”. Com Manuel Gonçalves é também co-autor do
“Armorial da Marinha Portuguesa e Autoridade Marítima Nacional”.
Com o Cte. Rodrigues Pereira executou “Marinha Portuguesa Nove séculos de História”. Com Paulo Santos
colaborou também nas
obras acima mencionadas. É um dedicado colaborador do Gabinete de
Heráldica Naval da Marinha desde 2012.
No passado dia 18
de abril comemoraram-se 400 anos sobre a
data de referência para
a constituição do “Terço
da Armada da Coroa de
Portugal”. Fazendo um
apelo às nossas memórias, pergunto: Quantas
vezes questionamos os
nossos pais e avós sobre
a vida e comportamento
social e profissional dos
que nos antecederam.
Que prazer sentimos
quando fomos conhecedores do comportamento e do desempenho
desses nossos antepassados, por mais humildes que tivessem sido.
Este livro tem, entre outros méritos, o de nos trazer, sobretudo através de imagens, a história desta nossa outra família. A
família militar da Marinha. Da sua Infantaria e dos seus Fuzileiros,
a que muitos de nós pertenceram. O livro contém mais de 600
gravuras e fotografias, coligidas, selecionadas e criteriosamente
organizadas em 272 páginas, segundo as épocas e as diferentes
organizações militares que se foram sucedendo ao longo destes
quatro séculos. Passamos deste modo a ter uma visão muito
mais clara do historial de grandes feitos de armas e, como seria
de esperar, das vicissitudes por que passaram os que antecederam o atual Corpo de Fuzileiros. Houve períodos em que Portugal
não pôde contar com esta componente operacional. Períodos
houve em que a Infantaria Naval esteve ausente. Deixou de existir, foi extinta.
Permitam-me que recorde por exemplo as razões da extinção
94
do Batalhão Naval, organização que em 1837 havia sucedido
à famosa Brigada Real de Marinha. O Duque de Saldanha em
1851, ano da Regeneração, dirige uma carta à Rainha D. Maria II
em que diz, textualmente, e passo a citar:
SENHORA! Existe atualmente o Batalhão Naval com 853 praças das quais pouco mais de um terço se acha a bordo dos
nossos navios, sem se ocupar dos serviços de manobra e sem
instrução específica para o Serviço de Artilharia, o soldado do Batalhão Naval é quase uma praça inútil dentro do navio. Saldanha
afirma ainda … uma tropa com tal organização pode e tem sido
efectivamente um bom Corpo para servir em terra, mas é perfeitamente dispensável para servir a bordo. O Duque de Saldanha,
conclui a sua missiva com algo surpreendente … não é pouco
inconveniente o ciúme natural que se desenvolve a bordo entre o
marinheiro e o soldado, pois sucede que o pré do Batalhão Naval
está quase pago em dia, relativamente ao enorme atraso das
soldadas da marinhagem
que há mais de 6 meses
não recebem um real.
Por razões desta natureza ou parecidas, bem
mesquinhas,
períodos
houve em que as Forças
de Desembarque foram
constituídas apenas por
elementos das guarnições dos navios. Este
livro, em boa hora elaborado, passará a constituir
uma referência importantíssima para a História do
Corpo de Fuzileiros e para a importância da sua
existência.
Sabemos bem que
uma Marinha e a sua
Infantaria não se organizam de um dia para o
outro. Não fora a visão e
a determinação do Almirante Roboredo e Silva
ao criar condições para
que Portugal e a sua Marinha voltassem a ter os seus Fuzileiros e a participação da Marinha no esforço de guerra em África teria ficado tremendamente
diminuída.
Felicito vivamente os autores deste livro pelo conhecimento
muito completo e sistematizado que trouxeram à nossa história.
Está lá tudo quanto é importante saber. Em tempo de pandemia, com deslocações e contactos condicionados, a obra só foi
possível pela tenacidade e determinação dos autores deste livro.
Acredito que esta obra só foi possível porque José Cabrita e Paulo Santos, têm uma grande alma, uma grande alma marinheira.
Esta obra está à venda na sede da Associação de Fuzileiros,
no Barreiro. Poderá também ser solicitada aos autores através
dos e-mails
[email protected] e
[email protected]
; tem o preço de 30€.
José Rocha e Abreu
revistademarinha.com
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Escaparate
NAVEGAÇÃO A VAPOR ENTRE
O CONTINENTE E OS AÇORES
PRIMEIROS TEMPOS
Em recente deslocação à Ilha Terceira
mão amiga ofereceu à RM um exemplar
desta obra, já com uns anos, mas que não
conhecíamos e que merece divulgação;
desde já os nossos agradecimentos ao Alm.
José Filipe Moreira Braga, nosso estimado
assinante e colaborador.
Trata-se de uma edição de autor, de Carlos Ramos da Silveira, nascido na cidade da
Horta, Ilha do Faial, em 1932 e ali residente.
Funcionário da Western Union Telegraph
Company, desde cedo, como hobby, se
dedicou a colecionar fotografias dos hidroaviões que passavam pela baía da Horta.
Posteriormente, investigou também o tema
das comunicações marítimas, recolhendo
informações e materiais diversos, sendo um
autodidata e um investigador reconhecido e
respeitado.
Como refere, com oportunidade, Jorge Costa Pereira no prefácio … profusa e
belamente ilustrada, privilegiando mesmo a
imagem em detrimento do texto, esta obra
constitui um interessante repositório da memória visual sobre os barcos a vapor mais
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
utilizados nas primeiras
carreiras para os Açores,
acompanhada de oportuna
e curta memória descritiva.
O primeiro capítulo
aborda os primórdios da
navegação a vapor no
mundo, assinalando a possível primazia do PYROSCAPHE, que nos fins do
século XVIII navegou no rio
Saône, em França.
Segue-se o segundo
capítulo, focado na navegação a vapor em Portugal, que se iniciou com o navio CONDE DE
PALMELA, em 1820, a que se segue o capítulo “Da União Mercantil à Insulana de Navegação”, que refere os esforços do Ministro
Fontes Pereira de Melo, em 1855, para encontrar um empresário disposto a aceitar a
tarefa da exploração comercial da carreira
regular entre o Continente e os Açores.
No capítulo “Barcos a vapor mais utilizados nas primeiras carreiras para os Açores”
· revistademarinha.com
são-nos
apresentadas
descrições dos navios,
por vezes acompanhadas de lindas aguarelas,
designadamente dos navios DUQUE DO PORTO, DONA ESTEPHANIA,
AÇORIANO,
MINDELO,
ATLANTICO, LUSITANIA e
INSULANO.
Nos capítulos finais
apresenta-se uma cronologia da navegação a vapor
em Portugal, documentação diversa alusiva a estes
temas e uma bibliografia.
Obra de divulgação, com excelente apresentação gráfica, será certamente útil para
quem estude a história da nossa Marinha
Mercante. Parabéns calorosos, ao autor!
Desconhecemos se esta obra se encontra à venda; sabemos apenas que foi publicada em 2014, com uma tiragem de 300
exemplares, impressa na Gráfica “O Telegrapho”, da cidade da Horta.
95
84.O Ano
A PIRATARIA MARÍTIMA
Trata-se de uma obra de David Vasquez
Barros, jurista e Mestre em Direitos Humanos, com o esclarecedor subtítulo “O seu
regime jurídico e problemas atuais”.
Para muitos de nós, nos finais do século XX a pirataria era algo do passado,
que ocorrera até aos princípios do século XIX, e que surgia, por vezes com contornos românticos, em filmes de ação de
Hollywood. Foi com surpresa que na passagem da primeira para a segunda década do século XXI fomos despertados para
este fenómeno nas costas da Somália e
no Golfo de Aden, afetando diretamente
a linha de comunicações marítimas que
liga o Oriente ao Mediterrâneo pelo canal
de Suez e por onde passa cerca de 1/3
do comércio mundial. Esta situação levou
diversos países, isoladamente ou agrupados em alianças, a movimentar meios
aeronavais para proteger a sua navegação
naquela área; Portugal foi um deles.
Entretanto a situação na Somália acalmou, não havendo notícia de incidentes de
pirataria há muitos meses; mas agravou-se
no Golfo da Guiné, onde é endémica, uma
área rica em ramas de petróleo e onde
Portugal se abastece de gás natural, e afe-
tando diretamente alguns países da CPLP,
como S. Tomé e Principe, a Guiné Equatorial, Angola e Cabo Verde.
A obra em apreço aborda a fragilidade
do atual regime jurídico face ao crime de
pirataria marítima, revelando também as
várias indefinições existentes a propósito
deste crime na ordem jurídica da comuni-
dade internacional. É reservado um capítulo para a situação verificada na Somália e
para os moldes em que ali foi legitimado o
recurso à força armada.
O texto em apreço tem por base uma
dissertação de Mestrado defendida publicamente na Universidade do Minho em
dezembro de 2011, atualizado e publicado
recentemente, em abril de 2021, com a
chancela da Editora Booksfactory.
Em nossa opinião deverá ser considerado um texto de referência para quem aborde estes temas por razões profissionais,
caso dos Oficiais da Armada e da Marinha
Mercante, ou para quem por quaisquer
outras razões se interesse pelo shipping,
pelo comércio marítimo ou pela segurança
nos mares.
A Revista de Marinha endereça sinceros parabéns ao Mestre David Barros
pela sua obra, que consideramos muito
útil, e bem fundamentada em profícua e
meritória investigação.
Este livro custa 18€ e encontra-se à
venda na Loja do Museu de Marinha e na
loja online do Clube dos Amigos do Livro.
Juntam-se os contactos do autor, e-mail
[email protected], t/m 96 543 3561.
REVISTA AGEPOR
É a revista da AGEPOR – Associação
dos Agentes de Navegação de Portugal,
de edição bimestral e distribuição gratuita,
com apenas 10 páginas, compartilhando
a mesma edição com a APAT – Associação dos Transitários de Portugal (38 pgs)
e com a Ordem dos Despachantes Oficiais
(4 pgs). De um lado está a revista AGEPOR, do outro a revista APAT, e entre estas duas, as 4 curtas páginas da Ordem
dos Despachantes. Afigura-se-nos que é
uma colaboração que faz sentido, pois são
associações afins, do âmbito do shipping,
das cargas e dos portos. Contudo …
O exemplar que comentamos, o nº 69
referido a mai / jun de 2021, abre, como é
usual, com um editorial assinado pelo Dr.
João Silva, Presidente da Direção Nacional
da AGEPOR. Com o título “Uma nova forma de comunicar” diz-nos que … chegou
a hora de inovar e apostar em novas formas de comunicar. Neste seu último editorial, pelo menos neste formato, explica os
fundamentos desta decisão que passam
pela evolução tecnológica e pela necessidade de conteúdos mais dinâmicos e mais
adaptados às necessidades dos associados e dos stakeholders.
96
Segue-se uma interessante e oportuna entrevista relativa ao setor dos navios
de cruzeiro, um dos mais afetados pela
pandemia, com Eduardo Cabrita, representante da CLIA – Cruise Line International Association, Catarina Rawes (James
Rawes), Cátia Esteves (Transinsular /
revistademarinha.com
Madeira) e Américo Nunes (Bensaúde).
Embora 2020 tenha sido um ano muito
complicado, há esperança numa retoma
com início já neste ano.
Pedro Carvalho Esteves, advogado maritimista, colaborador residente, no texto
intitulado “Hora de levantar ferro … e até
já …” traz-nos as suas reflexões no âmbito do mar e das leis; entre outros aspetos,
sugere a criação de um Tribunal Arbitral.
Por fim João de Sousa Magalhães, também colaborador residente, analisa o tema
“DDP – o incoterms problemático?” de um
ponto de vista prático, chamando a atenção aos importadores para aspetos que se
podem revelar verdadeiras armadilhas.
Em síntese, uma revista com um espaço
gráfico limitado que, talvez por isso, seleciona com particular cuidado os textos que
publica, certamente de muito interesse para
os associados da AGEPOR, mas também
para quem entre nós se movimenta na área
do shipping. Uma revista que nos habituamos a ler na integra e que vemos desaparecer com muita pena. Vamos ter saudades!
À sua direção e aos seus colaboradores os nossos sinceros parabéns pela obra
realizada! Bem hajam!
· 1023 Setembro/Outubro 2021 · Revista de Marinha
Arquivo Histórico
A Revista de Marinha
há mais de oitenta anos… nº 77
este número comentamos a revista nº 77, relativa a 31 de
março de 1940. A II Grande Guerra levava já mais de seis
meses, mas a frente ocidental permanecia calma – a drole de guerre – a calma que antecedeu a blitzkrieg de mai / jun
que levou à invasão da Holanda
e da Bélgica e à capitulação da
França.
Na capa uma foto do Cte.
Henrique Tenreiro e uma citação
“nacionalista” do seu discurso no
… grande almoço de homenagem que lhe foi oferecido, a que
nos referiremos mais à frente.
A abrir a “crónica da guerra no
mar”, assinada por um enigmático CFrag X e intitulada “A insidia
submarina”. Neste texto analisa-se o efeito das minas e dos torpedos lançados por submarinos,
armas consideradas censuráveis. É feita uma comparação entre os quatro primeiros meses de
guerra no mar deste conflito com
o período homologo da I Grande
Guerra, constatando-se que a
tonelagem comercial afundada
é menor, verifica-se mesmo que
são os navios mercantes neutros
que mais tem sofrido. A eficácia
da organização dos comboios e
das suas escoltas é muito valorizada, afirmando-se que em cada
750 navios escoltados só um se
perdeu. Veremos que mais tarde, com as táticas de “matilha”
dos submarinos, não será assim.
Na “crónica internacional” Francisco Velloso aborda a situação
da Finlândia, forçada a uma capitulação frente à URSS, face à falta
de apoio dos países nórdicos e dos aliados; de assinalar que a Noruega, a Dinamarca e a Suécia não teriam permitido a passagem de
tropas e de material através do seu território para apoiar a Finlândia.
N
Revista de Marinha ·
1023 Setembro/Outubro 2021
· revistademarinha.com
A justa homenagem, o banquete em honra do Cte. Henrique
Tenreiro é objeto de uma reportagem ilustrada de 5 páginas!
Henrique Tenreiro esteve doente no início do ano de 1940 e
para celebrar o seu restabelecimento alguns amigos promoveram um almoço que redundou
num banquete com 470 convivas – incluindo uma delegação
da RM – e presidido pelo Ministro do Comércio e Indústria,
Dr. Costa Leite. Presentes delegações de pescadores e muitos discursos, do representante
dos armadores da pesca, das
Federações do Remo e da Vela,
do Prior da Caparica, dos Sindicatos da Marinha Mercante
e até do Presidente do Centro
Espanhol. Terminado o almoço
o Comandante Tenreiro esteve
durante meia hora a receber os
abraços de todas as pessoas
que assistiram à grande manifestação.
Uma notícia ilustrada dá-nos
conta da nomeação do C.m.g.
Álvaro de Freitas Morna para
Comandante da Flotilha Ligeira,
a bordo do navio-chefe, o contratorpedeiro N.R.P. DOURO.
Assistiram á cerimónia os Comandantes das unidades que
integravam esta força naval, o
CTen Sarmento Rodrigues, o
novo chefe do estado-maior, e
toda a oficialidade do DOURO.
A fechar, a rubrica “a guerra
no mar – os acontecimentos enumerados e resumidos dia a
dia”, relativa ao período de 20 a 26 de fevereiro; ataques da
aviação alemã a navios e embarcações de pesca, torpedeamentos e alguns afundamentos causados por minas, nada de
muito significativo.
97
84.O Ano
Associação Economia Azul – Unidos pelo Mar
O Oceano em Movimento,
a Cooperação entre Povos
PREÂMBULO
O mecanismo que se pretende implementar tem duas componentes que se
descrevem:
– Realização de “Encontros do Oceano”
– Realização de uma “Conferencia anual
do Oceano em língua portuguesa”
A AEZULMAR – Associação Economia
Azul, foi criada com a missão de reforçar o
conhecimento das potencialidades económicas do Oceano e de dinamizar iniciativas
para melhorar a literacia e cultura marítimas.
Sendo o Oceano uma realidade global,
o fomento da cooperação entre os povos,
é uma das responsabilidades que a Associação se propõe, sabendo que há que ter
sempre em conta a solidariedade e a responsabilidade social, que permita que o Oceano
contribua para o processo de transição para
a Economia Azul, como forma de concretização do ODS 14 (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas) e
o alcance da meta 14.7, particularmente no
que concerne à conservação e utilização
sustentável dos recursos marinhos.
“ENCONTROS DO OCEANO”
A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL
A cooperação pretendida terá sempre em atenção a parte cultural e a parte
económica, e a Associação está já a desenvolver iniciativas de cooperação com
a Costa do Marfim, através de um projeto
denominado “Portugal Marítimo”, devendo
ser replicado noutros países.
A COOPERAÇÃO NO ÂMBITO DOS
PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA
Os “Encontros do Oceano” e a “Conferência do Oceano de Língua Portuguesa”
estão em marcha.
Na CPLP, o Oceano representa um
elemento fundamental a considerar na
definição das políticas públicas, pela
sua importância intrínseca, mas também
pela transversalidade entre este setor e
muitas outras dimensões de desenvolvimento. A “Estratégia da CPLP para os
Oceanos”, é o referencial para a promoção do desenvolvimento sustentável do
espaço oceânico sob jurisdição dos Estados-Membros da CPLP e o instrumento primordial para orientar a cooperação
da Comunidade neste domínio, exigindo
níveis acrescidos de compromisso e uma
gestão orientada para a sua sustentabilidade.
Para os Países de Língua Portuguesa existem razões históricas e concretas
para que a cooperação tenha contornos
próprios, por várias razões. Por um lado,
deverá ser realizada de forma multilateral,
e em torno da língua portuguesa; por outro lado, as questões relacionadas com a
dispersão geográfica e a grande diferença
das economias e das populações, exigem
iniciativas apropriadas e especiais.
Terão uma forma semelhante aos que têm
sido realizados pela AEZULMAR, a nível de
vários municípios em Portugal, e irão ser replicados também em vários municípios dos
Países da CPLP, ajustados às condições
concretas das necessidades de cada um:
– Duração máxima de dois dias
– Apresentações e debates em auditório
sobre temas selecionados
– Envolvimento dos alunos dos grupos
de Escolas locais, fomentando a aproximação ao mar, incluindo sempre que possível
a prática de desportos náuticos
– Mini-feira para apresentação da economia local
“CONFERÊNCIA DO OCEANO DE
LÍNGUA PORTUGUESA”
A realizar de forma rotativa em cada um
dos Países da CPLP, em termos semelhantes aos “Encontros do Oceano”, mas
dando mais relevo à parte económica, ou
seja:
– Realizada anualmente, com um máximo de três dias.
– Apresentações e debates em auditório
sobre temas selecionados.
– Realização de uma feira da economia
do Oceano da CPLP com participação
alargada.
– Elaboração de relatório em site apropriado, criado para o efeito.
ASSINATURA DA REVISTA
Assinando a Revista de Marinha recebe o seu exemplar, em sua casa, a um preço mais
económico. Envie-nos pelo correio um boletim de assinatura, acompanhado de um cheque
ou vale de correio, à ordem da firma “ENN - Editora Náutica Nacional, Lda.”, ou faça uma
transferência bancária para o nosso NIB no Banco Montepio 0036 0063 9910 0073 855
37, não esquecendo identificar-se. Poderá ainda autorizar o débito em conta (SDD). No
nosso site, www.revistademarinha.com encontrará também o modelo do impresso,
que poderá imprimir. Contacte-nos para o 91 996 4738 ou 21 580 98 91 e para os e-mails:
[email protected] ou
[email protected] ·
98
PREÇOS DAS ASSINATURAS
DA REVISTA DE MARINHA
6 NÚMEROS
Portugal . . . . . . . . . . . . . . . E 27,50
Europa . . . . . . . . . . . . . . . . E 47,50
Extra-Europa . . . . . . . . . . . E 52,50
PDF (digital) 2021
. . . . · . .Revista
. . . . .de
. EMarinha
20,00
1023 Setembro/Outubro
ALWAYS THERE. EVERYWHERE.
Navegação e comunicações
Instalação e manutenção
Inspeções de equipamentos
de navegação, radio e VDR
Monitorização remota
Conectividade
A Radio Holland, globalmente
reconhecida como fornecedora
e prestadora de serviços de
equipamentos NavCom, possui
uma incomparável rede de filiais
(mais de 80) para assistir o seu
navio ao longo das rotas
marítimas globais
Tel. +351 213 976 087 | E
[email protected] | www.radioholland.com