150 anos
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FUNDAÇÃO MILLENIUM BCP
Coordenação editorial: José Morais Arnaud, Andrea Martins, César Neves
Design gráfico: Flatland Design
Produção: DPI Cromotipo – Oficina de Artes Gráficas, Lda.
Tiragem: 400 exemplares
Depósito Legal: 366919/13
ISBN: 978-972-9451-52-2
Associação dos Arqueólogos Portugueses
Lisboa, 2013
O conteúdo dos artigos é da inteira responsabilidade dos autores. Sendo assim a Associação
dos Arqueólogos Portugueses declina qualquer responsabilidade por eventuais equívocos
ou questões de ordem ética e legal.
Os desenhos da primeira e última páginas são, respectivamente, da autoria de Sara Cura
e Carlos Boavida.
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Apoio institucional
um novo abrigo com pintura
rupestre esquemática: o abrigo
de segura, ou como, só se encontra
aquilo que se procura
Andrea Martins / Associação dos Arqueólogos Portugueses /
[email protected]
Luís Nobre /
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RESUMO
Em 2006 foi identificado um pequeno abrigo localizado na margem direita do Rio Erges, perto da povoação
fronteiriça de Segura (Idanha-a-Nova). Este abrigo, denominado de Abrigo de Segura, encontra-se numa área
muito encaixada do rio, formada por um imponente canhão granítico, estando a cerca de 30 m de altura, sendo
o acesso ao seu interior extremamente difícil. O reportório iconográfico distribui-se por dois painéis, que
apresentam motivos esquemáticos, sendo de destacar um interessante motivo soliforme. Através da análise
estilística, iconográfica e contexto arqueológico enquadramos este abrigo com pinturas no denominado ciclo
da Pintura Rupestre Esquemática (PRE), cuja cronologia se insere na Pré-História Recente.
ABSTRACT
A small rock shelter was identified in 2006 nearby the village of Segura (Idanha-a-Nova, Portugal) in the right
bank of the Erges River. The rock shelter is located in a narrow area of the river valley, locally formed by a 30
m high granitic canyon, a topography that greatly hampers the access to the site. The existing iconographic
repertoire is distributed into two panels, showing mainly schematic motifs. Combined stylistic, iconographic
and archaeological evidence allow us to frame this rock art within the so-called Schematic Rock Art style,
which is associated with a Recent Prehistory chronology.
1. O ABRIGO DE SEGURA: IDENTIFICAÇÃO
E LOCALIZAÇÃO
O Abrigo de Segura foi identificado em 2006 por
um dos signatários (L.N.) no âmbito de trabalhos
de prospecção intensiva na margem esquerda do
rio Erges (margem Espanhola). Devido a condicionantes geomorfológicas deste troço do rio, muito encaixado e com vertentes abruptas, tornou-se
necessário nalguns troços a passagem para a outra
margem para permitir a progressão no terreno, sendo numa destas fases que ocorreu a identificação do
abrigo. Nesta situação apenas foi realizado um simples registo fotográfico, prosseguindo os trabalhos
na margem espanhola. Em 2011-2012 iniciou-se um
projecto de investigação de responsabilidade dos
signatários, sendo que a denominação de Abrigo de
Segura foi definida no pedido de autorização e cor-
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Arqueologia em Portugal – 150 Anos
responde ao topónimo mais próximo do abrigo.
O Abrigo de Segura localiza-se do ponto de vista administrativo na freguesia de Segura, concelho de Idanha-a-Nova, distrito de Castelo Branco.
Encontra-se exactamente sobre a margem direita do
Rio Erges, afluente da margem direita do Rio Tejo,
no limite Este da freguesia de Segura, fazendo fronteira territorial com Espanha. Trata-se de uma zona
de vale muito encaixado correspondendo a um canhão granítico, com paredes abruptas em ambas as
margens. O acesso ao abrigo, localizado na margem
direita, é feito por uma rampa natural que parte desde o rio Erges (Figura 1).
2. O ESPAÇO E A IMPLANTAÇÃO
O Abrigo de Segura encontra-se a cerca de 20 m de
altura do leito do rio e apresenta uma área útil mui-
to reduzida devido à forte inclinação. As pinturas
rupestres localizam-se no tecto do abrigo, na zona
mais interior e de difícil acesso. O abrigo é assim
constituído por uma grande rampa de acesso muito
inclinada com cerca de 18 m de comprimento, uma
pequena superfície horizontal que forma uma plataforma com cerca de 1,80 m, localizada junto da parede de fundo com 2 m de altura e uma grande pala
que cobre parcialmente a rampa de acesso (Figura 2).
Encontra-se orientado a Este, virado para montante, sendo o acesso efectuado pela rampa inclinada desde o leito do rio em altura de estio, ficando
completamente seco nesta zona. Quando a corrente
é forte forma-se nesta área encaixada bastante turbulência, tornando o acesso ao abrigo mais difícil
pela água, sendo apenas possível vindo de jusante
e após a transposição de enormes blocos graníticos.
O acesso pelo topo do maciço granítico é impossível, localizando -se assim o sítio arqueológico num
local quase inacessível, escolhido actualmente apenas por um casal de grifos para colocar o seu ninho.
A visibilidade do abrigo é inexistente para Norte e
Oeste, sendo reduzida para Este e Sul devido à sua
implantação numa área de vale muito encaixado. O
abrigo apenas é visível da margem esquerda, ou, se
nos posicionarmos nos grandes blocos graníticos
que se encontram no meio do rio, não sendo visível
a partir da margem direita.
O espaço decorado localiza-se no tecto, na superfície mais interior do abrigo, ficando protegido dos
elementos meteóricos e apenas tendo incidência
solar directa durante um curto espaço de tempo.
O tecto é formado por diversas placas graníticas
sobrepostas, que originam diferentes planos onde
se localizam os painéis com pinturas. A superfície
apesar de não ser regular, apresenta poucas fracturas existindo alguns elementos micro -vegetais em
formação que cobrem a totalidade da superfície. As
paredes e o tecto mostram também algumas manchas negras resultantes da circulação de água proveniente da pala do abrigo. Na rampa de acesso ao
abrigo existe apenas uma pequena silva, enquanto
na pequena plataforma junto da parede encontra-se
o ninho de grifo. O abrigo apresenta um excelente
estado de conservação, sendo a presença de água e a
formação de líquenes os únicos elementos de possível degradação e destabilização.
Não existia qualquer tipo de sedimento no interior
do abrigo, o que nos leva a considerar a inexistência
de possíveis camadas arqueológicas que evidencia-
riam uma utilização do abrigo como possível habitat. Actualmente o interior do abrigo é utilizado
apenas como habitat de grifos, sendo os vestígios
presentes o ninho e os abundantes dejectos que cobrem parte da rampa de acesso do abrigo.
3. AS PINTURAS RUPESTRES
O dispositivo iconográfico existente no Abrigo de
Segura localiza-se no tecto do abrigo, junto da parede de fundo, numa zona mais acessível e menos
instável permitindo a permanência em pé e a execução das pinturas. É constituído por dois painéis, definidos pelas fracturas existentes no tecto do abrigo,
que originam diferentes planos, estando o painel 1
num plano mais recuado junto do limite do abrigo e
o painel 2 numa zona mais destacada. Pela sua localização interior, no começo do tecto do abrigo, os dois
painéis encontram-se protegidos, apenas sendo visualizáveis desde o interior do abrigo, após a subida
da rampa de acesso. Os motivos pintados também
são apenas visíveis junto da parede de fundo, sendo
assim a visibilidade a meia e longa distância inexistente. Devido às reduzidas dimensões da plataforma existente no interior do abrigo apenas é possível
a permanência em segurança de duas ou três pessoas, sendo que junto das margens do rio também não
é possível permanecerem diversas pessoas, situação
que se altera na época de estio.
Os dois painéis encontram-se orientados para Este,
pois apesar de se localizarem no tecto do abrigo,
corresponde a uma superfície bastante inclinada.
Têm assim visualização directa para a entrada do
abrigo e para o Rio Erges.
Painel 1 – Localiza-se no início do tecto do abrigo,
na área mais exterior, correspondendo ao limite externo do abrigo. As pinturas localizam-se na zona
mais à direita do painel, ou seja, na área mais afastada do limite do abrigo, sendo porém o acesso difícil devido à irregularidade da parede de fundo que
origina diversos patamares inclinados. A superfície
apresenta coloração clara, sendo de morfologia regular e plana, de formato quadrangular, com elevada
inclinação. O dispositivo iconográfico é constituído
por três motivos esquemáticos (Figura 3).
Motivo 1 – Morfologia caracterizada como uma
mancha de pigmento. Distribui-se numa superfície de 7 cm de largura por 10 cm de comprimento e
localiza-se na zona mais à esquerda do painel. O es-
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tado de conservação é muito deficiente sendo o método de aplicação do pigmento impossível de definir.
Cor: 2.5YR 7/6 1.
Motivo 2 – Conjunto de cinco pontos de morfologia elipsoidal, com contornos irregulares e mal
definidos, dispostos na vertical. Encontram-se
agrupados em duas filas verticais paralelas entre si,
sendo a primeira fila constituída por dois pontos
alinhados na vertical e a segunda fila por três pontos também dispostos verticalmente. Apresentam
na generalidade cerca de 3 cm de comprimento e
1,5 cm de largura máxima. Os dois alinhamentos
de pontos encontram-se separados entre si por 3,5
cm e localizam-se à direita do motivo 1 e à esquerda
do motivo 3. O estado de conservação é muito deficiente porém o método de aplicação do pigmento
foi possivelmente a digitação. Cor: 2.5YR 7/6.
Motivo 3 – Conjunto de nove pontos de morfologia
elipsoidal, com contornos regulares e bem definidos, dispostos na vertical. Encontram-se agrupados
em três filas verticais paralelas entre si, sendo cada
conjunto formado por três pontos alinhados na vertical. Apresentam na generalidade cerca de 2 cm de
comprimento por 1 cm de largura máxima. As três
filas de pontos encontram-se separadas entre si por
1 cm de distância. O primeiro conjunto de três pontos encontra-se em melhor estado de conservação,
sendo bem visível, enquanto os restantes grupos
de pontos estão pior conservados devido à camada de concreções existente na superfície do painel.
Localiza-se na extremidade direita do painel. O método utilizado para aplicação do pigmento foi a digitação. Cor: 2.5YR 4/6.
Painel 2 – Localiza-se na zona mais interior do abrigo, junto da parede direita e numa superfície mais
destacada do tecto. Trata-se de uma superfície que
tem início na parede de fundo do abrigo, com elevada inclinação, de formato rectangular tornando -se
mais estreita na extremidade superior. Ao localizar-se na zona mais interior do abrigo encontra-se totalmente protegido sendo o seu estado de conservação bom. O dispositivo iconográfico é constituído
por quatro motivos esquemáticos (Figura 4).
Motivo 4 – Morfologia tipologicamente associável
à categoria dos soliformes. É constituído por um círculo central, que se encontra dividido interiormente
1. Foi utilizado para definição cromática o Munsell Soil Color Charts (1975).
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Arqueologia em Portugal – 150 Anos
por um traço horizontal, originando dois semi-círculos unidos. Ao redor deste círculo encontram-se nove traços de diferentes dimensões, planos, regulares e com os contornos bem definidos. Alguns
traços encontram-se em pior estado de conservação
sendo mais difíceis de visualizar. A figura apresenta
como dimensões máximas 15 cm de comprimento
por 12 cm de largura, tendo o círculo central cerca de
7 cm de diâmetro. Trata-se do motivo localizado na
zona superior do painel. O método de aplicação utilizado para aplicação do pigmento foi provavelmente a tinta plana. Cor: 2.5YR 7/6.
Motivo 5 – Conjunto de cinco pontos de morfologia
elipsoidal, com contornos regulares e bem definidos, dispostos na vertical. Três pontos encontram-se alinhados na horizontal e os restantes dois na
vertical partindo do último ponto da horizontal.
Apresentam na generalidade cerca de 2 cm de comprimento por 1cm de largura máxima e encontram-se separados entre si por 1 cm de distância. O estado de conservação é deficiente, sendo difícil a sua
correcta visualização. Localizam-se na zona inferior
do motivo 4 e junto a uma fractura da superfície que
apresenta coloração negra devido à circulação de
água. O método utilizado para aplicação do pigmento foi a digitação. Cor: 2.5YR 5/6.
Motivo 6 – Morfologia de formato elipsoidal, com
contornos regulares e bem definidos, disposta na
vertical. Trata-se de uma figura de tipologia indeterminada ou geométrica, formada por uma elipse ou
círculo alongado, preenchido interiormente excepto numa pequena área inferior. Apresenta como dimensões 9 cm de comprimento por 4 cm de largura
e localiza-se na extremidade direita do painel, junto da parede, encontrando -se isolado. O estado de
conservação é bom, estando o pigmento distribuído
uniformemente no interior do motivo, excepto na
pequena superfície que intencionalmente não foi
pintada. O método utilizado para aplicação do pigmento foi a digitação. Cor: 2.5YR 4/6.
Motivo 7 – Morfologia caracterizada como uma
mancha de pigmento. Distribui-se numa superfície de 15 cm de largura por 10 cm de comprimento
e localiza-se na zona inferior do painel. O estado de
conservação é muito deficiente sendo o método de
aplicação do pigmento impossível de definir. Cor:
2.5YR 7/6.
4. DO PROCESSO GRÁFICO AO PROCESSO
SIMBÓLICO
O Abrigo de Segura localiza-se na margem direita
do rio Erges, num troço onde existe um imponente canhão granítico que origina paredes abruptas
em ambas as margens. Foi este monumento natural que, seguramente, levou à escolha deste abrigo
como o local onde seria executado o reportório iconográfico. A localização a cerca de 25 m de altura do
leito do rio e o seu acesso extremamente difícil foram também factores levados em conta no momento de execução.
O reportório iconográfico apresenta pouca diversidade, sendo marcadamente esquemático, com
predominância para os pontos, em número de 19,
destacando -se a presença de um motivo esteliforme
ou soliforme. Os dois painéis encontram-se devidamente organizados no espaço cénico possuindo,
apesar do reduzido número e do esquematismo inerente, associações e organização interna. No painel
1 surgem dois grupos de pontos (2 e 3), sendo que o
motivo 2 é constituído por cinco pontos e o motivo
3 por nove pontos. Estes pontos encontram-se agrupados em filas verticais de três, sendo que o motivo
2 estará, muito possivelmente, incompleto, fazendo
actualmente parte da mancha de pigmento (1). O
motivo 3 é assim formado por três filas de três pontos, alinhadas horizontal e verticalmente, formando uma morfologia quadrangular. Encontram-se
ligeiramente inclinados para a esquerda, podendo
esta inclinação ser resultado do campo de execução. O motivo 5, existente no painel 2, corresponde
a outra agrupação de pontos, em número de cinco,
distribuídos na horizontal (três deles), estando os
restantes dois na vertical, fazendo uma morfologia
em ângulo recto. Estes três motivos, formados por
conjuntos de pontos, apresentam uma organização
interna, quer na sua disposição, como na regularidade das suas dimensões, tendo sido executados
através da digitação. Além da óbvia associação entre
os pontos de cada conjunto, os próprios conjuntos
encontram-se associados entre si, podendo possuir
um mesmo conceito inerente.
No painel 2, localizado na área interior do abrigo,
junto da parede lateral, surgem dois motivos esquemáticos distintos. Na extremidade direita encontramos um motivo geométrico, de formato elipsoidal, preenchido parcialmente internamente, de
coloração vermelho vinhoso, destacando -se, assim,
na superfície. Não se encontra, aparentemente, associado aos outros motivos, estando isolado. Ao
centro do painel, numa área superior ao motivo 5,
surge o motivo 4, caracterizado como uma morfologia esteliforme ou soliforme, simbolizando, estilizadamente, a representação solar. Este soliforme
mostra nove raios, que circundam o círculo central,
sendo que este mostra uma segmentação interna,
dividindo-o em dois. Estará esta representação solar
relacionada com os restantes motivos, o conjunto
de cinco pontos ou a morfologia elipsoidal? Serão
os diversos grupos de pontos algum tipo de contagem, que poderá estar relacionada com o soliforme?
Analisando a organização interna do dispositivo iconográfico existente neste abrigo podemos verificar
que os motivos encontram-se desorganizados nos
painéis, não existindo um eixo horizontal ou vertical
orientador. Esta desorganização poderá corresponder a conceitos e categorias idênticas entre todos os
motivos. A inexistência de sobreposições entre motivos e a ausência de variações cromáticas relevantes
revela, provavelmente, a execução, de todo o dispositivo iconográfico, num mesmo momento.
5. QUE “ARTE”, QUE PESSOAS, PORQUÊ
AQUI? BREVES CONSIDERAÇÕES
A iconografia presente no Abrigo do Erges enquadra-se no denominado ciclo de Arte Esquemática Peninsular, formado quer por gravuras como por pinturas
rupestres, executadas nos mais diversos suportes,
com técnicas variadas e com um reportório iconográfico muito diversificado. A principal característica deste ciclo artístico é a realização dos seus motivos
através de um esquema, reduzindo as características formais de uma figura aos seus elementos mais
básicos, tornando -se predominantes os motivos
abstractos e geométricos (Sanchidrián Tortí, 2002:
445). A aparente heterogeneidade origina a sua divisão em diversos ciclos definidos por parâmetros
técnicos e geográficos que adquirem diversas denominações como arte megalítica, arte esquemática negro -subterrâneo, esquemático -abstracto ou
esquemática-linear, arte Atlântica ou arte Galaico-Portuguesa ou do Noroeste Peninsular, entre outras. Porém, o universo crono -cultural destes diversos grupos terá, em muitos casos, correspondência
imediata, ou seja, o único factor distintivo é o método de execução. A divisão em Pintura Rupestre
Esquemática (PRE) (Martínez García, 2002: 65) e
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Gravura Rupestre Esquemática (GRE) permite não
só uma clarificação em termos técnicos, mas também uma abordagem mais analítica, fazendo com
que o estudo de um sítio arqueológico com gravuras ou pinturas rupestres se inicie sem conceitos interpretativos contemporâneos como os inerentes à
terminologia de Arte (Martins, no prelo). A arte rupestre é um produto cultural e não um produto artístico (Martínez García, 1998: 543), e por esta razão,
o termo “Arte” terá de ser utilizado prudentemente
e em determinados contextos.
A PRE tem larga distribuição no território actualmente Português, existindo uma elevada concentração no Norte, nomeadamente em Trás-os-Montes
e Beira Alta interior. No centro do território surgem pequenos núcleos como no Maciço Calcário
Estremenho e na zona do Alto Tejo e seus afluentes. O núcleo localizado mais a Sul distribui-se
pelos contrafortes da Serra de São Mamede, desde
Marvão até Arronches, onde se encontra o importante núcleo dos abrigos de Arronches. O Abrigo
de Segura corresponde assim a mais um local com
PRE no centro interior do território, localizando -se
perto dos abrigos da Serra das Talhadas (Henriques
et al., 2011a) e, tal como o Pego da Rainha (Cardoso,
2002; 2003), num dos afluentes da margem direita
do rio Tejo. Nestes abrigos surgem também representações esquemáticas como pontos ou manchas,
tal como no Abrigo de Segura. No entanto a sua integração terá necessariamente de ser realizada a um
nível regional, ficando englobado na área geográfica
dos numerosos abrigos existentes na província da
Extremadura (Espanha), que se inicia a escassos metros do abrigo (Collado Giraldo, 2005; 2009).
Porém esta diferenciação técnica (entre PRE e GRE)
não é, como já referimos, crono -cultural, surgindo
as mesmas tipologias iconográficas existentes no
Abrigo de Segura também representadas nos numerosos grupos de gravuras esquemáticas existentes na área. O rio Erges apresenta desde a sua foz até
uma zona a montante de Segura, diversas rochas e
pequenos abrigos onde foram executadas gravuras
rupestres. Estes grafismos correspondem ao núcleo
mais a montante do ciclo artístico do Vale do Tejo,
tendo sido identificadas as primeiras rochas nos
anos 70, quando se procediam aos trabalhos de levantamento e estudo deste importante sítio arqueológico (Gomes, 1989). A localização marginal e a não
afectação da barragem do Fratel levou a que os trabalhos de prospecção não tivessem sido intensivos
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Arqueologia em Portugal – 150 Anos
nesta área. Passados mais de 30 anos diversas equipas (Nobre, 2006; Henriques et al., 2011b) efectuaram prospecções sistemáticas nas margens do Erges
identificando mais rochas com gravuras, bem como
o abrigo com pinturas de Segura. A iconografia
existente nas rochas que se localizam nas margens
do rio Erges é formada principalmente por motivos abstractos ou geométricos (Tremal 1, Tremal 2,
Tapada da Foz na margem direita (Henriques et al.,
2011b) e rochas 1, 2, 3, 4, 5 e 6 na margem esquerda
(Nobre, 2006)) surgindo também motivos antropomórficos de diversas tipologias (Tremal 2, Foz do
Ribeiro da Enchacana 1, Tapada da Foz na margem
direita (Henriques et al., 2011b) e o Abrigo Catarina
na margem esquerda (Nobre, 2006)). Nos motivos geométricos destacam-se as formas circulares,
que surgem em diversas tipologias (círculo, semi-círculo, círculos concêntricos), bem como as denominadas “nuvens” de pontos ou manchas.
Os motivos existentes no Abrigo de Segura apresentam paralelos não apenas nas rochas gravadas nas
margens do Erges, mas principalmente nos diversos núcleos de gravuras que constituem o complexo
artístico do Vale do Tejo, onde surgem numerosos
motivos soliformes, manchas e pontos (Gomes,
2010). O elevado grau de esquematismo leva-nos a
integrar estas representações na denominada arte
esquemática ideográfica, que surge num momento
após a consolidação do sistema agro -pastoril, onde
o modelo conceptual do território altera-se e com
ele o subsistema simbólico, transformando -se as
representações em ideogramas (Martins, no prelo). Esta fase terá início no final do IV milénio a.C.,
prolongando -se por todo o III milénio a.C., correspondendo assim ao Neolítico Final e Calcolítico.
Lisboa, Junho de 2013
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Figura 1 – Vista do abrigo desde o leito do rio Erges, num momento de caudal elevado (imagem esquerda) e noutro sem
corrente (imagem direita).
520
Figura 2 – Abrigo de Segura – perfil.
Figura 3 – Abrigo de Segura – painel 1.
Figura 4 – Abrigo de Segura – painel 2.
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