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O movimento social das prostitutas e o direito à cidade para as mulheres

2017, HELENE, Diana. "O movimento social das prostitutas e o direito à cidade para as mulheres". In: Anais eletrônicos do Fazendo Gênero 2017 (ISSN 2179-510X), IEG/UFSC, Florianópolis, 2017.

O movimento social das prostitutas no Brasil tem pautado uma série de temas e debates fundamentais para se (re)pensar gênero e feminismo, sobretudo nas questões relacionadas ao uso da cidade pelas mulheres. A partir do estudo de caso da organização de prostitutas na cidade de Campinas “Associação Mulheres Guerreiras”, apresento nesta comunicação oral os resultados da tese de doutorado “‘Preta, pobre e puta’: a segregação urbana da prostituição em Campinas: Jardim Itatinga”, defendida em 2015 na Instituto de Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro – IPPUR-UFRJ, ganhadora do Prêmio Capes de tese em planejamento urbano e regional. Neste trabalho analiso como este movimento social singular pauta a questão da igualdade feminina no contexto das lutas por direito à cidade e gênero, revisitando e reconstruíndo formas de militar dentro do feminismo. A partir da observação da forma de atuação e manifestação caracterísitica desse movimento organizado, que utiliza, sobretudo, o corpo como plataforma de “profanação” do espaço público - objetivando gerar visibilidade e desconstruir paradigmas relacionados aos direitos sexuais - este movimento atua na desconstrução do “estigma de Puta” (Pheterson, 1986), uma poderosa estrutura de controle sobre todas as mulheres, sobretudo o controle acerca da maneira delas circularem e se apropriarem das cidades.

O MOVIMENTO SOCIAL DAS PROSTITUTAS E O DIREITO À CIDADE PARA AS MULHERES Diana Helene1 Resumo: ​O movimento social das prostitutas no Brasil tem pautado uma série de temas e debates fundamentais para se (re)pensar gênero e feminismo, sobretudo nas questões relacionadas ao uso da cidade pelas mulheres. A partir do estudo de caso da organização de prostitutas na cidade de Campinas “Associação Mulheres Guerreiras”, apresento nesta comunicação oral os resultados da tese de doutorado “‘Preta, pobre e puta’: a segregação urbana da prostituição em Campinas: Jardim Itatinga”, defendida em 2015 na Instituto de Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro – IPPUR-UFRJ, ganhadora do Prêmio Capes de tese em planejamento urbano e regional. Neste trabalho analiso como este movimento social singular pauta a questão da igualdade feminina no contexto de uma ação associada às lutas por direito à cidade e gênero, revisitando e reconstruindo formas de militar dentro do feminismo. A partir da observação da forma de atuação e manifestação característica desse movimento organizado, que utiliza, sobretudo, o corpo como plataforma de “profanação” do espaço público - objetivando gerar visibilidade e desconstruir paradigmas relacionados aos direitos sexuais - este movimento atua na desconstrução do “estigma de Puta” (Pheterson, 1986), uma poderosa estrutura de controle de todas as mulheres, sobretudo o controle acerca da maneira destas circularem e se apropriarem das cidades. Palavras chave:​ Prostituição. Direito à cidade. Estigma. Movimentos sociais. Putafeminismo. No dia 2 de junho de 2014, a Associação Mulheres Guerreiras, uma organização de prostitutas em Campinas - cidade do estado de São Paulo, Brasil - organizou um evento para celebrar o "Dia Internacional de luta das trabalhadoras do sexo", o PUTADEI Campinas 2014. A data escolhida fazia referência a um evento fundador desse movimento social, acontecido em Lyon, França, em 2 de junho de 19752, quando uma centena de mulheres ocuparam a igreja de Saint-Nizier no centro da cidade para protestar contra a repressão que sofriam (Mathieu, 2011, 77). A associação de Campinas, portanto, queria fazer uma festa que também fosse um ato político. O local escolhido para sediar o evento seria a Praça Rui Barbosa, aos fundos da catedral, um local de trabalho das prostitutas que atuam no centro da cidade. Sem recursos financeiros, a montagem de uma festa ao ar livre parecia uma tarefa impossível. Outras possibilidades foram pensadas, mas, por fim, a associação decidiu que o evento deveria acontecer nessa praça. Isso porque, este lugar representa um espaço de disputa, no qual há muitos anos elas lutam para permanecer apesar da Diana Helene é professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UNIGRANRIO, em Duque de Caxias - RJ, Brasil; e pós-doutoranda do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ, no Rio de Janeiro - RJ, Brasil. 2 Simultaneamente, em 1973, na Califórnia-EUA, foi fundada por Margot St. James a primeira organização de prostitutas do mundo a COYOTE (Call Off Your Old Tired Ethics). Deve-se notar que, enquanto o feminismo ocidental estava em sua "segunda onda" (entre as décadas de 1970-1980), com forte apelo abolicionista, novas organizações de prostitutas se espalharam pelo mundo dando luz à um novo movimento social feminino (Chateauvert, 2013, 14; Doezema, 2010; Olivar, 2013; Pheterson, 1986). 1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 1 perseguição e violência que sofrem no local. Segundo Denise, coordenadora geral da Associação Mulheres Guerreiras, a própria razão pela qual a organização foi criada está ligada a uma história de resistência das prostitutas em ocuparem a região central da cidade: Então, as reuniões [encontros que deram origem a associação], elas começaram a acontecer porque toda vez que mudava de governo, o município, então começava-se uma... todo um processo de dizer que iam ​limpar ​o centro da cidade. E nesse processo de reestruturar o centro, ​“revitalizar”, que é a palavra que eles usam muito, ​então eles diziam que tinham que tirar os moradores de rua, as profissionais do sexo, os meninos de rua... Então assim, sempre quando mudava de governo, começava a nova gestão, sempre tinha um confronto, ou da guarda municipal, ou dos policiais, da polícia militar, às vezes também da polícia civil, com relação de discriminação, preconceito e violência com as mulheres que se prostituem (entrevista com Denise, realizada pela Associação Mulheres Guerreiras, em 14/12/2012, grifos meus). Além de relatos de violência, batidas e revistas policiais excessivas, existem ainda as ações contra os locais de trabalho, como o fechamento de hotéis e bares que as prostitutas frequentam. Para poderem continuar no centro da cidade elas adotam diversas táticas, sobretudo o uso de vestimentas e posturas corporais “respeitáveis”, de modo a serem aceitas no espaço do Centro. No entanto, em alguns momentos, estas negociações não eram suficientes. Segundo relatos, a polícia “judiava das mulheres” e revistava até dentro das genitais sob o pretexto de “achar alguma coisa”. Também havia tortura: choque no bico do seio e na vagina3. Vale ressaltar que não existe motivo legal para a perseguição dessas mulheres, já que elas trabalham por conta própria e o trabalho sexual individual e independente não é um crime segundo a lei brasileira. Dessa forma, para se defender, elas tiveram que começar a se organizar de maneira mais estruturada e formal. Assim, começaram algumas reuniões em meados dos anos 1990 que, aos poucos, foram crescendo, com manifestações e outros eventos de maior visibilidade e culminaram na fundação da Associação Mulheres Guerreiras, em 2007, primeira organização profissional de prostitutas de Campinas. Nos relatos e memórias, a questão da violência que sofriam, sobretudo por ações policiais, é o motivo deflagrador da necessidade de organização entre elas. Deste modo, as mulheres da associação faziam questão de que o PUTADEI Campinas 2014 acontecesse nessa praça, na qual lutavam por permanecer. Para tornar o evento possível, vários parceiros, grupos, ONGs e associações se coordenaram. Dentre estes, se destaca a Daspu, uma marca de moda cujas coleções são criadas e apresentadas por prostitutas. A grife é um projeto A prática do choque para torturar prostitutas, sobretudo em suas partes íntimas/sexuais, também é relatada em outros estudos sobre prostituição, de outras regiões do Brasil. Gabriela Leite discorre em sua autobiografia sobre essa prática policial em relação às prostitutas e outros integrantes da Boca do Lixo: “Polícia e tortura andam juntos. Sadismo puro, doença perversa fascista, que sempre tenta se acobertar sob o motivo 'moral e bons costumes'. É uma doença profunda da nossa sociedade. O fato é que tortura é tortura, não há justificativa. O resto é cinismo infame (Leite, 1992, 85 e 86)”. 3 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 2 criado em 2005 pela ONG Davida, uma iniciativa de Gabriela Leite, prostituta, ativista e uma das fundadoras do movimento social das prostitutas no Brasil (Leite, 2009; Leite & Lenz, 2013; Lenz, 2008 e 2014). Assim, o evento começa. É segunda-feira, dezoito horas, fim de expediente, lojas fechando e muitos trabalhadores do Centro voltando para casa. Alguns param para assistir. Os moradores de rua que dormem na praça também se juntam à festa. Ali, é projetado um vídeo sobre a história da associação. As imagens das mulheres denunciando a expulsão e violência ressoa nos alto-falantes no mesmo local em que são perseguidas - como se dissessem: “estamos aqui, na praça, resistindo e falando o que pensamos”. Em seguida, começa o desfile da Daspu. Betânia, principal líder da associação, domina a cena com seu biquíni fio-dental e salto alto. Enquanto oferece um verdadeiro show de rebolado em praça pública na provinciana Campinas, ela grita para os espectadores: "prostituição é um trabalho", tendo a própria Catedral como pano de fundo da performance. Fechando o desfile, com todas as modelos atrás de si, ela carrega uma grande escultura em formato de vagina com os dizeres: “Buceta Insubmissa”. Neste momento, o público já está familiarizado com a música e canta em coro “Daspu é uma puta parada! Daspu é uma parada de puta!”. Um momento marcante, onde a praça é tomada pela palavra “puta” de uma forma bem diferente de como é usualmente evocada: uma “puta” plena de orgulho. Reafirmar a sua identidade, sua presença e sua luta por meio deste evento exatamente na praça onde disputam seu espaço, é uma atuação performativa expressiva do movimento social de prostitutas no Brasil, que têm relação direta com uma reivindicação pelo seu direito à cidade4. O movimento social das prostitutas no Brasil A organização social das prostitutas no Brasil nasceu em conjunto ao ressurgimento de uma série de movimentos sociais que, a partir de 1970, cresceram durante democratização contra o regime militar (Leite & Lenz, 2013, 41). O novo contexto político brasileiro propiciou uma ampla Apresento neste texto parte dos resultados da tese “‘Preta, pobre e puta’: a segregação urbana da prostituição em Campinas: Jardim Itatinga” (2015, IPPUR-UFRJ), ganhadora do Prêmio Capes de tese 2016 em planejamento urbano e regional. A pesquisa é resultado de uma longa parceria com a Associação Mulheres Guerreiras, desde 2006, quando entrei para um projeto de extensão universitária da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Unicamp para auxiliar a criação desta associação. A partir dos conhecimentos e das experiências vividas em conjunto com esse movimento social, aliados a uma pesquisa arquivística e documental sobre a questão da prostituição em Campinas, realizei o mapeamento da prostituição na cidade; a reconstrução da história de formação do bairro de prostituição Jardim Itatinga; e sistematização da história de resistência e luta prostitutas do centro da cidade (arquivos pesquisados: Arquivo Edgard Leuenrot - AEL; Centro de Memória da Unicamp - CMU; Arquivo da Associação Mulheres Guerreiras; Arquivo Rede Anhanguera de Comunicação - RAC). 4 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 3 mobilização social e o surgimento de diversas ações coletivas, como as primeiras ocupações organizadas de terra, os primeiros movimentos de luta pela urbanização e regularização fundiária nas favelas e o nascimento do movimento dos sem-tetos urbanos (Gohn, 1991). De forma similar, a origem do movimento de prostitutas aparece em um contexto eminentemente urbano, associado a um conjunto de queixas contra as violações dos direitos civis e reivindicações pelo o direito à cidade (Simões, 2010a; Helene, 2015). A primeira manifestação pública de prostitutas conhecida no país é uma passeata realizada em São Paulo, na Avenida São João, em 1979. Contra a brutalidade policial na região da “Boca do Lixo” - que havia causado a morte de duas transexuais e uma grávida - milhares de prostitutas fecharam as ruas do centro da cidade como protesto. Gabriela Leite, que se tornaria pouco depois a principal “cara” desse movimento, relata esse evento em sua autobiografia: ...se nós conseguíamos realizar aquilo com o centro de São Paulo, é porque dava pra fazer outras coisas mais. No auge da excitação com a passeata, algumas perguntas brotavam na minha cabeça: “Por que nós não nos organizamos de uma maneira mais permanente?” “Porque a gente não se organiza contra a violência policial?” Comecei a ver nisso um trabalho político seríssimo, concreto, que faz parte do dia-a-dia da prostituição (LEITE, 1992, p. 85 e 86) Mais tarde, em 1987, é realizado o primeiro encontro nacional de prostitutas, com cerca de setenta mulheres provenientes de onze estados do país, a partir do qual foi criada a ​Rede Brasileira de Prostitutas​. Poucos meses depois, acontece a fundação da primeira associação de prostitutas do Brasil, encabeçada por Gabriela Leite e criada também em função da necessidade de se proteger de um processo de remoção e segregação urbana (1987, Rio de Janeiro-RJ), seguida pela GEMPAC (1990, Belém-PA) e APROCE (1990, Fortaleza-CE). A partir de então, surgem organizações de prostitutas por todo o Brasil (Moraes, 1996; Lenz, 2014; Leite, 1992 e 2009; Leite & Lenz, 2013). A reivindicações principais desse movimento social são o fim da violência, do preconceito e do estigma sofridos pelas prostitutas. Para isso, a visibilidade e o reconhecimento dessa atividade como ​trabalho ​é um dos seus objetivos principais. Nesse sentido, o desafio consiste em transformar a prostituição um modelo valorizado de profissão. Isso porque, ainda hoje, identificar-se publicamente como “puta” pode ter consequências extremamente perigosas. Margot St. James, prostituta, ativista e criadora da primeira organização de prostitutas no mundo, explica de que forma a conotação negativa relacionada à prostituição e a marcação depreciativa da “puta” como objeto de insulto e desmoralização recai sobre todas as mulheres, tendo condições específicas para as mulheres prostitutas: […] The word “whore” is still used to keep other women in line, all women, but the punishment of a prostitute is the example, set by the system that: if you dont – you know – Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 4 act right, bow down to man (I suppose), that at... you give what coming to you. And... a lot of hookers are murdered in this country […] the prostitute became a legitimate victim for rape, murder, robbery, and any kind of abuse, verbal abuse and physical abuse...​1 (transcrição de entrevista feita à Margot St. James, “The World Whores' Summit”, em San 5 Francisco, 1989 ). O chamado “estigma de puta”, categoria analítica introduzida por Gail Pheterson, escritora e militante do movimento social das prostitutas (Pheterson, 1986), é uma marcação de “desvalor” que pode ser aplicada tanto para as “trabalhadoras do sexo” como para outras mulheres: ​« the adjective 'whore' is specifically a FEMALE GENDER STIGMA (…) a mark of shame or disease on an unchaste women »6. Toda mulher está sujeita a esta classificação dependendo da forma como age, como se veste, quais lugares frequenta, sua etnia, cor de pele, origem e classe social. O “estigma de puta” seria um “mecanismo geral de controle social” relacionado ao gênero feminino, que serve como instrumento, ao alcance de qualquer um para realizar um ataque contra mulheres. É por essa razão que, a luta de uma mulher por ser valorizada, ou mesmo por sua sobrevivência e dignidade, requer que ela acione constantemente mecanismos para afastar-se da imagem negativa da “puta”. No caso das prostitutas, vale dizer ainda que, além de marcadas, elas constituem o próprio estigma (Pheterson, 1986, 44-45). O “estigma da puta” é uma função normativa (Tabet, 2004, 33 e 38) e controla a todas as mulheres (Cabiria, 2004, 108) em função da construção da imagem depreciativa da “puta”: sua função é servir como um exemplo de punição. Além disso, o “estigma de puta” se baseia na ideia abstrata de que a prostituição sinaliza uma categoria de mulheres construída como totalmente separada e distinta das “outras” mulheres: uma clivagem absoluta entre, de um lado, a “puta”, e do outro, a “mulher honesta”, representada pela “mãe” ou “esposa” (Tabet, 2004, 7). Em função dessa dicotomia é gerada uma separação radical entre a vida pessoal e a vida profissional das mulheres prostitutas. Um bom exemplo é a escolha de um outro nome - o “nome de guerra” - para trabalhar. Segundo Gabriela Leite tal fato acarreta que a prostituta viva uma “situação partida”, uma “vida partida”: é prostituta e tem vergonha de ser, pois vive numa sociedade que a estigmatiza (conversa com Gabriela Leite, Rio de Janeiro, 27/09/12). Dessa forma, em geral, o mundo das prostitutas é repartido em dois: a constituição de cada mundo se relaciona intrinsecamente com cada identidade adotada, nestes que 5 ​ “A palavra "puta" ainda é usada para manter as outras mulheres na linha, todas as mulheres, mas a punição de uma prostituta é o exemplo, definido pelo sistema que: se você não - você sabe - agir direito, curvar-se aos homens (eu suponho), você terá o que merece, e ... um monte de prostitutas são assassinadas neste país [...] a prostituta se torna uma vítima legítima para o estupro, o assassinato, o roubo, e qualquer tipo de abuso, abuso verbal e abuso físico ...” (tradução livre). Disponível em: <http://youtu.be/PlXV370ipEI>. Acesso em: fev, 2015. 6 “A palavra “puta” é especificamente um ESTIGMA DE GÊNERO FEMININO […] podemos definir o estigma de puta como marca de vergonha ou doença que sinaliza uma mulher como escrava, incasta ou criminosa (tradução livre). Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 5 são, via de regra, conhecidos como “os dois mundos” da mulher prostituta (Dos Anjos Júnior, 1980; Leite, 1993; Rago, 1991; Simões, 2010a). Associado aos valores e às imagens da divisão simbólica desses “mundos” estão também separados, no espaço urbano, os locais destinados a essas atividades. Isto é, de maneira recorrente a prostituição é delimitada, isolada e confinada a certas áreas da cidade. Nesse sentido, vale destacar um importante motivo relacionado a perseguição das prostitutas que trabalham no centro de Campinas: a cidade é conhecida por possuir uma das maiores áreas de prostituição da América Latina, o bairro Jardim Itatinga. Segundo dados do Centro de Saúde, no local trabalham aproximadamente duas mil prostitutas, distribuídas em cerca de duzentas diferentes casas de prostituição. O bairro foi criado estrategicamente no final dos anos 1960, em um terreno vazio e distante do espaço urbano consolidado, com o objetivo de confinar numa área periférica todas as atividades ligadas à prostituição. Mesmo que, segundo a lei brasileira, sejam crimes os atos de mediação e facilitação, bem como o lucro da prostituição por terceiros, o bairro é quase que totalitariamente composto de casas de prostituição. Ao contrário do que é observado no centro da cidade, no Jardim Itatinga não se reprime essas atividades. Essa prática do poder público, que podemos chamar de “repressão seletiva” segundo Nicola Paris (2014, p. 45), é recorrente quando se trata de prostituição, criando áreas de tolerância não oficiais7. Segundo Soraya Simões, enquanto a chamada prostituição localizada, como o Jardim Itatinga, costuma ser tolerada por se configurar como um “cordão sanitário”, a prostituição dispersa nas ruas, mais visível e difusa, “é combatida por métodos muitas vezes violentos”. Essa recorrente delimitação de um lugar específico para a prática da prostituição representaria ainda “a tradução de uma ordem moral na morfologia urbana” (Simões, 2010b, 30-34), na qual, acontece ainda uma relação entre a repressão da prostituição e a higienização da cidade, a partir da discriminação da prostituta em relação aos espaços públicos frequentados pelas aquelas classificadas de “mulheres honestas/mães/esposas”. Nesse sentido, se destaca a importância dos projetos de remodelação urbana na criação, fixação e/ou deslocamento dos espaços de prostituição (​Ibidem​; Helene, 2015; Leite, 1993, 7; Silva, 2000, 29). Gabriela Leite afirma que, por motivos sociais bem concretos, “a prostituição ocupa, em princípio, áreas desvalorizadas” (Leite, 1992, 126). Isto é, bairros em “transformação”, com terrenos vagos, áreas intersticiais, com atividades obsoletas ou pouco definidas e com valor funcional e imobiliário médio, habitados por uma população modesta e desprovida de recursos 7 Para mais informações sobre a criação do bairro ver Helene, 2014 e 2015. Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 6 materiais. Vale dizer ainda que a prostituição faz parte de uma certa imagem social de cidade associada ao “estigma de puta”: espaços “deteriorados”, “trash”, “esquisitos”, “perigosos”, etc. Isto é, a partir dessas observações pode-se perceber como cada papel destinado às mulheres tem também o seu lugar na cidade, que não podem se misturar. A “mulher honesta”, a “mãe” e/ou a “esposa” devem permanecer confinadas às funções e ao espaço doméstico do “lar” e da família, seguirem as regras de obediência, servidão e fidelidade de modo a se afastarem ao máximo da imagem depreciativa da “puta”. Por outro lado, as prostitutas devem ficar restritas às funções e ao espaço confinado destinado à prostituição e devem manter esse isolamento à partir de uma separação radical entre esses “dois papéis”, não podendo, dessa forma, atuarem ou se assumirem como prostitutas fora das áreas de “tolerância”, sob a pena de sofrerem as consequências associadas ao “estigma de puta”. Na passarela passeata da Daspu Na luta pela desconstrução da imagem de deterioração e o confinamento imposto às prostitutas, esse movimento social começa a instituir no espaço urbano iniciativas tais como festivais, performances artísticas e práticas políticas de ocupação da cidade que promovem o tema da prostituição, com o objetivo de atrair a atenção, tornar visível e valorizar a atividade. Neste sentido, a criação da Daspu destaca-se como um exemplo maior dessas ações (Simões, 2010b, 27; Lenz, 2008). De forma similar ao evento em Campinas, o primeiro desfile da Daspu aconteceu em um espaço da cidade em disputa pelas prostitutas: a Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro. Segundo Flávio Lenz, essa praça - que tinha “ares boêmios e artísticos” e uma quantidade expressiva de prostitutas trabalhando - começa a sofrer um processo de segregação urbana e gentrificação, em 2002, em função de um programa de “revitalização” urbana do Ministério da Cultura. Segundo Gabriela Leite, são as prostitutas as primeiras a serem expulsas quando se iniciam a maior parte das intervenções urbanas (Leite, 2006). Os processos de gentrificação advém de ações que buscam revalorizar economicamente e simbolicamente espaços da cidade, de modo que estes tenham valor dentro do sistema capitalista. Para isso é recorrente expulsar aqueles que “dificultariam” esse processo. Ou seja, a clássica estigmatização da pobreza e a sua segregação, cujas justificativas são as conhecidas práticas higienistas de “limpeza social”, se inicia, via de regra, com a expulsão das prostitutas. Ademais, a prostituição e o “estigma de puta” são usados instrumentalmente na criação de uma imagem depreciativa destas áreas, como um exemplo de Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 7 “degradação” (Helene, 2015). Dessa forma, ameaçada pela gentrificação, a Praça Tiradentes é escolhida como palco do primeiro desfile da Daspu. Um desfile manifesto, ao qual Flávio Lenz intitulou mais tarde de “passarela-passeata” (Lenz, 2008, 34, 74-78). Nesse primeiro evento, elas demonstraram de forma incisiva sua estética, sua voz e sua sensualidade. Segundo descreve Flávio Lenz: Em poucos minutos, prostitutas vestindo parangolés espalharam pétalas de rosa vermelha sobre a rua para a entrada triunfal das colegas. As manequins ​dasputinhas ​começaram a surgir pela porta do Hotel Nicário [local de programas das prostitutas da praça], arrancando os primeiros aplausos, torcendo pescoços e provocando o tumulto das câmaras. Uma a uma, ou em pares, […] percorreram a rua e pétalas em direção oposta à Praça […]. Ladeadas por uma multidão que, mesmo entusiasmada, respeitou o espaço do desfile, acompanhadas na passarela-passeata […] pelas câmeras e luzes da GNT [agência televisiva], por fotógrafos de outros veículos e agências, elas arrasaram! Cabeça erguida, peito empinado, sorridentes e sensuais, malemolentes, emocionadas, vibrantes (​Ibidem​, 81, grifo meu). André Villas-Boas compara a performática atuação desta grife às estratégias que vêm adotando os movimentos sociais nas últimas décadas, “políticas estéticas”: “estratégias políticas de afirmação de identidades e de direitos à cidadania que não se limitam às formas tradicionais do ativismo político (ou mesmo o substituem de todo, em certos casos)”. Como modelo dessa nova configuração de militância, figura o movimento LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), que por meio de suas paradas pautam e reivindicam sua identidade a partir da “própria expressão de sua sexualidade em praça pública”. É um ativismo político em que, ao invés das atividades artísticas serem apenas um “braço cultural” da mobilização, estas se “tornam o próprio movimento”: “Dançar ou desfilar, seja de tanguinha prateada, seja de vestido de noiva com logotipos desbotados de hotéis de encontro [uma criação da Daspu] é a própria ação política” (Villas-Boas, 2008, 12-15). Em outras palavras, ao mesmo tempo as prostitutas mostram seus atributos para desfilar, elas mostram a cara e fazem política à sua maneira (Simões, 2010b, 26 e 27). São reivindicações que atuam na desconstrução de paradigmas ligados aos direitos sexuais ao (re)afirmarem sua estética e sua identidade por meio dessas “profanações” do espaço público das cidades: “quando minhas amigas putas desfilam lindas e altivas, sem vergonha de ser puta, estão falando por si mesmas e sendo políticas, extremamente políticas e revolucionárias” (Gabriela Leite apud Lenz, 2008, 19 e 133). Esta forma de fazer e de ser um movimento social altera, ainda, conceitos que identificam a institucionalização dos movimentos sociais, revisitando práticas militantes associadas ao feminismo e à luta contra preconceitos relacionados especificamente às mulheres. Nesse sentido, as militantes desse movimento social, ao mostrarem seus rostos e afirmarem-se publicamente “putas”, Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 8 desestabilizam as fronteiras entre as dicotomias fictícias criadas pelo estigma de puta. É o que podemos observar na escolha do título da autobiografia de Gabriela Leite: "Filha, mãe, avó e puta” (Leite, 2009) ou no discurso feito na fundação da associação de Campinas a seguir: Tudo bem meninas? Vocês me conhecem como Cida não é, mas meu nome verdadeiro é Salete. [...] eu no princípio tinha vergonha de ficar na praça [no Centro], vergonha, vinha uma pessoa conhecida eu corria, me escondia. Mas aí eu começava a pensar, mas meu Deus, eu vivo disso, pago minhas contas, sobrevivo disso, e porque que eu vou me esconder? Ninguém vai pagar as minhas contas... eu comecei a pensar assim e comecei a frequentar a Associação. Eu morria de vergonha de alguém me ver nas praças, gente que é isso? Que vergonha... [...] E comecei a ver com a Associação que não era nada disso, nós somos gente de carne e osso, que vive, tem memória, dorme, sonha, tem família. Antigamente as prostitutas tinham cafetão, hoje não, nós temos família. Filhos, pais, mães, que sobrevivem do nosso trabalho, com dignidade. (Salete, discurso na Assembleia de Fundação da Associação Mulheres Guerreiras, 19/09/2007). Isto é, sua visibilidade na sociedade - e na cidade - aponta para uma reinterpretação do papel social da mulher: a partir do enaltecimento positivo da classificação “puta” acontece a desconstrução das clivagens entre a "mulher honesta/esposa/mãe" e a "prostituta" . Nesse sentido, vale destacar que uma das reivindicações recorrentes de Gabriela Leite era que a palavra “puta” se tornasse, um dia, uma “palavra bonita”: “sempre sonhei com a palavra puta sendo falada por todos com a sonoridade e a força que a palavra tem (Leite, 2005)”. Ou seja, propunha uma “reapropriação” dessa categoria, de modo a ressignificá-la dando-lhe um sentido positivo, muito semelhante ao que foi realizado com os termos “Dyke” e “Queer”, e que ainda tenta empreender o movimento da Marchas das Vadias com os termos “Vadia/Slut”: “se a gente não toma as palavras pelo chifre, e assume elas, a gente não muda nada” (“Porque Gabriela gosta da palavra Puta”, UM BEIJO para Gabriela…). Isto é, o que e antes era considerado desvio, é reafirmado como fonte de orgulho: acontece um movimento de reapropriação de sua própria marginalidade, na qual a afirmação identitária se torna uma arma política (Sauzon, 2012, 3 e 4). Um ótimo exemplo dessa atuação pode ser visto com a atitude performática da prostituta e militante Lourdes Barreto, fundadora do movimento de prostitutas no Brasil junto a Gabriela Leite, que, com 74 anos de idade, tatuou em seu antebraço a frase "Eu sou puta". Portando, o movimento social das prostitutas contesta as simbologias que carregam os corpos das mulheres dependendo de sua maneira de vestir, agir e locais que frequentam na cidade, espaço este onde ainda impera o poder masculino. Põe ainda em evidência a violência sofrida por TODAS as mulheres em função do “estigma de puta”. Pode-se dizer também que se estabelece enquanto vanguarda ao reinterpretar, desafiar e ao romper as normas de gênero/sexualidade, as hierarquias e as divisões nas estruturas institucionais em relação ao gênero feminino. A partir da Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 9 reafirmação simbólica de sua identidade “puta” empreendem uma reconquista de seu espaço na cidade e na sociedade. Ao mesmo tempo que recusam circular como prostitutas apenas em espaços confinados e mostram sua cara fora dos “guetos” e outros espaços de “tolerância”, elas estabelecem uma crítica a um certo modelo de cidade, ao mesmo tempo em que contestam um certo modelo de “mulher”. A reconquista da categoria “puta” acontece ao mesmo tempo em que empreendem a reconquista de seu direito à cidade. Referências CABIRIA.​ Mujeres y migraciones en Europa​. Lyon : le Dragon lune éd, 2004 . 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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 11 ​The social movement of sex workers and the women's right to the city Abstract: ​The social movement of prostitutes in Brazil has been based on a series of themes and debates that are fundamental for (re) thinking about gender and feminism, especially on issues related to women's use of the city. From the case study of the organization of prostitutes in the city of Campinas, "Women Warriors Association", I present in this oral communication the results of the doctoral thesis "‘Preta, pobre e puta’: the urban segregation of prostitution in Campinas: Jardim Itatinga", defended in 2015 at the Institute of Urban and Regional Planning of the Federal University of Rio de Janeiro - IPPUR-UFRJ, winner of the Capes Thesis Prize in urban and regional planning. In this paper I analyze how this singular social movement guides the issue of feminine equality in the context of an action associated with struggles for the right to the city and gender, revisiting and reconstructing forms of militanting within feminism. From the observation of the form of performance and characteristic manifestation of this organized movement, which mainly uses the body as a platform for "profanation" of the public space - aiming at generating visibility and deconstructing paradigms related to sexual rights - this movement acts in the deconstruction of “The Whore Stigma" (Pheterson, 1986), a powerful control structure for all women, especially to control over their way of circulating and appropriating off the cities. Key words: ​Prostitution, Rigth to the city, The Whore Stigma, social movements, whore feminism Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13​th​ Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN ​2179-510X 12