O MOVIMENTO SOCIAL DAS PROSTITUTAS E O DIREITO À CIDADE
PARA AS MULHERES
Diana Helene1
Resumo: O movimento social das prostitutas no Brasil tem pautado uma série de temas e debates
fundamentais para se (re)pensar gênero e feminismo, sobretudo nas questões relacionadas ao uso da
cidade pelas mulheres. A partir do estudo de caso da organização de prostitutas na cidade de
Campinas “Associação Mulheres Guerreiras”, apresento nesta comunicação oral os resultados da
tese de doutorado “‘Preta, pobre e puta’: a segregação urbana da prostituição em Campinas: Jardim
Itatinga”, defendida em 2015 na Instituto de Planejamento Urbano e Regional da Universidade
Federal do Rio de Janeiro – IPPUR-UFRJ, ganhadora do Prêmio Capes de tese em planejamento
urbano e regional. Neste trabalho analiso como este movimento social singular pauta a questão da
igualdade feminina no contexto de uma ação associada às lutas por direito à cidade e gênero,
revisitando e reconstruindo formas de militar dentro do feminismo. A partir da observação da forma
de atuação e manifestação característica desse movimento organizado, que utiliza, sobretudo, o
corpo como plataforma de “profanação” do espaço público - objetivando gerar visibilidade e
desconstruir paradigmas relacionados aos direitos sexuais - este movimento atua na desconstrução
do “estigma de Puta” (Pheterson, 1986), uma poderosa estrutura de controle de todas as mulheres,
sobretudo o controle acerca da maneira destas circularem e se apropriarem das cidades.
Palavras chave: Prostituição. Direito à cidade. Estigma. Movimentos sociais. Putafeminismo.
No dia 2 de junho de 2014, a Associação Mulheres Guerreiras, uma organização de
prostitutas em Campinas - cidade do estado de São Paulo, Brasil - organizou um evento para
celebrar o "Dia Internacional de luta das trabalhadoras do sexo", o PUTADEI Campinas 2014. A
data escolhida fazia referência a um evento fundador desse movimento social, acontecido em Lyon,
França, em 2 de junho de 19752, quando uma centena de mulheres ocuparam a igreja de
Saint-Nizier no centro da cidade para protestar contra a repressão que sofriam (Mathieu, 2011, 77).
A associação de Campinas, portanto, queria fazer uma festa que também fosse um ato político. O
local escolhido para sediar o evento seria a Praça Rui Barbosa, aos fundos da catedral, um local de
trabalho das prostitutas que atuam no centro da cidade. Sem recursos financeiros, a montagem de
uma festa ao ar livre parecia uma tarefa impossível. Outras possibilidades foram pensadas, mas, por
fim, a associação decidiu que o evento deveria acontecer nessa praça. Isso porque, este lugar
representa um espaço de disputa, no qual há muitos anos elas lutam para permanecer apesar da
Diana Helene é professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UNIGRANRIO, em Duque de Caxias - RJ, Brasil;
e pós-doutoranda do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ, no Rio de Janeiro - RJ, Brasil.
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Simultaneamente, em 1973, na Califórnia-EUA, foi fundada por Margot St. James a primeira organização de
prostitutas do mundo a COYOTE (Call Off Your Old Tired Ethics). Deve-se notar que, enquanto o feminismo ocidental
estava em sua "segunda onda" (entre as décadas de 1970-1980), com forte apelo abolicionista, novas organizações de
prostitutas se espalharam pelo mundo dando luz à um novo movimento social feminino (Chateauvert, 2013, 14;
Doezema, 2010; Olivar, 2013; Pheterson, 1986).
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perseguição e violência que sofrem no local. Segundo Denise, coordenadora geral da Associação
Mulheres Guerreiras, a própria razão pela qual a organização foi criada está ligada a uma história de
resistência das prostitutas em ocuparem a região central da cidade:
Então, as reuniões [encontros que deram origem a associação], elas começaram a acontecer
porque toda vez que mudava de governo, o município, então começava-se uma... todo um
processo de dizer que iam limpar o centro da cidade. E nesse processo de reestruturar o
centro, “revitalizar”, que é a palavra que eles usam muito, então eles diziam que tinham
que tirar os moradores de rua, as profissionais do sexo, os meninos de rua... Então assim,
sempre quando mudava de governo, começava a nova gestão, sempre tinha um confronto,
ou da guarda municipal, ou dos policiais, da polícia militar, às vezes também da polícia
civil, com relação de discriminação, preconceito e violência com as mulheres que se
prostituem (entrevista com Denise, realizada pela Associação Mulheres Guerreiras, em
14/12/2012, grifos meus).
Além de relatos de violência, batidas e revistas policiais excessivas, existem ainda as ações
contra os locais de trabalho, como o fechamento de hotéis e bares que as prostitutas frequentam.
Para poderem continuar no centro da cidade elas adotam diversas táticas, sobretudo o uso de
vestimentas e posturas corporais “respeitáveis”, de modo a serem aceitas no espaço do Centro. No
entanto, em alguns momentos, estas negociações não eram suficientes. Segundo relatos, a polícia
“judiava das mulheres” e revistava até dentro das genitais sob o pretexto de “achar alguma coisa”.
Também havia tortura: choque no bico do seio e na vagina3. Vale ressaltar que não existe motivo
legal para a perseguição dessas mulheres, já que elas trabalham por conta própria e o trabalho
sexual individual e independente não é um crime segundo a lei brasileira. Dessa forma, para se
defender, elas tiveram que começar a se organizar de maneira mais estruturada e formal. Assim,
começaram algumas reuniões em meados dos anos 1990 que, aos poucos, foram crescendo, com
manifestações e outros eventos de maior visibilidade e culminaram na fundação da Associação
Mulheres Guerreiras, em 2007, primeira organização profissional de prostitutas de Campinas. Nos
relatos e memórias, a questão da violência que sofriam, sobretudo por ações policiais, é o motivo
deflagrador da necessidade de organização entre elas.
Deste modo, as mulheres da associação faziam questão de que o PUTADEI Campinas 2014
acontecesse nessa praça, na qual lutavam por permanecer. Para tornar o evento possível, vários
parceiros, grupos, ONGs e associações se coordenaram. Dentre estes, se destaca a Daspu, uma
marca de moda cujas coleções são criadas e apresentadas por prostitutas. A grife é um projeto
A prática do choque para torturar prostitutas, sobretudo em suas partes íntimas/sexuais, também é relatada em outros
estudos sobre prostituição, de outras regiões do Brasil. Gabriela Leite discorre em sua autobiografia sobre essa prática
policial em relação às prostitutas e outros integrantes da Boca do Lixo: “Polícia e tortura andam juntos. Sadismo puro,
doença perversa fascista, que sempre tenta se acobertar sob o motivo 'moral e bons costumes'. É uma doença profunda
da nossa sociedade. O fato é que tortura é tortura, não há justificativa. O resto é cinismo infame (Leite, 1992, 85 e 86)”.
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criado em 2005 pela ONG Davida, uma iniciativa de Gabriela Leite, prostituta, ativista e uma das
fundadoras do movimento social das prostitutas no Brasil (Leite, 2009; Leite & Lenz, 2013; Lenz,
2008 e 2014).
Assim, o evento começa. É segunda-feira, dezoito horas, fim de expediente, lojas fechando e
muitos trabalhadores do Centro voltando para casa. Alguns param para assistir. Os moradores de
rua que dormem na praça também se juntam à festa. Ali, é projetado um vídeo sobre a história da
associação. As imagens das mulheres denunciando a expulsão e violência ressoa nos alto-falantes no mesmo local em que são perseguidas - como se dissessem: “estamos aqui, na praça, resistindo e
falando o que pensamos”. Em seguida, começa o desfile da Daspu. Betânia, principal líder da
associação, domina a cena com seu biquíni fio-dental e salto alto. Enquanto oferece um verdadeiro
show de rebolado em praça pública na provinciana Campinas, ela grita para os espectadores:
"prostituição é um trabalho", tendo a própria Catedral como pano de fundo da performance.
Fechando o desfile, com todas as modelos atrás de si, ela carrega uma grande escultura em formato
de vagina com os dizeres: “Buceta Insubmissa”. Neste momento, o público já está familiarizado
com a música e canta em coro “Daspu é uma puta parada! Daspu é uma parada de puta!”. Um
momento marcante, onde a praça é tomada pela palavra “puta” de uma forma bem diferente de
como é usualmente evocada: uma “puta” plena de orgulho. Reafirmar a sua identidade, sua presença
e sua luta por meio deste evento exatamente na praça onde disputam seu espaço, é uma atuação
performativa expressiva do movimento social de prostitutas no Brasil, que têm relação direta com
uma reivindicação pelo seu direito à cidade4.
O movimento social das prostitutas no Brasil
A organização social das prostitutas no Brasil nasceu em conjunto ao ressurgimento de uma
série de movimentos sociais que, a partir de 1970, cresceram durante democratização contra o
regime militar (Leite & Lenz, 2013, 41). O novo contexto político brasileiro propiciou uma ampla
Apresento neste texto parte dos resultados da tese “‘Preta, pobre e puta’: a segregação urbana da prostituição em
Campinas: Jardim Itatinga” (2015, IPPUR-UFRJ), ganhadora do Prêmio Capes de tese 2016 em planejamento urbano e
regional. A pesquisa é resultado de uma longa parceria com a Associação Mulheres Guerreiras, desde 2006, quando
entrei para um projeto de extensão universitária da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Unicamp para
auxiliar a criação desta associação. A partir dos conhecimentos e das experiências vividas em conjunto com esse
movimento social, aliados a uma pesquisa arquivística e documental sobre a questão da prostituição em Campinas,
realizei o mapeamento da prostituição na cidade; a reconstrução da história de formação do bairro de prostituição
Jardim Itatinga; e sistematização da história de resistência e luta prostitutas do centro da cidade (arquivos pesquisados:
Arquivo Edgard Leuenrot - AEL; Centro de Memória da Unicamp - CMU; Arquivo da Associação Mulheres
Guerreiras; Arquivo Rede Anhanguera de Comunicação - RAC).
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mobilização social e o surgimento de diversas ações coletivas, como as primeiras ocupações
organizadas de terra, os primeiros movimentos de luta pela urbanização e regularização fundiária
nas favelas e o nascimento do movimento dos sem-tetos urbanos (Gohn, 1991). De forma similar, a
origem do movimento de prostitutas aparece em um contexto eminentemente urbano, associado a
um conjunto de queixas contra as violações dos direitos civis e reivindicações pelo o direito à
cidade (Simões, 2010a; Helene, 2015).
A primeira manifestação pública de prostitutas conhecida no país é uma passeata realizada
em São Paulo, na Avenida São João, em 1979. Contra a brutalidade policial na região da “Boca do
Lixo” - que havia causado a morte de duas transexuais e uma grávida - milhares de prostitutas
fecharam as ruas do centro da cidade como protesto. Gabriela Leite, que se tornaria pouco depois a
principal “cara” desse movimento, relata esse evento em sua autobiografia:
...se nós conseguíamos realizar aquilo com o centro de São Paulo, é porque dava pra fazer
outras coisas mais. No auge da excitação com a passeata, algumas perguntas brotavam na
minha cabeça: “Por que nós não nos organizamos de uma maneira mais permanente?”
“Porque a gente não se organiza contra a violência policial?” Comecei a ver nisso um
trabalho político seríssimo, concreto, que faz parte do dia-a-dia da prostituição (LEITE,
1992, p. 85 e 86)
Mais tarde, em 1987, é realizado o primeiro encontro nacional de prostitutas, com cerca de
setenta mulheres provenientes de onze estados do país, a partir do qual foi criada a Rede Brasileira
de Prostitutas. Poucos meses depois, acontece a fundação da primeira associação de prostitutas do
Brasil, encabeçada por Gabriela Leite e criada também em função da necessidade de se proteger de
um processo de remoção e segregação urbana (1987, Rio de Janeiro-RJ), seguida pela GEMPAC
(1990, Belém-PA) e APROCE (1990, Fortaleza-CE). A partir de então, surgem organizações de
prostitutas por todo o Brasil (Moraes, 1996; Lenz, 2014; Leite, 1992 e 2009; Leite & Lenz, 2013).
A reivindicações principais desse movimento social são o fim da violência, do preconceito e
do estigma sofridos pelas prostitutas. Para isso, a visibilidade e o reconhecimento dessa atividade
como trabalho é um dos seus objetivos principais. Nesse sentido, o desafio consiste em transformar
a prostituição um modelo valorizado de profissão. Isso porque, ainda hoje, identificar-se
publicamente como “puta” pode ter consequências extremamente perigosas. Margot St. James,
prostituta, ativista e criadora da primeira organização de prostitutas no mundo, explica de que forma
a conotação negativa relacionada à prostituição e a marcação depreciativa da “puta” como objeto de
insulto e desmoralização recai sobre todas as mulheres, tendo condições específicas para as
mulheres prostitutas:
[…] The word “whore” is still used to keep other women in line, all women, but the
punishment of a prostitute is the example, set by the system that: if you dont – you know –
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act right, bow down to man (I suppose), that at... you give what coming to you. And... a lot
of hookers are murdered in this country […] the prostitute became a legitimate victim for
rape, murder, robbery, and any kind of abuse, verbal abuse and physical abuse...1
(transcrição de entrevista feita à Margot St. James, “The World Whores' Summit”, em San
5
Francisco, 1989 ).
O chamado “estigma de puta”, categoria analítica introduzida por Gail Pheterson, escritora e
militante do movimento social das prostitutas (Pheterson, 1986), é uma marcação de “desvalor” que
pode ser aplicada tanto para as “trabalhadoras do sexo” como para outras mulheres: « the adjective
'whore' is specifically a FEMALE GENDER STIGMA (…) a mark of shame or disease on an
unchaste women »6. Toda mulher está sujeita a esta classificação dependendo da forma como age,
como se veste, quais lugares frequenta, sua etnia, cor de pele, origem e classe social. O “estigma de
puta” seria um “mecanismo geral de controle social” relacionado ao gênero feminino, que serve
como instrumento, ao alcance de qualquer um para realizar um ataque contra mulheres. É por essa
razão que, a luta de uma mulher por ser valorizada, ou mesmo por sua sobrevivência e dignidade,
requer que ela acione constantemente mecanismos para afastar-se da imagem negativa da “puta”.
No caso das prostitutas, vale dizer ainda que, além de marcadas, elas constituem o próprio estigma
(Pheterson, 1986, 44-45). O “estigma da puta” é uma função normativa (Tabet, 2004, 33 e 38) e
controla a todas as mulheres (Cabiria, 2004, 108) em função da construção da imagem depreciativa
da “puta”: sua função é servir como um exemplo de punição.
Além disso, o “estigma de puta” se baseia na ideia abstrata de que a prostituição sinaliza
uma categoria de mulheres construída como totalmente separada e distinta das “outras” mulheres:
uma clivagem absoluta entre, de um lado, a “puta”, e do outro, a “mulher honesta”, representada
pela “mãe” ou “esposa” (Tabet, 2004, 7). Em função dessa dicotomia é gerada uma separação
radical entre a vida pessoal e a vida profissional das mulheres prostitutas. Um bom exemplo é a
escolha de um outro nome - o “nome de guerra” - para trabalhar. Segundo Gabriela Leite tal fato
acarreta que a prostituta viva uma “situação partida”, uma “vida partida”: é prostituta e tem
vergonha de ser, pois vive numa sociedade que a estigmatiza (conversa com Gabriela Leite, Rio de
Janeiro, 27/09/12). Dessa forma, em geral, o mundo das prostitutas é repartido em dois: a
constituição de cada mundo se relaciona intrinsecamente com cada identidade adotada, nestes que
5
“A palavra "puta" ainda é usada para manter as outras mulheres na linha, todas as mulheres, mas a punição de uma
prostituta é o exemplo, definido pelo sistema que: se você não - você sabe - agir direito, curvar-se aos homens (eu
suponho), você terá o que merece, e ... um monte de prostitutas são assassinadas neste país [...] a prostituta se torna uma
vítima legítima para o estupro, o assassinato, o roubo, e qualquer tipo de abuso, abuso verbal e abuso físico ...”
(tradução livre). Disponível em: <http://youtu.be/PlXV370ipEI>. Acesso em: fev, 2015.
6
“A palavra “puta” é especificamente um ESTIGMA DE GÊNERO FEMININO […] podemos definir o estigma de
puta como marca de vergonha ou doença que sinaliza uma mulher como escrava, incasta ou criminosa (tradução livre).
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são, via de regra, conhecidos como “os dois mundos” da mulher prostituta (Dos Anjos Júnior, 1980;
Leite, 1993; Rago, 1991; Simões, 2010a).
Associado aos valores e às imagens da divisão simbólica desses “mundos” estão também
separados, no espaço urbano, os locais destinados a essas atividades. Isto é, de maneira recorrente a
prostituição é delimitada, isolada e confinada a certas áreas da cidade. Nesse sentido, vale destacar
um importante motivo relacionado a perseguição das prostitutas que trabalham no centro de
Campinas: a cidade é conhecida por possuir uma das maiores áreas de prostituição da América
Latina, o bairro Jardim Itatinga. Segundo dados do Centro de Saúde, no local trabalham
aproximadamente duas mil prostitutas, distribuídas em cerca de duzentas diferentes casas de
prostituição. O bairro foi criado estrategicamente no final dos anos 1960, em um terreno vazio e
distante do espaço urbano consolidado, com o objetivo de confinar numa área periférica todas as
atividades ligadas à prostituição. Mesmo que, segundo a lei brasileira, sejam crimes os atos de
mediação e facilitação, bem como o lucro da prostituição por terceiros, o bairro é quase que
totalitariamente composto de casas de prostituição. Ao contrário do que é observado no centro da
cidade, no Jardim Itatinga não se reprime essas atividades. Essa prática do poder público, que
podemos chamar de “repressão seletiva” segundo Nicola Paris (2014, p. 45), é recorrente quando se
trata de prostituição, criando áreas de tolerância não oficiais7.
Segundo Soraya Simões, enquanto a chamada prostituição localizada, como o Jardim
Itatinga, costuma ser tolerada por se configurar como um “cordão sanitário”, a prostituição dispersa
nas ruas, mais visível e difusa, “é combatida por métodos muitas vezes violentos”. Essa recorrente
delimitação de um lugar específico para a prática da prostituição representaria ainda “a tradução de
uma ordem moral na morfologia urbana” (Simões, 2010b, 30-34), na qual, acontece ainda uma
relação entre a repressão da prostituição e a higienização da cidade, a partir da discriminação da
prostituta em relação aos espaços públicos frequentados pelas aquelas classificadas de “mulheres
honestas/mães/esposas”. Nesse sentido, se destaca a importância dos projetos de remodelação
urbana na criação, fixação e/ou deslocamento dos espaços de prostituição (Ibidem; Helene, 2015;
Leite, 1993, 7; Silva, 2000, 29).
Gabriela Leite afirma que, por motivos sociais bem concretos, “a prostituição ocupa, em
princípio, áreas desvalorizadas” (Leite, 1992, 126). Isto é, bairros em “transformação”, com
terrenos vagos, áreas intersticiais, com atividades obsoletas ou pouco definidas e com valor
funcional e imobiliário médio, habitados por uma população modesta e desprovida de recursos
7
Para mais informações sobre a criação do bairro ver Helene, 2014 e 2015.
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materiais. Vale dizer ainda que a prostituição faz parte de uma certa imagem social de cidade
associada ao “estigma de puta”: espaços “deteriorados”, “trash”, “esquisitos”, “perigosos”, etc.
Isto é, a partir dessas observações pode-se perceber como cada papel destinado às mulheres
tem também o seu lugar na cidade, que não podem se misturar. A “mulher honesta”, a “mãe” e/ou a
“esposa” devem permanecer confinadas às funções e ao espaço doméstico do “lar” e da família,
seguirem as regras de obediência, servidão e fidelidade de modo a se afastarem ao máximo da
imagem depreciativa da “puta”. Por outro lado, as prostitutas devem ficar restritas às funções e ao
espaço confinado destinado à prostituição e devem manter esse isolamento à partir de uma
separação radical entre esses “dois papéis”, não podendo, dessa forma, atuarem ou se assumirem
como prostitutas fora das áreas de “tolerância”, sob a pena de sofrerem as consequências associadas
ao “estigma de puta”.
Na passarela passeata da Daspu
Na luta pela desconstrução da imagem de deterioração e o confinamento imposto às
prostitutas, esse movimento social começa a instituir no espaço urbano iniciativas tais como
festivais, performances artísticas e práticas políticas de ocupação da cidade que promovem o tema
da prostituição, com o objetivo de atrair a atenção, tornar visível e valorizar a atividade. Neste
sentido, a criação da Daspu destaca-se como um exemplo maior dessas ações (Simões, 2010b, 27;
Lenz, 2008).
De forma similar ao evento em Campinas, o primeiro desfile da Daspu aconteceu em um
espaço da cidade em disputa pelas prostitutas: a Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro. Segundo
Flávio Lenz, essa praça - que tinha “ares boêmios e artísticos” e uma quantidade expressiva de
prostitutas trabalhando - começa a sofrer um processo de segregação urbana e gentrificação, em
2002, em função de um programa de “revitalização” urbana do Ministério da Cultura.
Segundo Gabriela Leite, são as prostitutas as primeiras a serem expulsas quando se iniciam
a maior parte das intervenções urbanas (Leite, 2006). Os processos de gentrificação advém de ações
que buscam revalorizar economicamente e simbolicamente espaços da cidade, de modo que estes
tenham valor dentro do sistema capitalista. Para isso é recorrente expulsar aqueles que
“dificultariam” esse processo. Ou seja, a clássica estigmatização da pobreza e a sua segregação,
cujas justificativas são as conhecidas práticas higienistas de “limpeza social”, se inicia, via de regra,
com a expulsão das prostitutas. Ademais, a prostituição e o “estigma de puta” são usados
instrumentalmente na criação de uma imagem depreciativa destas áreas, como um exemplo de
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“degradação” (Helene, 2015).
Dessa forma, ameaçada pela gentrificação, a Praça Tiradentes é escolhida como palco do
primeiro desfile da Daspu. Um desfile manifesto, ao qual Flávio Lenz intitulou mais tarde de
“passarela-passeata” (Lenz, 2008, 34, 74-78). Nesse primeiro evento, elas demonstraram de forma
incisiva sua estética, sua voz e sua sensualidade. Segundo descreve Flávio Lenz:
Em poucos minutos, prostitutas vestindo parangolés espalharam pétalas de rosa vermelha
sobre a rua para a entrada triunfal das colegas. As manequins dasputinhas começaram a
surgir pela porta do Hotel Nicário [local de programas das prostitutas da praça], arrancando
os primeiros aplausos, torcendo pescoços e provocando o tumulto das câmaras. Uma a uma,
ou em pares, […] percorreram a rua e pétalas em direção oposta à Praça […]. Ladeadas por
uma multidão que, mesmo entusiasmada, respeitou o espaço do desfile, acompanhadas na
passarela-passeata […] pelas câmeras e luzes da GNT [agência televisiva], por fotógrafos
de outros veículos e agências, elas arrasaram! Cabeça erguida, peito empinado, sorridentes
e sensuais, malemolentes, emocionadas, vibrantes (Ibidem, 81, grifo meu).
André Villas-Boas compara a performática atuação desta grife às estratégias que vêm
adotando os movimentos sociais nas últimas décadas, “políticas estéticas”: “estratégias políticas de
afirmação de identidades e de direitos à cidadania que não se limitam às formas tradicionais do
ativismo político (ou mesmo o substituem de todo, em certos casos)”. Como modelo dessa nova
configuração de militância, figura o movimento LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis,
Transexuais e Transgêneros), que por meio de suas paradas pautam e reivindicam sua identidade a
partir da “própria expressão de sua sexualidade em praça pública”. É um ativismo político em que,
ao invés das atividades artísticas serem apenas um “braço cultural” da mobilização, estas se
“tornam o próprio movimento”: “Dançar ou desfilar, seja de tanguinha prateada, seja de vestido de
noiva com logotipos desbotados de hotéis de encontro [uma criação da Daspu] é a própria ação
política” (Villas-Boas, 2008, 12-15). Em outras palavras, ao mesmo tempo as prostitutas mostram
seus atributos para desfilar, elas mostram a cara e fazem política à sua maneira (Simões, 2010b, 26
e 27). São reivindicações que atuam na desconstrução de paradigmas ligados aos direitos sexuais ao
(re)afirmarem sua estética e sua identidade por meio dessas “profanações” do espaço público das
cidades: “quando minhas amigas putas desfilam lindas e altivas, sem vergonha de ser puta, estão
falando por si mesmas e sendo políticas, extremamente políticas e revolucionárias” (Gabriela Leite
apud Lenz, 2008, 19 e 133).
Esta forma de fazer e de ser um movimento social altera, ainda, conceitos que identificam a
institucionalização dos movimentos sociais, revisitando práticas militantes associadas ao feminismo
e à luta contra preconceitos relacionados especificamente às mulheres. Nesse sentido, as militantes
desse movimento social, ao mostrarem seus rostos e afirmarem-se publicamente “putas”,
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desestabilizam as fronteiras entre as dicotomias fictícias criadas pelo estigma de puta. É o que
podemos observar na escolha do título da autobiografia de Gabriela Leite: "Filha, mãe, avó e puta”
(Leite, 2009) ou no discurso feito na fundação da associação de Campinas a seguir:
Tudo bem meninas? Vocês me conhecem como Cida não é, mas meu nome verdadeiro é
Salete. [...] eu no princípio tinha vergonha de ficar na praça [no Centro], vergonha, vinha
uma pessoa conhecida eu corria, me escondia. Mas aí eu começava a pensar, mas meu
Deus, eu vivo disso, pago minhas contas, sobrevivo disso, e porque que eu vou me
esconder? Ninguém vai pagar as minhas contas... eu comecei a pensar assim e comecei a
frequentar a Associação. Eu morria de vergonha de alguém me ver nas praças, gente que é
isso? Que vergonha... [...] E comecei a ver com a Associação que não era nada disso, nós
somos gente de carne e osso, que vive, tem memória, dorme, sonha, tem família.
Antigamente as prostitutas tinham cafetão, hoje não, nós temos família. Filhos, pais, mães,
que sobrevivem do nosso trabalho, com dignidade. (Salete, discurso na Assembleia de
Fundação da Associação Mulheres Guerreiras, 19/09/2007).
Isto é, sua visibilidade na sociedade - e na cidade - aponta para uma reinterpretação do papel
social da mulher: a partir do enaltecimento positivo da classificação “puta” acontece a
desconstrução das clivagens entre a "mulher honesta/esposa/mãe" e a "prostituta" . Nesse sentido,
vale destacar que uma das reivindicações recorrentes de Gabriela Leite era que a palavra “puta” se
tornasse, um dia, uma “palavra bonita”: “sempre sonhei com a palavra puta sendo falada por todos
com a sonoridade e a força que a palavra tem (Leite, 2005)”. Ou seja, propunha uma
“reapropriação” dessa categoria, de modo a ressignificá-la dando-lhe um sentido positivo, muito
semelhante ao que foi realizado com os termos “Dyke” e “Queer”, e que ainda tenta empreender o
movimento da Marchas das Vadias com os termos “Vadia/Slut”: “se a gente não toma as palavras
pelo chifre, e assume elas, a gente não muda nada” (“Porque Gabriela gosta da palavra Puta”, UM
BEIJO para Gabriela…). Isto é, o que e antes era considerado desvio, é reafirmado como fonte de
orgulho: acontece um movimento de reapropriação de sua própria marginalidade, na qual a
afirmação identitária se torna uma arma política (Sauzon, 2012, 3 e 4). Um ótimo exemplo dessa
atuação pode ser visto com a atitude performática da prostituta e militante Lourdes Barreto,
fundadora do movimento de prostitutas no Brasil junto a Gabriela Leite, que, com 74 anos de idade,
tatuou em seu antebraço a frase "Eu sou puta".
Portando, o movimento social das prostitutas contesta as simbologias que carregam os
corpos das mulheres dependendo de sua maneira de vestir, agir e locais que frequentam na cidade,
espaço este onde ainda impera o poder masculino. Põe ainda em evidência a violência sofrida por
TODAS as mulheres em função do “estigma de puta”. Pode-se dizer também que se estabelece
enquanto vanguarda ao reinterpretar, desafiar e ao romper as normas de gênero/sexualidade, as
hierarquias e as divisões nas estruturas institucionais em relação ao gênero feminino. A partir da
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reafirmação simbólica de sua identidade “puta” empreendem uma reconquista de seu espaço na
cidade e na sociedade. Ao mesmo tempo que recusam circular como prostitutas apenas em espaços
confinados e mostram sua cara fora dos “guetos” e outros espaços de “tolerância”, elas estabelecem
uma crítica a um certo modelo de cidade, ao mesmo tempo em que contestam um certo modelo de
“mulher”. A reconquista da categoria “puta” acontece ao mesmo tempo em que empreendem a
reconquista de seu direito à cidade.
Referências
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MULHERES GUERREIRAS – Desbravando Estradas da vida. Realização: Theresinha Ferreira,
Diana Helene e Aline Tavares, 2014, DVD e online, Campinas, 30 min
(https://youtu.be/zgCf_QQjxRg).
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The social movement of sex workers and the women's right to the city
Abstract: The social movement of prostitutes in Brazil has been based on a series of themes and
debates that are fundamental for (re) thinking about gender and feminism, especially on issues
related to women's use of the city. From the case study of the organization of prostitutes in the city
of Campinas, "Women Warriors Association", I present in this oral communication the results of
the doctoral thesis "‘Preta, pobre e puta’: the urban segregation of prostitution in Campinas: Jardim
Itatinga", defended in 2015 at the Institute of Urban and Regional Planning of the Federal
University of Rio de Janeiro - IPPUR-UFRJ, winner of the Capes Thesis Prize in urban and regional
planning. In this paper I analyze how this singular social movement guides the issue of feminine
equality in the context of an action associated with struggles for the right to the city and gender,
revisiting and reconstructing forms of militanting within feminism. From the observation of the
form of performance and characteristic manifestation of this organized movement, which mainly
uses the body as a platform for "profanation" of the public space - aiming at generating visibility
and deconstructing paradigms related to sexual rights - this movement acts in the deconstruction of
“The Whore Stigma" (Pheterson, 1986), a powerful control structure for all women, especially to
control over their way of circulating and appropriating off the cities.
Key words: Prostitution, Rigth to the city, The Whore Stigma, social movements, whore feminism
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