Thiago Tolfo
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia:
fontes e especificidades
UMinho | 2017
Thiago Tolfo
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia:
fontes e especificidades
Universidade do Minho
Instituto de Ciências Sociais
Janeiro de 2017
Universidade do Minho
Instituto de Ciências Sociais
Thiago Tolfo
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia:
fontes e especificidades
Dissertação de Mestrado
História
Trabalho efetuado sob a orientação da
Professora Doutora Maria Manuela dos Reis Martins
Janeiro de 2017
DECLARAÇÃO
Nome: Thiago Tolfo
Endereço eletrónico:
[email protected]
Telefone: +5555 96891052
Número do Bilhete de Identidade: 8116CC165
Título da Dissertação de Mestrado: A urbanização romana no noroeste da Hispânia:
fontes e especificidades
Orientador:
Professora Doutora Maria Manuela dos Reis Martins
Ano de conclusão: 2017
Ramo do Conhecimento do Mestrado:
História
DE ACORDO COM A LEGISLAÇÃO EM VIGOR, NÃO É PERMITIDA A REPRODUÇÃO DE
QUALQUER PARTE DESTA TESE.
Universidade do Minho, ____ / ___ /2017
Assinatura: ________________________________________________
Agradecimentos
Primeiramente quero agradecer à minha orientadora, Professora Doutora Maria Manuela
dos Reis Martins, por quem detenho muita estima e admiração pelo trabalho que tem
desenvolvido ao longo de décadas no âmbito do Projeto de Bracara Augusta e do estudo da
cidade de Braga e pelo seu contributo para os estudos arqueológicos em geral. O meu
reconhecimento também se direciona aos seus valiosos conselhos e correções, fundamentais
para a realização deste trabalho, bem como à sua postura sempre crítica e zelosa.
Aos professores do Mestrado em História da Universidade do Minho queria agradecer,
também, o seu contributo para a minha formação. O meu agradecimento dirige-se muito
particularmente ao Doutor Arnaldo Rui Azevedo Sousa Melo, coordenador daquele Mestrado no
momento de minha chegada (20014/2015), essencialmente pela sua atenção e disponibilidade
na explicação do funcionamento do referido curso e nas orientações que me forneceu para
cumprir as minhas obrigações académicas e para orientar as minhas investigações.
Aos colegas, bolseiros e profissionais da Unidade de Arqueologia da Universidade do
Minho (UAUM), agradeço todo o apoio que me concederam para a realização deste trabalho e
pelas condições e ambiente que me proporcionaram para redigir boa parte deste texto. Destaco
em particular a Mestre Fernanda Eugénia Puga Magalhães, pelo auxílio, compreensão, conselhos
e amizade e pela sua sempre pronta disponibilidade para resolver os problemas com que me
defrontei, bem como pela sua dedicação.
Ao Professor Doutor Joaquín Ruiz de Arbulo Bayona, da Universidade Rovira i Virgili
(URV/Tarragona), agradeço ter-me proporcionado todas as facilidades na realização das minhas
atividades de investigação no âmbito do estágio ERASMUS+, que realizei no segundo semestre
do ano académico de 20015/2016, em Tarragona, sendo sempre muito solícito e paciente, um
exemplo que pretendo seguir no futuro.
À Doutora Diana Gorostidi Pi, agradeço a amizade, carisma e acolhimento no momento
de minha chegada ao Institut Català d’Arqueologia Clàssica (ICAC), louvando o seu exemplar
profissionalismo, que vem contribuindo efetivamente para os estudos epigráficos da antiga
Tarraco. O meu reconhecimento também para a funcionária dos Serviços Gerais do ICAC, Teresa
Masip Masip, pela simpatia e preocupação rotineira para comigo e para as minhas atividades de
pesquisa no Instituto. O meu agradecimento é extensível a todos os funcionários e à direção do
ICAC, que me prestaram todo o tipo de auxílio que necessitei.
iii
Faço também um agradecimento geral aos Serviços de Relações Internacionais da
Universidade do Minho (Sri) no tocante à resolução dos assuntos relativos ao meu estágio,
oportunizado pelo programa europeu ERASMUS+. Não posso deixar de agradecer também a
disponibilidade da Doutora Helena Paula Carvalho, coordenadora do Programa Erasmus, que
permitiu com o seu empenho a minha mobilidade para Tarragona.
Por fim, não posso deixar de fazer menção à aprendizagem académica e pessoal que
me foi facultada pela Universidade do Minho e pela minha estadia em Portugal, um país que,
sob o meu ponto de vista, se mostrou muito acolhedor, com uma infinidade de riquezas culturais
e paisagísticas e uma forte identidade nacional, que aprendi a apreciar. O conhecimento e as
experiências que adquiri neste país serão guardadas com especial ternura nas minhas
memórias.
Acredito que antes de qualquer realização empreendida temos a responsabilidade de
refletir sobre o trajeto percorrido, para assim apontar quais foram as motivações que nos levaram
a dar continuidade às nossas tarefas académicas cotidianas, principalmente nos momentos de
maior desiquilibro. Sendo assim, creio ser minha obrigação reconhecer a importância das
pessoas que nos apoiaram nos momentos de dificuldade e oportunizaram a realização de um
sonho, que se transformou numa ideia amadurecida ao longo dos anos, tornando-a num
aprendizado para vida.
Neste sentido, gostaria de deixar expresso o meu reconhecimento aos meus
antepassados que nunca desistiram da vida e do bem estar familiar. Logo, representando toda
as gerações, quero fazer um agradecimento póstumo, em memória dos meus avós paternos,
Gentil Tolfo, descendente de imigrantes italianos, que sempre lutou para proporcionar uma vida
apropriada aos seus familiares, enfrentando cotidianamente as dificuldades da labuta do campo
e à sua respetiva cônjuge, minha querida avó, que há pouco tempo se despediu de nós, Auta
Gai Tolfo, mulher honrada, devota à família, aos amigos e sobretudo a Deus, pela qual sempre
tive muito carinho, respeito e afetuosidade. Representando a minha família materna quero
prestar o meu respeito ao meu falecido avô, Vitor Rosa da Silva, bom pai, homem humilde e de
grandes virtudes, como também à minha avó, Lurdes Ribeiro de Souza, um polo agregador da
família, que acredito ter como seu maior legado a responsabilidade pela unidade familiar, a qual
exerce com mestria. Também gostaria de fazer um agradecimento e homenagem ao meu
padrinho de crisma, o meu querido tio Élio Tolfo, que deixou muito cedo a nossa família.
iv
Especialmente quero reconhecer a imprescindível importância do meu núcleo familiar
em todas as instâncias da minha vida, enquanto símbolo de união, carinho, felicidade,
responsabilidade e segurança. Ao meu pai, Sadi Tolfo, homem gentil, honesto, carinhoso,
honrado, protetor, talvez o meu maior exemplo enquanto homem social, portador de um caráter
irrepreensível, que emana aos seus próximos uma sensação de segurança e equilíbrio. À minha
mãe, Áurea Regina Silva Tolfo, mulher que me proporcionou a riqueza da vida, a quem devo o
afeto mais sincero e provido de pureza, que me é agraciado desde o dia em que me
proporcionou viver entre nossos semelhantes. Também ao meu irmão, Sadi Tolfo Junior, uma
outra parte de mim, sangue do meu sangue, o meu melhor amigo, uma das pessoas mais
importantes da minha vida, quero agradecer os muitos anos de convivência que criaram um
complacente companheirismo e uma imensurável reciprocidade.
Com esta evocação familiar quero reconhecer, de um modo abrangente, o valor da
minha família Silva, por parte materna e da minha família Tolfo, do lado paterno, porque ambas
me conferiram um dever cívico e de responsabilidade para o nome que uso.
Aos meus amigos de Santa Maria/RS, aos quais me ligam sentimentos que há mais de
uma década continuam sólidos, queria agradecer o seu suporte emocional, que, nalguns
momentos da realização deste mestrado, foi um excelente refúgio. Também quero reconhecer o
apoio dos meus amigos dos diferentes cantos do Brasil, Portugal, Espanha e do mundo,
destacando a minha amiga Edmara de Castro Pinto, que me ajudou com o seu carinho,
dedicação e incentivo, não no alvorecer desta empreitada, mas no seu desgastante
encerramento. Também à Alice Dutra Balbé, pela amizade e disponibilidade em me ajudar,
sobretudo aquando da minha chegada a Braga e aos meus amigos Luiz Felipe Santos, Francisco
Conrado e Diana Sofia Ferreira da Rocha por todo o apoio prestado na fase final da elaboração
da dissertação.
Finalmente, quero fazer uma menção aos meus professores da Universidade Federal de
Santa Maria (UFSM), sábios do conhecimento que me possibilitaram a formação enquanto
historiador. Em especial ao Prof. Dr. Vitor Biasoli e ao Prof. Dr. Carlos Henrique Armani, dois
grandes amigos que me encorajaram no meu entusiasmo constante em tornar-me um
historiador do mundo antigo.
v
vi
Resumo
A urbanização no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades.
O presente trabalho consiste na abordagem do processo de urbanização romana da
região do NO da Hispânia, tendo por base a avaliação dos conhecimentos disponíveis
propiciados pelas fontes escritas, epigráficas e arqueológicas. Para o efeito foram selecionadas
as capitais dos três conventos jurídicos do NO peninsular, fundadas por Augusto, Bracara
Augusta (Braga), Lucus Augusti (Lugo) e Asturica Augusta (Astorga), duas cidades de estatuto
intermediário, que funcionaram como capitais regionais do conventus bracaraugustanus, Aquae
Flaviae (Chaves) e Tongobriga (Freixo, Marco de Cavaneses), tendo sido igualmente avaliado o
papel dos núcleos secundários, de carácter semiurbano, amplamente dispersos pelo território,
denominados pelos termos de fora e vici.
Com o objetivo de enquadrar e problematizar o processo de urbanização romana no NO
da Hispânia, o trabalho desenvolve-se numa linha teórica voltada para a compreensão e
desenvolvimento do conceito de romanização, desde a sua génese, no século XIX, até à
atualidade, tendo-se procurado igualmente valorizar o estudo do fenómeno urbano no contexto
do quadro teórico e metodológico de recuperação do património material das cidades europeias
do contexto pós-guerra.
Assim, numa perspectivas da ciência histórica, procuramos desenvolver um trabalho de
avaliação crítica dos dados disponíveis sobre a urbanização romana na região do NO peninsular
através dos resultados dos estudos arqueológicos e epigráficos, articulados com a
documentação textual antiga de autores que tratam da região em questão. Neste sentido,
estabelecemos um panorama sobre a ocupação romana da Península Ibérica, enquadrado pelas
razões político-estratégicas que podem ter estado na sua origem, procurando-se compreender o
programa urbanístico de Augusto no quadro da reorganização administrativa que se segue às
guerras cantábricas. Deste modo, tentamos compreender os processos que justificam a criação
das capitais conventuais e a posterior consolidação do urbanismo do NO peninsular durante as
dinastias Flávia e Antonina, que resultaram na integração das populações indígenas provinciais
na esfera cultural do Império romano, analisando-se, com base nos estudos empíricos, a forma
como se consolidou o elemento urbano enquanto instrumento catalizador dessa integração.
vii
Abstract
The urbanization in the Northwest of Hispania: sources and specificities
The present work consists in an approach to the Roman urbanization process of the NW
region of Hispania, based on the evaluation of the knowledges availables propitiated from the
epigraphics, archaeologicals and written sources. For effect were selected the capitals of the
three formative juridical convents: Bracara Augusta (Braga), Lucus Augusti (Lugo), and Asturica
Augusta (Astorga), two cities of intermediate status, that worked as regional capitals of the
conventus bracaraugustanus, such as Aquae Flaviae (Chaves) and Tongobriga (Freixo, Marco de
Cavaneses), having also been evaluated the role of two secondary nuclei, of a semi-urban
character, and widely dispersed throughout territory, named fora and vici.
In order to frame and to problematizate the process of Roman urbanization in the NW of
Hispania, the present work has been developed in a theorical line focused on the understanding
and development of the concept of Romanization, since its genesis in the nineteenth century,
until the present, having search equally valorize the study of the urban phenomenon in the
context of the theoretical and methodological cadre from the recovery of the material heritage of
European cities in a post-war context.
Thus, from a perspective of a historical science, we seek to develop a synthesis work of
the urban nuclei. This will be performed through the results of archaeological and epigraphic
studies, and through ancient textual documentation analyses of authors about the region in
question. Therefore, we established an overview of the Roman occupation of the Iberian
Peninsula framed for the political-strategic reasons that may have been at their origin, search to
understand the augusto urbanistic program in the administrative reorganization cadre that follows
the cantabrian wars. Thus, we try to understand the processes that justify the cration of
conventual capitals and posterior consolidation of urbanism in the NW peninsular during the
Flavian and Antonine dynasties, which have resulted in the integration of the provincial
indigenous populations in the cultural sphere of the Roman Empire, analyzing, based in the
empirical studies, the way in which the urban element was consolidated as a catalytic instrument
of that integration.
viii
Índice
Agradecimentos
Resumo
Abstract
Índice
Lista de figuras
iii
vii
viii
ix
x
Introdução
3
Parte I – Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
1. A construção do conceito de romanização a partir de Theodor Mommsen
2. As novas formas de pensar a romanização
3. O conceito de urbanismo no mundo romano
4. O papel das cidades no processo de romanização
9
13
20
27
Parte II – A romanização e urbanismo na Hispânia romana
1. A Hispânia romana: organização administrativa e rede hierárquica
de cidades
2. A romanização e urbanização do NO peninsular
2.1
A ocupação pré-romana e a questão dos oppida
2.2
Augusto e a fundação das capitais jurídicas
2.3
A consolidação do urbanismo entre os Flávios e os Antoninos
33
41
41
46
54
Parte III – As cidades do NO à luz das diferentes fontes
1. As capitais jurídicas
Bracara Augusta
1.1
1.2
Asturica Augusta
1.3
Lucus Augusti
2. A rede de capitais regionais
2.1
Aquae Flaviae
Tongobriga
2.2
3. Os aglomerados secundários
63
63
72
81
87
87
92
97
Considerações finais
Referências bibliográficas
105
111
ix
Lista de Figuras
Figura 1 – Representação do traçado da nova cidade com o cardus maximus e o decumanus
maximus
25
Figura 2 – Planta da cidade romana de Timgad/Argélia
26
Figura 3 – Divisão provincial da Hispânia romana
37
Figura 4 – Divisão dos conventos jurídicos da Hispânia por províncias
39
Figura 5 – Tabula Lougeiorum
49
Figura 6 – As três circunscrições conventuais do Noroeste hispânico e suas respectivas capitais
jurídicas
51
Figura 7 – Inscrição epigráfica proveniente de Asturica Augusta que faz referência a L. Pempeius
Faventinus, inscrito na tribo Quirina
55
Figura 8 – Inscrição epigráfica proveniente de Bracara Augusta que faz referência a L. Terentius
Rufus, inscrito na tribo Quirina
56
Figura 9 – Exemplo de epígrafe com o registo a sacerdoti Romae Augustorum conventus
comreferência à tribo Quirina
59
Figura 10 – Malha urbana de Bracara Augusta
72
Figura 11 – Malha urbana de Asturica Augusta
81
Figura 12 – Malha urbana de Lucus Augusti
87
Figura 13 - Malha urbana de Aquae Flaviae
92
Figura 14 - Malha urbana de Tongobriga
97
x
Introdução
_______________________________
Introdução
A urbanização romana na Hispânia enquadra-se no âmbito da expansão de Roma, tendo
como consequência, o gradual avanço e ocupação da Península Ibérica em diferentes contextos
ao longo de dois séculos. Entretanto, para o período que decorre entre o desembarque das tropas
romanas em Emporion (Ampúrias), em 218 a.C., até o fim das guerras cantábricas, entre 29 e 19
a.C., temos um escasso número de vestígios arqueológicos e epigráficos que permitam retratar os
diferentes momentos dessa ocupação. Contudo, em finais do século I a.C., momento que encerra
o governo republicano em Roma e se consolida uma proposta de principado idealizado por
Augusto, cujas medidas se refletem na sólida estruturação do Império, as províncias ocidentais
serão palco de uma verdadeira proliferação de núcleos urbanos construídos como instrumentos
de integração sóciopolítica das comunidades indígenas e como importantes agentes de
aculturação.
Com efeito, o processo urbanizador empreendido por Roma, nas suas distintas variantes,
representou um modelo administrativo de integração das populações das províncias hispânicas
sob o domínio imperial. Tendo em vista que a região do NO peninsular representava, juntamente
com o território cántabro, uma zona periférica, com uma forte componente indígena e baixa
influência romanizadora, procurámos neste trabalho avaliar de que forma o processo urbanizador
protogonizado por Augusto, com a criação das capitais conventuais do NO, nomeadamente,
Bracara Augusta (conventus Bracaraugustanus), Lucus Augusti (conventus Lucensis) e Asturica
Augusta (conventus Asturicensis), contribuiu para uma efetiva política de integração e
romanização.
Para a realização deste estudo interessou-nos entender o processo de fundação e
desenvolvimento destas capitais, baseado, essencialmente, nos resultados obtidos pela
investigação arqueológica que se desenvolveu nas cidades de Braga, Lugo e Astorga, a partir dos
anos 70 do século passado. O nosso trabalho contemplou igualmente a valorização dos
conhecimentos empíricos proveniente dos estudos epigráficos, com destaque para o significativo
contributo dos autores franceses da Escola de Bordéus1 e de outros investigadores espanhóis,
articulado com os dados fornecidos pela documentação literária antiga dos autores que abordaram
o espaço territorial do NO hispânico. Assim, consideramos que esta contribuição constitui um
trabalho de História Antiga, que cruza os contributos de várias fontes, que nos ajudam a questionar
1
Com destaque para os investigadores Alain Tranoy, Patrick Le Roux e Robert Etienne.
3
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
e problematizar o passado de uma região que a historiografia tradicional considerou até há poucas
décadas insuficientemente integrada e romanizada. Cabe também ressaltar que a intensificação
dos trabalhos arqueológicos nas cidades históricas do NO peninsular, que permitiu identificar
numerosos vestígios da sua fundação romana, possui um forte impacto na vida cultural dessas
cidades, alicerçado em investimentos na preservação do património material e imaterial, que tem
permitido valorizar a sua identidade.
O ponto de partida do nosso trabalho consistiu numa releitura da literatura historiográfica
respeitante ao protagonismo das cidades no processo de romanização do NO peninsular, com
todas as nuances que o uso deste conceito subentende. Na verdade, desde a extraordinária obra
de síntese de Alain Tranoy, de 1981, relativa à romanização do NO, muito se avançou na
investigação arqueológica, quer nas cidades, quer nos seus territórios, facto que permitiu, não só
caracterizar a forma urbis das capitais conventuais, como identificar numerosos aglomerados
urbanos secundários. No seu conjunto, os resultados da arqueologia, ainda que fragmentários e
dispersos por uma vasta bibliografia, maioritariamente de carácter monográfico e regional,
permitem contrariar algumas das premissas defendidas por vários autores relativas a uma
deficiente integração da região nos modelos económicos e culturais do Império.
Assim, podemos considerar que a problemática que norteou a realização deste trabalho
se centra na tentativa de compreender o processo de urbanização do NO, enquanto processo de
romanização e integração daquele território. Problemática que remete igualmente para a questão
do impacto que as cidades conventuais e os demais centros urbanos, que se desenvolvem ao
longo do Alto Império, tiveram no desmembramento do povoamento pré-romano e na criação de
novas centralidades políticas nos territórios integrados. Na verdade, e em última instância,
procuramos com este trabalho verificar a veracidade de algumas das premissas defendidas pela
historiografia, no que se refere à deficiente integração do NO da Hispânia, supostamente apenas
com impacto a nível das cidades administrativas.
Neste sentido, os objetivos visados neste trabalho centraram-se na compreensão dos
processos que conduziram ao desenvolvimento da urbanização romana do NO peninsular, iniciada
com Augusto e prosseguida e consolidada no período Flávio. Foi igualmente objetivo desta
contribuição compreender os contextos sócioculturais pré-romanos, em que se desenvolveram as
cidades e avaliar as especificidades que as caracterizam, quer do ponto de vista da sua fundação,
4
Introdução
quer no âmbito do seu desenvolvimento, ao longo do Alto Império. Neste contexto, procurámos
compreender o papel dos indígenas no processo geral de urbanização do território.
Para atingir os objetivos visados lançámos mão dos dados da arqueologia urbana, do
registo epigráfico e dos textos de autores antigos, tendo-se procurado demonstrar os notáveis
avanços do conhecimento relativo ao urbanismo romano, particularmente decorrente das fontes
arqueológicas. Por isso, a metodologia de investigação utilizada consistiu basicamente na leitura
crítica da bibliografia disponível, que se revelou bastante diversificada e fragmentada, escasseando
as obras de síntese.
O nosso trabalho apresenta-se estruturado em três partes, nas quais procurámos
problematizar e situar a nossa investigação na concepção teórica sobre o mundo romano antigo,
traçar o contexto histórico da ocupação da Hispânia romana e retratar algumas linhas de força do
processo urbanizador no NO hispânico.
Assim, na primeira parte do trabalho procurámos traçar cronologicamente a evolução do
conceito de romanização, a partir do contributo de Theodor Mommsen, no século XIX, para nos
centrarmos, de seguida, na génese dos estudos urbanísticos aplicados ao mundo romano. Por
fim, convergimos a nossa atenção na importância do processo de urbanização enquanto processo
de romanização.
Na segunda parte do nosso trabalho orientámos as nossas abordagens na atuação romana
em território peninsular, tendo em consideração a sua forma de ocupação e a inserção das novas
cidades na formalização de uma rede hierárquica de núcleos urbanos com diferentes funções no
âmbito do Império. De seguida, centrámos as atenções na realidade do NO hispânico, articulandose a compreensão dos território pré-romanos com as principais medidas administrativas adotadas
por Augusto, no âmbito do desenho das novas províncias, discorrendo-se, de seguida, sobre as
políticas adotadas pelas dinastias Flávio-Antonina, que teve por resultado, uma maior consolidação
do urbanismo romano na região do NO.
Por fim, na terceira parte deste trabalho, apontam-se exemplos específicos para o
processo de urbanização romana no NO através dos resultados obtidos nas investigações
arqueológicas e epigráficas, usando-se também a documentação literária antiga. Neste sentindo,
analisa-se o processo de criação e urbanização das três capitais jurídicas, Bracara Augusta (Braga),
Lucus Augusti (Lugo) e Asturica Augusta (Astorga), valorizando-se igualmente algumas das capitais
regionais, designadamente Aquae Flaviae (Chaves) e Tongobriga (Freixo/Marco de Cavaneses),
5
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
ambas inseridas no conventus bracaraugustanus. Concluímos esta parte do trabalho analisando
a funcionalidade e representação dos aglomerados secundários no NO, dando-se ênfase a dois
tipos de núcleos semiurbanos, concretamente os fora e os vici.
Terminamos este trabalho formulando as principais considerações que resultam da
investigação realizada, onde refletimos sobre o diferencial contributo das fontes para a
compreensão da matriz urbana romana, traçando-se possíveis diretrizes de trabalhos futuros.
6
Parte I
___________________________________
Repensando os conceitos de romanização e
urbanismo
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
1. A construção do conceito de romanização a partir de Theodor
Mommsen
O conceito de romanização surge associado a um momento histórico de legitimação dos
grandes impérios coloniais, de afirmação de identidades nacionais e de formação de coleções de
vestígios de antigas civilizações que marcou o cenário global de finais do século XIX e início do XX.
Os investigadores daquele período conviveram com a influência ideológica da consolidação das
ideias nacionalistas, que pretendiam legitimar os Estados Nações e as práticas imperialistas.2 Por
isso, a retomada dos preceitos clássicos e a sua ressignificação voltada para analogias com o
passado glorioso dos grandes impérios helenísticos e romano, traduz-se na visão positivista
construída pelos intelectuais da época em relação à temática do imperialismo romano. Em outros
termos, o contexto das práticas imperialistas das antigas potências europeias influenciou o pensar
académico, na forma de investigar o passado.3
O termo romanização passou a ser usado, estritamente na acepção moderna, a partir do
estudioso alemão Theodor Mommsen. No final de sua vida, Christian Matthias Theodor Mommsen
é premiado com o ‘Prémio Nobel de Literatura’ com a sua obra ‘A História de Roma’,4 publicada
em 1854-1855. A ser Mommsen um precursor sobre os estudos romanos as suas teses serviram
por muito tempo como referência para os estudos da História de Roma.5 A pesquisas seguintes,
sobre a Roma antiga, desenvolveram a teoria do ‘expansionismo defensivo’ do Império romano,
um modo de avaliar as questões sobre política imperialista que perdurou até meados da década
de 60 e 70 do século XX.6 O expansionismo defensivo7 traduz-se na participação de Roma em
conflitos que afetassem a sua própria sobrevivência. Como atesta Mommsen, no decorrer da sua
expansão territorial, Roma misturará os seus objetivos expansionistas com os assuntos
diplomáticos de seus aliados envolvendo-se em conflitos armados e em novas políticas de aliança,
Não devemos deixar de refletir sobre o movimento de busca por espólios pessoais. Muitos explorados, com seus próprios propósitos negociavam
peças como verdadeiros mecenas contemporâneos. Isso reflete-se na perda de alguns objetos históricos que até aos dias de hoje se encontram
em mercados clandestinos ou na posse de privados.
3
Apesar da evolução das ciências humanas no que diz respeito ao passado sabe-se que a História é vista sobre o ponto de vista atual. Portanto os
estudos relativos a determinados conceitos refletem muito os acontecimentos dos respetivos períodos, sejam políticos, econômicos, sociais, entre
outros.
4
Título original Römische Geschichte.
5
Silva, 2011a: 3.
6
Silva, 2011a: 5.
7
Para Silva (2011a, p.5), na teoria do ‘expansionismo defensivo’ de Mommsen, uma das principais características é a concordância dos benefícios
da centralização do império em Roma, ao mesmo tempo que, ao longo de sua história passa a ter um olhar mais cuidadoso para as províncias
conquistadas.
2
9
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
o que, gradualmente, acabou por mudar o aspecto da formação militar, pouco a pouco mais coesa,
maior e eficaz8.
Na aplicação teórica dos autores do século XIX, a destacar Mommsen pela influência
póstuma dos seus estudos, o imperialismo romano foi pensado em termos de comparações
positivas9 com o imperialismo inglês.10 Portanto é importante perceber alguns aspectos de seu
contributo académico ligado ao contexto no qual estava inserido.
Para entender a importância do legado de Mommsen é essencial conhecer quem foi este
distinto agente transformador dos estudos romanos. Nascido em Oldesloe, 11 no ano de 1817,
Theodor Mommsen teve um percurso de formação científica imenso e variado, facto este que levou
o investigador a buscar novas formas de coletar dados alusivos ao mundo romano.
A sua vocação orientou-se para os estudos jurídicos e filológicos,12 tendo seguido as lições
metodológicas da ‘Escola Histórica de Direito’,13 pois estava convencido de que a indagação da
tradição jurídica poderia ser um caminho mais produtivo e exigente para reconstruir a história
institucional romana do que o uso do método histórico-filológico herdado de Barthol Georg
Niebuhr14. Por isso, entrou em contacto com a ‘Nova filologia’ ensinada por Otto Jahn, quando
percebeu que ela podia ser uma importante ferramenta para penetrar na história romana15. Nesta
perspectiva, a filologia representou um elemento essencial para o aprofundamento da investigação
histórica e jurídica, de onde retirou as bases metodológicas, sobretudo as modernas técnicas de
crítica e edição textual proposta por Jarls Lachmann.16
O seu contributo para a epigrafia foi igualmente significativo, pois compreendeu a
necessidade de dispor de um corpo de inscrições latinas o mais rigoroso e completo possível17. A
sua viagem a França e a Itália foi a este propósito fundamental.18 Em Itália, sob a supervisão de
Borghesi, Mommsen reviu com profundidade as inscrições do Reino de Nápoles, o que permitiu
aperfeiçoar a sua competência como epigrafista, disponibilizando novas ideias relacionadas com
O procedimento da adoção de aliança e defesa mútua dos territórios ocupados explica-se na matriz expansionista da cidade de Roma no Lácio.
(Mommsen, 2003: 468-469).
9
Apesar da indiscutível influência do positivismo no século XIX a palavra ‘positiva’ empregada no texto está referindo-se a comparações brandas,
sem uma metodologia apurada que diferencie os distintos contextos históricos.
10
Silva, 2011a: 4.
11
Situada em Eiderstedt, uma península na costa do Mar Norte, no distrito de North Frieslans, em Schleswig-Holtein. Na época de Mommsen
estava sobre a autoridade dinamarquesa.
12
Delgado Delgado, 2003: 46.
13
Escola pandectista alemã.
14
Delgado Delgado, 2003: 46.
15
Delgado Delgado, 2003: 45-46.
16
Delgado Delgado, 2003: 48.
17
Delgado Delgado, 2003: 49; conforme o autor, Mommsen julgava este corpus indispensável para os estudos do direito público romano.
18
Delgado Delgado, 2003: 49; Bancalari Molina, 2005: 135.
8
10
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
o planeamento de um corpus.19 Em 1847, propôs à ‘Academia de Ciências do Reino da Prússia’,
sediada em Berlim, um plano detalhado para preparação e edição das inscrições que atualmente
conhecemos como Corpus Inscriptionum Latinarum (ou C.I.L). Para se ter uma ideia da
contribuição de Mommsen para a epigrafia, refira-se que no ano de sua morte já haviam sido
publicados 15 volumes com mais de 120.000 inscrições.20
Theodor Mommsen também se envolveu noutros projetos, designadamente nos estudos
numismáticos, por influência de Julius Friedländer,21 tendo publicado no ano de 1848 a obra ‘O
Tratado sobre o sistema monetário romano’.22
Todo o conhecimento obtido por Mommsen está refletido na sua obra ‘História de Roma’,23
cujos três primeiros volumes foram editados entre 1854 e 1856, onde se narra a evolução de
Roma desde os tempos primitivos até ao término das últimas resistências republicanas a Caio
Júlio César,24 finalizada no terceiro volume com a batalha de Tapso no ano de 46 a.C. e o triunfo
de César.25 A sua ideia em relação ao quarto volume era o período de tempo entre a batalha de
Tapso e o fim do reinado de Marco Aurélio. No entanto, este volume nunca foi concretizado26. Em
contrapartida lança o quinto volume em 1885, consagrando-o ao porvir das províncias do Império
romano desde César a Diocleciano.27
Esta obra de Mommsen constitui um marco significativo para os estudos romanos. É a
primeira vez que são citadas as distintas formas de documentos históricos e usada uma
metodologia e uma teoria de análise, facto este que condiciona o início dos estudos de uma
História científica do mundo romano. Por outro lado, é importante salientar a articulação de temas
do passado com a História do presente. Por este motivo não podemos dissociar o autor do seu
contexto, percebido nas entrelinhas dos seus escritos, onde as concepções ideológicas se
articulam com as formas de construção do conhecimento histórico do século XIX.
Theodor Mommsen sempre teve uma intensa atividade política. Mesmo sendo um homem
que voltou a sua atenção para a ciência, considerou como obrigação a participação nos problemas
Fernández, 1998: 1; Delgado Delgado, 2003: 49.
Delgado Delgado, 2003: 50. Atualmente o projeto C.I.L. vem publicando, paulatinamente, uma segunda edição revisionada e atualizada, na qual
leva a seguinte correspondência ‘C.I.L²’.
21
Delgado Delgado, 2003: 50.
22
Fernández, 1998: 1.
23
O título original é Römische Geschchte.
24
Molina Gómez, 2001: 446.
25
Fernández, 1998: 1-2.
26
Para Fernández (1998: 2) com este quarto volume se entrelaçaria com a História da decadência do Império Romano de Edward Gibbon.
27
Fernández, 1998: 2; Molina Gómez, 2001: 446; Delgado Delgado, 2003: 52.
19
20
11
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
da sua época e as questões públicas do seu Estado.28 Por isso, podemos afirmar que Mommsen
foi um personagem histórico que enfrentou e viveu as transformações do seu tempo, refletidas
nos seus estudos. Na verdade, o seu conceito de romanização está diretamente relacionado com
o cenário político-económico do século XIX. Ao apropriar-se do termo imperium, a historiografia
oitocentista construiu a definição de Império como política expansionista e incorporadora,
empreendida por Estados Nações, que passavam a exercer por conquista a soberania sobre uma
ampla extensão territorial.29 Além disso, Mommsen considera que a difusão da civitas romana
criou uma espécie de cidadania mediterrânica imperial, percebida como a ‘matriz dos Estados
modernos’30. Por outro lado, concebeu o Império romano numa dimensão holística, como um
espaço geográfico romanizado, ecuménico e, sobretudo, globalizado,31 entendendo a romanização
como simples processo de aculturação. Influenciado pelo imperialismo europeu do seu tempo o
autor procurou explicar as lições da unificação da Itália empreendida por Roma32 no contexto dos
problemas do seu tempo, designadamente relacionados com a unidade alemã.33 Na perspetiva de
Mommsen a Prússia, igual a Roma, teria o trabalho de unificar a Alemanha contemporânea.34
Em conclusão, percebemos que Theodor Mommsen categorizou uma nova forma de
abordagem do mundo antigo baseado na História, na epigrafia e no Direito, sendo o pioneiro dos
estudos do imperialismo e da romanização, criando uma linha de interpretação da história romana
que combinava a tradição literária com a epigráfica, numismática,35 filologia e os estudos
jurídicos.36
Molina Gómez, 2001: 447-448; Delgado Delgado, 2003: 45; Bancalari Molina, 2005: 139.
Seus estudos confiam-se na concepção de Estado Nação das correntes positivistas e historicistas da escola alemã do século XIX com as práticas
imperialista assente nas instituições romanas promotora da romanização na História do império romano (Delgado Delgado, 2003: 48).
30
Esta tese foi tão influenciadora que foi sustentado por Claude Nicolet (Bancalari Molina, 2005: 145).
31
Bancalari Molina, 2005: 145. Aproximação com a história global do historicismo alemão a ter suas raízes no teórico Max Weber.
32
Para Mommsen a unificação da península itálica se produziu em benefício de Roma pela capacidade centralizadora representada na figura de
Júlio César que ortogou a cidadania a certas regiões submetidas que até então não possuíam (Fernández, 1998: 1-2).
33
Sua visão sobre as revoluções de 1848 atribui as particularidades feudais aos impedimentos mais fortes para a unidade da Alemã e insiste na
necessidade do desaparecimento dos pequenos Estados germânico para o surgimento da Alemanha (Fernández, 1998: 2).
34
Fernández, 1998: 2.
35
Bancalari Molina, 2005: 136.
36
Delgado Delgado, 2003: 46.
28
29
12
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
2. As novas formas de pensar a romanização
O conceito de romanização, desde a sua origem, trata da influência romana em relação
aos povos integrados em sua esfera de ocupação, seja ela territorial, cultural, económica ou
política. Este conceito apresenta-se como um dos mais discutíveis aplicado à História de Roma,
sendo objeto de intenso debate por parte dos estudiosos que, nos distintos contextos de
transformação do pensamento cultural e intelectual, buscaram e buscam novos questionamentos
sobre o mundo romano provincial. Neste sentido, tomando por base o panorama global dos
estudos referentes à romanização, vamos expor a evolução do conceito, do seu desenvolvimento
pós Theodor Mommsen até às suas implicações na historiografia recente.
Durante o século XIX, o modelo cultural e do pensamento estava moldado nos parâmetros
das escolas científicas dos antigos Estados Nações da Europa. No cenário do historicismo alemão,
notáveis investigadores reinterpretaram os estudos voltados para as sociedades do passado,
sobretudo as sociedades greco-romanas, tendo por base contribuições historiográficas e
arqueológicas.37 O conceito de romanização adquire então características político-sociais próprias
do contexto oitocentista, de forma que teremos nas pesquisas relacionadas com as sociedades
antigas, afinidades com as problemáticas do momento em que foram pensadas. Como já
mencionado, Theodor Mommsen foi um importante impulsionador dos estudos clássicos, que
atualizou referências bibliográficas, incorporou estudos filológicos, o direito romano antigo, a
documentação literária e a epigrafia, entre outras fontes, numa única obra denominada ‘História
de Roma’, que perdurou por dezenas de anos no prestigiado palco do ensino superior europeu.
Porém, sem menos méritos, outro importante autor coetâneo de Mommsen, Fustel de Coulanges,
publicou em 1864 a obra ‘A cidade antiga’, fortemente marcada por tendências nacionalistas e
anti-germânicas. No pensamento de Coulanges, a base da sociedade era a família e a religião,
pilares sociais que estariam diretamente articulados com a propriedade da terra. 38 Do mesmo
modo que Mommsen, Coulanges reforça o pensamento positivista e nacionalista do século XIX na
construção das primeiras formas de pensar a cientificidade na História Antiga.
Silva, 2011b: 57-58.
Fustel de Coulange acreditava que a propriedade da terra, além de caracterizar-se como a principal ferramenta económica e de sobrevivência
da família, unia-a à religião através do culto aos mortos (Cavada Nieto, 1995: 68).
37
38
13
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Para citar alguns importantes expoentes associados ao legado mommsensiano e de Fustel
de Coulanges, podemos apontar o inglês Francis Haverfield (1860-1919) e o francês Camille
Jullian (1859-1933), que respetivamente estudaram as províncias da Bretanha e da Gália,
utilizando como fontes a documentação literária antiga, a epigrafia e a arqueologia, cujo foco era
identificar traços de romanização nessas regiões.39 Haverfield, descreve a romanização como o
processo em que a cultura romana e a ‘bárbara’ se combinam preponderando os elementos
civilizatórios romanos.40 Sem uma análise e crítica mais detalhada, Haverfield chega a esta
conclusão por julgar evidente a forte presença romana na cultura material, enquanto Jullian,
influenciado pelos discursos nacionalistas franceses da sua época,41 esbate um pouco a carga
civilizatória dos romanos,42 salientando as qualidades ‘positivas’ dos Gauleses.43
Jullian e Haverfiled foram o símbolo da formatação do pensamento teórico da virada do
século XIX para o XX e as suas concepções sobre o mundo antigo enquadravam-se no âmbito do
estabelecimento de paralelos entre os imperialismos romano e os Estados Nações europeus. Esta
prática historiográfica, que se sustentava na ideia de progresso, buscando uma validação nos
padrões imperialistas frente às populações conquistadas, serviu de modelo predominante para os
estudos sobre a Antiguidade, influenciando a investigação do mundo romano até ao período póssegunda guerra mundial.
No entanto, a partir das décadas de 1960 e 1970 a historiografia antiga romana foi alvo
de uma mudança relativa à reinterpretação e uso dos conceitos tradicionais. Logo, a ideia que
associava a romanização aos processos civilizatórios dos países europeus no mundo, foi
resignificada, tendo como motivo os acontecimentos globais ocorridos no período pós-segunda
grande guerra. Para elucidar melhor esta mudança é necessário perceber o contexto político em
que se enquadram as novas perspetivas teóricas dos estudos da Antiguidade.
Na sequência do fim do conflito armado em 1945, o quadro global registou um
enfraquecimento das potências imperialistas e a emergência de duas propostas económicas e
ideológicas distintas, transformando o mundo numa bipolaridade de nações encabeçada pelo
capitalismo norte-americano e pelo comunismo soviético, facto que resultou no aparecimento de
Para Hingley (2005: 34), a questão da romanização proposta por Haverfield e Jullian possui características espirituais que superam as dos povos
conquistados.
40
Terminologia muito utilizada sobretudo por historiadores vinculados às escolas teóricas oitocentistas.
41
Hingley, 2005: 35.
42
As fontes utilizadas pelo autor para identificar os fortes traços de romanização foi a obra de Tácito vita et moribus Iulii Agricolae.
43
A própria forma de denominar genericamente de gauleses os diferentes povos da província romana da Gália é uma herança nacionalista do
século XIX.
39
14
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
entidades supranacionais.44
Nesta mesma época emerge uma série de movimentos de
independência nas antigas colónias africanas e asiáticas, marcando os processos associados à
descolonização,45 com profundas consequências políticas, sociais e culturais. Estes
acontecimentos contribuíram para um processo embrionário de globalização e afetaram a
intelectualidade da época, uma vez que conduziram a reinterpretações teóricas da História.
Para compreender o início da mudança da perspetiva positivista no campo historiográfico
é também importante remontar ao ano de 1929, marco do surgimento dum novo movimento
intelectual francês, encabeçado pelos historiadores Marc Bloch e Lucien Lefebvre, que fez
despontar uma nova proposta teórica em discordância com o positivismo do século XIX. Este
movimento, que se desenvolveu em Escola teórica, teve na sua segunda geração a direção do
historiador Fernand Braudel, que contribuiu para fundar novos conceitos (estrutura e conjuntura)
e metodologias (como a história serial das mudanças na longa duração).46 Na sua obra ‘La
Mediterranée et le Monde Mediterranéen à l’époque de Philippe II’ Braudel pondera a questão da
temporalidade histórica, estabelecendo uma nova percepção de tempo histórico, enquanto
processo, repartido em três durações e velocidades, criticando as divisões históricas tradicionais.
Deste modo, trabalhou a questão do ‘tempo histórico’ e do ‘tempo natural’. Para Braudel o ‘tempo
histórico’ estabelece um recorte temporal e consequentemente a delimitação de um tema, sendo
a sua duração curta, média e longa, pautando-se na premissa de que os acontecimentos históricos
possuem ritmos e constâncias distintas.
A dimensão temporal desenvolvida por Braudel revolucionou a forma de pensar e
pesquisar história durante a segunda geração dos Annales (1946-1968), abrindo portas à
utilização de uma grande variedade de fontes, ajudando a refinar procedimentos teóricometodológicos e contribuindo para a defesa da interdisciplinaridade entre as ciências humanas,
que conduziu à ascensão da Sociologia durante a segunda metade do século XX.47
Comunidade Europeia do Carvão e Aço (Tratado de Paris, 1951) e a Comunidade Econômica Europeia (Tratado de Roma, 1957).
O marco que estabelece o período de descolonização é o início da década de 1940 com a desobediência civil de Gandhi (Satyagraha) e a
Conferência de Bandung de 1955 (Silva, 2011b: 61).
46
Porto, 2010: 133.
47
Numa aula inaugural no Collège de France, em 1950, Braudel verbalizou sobre a questão de fazer história. Para ele o passado está incrustado
na forma como somos atingidos pelo nosso meio. Acreditava que as mudanças ocorridas nos últimos anos abalavam as bases do pensamento
teórico positivista: ‘A história se encontra, hoje, diante de responsabilidades temíveis, mas também exultantes. Sem dúvida porque jamais cessou,
em seu ser e em suas mudanças, de depender de condições sociais concretas. (...) E se seus métodos, seus programas, suas respostas mais
precisas e mais seguras ontem, se seus conceitos estalam todos de uma só vez, é sob o peso de nossas reflexões, de nosso trabalho e, mais
ainda, de nossas experiências vividas. Ora, essas experiências, durante estes últimos quarenta anos, foram particularmente cruéis para todos os
homens: elas nos lançaram, violentamente, no mais profundo de nós mesmos e, além no destino conjunto dos homens, isto é, nos problemas
cruciais da história’ (Braudel, 1992: 17-18).
44
45
15
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Na sequência do contributo braudeliano surgiram inúmeros pensadores empenhados em
corrigir os erros das recordações do período imperialista-colonial, destacando as singularidades
culturais dos seus países de origem.48 Nesta ótica insere-se a figura de Edward Said, uma peça
fundamental na modificação da visão global eurocêntrica que fora aplicada no exercício do seu
ativismo palestino. Na sua principal obra, O orientalismo (1978), Said tratou da invenção do
Oriente pelo Ocidente, cujo pensamento estabelecia um passado oriental, retratado como
ferramenta de legitimação das identidades discriminatórias dos países europeus, condenando
deste modo uma visão eurocêntrica ainda predominante49. Portanto, no que se refere à
problematização das ciências humanas, Said constitui uma referência obrigatória, sobretudo no
tocante ao conceito de identidade.
A investigação académica, de um modo geral, passou a interrogar a questão das
identidades nacionais e a gradativamente substituir este conceito pelo de identidades culturais,
tribais, étnicas, familiares, subjetivas, entre outras.50 Os autores responsáveis por esta inversão
conceitual pretendiam encontrar aspectos híbridos da presença europeia nas antigas colónias,
relacionados com a cultura local e as lutas pela independência. Neste panorama de
questionamentos voltados para a abordagem cultural, o termo ‘romanização’ foi repensado, pois
até então os estudos das identidades das populações de todo Império romano não tinham espaço
nos trabalhos sobre a História de Roma, uma vez que estavam limitados às pesquisas da
prevalência cultural das instituições romanas nas províncias e com o legado da capital do Império.
Para além da crítica ao eurocentrismo europeu, Said define o conceito de imperialismo,
na sua obra ‘Cultura e Imperialismo' (1993), como a ação de pensar, colonizar, controlar terras,
que não são as suas, distantes, habitadas e alusivas a outros povos. Enquadra a noção imperialista
como uma atividade exercida tanto na prática quanto na teoria, comportando atitudes dum centro
metropolitano dominante que administrasse territórios distantes. Contradizendo o positivismo
oitocentista defensor dos elementos civilizatórios, pensa que a ação imperialista só pode ser
alcançada pelo uso da força, pela colaboração política e por dependências económica, social e
cultural.51 Logo, o imperialismo seria um processo da cultura metropolitana, compreendida
enquanto um agrupamento de códigos de identificação, referência e distinção geográfica, controle,
Silva, 2011b: 61.
Silva, 2011b: 61-62.
50
Silva, 2011b: 62.
51
Para Said (1995: 40-41), o uso da força cria uma dinâmica específica de dependência, que sobrevive em determinadas práticas económicas,
políticas, sociais e ideológicas.
48
49
16
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
autoridade, dependência, vantagens e desvantagens, cuja função era a de sustentar, elaborar e
consolidar uma prática imperial.52
A luta de Edward Said para uma visão incipiente de cultura periférica, juntamente com o
repensar do tempo histórico redirecionou as abordagens teóricas sobre a romanização. No
seguimento desta sua atuação teórica, o investigador Moses Finley, na sua obra ‘ Ancient
Economy’, datada de 1973, trata de desmembrar o ainda abrangente conceito de Mundo Romano
e Mundo Grego, desconstruindo a ideia duma história romana como um Estado em contínuo
desenvolvimento, portador dos elementos civilizatórios a serem futuramente herdados pelos
europeus. A problemática de Finley retoma enunciados da obra de Braudel sobre o espaço do
Mediterrâneo, pois para Finley o palco dos acontecimentos no Império romano está inserido numa
‘História do Mediterrâneo’, a ter nas cidades-Estados, o grande centro das transformações de
cunho sóciopolítico e económico.53
Todas estas problematizações serviram de base para mudanças fundamentais na forma
de tratar a romanização nos últimos 40 anos, pormenorizando e relativizando a atuação de Roma
nas periferias do Império. Consequentemente, alguns autores com trabalhos realizados
essencialmente nas províncias romanas, ajudaram a reestruturar o conceito, relativizando-o e
aplicando-o a realidades culturais locais.
Um dos contributos dessa reinterpretação baseia-se na análise da articulação entre as
elites locais e os elementos de disseminação cultural romana, tendo como expoentes
historiográficos os investigadores Greg Woolf e Martin Millet. Ambos contribuíram para a
abordagem do conceito referente à identidade e síntese cultural, ajudando a repensar o papel das
elites indígenas na gestão administrativa das províncias romanas.54 De acordo com Greg Woolf,
detalhar as características das províncias foi possibilitado pelas mudanças ocorridas no modo de
perspetivar a romanização, devedoras do grande contributo da Arqueologia do pós-guerra.55 Em
outras palavras, o diálogo dos historiadores com os arqueólogos desencadeou um forte aumento
de informações, que ajudaram a ultrapassar as interpretações generalizantes tradicionais e
permitiram compreender o contributo indígena na cultura material das diferentes regiões do
Império. Woolf argumenta que esta percepção se norteia na adoção da cultura material romana
Said, 1995: 40-41.
Silva, 2011b: 62.
54
Estes autores estudam respetivamente os casos provinciais da Bretanha e da Gália.
55
Woolf, 2003-2004: 159.
52
53
17
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
pelas elites locais, que teria funcionado como um novo instrumento de manutenção da ordem
social, afirmação esta que contraria as hipóteses interpretativas baseadas no uso da força por
Roma para manter a paz dentro do Império. No ponto de vista de Woolf, a cultura romana nas
províncias traduz-se na propagação da humanitas, portadora do ideal educacional do homem
romano, difundida através do projeto de expansão e organização do império empreendido por
Augusto.56
Em contrapartida, Millet sugere uma Roma que se caracterizava por uma política externa
que tinha por objetivo difundir alianças articuladas com a sua esfera de influências nas regiões
conquistadas.57 Esta hipótese indica uma romanização indireta ou, nas palavras do autor, uma
‘auto romanização’, projetada pelas elites locais, no interesse de adotar os hábitos romanos para
manter a sua preponderância social. Nesta mesma linha de pensamento, se insere Richard Hingley
que vê na política romana um incentivo para as elites locais adotarem os hábitos romanos, facto
que levaria a restante população a assumir a cultura romana por imitação, seguindo o exemplo
dos seus líderes e dirigentes.58
Por outro lado, Louise Revell possui um posicionamento distinto relativamente à interação
de Roma com as províncias, que contraria a visão de Millet e Hingley, considerando que a
aceitação de hábitos romanos pelos povos conquistados não foi uma adoção exclusiva das elites.
As trocas de experiências estariam interligadas aos espaços públicos, definidos pela autora como
‘espaços sociais’,59 pelo que aspectos como a religião, o urbanismo e o culto imperial, todos
diretamente ligados à iniciativa imperial, influenciariam rotineiramente o modo de viver dos
indígenas, tendo resultado na adoção de novos padrões comportamentais.60
Com propostas diferentes de Louise Revell, mas igualmente distanciando-se da postura
associada a uma assimilação cultural privilegiada das elites provinciais, Andrew Wallace-Hadrill
analisa a romanização buscando compreender as engrenagens dentro das próprias províncias que
pudessem legitimar a questão que envolve a maneira de ‘ser romano’. Para Wallace-Hadrill, o
modo de ser (viver) ‘romano’, que o autor define como romanitas, evidencia-se nos espaços
públicos e no comportamento quotidiano, potencializados pelo crescente fluxo comercial, que
gerou uma necessidade de produtos importados, explicada pela adoção da romanitas pelas
Woolf, 1998: 54.
Mollet 1990: 38.
58
Hingley, 2005: 42.
59
Revell, 2009: 21.
60
Revell, 2009: 193; a autora prefere a troca do uso da terminologia de romanização pelo uso do termo Roman-ness (Silva, 2011b: 66).
56
57
18
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
populações indígenas, causando desta forma mudanças nos padrões comportamentais das
populações provinciais. Nesta lógica, a articulação das trocas comerciais a crescente assimilação
da romanitas dentro das sociedades provinciais alteraria profundamente o estilo de vida, a forma
de comunicação, as práticas religiosas e a interação com outras populações circundantes.61
Por último, referiremos dois autores, também inseridos na recente historiografia, que
procuram compreender as relações entre a ação romana e os indígenas nas áreas mais periféricas
do Império. O primeiro deles é David Mattingly, especialista em estudos do Norte da África, local
que o autor acredita ter sido o cenário do enriquecimento das elites locais propiciado pelas
estratégias utilizadas por Roma. Nas suas considerações reconhece que o governo romano
exerceu uma administração baseada na divisão e loteamento de terras, a serem administradas
por particulares e representantes imperiais, fazendo com que, a longo prazo, estas medidas se
tenham convertido em circunstâncias de desenvolvimento que foram aproveitadas pelas elites
locais. Entre essas medidas estão os excedentes agrícolas da região, o estímulo de produção na
Tripolitânia e Namíbia, o incentivo comercial proporcionado pela presença do exército, a
proliferação de acordos de arrendamento de terras e a sedentarização das tribos indígenas, fator
crucial para a transformação das elites indígenas provinciais em proprietários de grandes
extensões de terras.62
Com pesquisas que apontam para a análise da periferia dentro do Império, a
investigadora Susan Alcock classifica as províncias em dois tipos, tendo em conta a esfera
territorial romana. De acordo com a autora, existiam províncias que eram produtivamente ricas e
outras que, contrariamente, tinham o nível de produção muito abaixo da expectativa do governo
central, o que tradicionalmente se explicava por fatores naturais, como clima, relevo e composição
do solo. Ao analisar a região da Aquéia, que até então se enquadrava no segundo grupo, Alcock
percebeu particularidades associadas ao comportamento das elites aqueias, que elegeram os
centros urbanos em detrimento do campo, adquirindo características próprias no seu estilo de
vida, procurando preservar traços singulares da sua cultura ancestral, como a devoção ao recinto
da polis, ou aspetos religiosos. Em suma, a questão da configuração identitária da Aquéia
contribuiu para uma resistência à presença cultural romana, que Alcock conclui como sendo um
dos principais fatores que justificam a baixa produtividade na região.63
Wallace-Hadrill, 2008: 315-355.
Mattingly, 1997: 134.
63
Silva, 2011b: 67.
61
62
19
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Em jeito de conclusão, pensamos que o conceito de romanização pode ser entendido num
sentido amplo, como um processo que fez com que as relações de hegemonia de Roma
fomentassem múltiplos processos de negociação de identidades, de ressignificações simbólicas e
adequações de objetos e comportamentos culturais, que implicaram a criação de novos elementos
híbridos.64 Desta maneira, constatamos uma evolução do conceito desde o final do século XIX,
quando surgiu numa perspetiva positivista e legitimadora de práticas imperialistas, sofrendo uma
alteração do sentido de acordo com novas condições políticas e ideológicas que influenciaram o
campo académico. Portanto, o conceito sofreu uma reinterpretação concordante com a evolução
histórica recente associada à redefinição do papel das centralidades políticas e à compreensão
periférica de mundo. Estes fatores fizeram com que a historiografia contemporânea buscasse
alternativas para pensar a romanização num plano interdisciplinar, com maior delimitação dos
recortes espaçotemporais e análises que valorizam as especificidades das províncias e regiões do
Império.
3. O conceito de urbanismo no mundo antigo
O conceito de urbanismo é abordado por diferentes áreas do saber, definindo-se deste
modo como um campo multidisciplinar, que nos remete para o questionamento sobre o que vem
a ser ‘urbano’. Numa perspetiva geral podemos caracterizar como urbano um espaço físico que
compreende um conjunto de normativas e equipamentos reguladores que nos remetem para a
esfera política, administrativa, religiosa, económica e social.
O esforço de compreender o fenómeno urbano remete-nos para a Antiguidade, onde as
primeiras grandes civilizações se organizaram em espaços urbanos. Estes conglomerados de
pessoas migrantes de diferentes regiões, sobretudo do campo, formalizaram as primeiras cidades
do mundo antigo, no Oriente Próximo, no antigo Egito, na China e Vale do Indo. Ao estabelecermos
as fontes antigas como nossos primordiais documentos para analisar a preocupação em construir
o que chamamos de espaços urbanos e as suas múltiplas funcionalidades 65, a teoria racional de
Hipodamos de Mileto (séc. V a.C.), sobre a recriação da cidade, apresenta-se como um dos
64
65
Bondioli, 2011: 7.
Ribeiro, 2008: 29.
20
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
principais legados sobre o urbanismo antigo. Segundo Aristóteles,66 a cidade ideal devia obedecer
a uma racionalidade de organização que está patente no planeamento dos espaços urbanos com
traçados ortogonais. A expressão mais evidente desta ideia assenta na característica do uso da
cidade de forma racional e funcional, noções estas que foram herdadas pelos romanos.67 Séculos
mais tarde Marcus Lucius Vitruvius Pollio (finais do séc. I a.C.) sedimentará essas noções na sua
obra De Achitectura, que influenciou outros tratadistas como Leon Battista Alberti, em meados do
século XV.
Inspirados em Vitrúvio, além de Alberti, também Antonio Averlino, Francesco di Giorgio
Marti, entre outros, contribuíram para os tratados de arquitetura renascentista que propunham a
concepção de ‘cidades ideais’,68 inspiradas no formato geométrico, com ruas retilíneas e
composição urbana simétrica.69 Estes ideais renascentistas, precisamente aplicados na
formatação do traçado urbano e na monumentalização do espaço físico inspiraram as
composições urbanas barrocas, nos diferentes cenários europeus, fruto da reinterpretação
clássica. O princípio básico da cidade renascentista caracterizava-se pela integração de ruas
retilíneas, a proliferação de praças e jardins, elementos ancorados numa composição artística e
arquitetónica fortemente ornamentada70. Este formato urbano originou-se no contraponto da
cidade medieval que, conforme François Ascher,71 se erigiu numa atmosfera urbana de incertezas
e inseguranças, onde as cidades organizavam-se em corporações em torno de um ambiente
fechado, numa perspetiva espacial que o autor classifica como sobreposta, solidária e dependente.
Mas o processo de desenvolvimento urbano terá o seu grande impulso a partir da
revolução industrial inglesa. Este período, marcado pela transição dos métodos de produção das
novas manufaturas, pelo crescimento do mercado e demandas de bens de consumo, implicará
numa nova releitura morfológica das cidades, já que estas sofrerão uma explosão demográfica
que estimulou novas preocupações com a questão urbanística. A partir deste momento elas
Aristóteles, Política, II, 8.
Hipodamo de Mileto não é o criador do plano ortogonal, mas se utiliza deste para seu método de planificar cidades. Aplicou sua teoria na
reconstrução de sua cidade natal, Mileto, e na construção do porto do Pireu, na região administrativa de Atenas.
68
Estas cidades nunca foram materializadas.
69
Ribeiro, 2008: 30.
70
Ascher, 2004: 24; na mesma página o autor expõe a opinião de que a cidade renascentista se torna um espaço mais aberto, com ruas mais
amplas voltadas a uma perspetiva mais funcional e social com a proliferação de bairros, agora mais povoados. No plano da arquitetura, para Ascher
é neste momento que se constitui enquanto uma forma de disciplina paralela moderna, correspondendo um campo específico que passa a integrar
valores e técnicas novas, sem prejuízo das novas reinterpretações dos elementos clássicos, mas atribuindo novas liberdades artística o que
desencadeará a arte barroca. Para o autor Glenn Storey (2006 apud Hassan, 1993: 555) o urbanismo em larga escala somente começou no
Renascimento Europeu a partir da fabricação de manufaturas em grandes proporções, do aumento da atividade industrial, e das relações de
comércio local e global.
71
Ascher, 2004: 20.
66
67
21
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
passarão a ser projetadas numa perspetiva que visava desenvolver soluções progressistas
articuladas com os novos ritmos que as sociedades industriais exigiam.72
Acompanhando a mudança física das cidades, será no decorrer do período oitocentista e
boa parte do século XX, que se estrutura um aprofundamento do conceito de urbano. No âmbito
dos estudos sobre as cidades, a preocupação com a questão ‘urbana’ ganha peso ao se tornar
uma área especializada de conhecimento tanto na Geografia quanto na Sociologia, contribuindo
para desenhar novas perspetivas de abordagem sobre os espaços urbanos, que permitiram que
emergisse o conceito de morfologia urbana.
O período do pós-guerra foi determinante para a ampliação dos estudos urbanísticos. No
final do conflito, e face ao cenário de destruição de muitas cidades europeias, foi necessário um
enorme trabalho de reconstrução e reinterpretação do património urbano. Neste contexto desponta
a arqueologia urbana que ajudou a recuperar os vestígios das sucessivas cidades sobrepostas no
espaço físico das cidades atuais73. Assim sendo, a ascensão da arqueologia urbana passa a
contribuir para a evolução dos estudos da história urbana. Portanto, o estudo da morfologia urbana
durante o século XX passa a constituir um objeto de estudo, quer da Arqueologia, quer da História,
partilhando deste modo, com a Geografia o interesse em analisar a estrutura física das cidades,
ainda que utilizando diferentes fontes e metodologias de análise.
Por fim, cabe salientar que desde o século XIX se regista um esforço em compreender as
questões impostas pelas ressignificações do ‘viver o ambiente urbano’ ligadas aos problemas
sociais, económicos e demográficos. Assim se formou a disciplina do ‘Urbanismo’, de carácter
multidisciplinar, na esfera das Ciências Sociais, que tem como proposta o estudo da História das
cidades e a sistematização e normalização dos elementos tipológicos básicos que formalizam o
espaço urbano, como os traçados das ruas, quarteirões, praças e parcelas, entre outros74.
Por conseguinte, para entender o fenómeno urbano no contexto do universo romano é
necessário identificar a cidade, o que ela representa e qual a sua funcionalidade. Para o urbanista
francês François Ascher,75 o fenómeno da urbanização está vinculado às interações produzidas
dentro das cidades, que o autor classifica enquanto ‘urbanidade’, exemplificada como ‘o potencial
Ribeiro, 2008: 31.
Esta informação está melhor explicitada em Martins e Ribeiro (2009-2010: 153) quando relacionam o Reino Unido como berço da arqueologia
urbana num contexto de crescimento económico na década de 50 e 60. As escavações sistemáticas realizadas neste período serão consequências
duma política de restauração das cidades históricas, designadamente de Londres, entre 1946 e 1963, sobre a supervisão de F. Grimes. (20092010 apud Carver, 1987: 103).
74
Ribeiro, 2008: 33.
75
Ascher, 2004: 19.
72
73
22
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
multiforme que produz o reagrupamento de grandes quantidades de população num mesmo
lugar’. Na sequência deste raciocínio o autor articula com a função da cidade a divisão técnica,
social e espacial da produção, fato que resulta em intercâmbios de natureza diversa entre os que
produzem bens de subsistência, bens manufaturados, bens simbólicos (sacerdotes e artistas) e o
poder. Seguindo a linha de pensamento de Ascher, Michael Pacione também aborda o conceito
de urbano enquanto um efeito sobre o estilo de vida das pessoas dentro de uma cidade. Assim
sendo, a cidade é tanto um facto físico e estrutural como subjetivo (estruturas cognitivas).76
Seguindo a ótica da cidade como um espaço físico articulado a subjetividades inerentes às ações
humanas, a cidade pode ser vista como um objeto de estudo da Arqueologia urbana,77 que
recupera as suas materialidades e espaços ao longo do tempo, ou da História urbana que recupera
os seus protagonistas.
Para o historiador Pierre Grimal ‘a civilização romana continua a ser, para nós, um
fenômeno urbano’.78 Partindo deste princípio é sabido que os romanos disseminaram pelo Império
um modelo de cidade, com concepções urbanísticas singulares, que não condizia com a capital,
Roma, metrópole que, segundo o seu passado literário, teria sido formada num contexto de
unificação dos povos do Lácio, possuindo traçados irregulares condicionados pelo relevo. No
entanto, ao longo de sua história, o expansionismo romano abarcou dentro de suas fronteiras
antigos territórios, anteriormente independentes, reestruturando-os e organizando-os em
províncias. Dentro delas integravam-se cidades de fundação anterior, ou criaram-se outras novas
para responder às necessidades de administrar o território. Não cabendo aos romanos a invenção
da cidade como espaço de vivência, deve-se a Roma a difusão sobretudo ocidental, de um padrão
de vida urbano, enquanto lugar onde se acumulavam funções políticas e administrativas,
económicas e culturais. Mas a cidade romana era também uma realidade física, na sua estrutura,
representada no traçado das suas ruas e quarteirões e nos edifícios públicos e privados.
A cidade romana pode ter diferentes origens, de acordo com o modo como se formou.
Assim, existem cidades que resultaram de prévios acampamentos militares (castra) e cidades que
evoluem de antigos povoados e cidades criadas de novo (ex nihilo). O estatuto jurídico das cidades,
em ordem crescente de importância, organizava-se em peregrinas (oppidum civium romanorum),
Pacione, 2009: 21.
Martins e Ribeiro, 2009-2010: 153.
78
Grimal, 2009: 295.
76
77
23
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
municípios (municipium civium romanorum) e colónia (coloniae civium romanorum).79 A partir do
principado de Augusto o mundo romano passará por um período de reestruturação políticoadministrativo, tendo na remodelação ou criação de novas cidades e na reorganização do seu
território em antigas e novas províncias um dos principais fatores para desenvolvimento do ideal
urbano.
A fundação de uma cidade romana tinha sobretudo um carácter funcional, racional e
religioso, que lhe conferia o estatuto de espaço sagrado. A característica principal da sua
morfologia condiz com o plano ortogonal, teorizado por Hipodamo de Mileto, mas que na realidade
já existia milénios antes, pois constitui a forma mais simples de organizar um espaço coletivo.
A cidade romana criada de novo era pensada de forma prática e funcional, que era
assegurada pela malha ortogonal das suas ruas, cujo cruzamento permitia desenhar os
quarteirões, onde se iriam construir os futuros edifícios. Mas se a regularidade era uma herança
helenística, os rituais de fundação, que tornavam a cidade um espaço consagrado, eram de origem
etrusca. Assim, a cidade basicamente era criada a partir de um rito religioso, o chamado
haruspícius (ou aruspice), em que um sacerdote, ou o cidadão que detivesse o direito a interpretar
o aruspício (augur), procurava perceber a vontade dos deuses relativa à escolha do sítio para
fundar uma nova cidade80. A sua função residia na interpretação dos voos dos pássaros, na
identificação dos presságios e na leitura das entranhas de animais. Assim, a primeira etapa
consistia na auscultação dos sinais divinos, à procura de aprovação para estabelecer o solo
sagrado no qual se iria consagrar a nova cidade, a inauguratio. Eleito o local onde se iria construir
o recinto da cidade passava-se à fase da limitatio, ou seja, à demarcação dos limites da cidade. O
fundador, provavelmente algum magistrado importante de Roma, utilizando uma simbologia que
remontava à tradição etrusca, traçava o que seriam os futuros limites da cidade, usando para o
efeito um arado, emblema da rusticidade e virilidade do homem do campo, cujo significado
representa o cidadão ideal (o fundador). Os sulcos formados pelo arado simbolizarão o pomerium,
que identifica a separação do solo onde se constituirá a nova cidade, ou seja, a divisão do solo
sagrado (interior), do não sagrado (exterior, ou ager).81 A futura muralha da cidade seria erguida
no local da demarcação dos sulcus do arado.
Ribeiro, 2008: 100.
Ribeiro,2008: 101.
81
Harouel,1990.
79
80
24
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
A etapa seguinte é designada por orientatio. Nesta fase os agrimensores determinavam
os dois eixos principais que se cruzavam ortogonalmente, formando um ângulo de 90°, sendo
marcados o decumanus maximus e o cardus maximus, que representariam as principais ruas da
cidade82. Este trabalho era realizado pelo agrimensor, que através de delicados cálculos traçava
as linhas perpendiculares. As restantes ruas eram delineadas com base nos alinhamentos
ortogonais dos eixos configurando o aspeto da morfologia da cidade que seria repartida em
quadrantes divididos em centuriae. Por fim, a consagratio era a última etapa da fundação da
cidade, cujo objetivo era receber o aval divino para compor um novo terreno urbano na terra. No
seguimento do processo o solo era transformado em terra pátria (lugar sagrado), já que para os
romanos a urbe era considerada um facto espiritual antes de material,83 necessitando deste modo
a eleição de uma divindade zeladora da nova cidade.
Após o rito de inauguração e depois de estabelecidos os seus eixos principais e
secundários, a área da nova cidade representava um espaço de simetria axial, em cujo centro, no
cruzamento do cardus e decumanus maximus, se iria localizar o espaço público do forum. O
conjunto das ruas secundárias, paralelas àqueles eixos principais, deixava entre si espaços que
formavam os quarteirões (insulae).84
Figura 1 - Representação do traçado da nova cidade com o cardus maximus e o decumanus maximus.
Mesmo sem valorizar a especificidade dos edifícios públicos e privados que compunham
as cidades romanas, importa destacar que eles materializavam no espaço as funções necessárias
Ribeiro, 2008: 101-102.
Rykwert, 1985: 117.
84
Ribeiro, 2008: 102.
82
83
25
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
à vida urbana, de carácter político e administrativo, mas também económico e religioso,
estendendo o braço de Roma às diferentes regiões do Império. Por isso, os seus edifícios e espaços
públicos possuíam um carácter religioso e funcional, cujos serviços estavam diretamente
associados às engrenagens da vida pública.85 Dentre alguns equipamentos inerentes ao espaço
urbano público e religioso podemos citar as ruas, praças, basílicas, foros, termas, aquedutos,
fontes, pórticos, templos, teatros, anfiteatros, hipódromos, cloacas, entre outros. No que diz
respeito ao âmbito privado podemos apontar os espaços destinadas a habitação, como as insulae
e as domus. Na periferia ordenavam-se as necrópoles, dispostas ao longo das vias que saíam da
cidade.
Por outro lado, importa referir que, embora as cidades criadas de novo obedecessem a
um plano ortogonal, todas elas eram singulares e possuem planimentrias distintas, decorrentes
de vários fatores, designadamente de índole geográfica e topográfica, que lhes conferiam
especificidades.86 Neste mesmo raciocíno cabe enfatizar igualmente que a base económica e o
substrato cultural das diferentes regiões pesaram também nas características dos edificados,
designadamente no que se refere à sua maior ou menor monumentalidade e aos métodos e
materiais utilizados na sua construção.
Figura 2 - Planta da cidade romana
de Timgad/Argélia (Pijoan, J.
(1988). História da Arte - Vol 2.
Lisboa: Alfa).
85
86
Burón Álvarez, 2006: 289.
Burón Álvarez, 2006: 289.
26
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
4. O papel das cidades no processo de romanização
As cidades foram um poderoso instrumento ao serviço do Império, da pax romana e do
processo de aculturação das populações indígenas nele integradas. Na verdade, devemos ter em
mente que a proliferação de cidades no Império, sobretudo a partir de Augusto, desempenhou um
papel extremamente relevante nos objetivos estratégicos de ocupação de novos territórios,
sobretudo no referente ao quadro administrativo. Se pensarmos as cidades como centros
fomentadores do ideal romano, traduzido nos seus costumes, na produção de bens materiais, na
representação linguística e na aplicabilidade das suas normas jurídicas, podemos aceitar que elas
foram o principal vetor de transformação social das populações indígenas, o que as tornam
essenciais no processo de romanização. Na verdade, importa reconhecer que o território que
compunha o mundo romano era maioritariamente rural, se excetuarmos o Egipto e o Oriente
helenizado, ou os territórios tocados pela colonização grega e fenícia, que urbanizou a costa
mediterrânica.
Estrabão fala de um número impressionante de mais de 1.000 cidades espalhadas pela
Península Ibérica.87 No entanto, atualmente sabemos que eram povoados diversificados e de difícil
caracterização, mas que poderiam ser maioritariamente oppida indígenas.88 Por sua vez, segundo
os cálculos de Plínio, a população da Hispânia, na primeira metade do século I d.C., contabilizaria
cerca de 6 a 7 milhões de habitantes, com uma densidade populacional entre 10 a 11 habitantes
por km², sem levar em conta os escravos e estrangeiros.89 Essas referências, mesmo que estejam
expondo o caso específico da Península Ibérica, permitem perceber que as províncias romanas
eram bastante populosas e que Roma necessitava de estabelecer estratégias de controle e
integração das diferenciadas populações.
Partindo do pressuposto de que a cidade é um veículo propagador da romanização é
possível compreender os motivos que levaram os romanos a criá-las num tão elevado número por
todo o Império. Na verdade, a cidade romana está diretamente associada a um ‘sistema de
integração’ que mantinha a preocupação de manter formas sofisticadas de exploração, permitindo
à população local o acesso aos elementos romanizadores reproduzidos no meio urbano.90 Assim,
Estrabão, Geografia, III,4,6,13.
Curchin, 1996: 139.
89
Le Roux, 2006: 118-119.
90
Sastre Prats, 1998: 27.
87
88
27
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
as cidades eram espaços transformadores de cultura, favorecendo o desenvolvimento de contactos
entre indígenas e os modelos de organização romanos, que potenciaram novas identidades.91 De
resto, a importância das cidades na esfera de integração das populações conquistadas por Roma,
havia já sido testada na própria Península Itálica e na província da Sicília.92
Um outro fator expressivo no quadro da proliferação de cidades, está associado à questão
militar levantada por A. Morris. Para o autor a dimensão fronteiriça do Império exigia o
deslocamento de grandes quantidades de legionários para o guarnecimento das fronteiras. Nesse
sentido, Roma procurou evitar o uso da força no esforço de dominação dos territórios recémadquiridos e fomentou a transformação de núcleos tribais em formas urbanizadas de diversas
categorias,93 onde as elites tribais foram estimuladas a inserir-se no quadro social imposto por
Roma, processo, apoiado pelo intercâmbio cultural ancorado na atividade comercial.94 Assim, é
possível pensar a cidade romana como um mecanismo de integração das populações locais,
sempre que existam mútuas dependências e interesses. Em outras palavras, as elites locais,
sustentadas pelo meio urbano, estariam numa posição passiva em relação a Roma. Do mesmo
modo, os chefes e as aristocracias locais, no exercício de comando, figuravam como peças
imprescindíveis para as ambições romanas. Assim, sendo a cidade o espaço desta correlação de
dependências, ela representou um positivo instrumento na interação entre dominador e
dominados, o que, de facto, contribuiu para benefício de ambas as partes.
Durante a República romana a quantidade de cidades compreendidas nos territórios
conquistados por Roma registou um aumento crescente, porém pouco significativo quando
comparado com o período das guerras civis, ocorrido durante o século I a.C. Podemos dizer que
ao longo deste espaço de tempo os romanos foram responsáveis pela criação de algumas colónias,
que, num âmbito geral, eram remodelações de centros urbanos indígenas pré-existentes. Portanto,
é no momento da crise republicana, sobretudo a partir das medidas adotadas por César, que os
processos de estabelecimento de novas cidades e a reconfiguração dos povoados indígenas se
tornou mais evidente. Este quadro de desenvolvimento do território, com o crescente aumento de
cidades estendeu-se até finais do século II, período considerado de florescimento do Império. Neste
Le Roux, 2006: 117.
Sastre Prats, 1998: 27.
93
Morris, 1984: 20.
94
Apesar de Morris somente indicar que o fenômeno comercial era um dos principais fatores de trocas culturais, Sastre Prats (1998: 25) reforça
que a cidade, enquanto um instrumento de controle, com raízes a partir da conquista da Sicília, em meados do século III a.C., não obrigou as
novas comunidades a integrarem-se ao sistema romano baseado num esquema ‘socioeconómico’.
91
92
28
Parte I - Repensando os conceitos de romanização e urbanismo
contexto, as províncias experimentaram uma expansão económica, cultural e urbana generalizada
e de grandes dimensões.95
Sobre a criação e organização geral das cidades durante o Império, cabe apontar a
significativa contribuição de Augusto e o seu projeto de reorganização administrativa das
províncias, já iniciado por César anos antes. Augusto deu continuidade à criação de colónias, com
o objetivo de beneficiar os veteranos das guerras civis através do loteamento de terras em zonas
estratégicas e recém pacificadas. Foi igualmente Augusto quem organizou a inserção dos
munícipios nas províncias, que chegaram a superar em número as colónias. Esta categoria urbana
era diferenciada e tinha como peculiaridade o estatuto jurídico do direito latino. De facto, é durante
o governo de Augusto que ocorre um grande crescimento populacional, associado ao
desenvolvimento interno das cidades, tendo como fatores a intensificação do comércio, o
acréscimo de cargos administrativos e o desenvolvimento da atividade artesanal.96 A importância
das medidas augustanas foi de tamanha envergadura para a criação e desenvolvimento dos novos
centros urbanos que, conforme A. Balil, o próprio Princeps, na sua Res gestae, se referiu como o
‘fundador de cidades’ e um difusor de uma política ‘urbanizadora’.97
Nos séculos seguintes ocorreram reformulações na reconfiguração dos espaços urbanos
integrados nas províncias. Por sua vez, é durante o governo dos imperadores Flávios98 que teremos
novas mudanças no estatuto político e jurídico das cidades, com a promoção do municipium
Latinum e a generalização do direito latino. Através destas medidas as cidades provinciais
aumentaram a sua esfera administrativa, reunindo um elevado número de cargos políticos. Este
facto coincidiu com o aumento da concentração monetária, o que, consequentemente, permitiu a
realização de obras públicas e a monumentalização do espaço urbano.
Nos finais da dinastia Antonina99 teremos a universalização da cidadania romana a todo o
Império, que assinala a integração jurídica da sociedade provincial. Portanto, qualquer centro
urbano teria no seu estatuto jurídico o direito à cidadania romana, salvo nalguns casos específicos,
como as cidades consideradas estipendiárias.100
Quando falamos da cidade temos de abarcar os espaços referente ao centro urbano e o campo. Logo, temos de admitir que as cidades eram
dotadas de um estatuto jurídico, condição que determinava a função dos habitantes e a importância da cidade no quadro administrativo romano.
(Le Roux, 2006: 117).
96
Montenegro Duque, 2008: 267.
97
Balil Ilana, 1976: 69.
98
Espaço de tempo que corresponde ao ano de 69 a 96 d.C.
99
Espaço de tempo que corresponde ao ano de 96 a 192 d.C.
100
Não tinha os mesmos privilégios que as outras cidades e pagavam um tributo.
95
29
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Concluímos que, inicialmente, as cidades romanas não faziam parte de um plano
estratégico integrador. O seu alastramento ao longo do território romano impôs-se por razões
administrativas e pela progressiva notoriedade da urbs no mapa mediterrânico, alcançando
proporções continentais ao longo do século I. Progressivamente, e graças ao processo de
municipalização, a cidade romana passou a representar um contexto de integração e uma clara
aproximação a Roma que reforçou o papel das colónias augustanas. Por fim, se pensarmos a
cidade como um instrumento imperial de integração das populações indígenas no âmbito
administrativo das províncias, entendemos a sua funcionalidade enquanto agente romanizador,
sendo possível considerar que representou uma necessidade histórica, fruto das pretensões de
um Império em ascensão.
30
Parte II
___________________________________
Romanização e urbanismo na Hispânia romana
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
1. A Hispânia romana: organização administrativa e rede hierárquica de
cidades
A organização administrativa da Hispânia acompanhou a progressão da conquista
romana, cujo primeiro contacto com a Península Ibérica deu-se no momento das guerras púnicas
entre Roma e Cartago, conflito este que definiria a grande potência marítima do Mediterrâneo
ocidental.101 Sabe-se que o conflito teve uma duração média superior a um século, tendo o avanço
romano pela costa mediterrânica da península sido feito de maneira gradual. Logo, a região tornouse o cenário de inúmeros confrontos bélicos e tomada de posições militares com fins estratégicos
a curto e médio prazo.
De acordo com Tranoy,102 a intervenção romana inicia-se no período final do conflito, com
a criação de duas províncias, a Hispânia Ulterior e Hispânia Citerior, no ano de 197 a.C. 103 A
insuficiência de testemunhos literários deste período torna difícil dimensionar as transformações
no âmbito social, político e económico das províncias. Para Roldán Hervás,104 a divisão do litoral
da Península durante o conflito contra Cartago possibilitou a Roma manter uma base
organizacional que culminou na conquista total do território peninsular ao longo de duzentos anos.
Logo, desde o fim das guerras púnicas, em meados do século II a.C. até à segunda metade do
século I a.C.105 decorreram ocupações de cunho intervencionista, quer com objetivos punitivos,
quer para defender alianças estrategicamente forjadas.106
Durante esse período Roma foi protagonista em inúmeros conflitos envolvendo as
populações hispânicas, dentre os quais podemos destacar o confronto contra os povos
celtibéricos,107 culminando na tomada de Numantia, contra os povos lusitanos, com ênfase na
resistência militar liderada por Viriato108 e nas incursões pelos territórios mais a norte,
designadamente na incursão de D. Junio Bruto, em 138-136 a.C, na atual região do Douro e do
Minho.109 Estes acontecimentos foram paulatinamente consolidando a presença romana na
Villanueva Acuña, 2016: 120.
Tranoy, 1981: 125.
103
Villanueva Acuña, 2016: 128; conforme Tranoy os territórios destas províncias ocupavam somente uma porção costeira da Península Ibéria que
ligava os Pirineus centrais em direção ao sul de Portugal, na atual cidade do Faro.
104
Roldán Hervás, 1988: 176.
105
Tomamos como marco significativo o governo ditatorial de Caio Júlio César e suas medidas administrativas na península.
106
Até os anos de 160-150 a.C. o progresso romano na península foi lento e muito incompleto (Tranoy, 1981: 125).
107
Villanueva Acuña, 2016: 123; a tomada de Numantia representa o marco da vitória romana sobre os povos celtibéricos. O confronto ocorreu
entre 154 e 133 a.C.
108
Villanueva Acuña, 2016: 123; Conflito que culminou com a derrota dos lusitanos após a morte de Viriato, em 134 a.C.
109
Martins, 2009a: 194.
101
102
33
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Hispânia e, deste modo, assumindo progressivamente um carácter imperialista que será mais
preponderante no decorrer do século I a.C.
Por conseguinte, a organização das províncias durante o período que antecedeu as
reformas das Guerras Sociais,110 consistia na arrecadação de impostos e no fornecimento de
tropas auxiliares.111 Roldán Hervás e Wulff Alonso112 explicam que o modelo administrativo nas
duas províncias era o mesmo, sendo a máxima representatividade de poder conferida a um
pretor,113 com mandato de um ano e possibilidade de prorrogação.114 Segundo Tranoy,115 a
administração das regiões conquistadas estava ordenada em três bases fundamentais: a
organização provincial, a presença militar e a aplicabilidade de um sistema financeiro. A
governança deste modelo administrativo competia a dirigentes que fossem cidadãos romanos,
magistrados ou soldados, selecionados por Roma, que tinham como tarefa aplicar as normativas
e políticas propostas pelo Senado romano.116
Geoffroy aborda a questão diplomática alicerçada nos acordos de lealdade entre
comunidades hispânicas e Roma.117 Muitos dos povoados que compunham o interior do território
ibérico, temendo algum tipo de represália ou vingança militar, integraram-se voluntariamente no
sistema político romano, que se fundamentava na manutenção de autoridades locais no governo
de suas respetivas comunidades desde que estivessem sob a autoridade de Roma. O autor aponta
para que este procedimento conduziu à criação de uma rede de protetorados.118 Por isso o autor
destaca o sucesso da diplomacia romana, garantida pelo suporte militar, económico e
administrativo, bem como com a formação de polos urbanos estratégicos criados nas
circunscrições provinciais.119
Durante os anos 91 a 89 a.C. Roma enfrentou uma revolta generalizada das cidades aliadas do Lácio ( socii) excluídas da civitas romana, que
culminou com transformações de carácter estatal, onde Roma passaria a ser a grande metrópole de um território italiano, pois as cidades da
península itálica passariam a gozar dos mesmos privilégios da cidadania romana (Grimal, 2009: 47). Este fenômeno marca a primeira expansão
da civitas romana além da capital.
111
Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2001: 418.
112
Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2001: 423.
113
Em ocasiões especiais poderia haver a substituição de um pretor por cônsules.
114
Os autores definem que o pretor acumulava os cargos de general e governador e disponibilizava dos ofícios de um questor encarregado dos
assuntos jurídicos e económicos. Estes funcionários estavam acompanhados de um séquito proveniente de Roma, como conselheiros e escribas.
Roldán Hervás e Wulff Alonso (2001: 423) reforçam a simplicidade deste modelo de administração, implantado nas duas províncias anteriormente
os desenvolvimentos do século I a. C.
115
Tranoy, 1981: 145.
116
Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2001: 417.
117
Saéz Geoffroy, 2010: 5.
118
O autor também utiliza o termo ‘Reinos títeres’, o que podemos interpretar como governos que atuavam no cenário político ibérico coagidos
pela influência romana.
119
Saéz Geoffroy, 2012: 5.
110
34
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
A partir dos desenvolvimentos decorrentes das guerras civis, que teve como consequência
máxima a ascensão do Império romano, assim como novas funcionalidades atribuídas às
desgastadas instituições republicanas, notáveis personagens, com destaque a Júlio César e Otávio
Augusto, passam a reorganizar o quadro administrativo do imenso território romano de finais do
século I a.C. Neste contexto, será dada uma ênfase especial ao rearranjo das províncias imperiais
e senatoriais, bem como às suas respetivas divisões administrativas internas.
O território hispânico, durante o governo de Júlio César, foi ampliado com a incorporação
da região do Douro,120 ao mesmo tempo que o ditador construiu por toda Península colónias
povoadas por veteranos de guerras e por imigrantes plebeus. 121 Estas transformações também
foram perceptíveis noutros cantos do território romano, motivadas pelo exemplo itálico, que levou
a que algumas cidades da Península passassem a usufruir do estatuto de municipum, aderindo,
deste modo, ao direito latino.122 Neste sentido, dando continuidade ao programa de reorganização
provincial iniciado por César, seu sobrinho, Otávio Augusto, promoveu importantes mudanças que
serviriam de baluartes na estruturação imperial.
A última fase da conquista da Hispânia resultou na ocupação dos territórios dos povos
Astures e Cántabros, localizados no norte da Península.123 Esta empresa esteve associada às
pretensões expansionistas de Augusto e permitiu que tivesse sido implementada uma nova divisão
provincial, em 27 a.C. Neste contexto o território hispânico passou a contar com três
circunscrições provinciais,124 respetivamente, a Província Hispânia Ulterior Baetica, a Província
Hispânia Citerior Tarraconensis, e a Província Ulterior Lusitania.125 O governo destas circunscrições
foi repartido entre o poder senatorial e o imperial, ficando sobre a tutela imperial a província da
Lusitania, com capital em Emerita Augusta e a província Tarraconensis, com capital em Tarraco.
Por outro lado, coube ao Senado o controle da província da Baetica, com capital em Corduba. O
exercício administrativo estava destinado a legados designados pelo Imperador nas províncias
Roldán Hervás, 1988: 177.
Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2001: 452.
122
O Direito Latino concedia a cidadania latina aos magistrados locais no fim dos seus cargos anuais (Le Roux, 2006: 140).
123
Dião Cássio (Romae Historia, LIV, 11, 5) explica que com o fim das guerras cantrábricas muitas comunidades perderam importância e os
povoados montanheses estabeleceram-se nas planícies).
124
A divisão em três províncias foi feita por Augusto, em dois momentos cronológicos distintos, logo após a conquista dos territórios dos povos
Astures e Cántabros em finais do século I a.C. (Roldán Hervás, 1988: 179).
125
Villanueva Acuña, 2016: 121; para o investigador Alain Tranoy (1981: 137) é possível considerar a hipótese de que num primeiro momento
Augusto teria tomado as rédeas de toda a administração da península e o controle das três províncias. De acordo com o autor a divisão
administrativa entre províncias imperiais e senatoriais somente ocorreu no ano de 25 a.C. quando encerra as campanhas de conquistas e funda a
cidade de Emerita Augusta, transformada em capital da Lusitania.
120
121
35
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
imperiais e, na província senatorial da Baetica, por um procónsul que representasse os interesses
do Senado Romano.126
A divisão provincial promovida por Augusto em 27 a.C., foi em poucos anos reelaborada
pelo próprio Princeps, aquando do desfecho das últimas incursões militares de pacificação dos
remanescentes focos de resistência no território Astur-Cántabro. De acordo com Plínio,
precisamente com o término das guerras de conquista, a região da Callaecia e das Asturias foi
anexada à província da Lusitania,127 ao mesmo tempo que a Cantábria foi integrada à
Tarraconensis.128
O período entre os anos 16 e 13 a.C., momento da segunda visita de Augusto à Hispânia,
marca a última reconfiguração administrativa da Península Ibérica. Neste caso, a província da
Tarraconensis passou a compreender territórios da Callaecia, o Norte do atual Portugal, mais
especificamente, entre os rios Douro e Minho e as regiões das Asturias e da Cantábria, além do
facto de integrar territórios da Costa de Cartagena e Almería, anteriormente compreendidos na
província da Baetica. A província da Lusitania passou a comportar a restante área do atual território
português, a região dos povos gaditanos no extremo sul e as atuais províncias espanholas de
Cáceres e Salamanca, encerrando-se nos limites de Toledo. Por fim, a província da Baetica incluía
uma parte da atual região de Jaén e parte da costa de Huelva.
No âmbito interno, Augusto ampliou a cidadania consoante os diferenciados estatutos
jurídicos. Deste modo, o Princeps criou inúmeros municipia por toda a Hispânia, reorganizou as
colónias, e multiplicou consideravelmente o número de centros urbanos. Para Le Roux, foi Augusto
o grande responsável pelo alastramento da civitates por toda península, facto que acentuou o
poder imperial, sendo, deste modo, determinante no objetivo de organização e pacificação da
Hispânia.129
No esforço de compreender as questões de cunho administrativo operadas em princípios
do Império, vale salientar a importância estratégica que as inúmeras cidades construídas na
Península representaram no que se refere ao controle romano. Neste sentido, é possível
pensarmos estes centros urbanos como espaços de intercâmbio que permitiam às elites locais o
Tranoy, 1981: 137; Roldán Hervás, 1988: 264.
‘Agrippa afirma que a Lusitania junto com Asturias e Calaecia medem quinhentos e quarenta mil passos de longitude e quinhentos e trinta e
seis mil de largura...’ (Plinio, Naturalis Historia, IV, 118). Para Tranoy (1981: 148) estas três regiões fizeram parte da Lusitania durante o período
de tempo de 29 a 22 a.C.
128
Roldán Hervás, 1988: 264.
129
Le Roux, 2006: 122.
126
127
36
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
acréscimo de riquezas, sobretudo oriundas do meio agrícola, e a concessão de títulos honoríficos,
oportunizados pela cidadania inerente aos diferenciados centros urbanos e estatutos jurídicos das
distintas cidades.130
Figura 3 - Divisão provincial da Hispânia romana (Andreu Pintado, 2009: 325).
Tais diferenciações baseavam-se na importância que gozavam os variados centros
urbanos, que poderiam ser portadores de direito romano,131 latino,132 ou peregrino, o que se
traduzia no seu estatuto de colónias, municípios ou centros urbanos de raiz indígena. Dentro da
hierarquia política das cidades as colónias eram as que possuíam maiores privilégios. Durante o
século I a.C. foram criadas em larga escala no governo de César e em menor número por Augusto,
que seguiu o modelo inspirado nos municípios latinos após as reformas posteriores às guerras
P. Le Roux (2006: 121) explica que este impulso foi reflexo da urbanização baseada na paz proporcionada pelo governo de Augusto que resultou
no desenvolvimento das atividades agrícolas e artesanais.
131
O direito romano (Civis Romani) englobava o direito de suffragium, a eleger candidatos as magistraturas, de connubium, contrair matrimónio
regular, exercitum, servir a legião romana e ius civile e ius commercium, em outras palavras, os direitos civis e económicos (Saéz Geoffroy, 2012:
4). Para Grimal (2009: 331), soma-se ainda o ius honorarium, o direito a elegibilidade para as magistraturas e o ius provocationis, que consistia
na possibilidade do cidadão poder recorrer a um tribunal popular de qualquer decisão tomada por um magistrado que infligisse uma pena capital.
132
O direito latino, ou ius Latii diferenciava-se do direito romano pois só concedia alguns privilégios económicos e sociais, como o ius commercium
e o ius conubium, mediante um contrato denominado foedus (Saéz Geoffroy,2012: 4). De acordo com Grimal (2009: 332) o estatuto do direito
latino disponibilizava o ius Suffragium, porém não acordava o ius honorarium.
130
37
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
sociais.133 Tal como os municípios latinos eram cidades autónomas, juridicamente possuidoras da
cidadania romana e representantes do poder imperial. A seguir vinham os munícipios,
amplamente difundidos por Augusto que os criou em várias províncias. De acordo com Le Roux134,
a diferença entre uma colónia e um município estava associadas ao facto deste último se definir
enquanto uma mescla de comunidade romana, coexistindo com usos e particularidades de
tradição indígena.135 Em contrapartida, os centros urbanos indígenas possuíam uma classificação
mais ampla podendo ser considerados livres, federados ou estipendiários. Segundo Le Roux, as
cidades livres conservavam as suas leis e costumes e estavam isentas do pagamento de impostos,
mantendo instituições de governo próprias. A cidade federada era igualmente isenta de prestações
económicas, estando subordinada a Roma, existinto entre ambas um acordo de assistência mútua
em caso de conflito armado.136 De todo o modo, não existiram muitas cidades livres ou federadas
na Península Ibérica, pois esta concessão honorífica só era concedida às poucas cidades cujos
serviços prestados ao Império eram reconhecidos por Roma.137 Por último, citamos as cidades de
tipo dediticiae,138 que, no âmbito geral da Península Ibérica, eram a grande maioria. Com a
pacificação da Hispânia estas cidades foram submetidas ao poder de Roma, e por este motivo,
além de possuírem poucos direitos, estavam sujeitas ao pagamento de um tributo que era
estipulado pelo governador, o estipendium. Em caso de conflitos armados estas cidades tinham a
obrigação de fornecer auxiliares para lutar em benefício de Roma.
Uma outra medida administrativa empreendida por Augusto foi a criação dos conventus
iuridicus.139 Estes conventos eram circunscrições com função judicial pertencentes a uma
Muitas cidades tornaram-se colónias no ano 13 a.C., por motivos da vinda do Princeps à Hispânia (Le Roux, 2006: 120).
Le Roux, 2006: 120.
135
As cidades de ius Romanii e ius Latinum apresentavam um senatus ou ordem municipal, formado por decuriões que deliberavam os assuntos
públicos, e por magistrados. Também cuidavam das questões relacionadas com os colégios sacerdotais, os magistrados dos templos e as
festividades religiosas (Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2010: 153).
136
Roldán Hervás e Wulff Alonso, 2001: 153.
137
Le Roux, 2006: 120.
138
A nossa melhor referência para enumerar a quantidade de centros urbanos na Península Ibérica é Plinio, que cita a classificação hierárquica
das cidades e a província na qual estavam inseridas. A sua obra foi de suma importância para o desenvolvimento dos estudos sobre as estruturas
administrativas na Hispânia romana. De acordo com Plinio, a província da Bética contava com 175 cidades, nas quais eram 120 estipendiárias,
10 municípios de cidadãos romanos, 9 eram colónias e 36 com situação excecional (Naturalis Historia, 3, 1, 7). A Província da Tarraconsensis
comportava 293 povoados que pagavam tributos, sendo 135 cidades estipendiárias, 13 municípios romanos, 12 colónias e 19 com situação
excecional (Naturalis Historia, 3, 3, 18). A província da Lusitania contava com 45 cidades, sendo 36 estipendiárias, 1 município, 5 colónias e 3 em
situação excecional (Naturalis Historia, 4, 22, 117). Se levarmos em conta que Plinio (23 a 79 d.C.) exerceu a função de procurador na Provincia
Hispania Citerior Tarraconensis e que o número de centros urbanos na Hispânia praticamente não se alterou desde Augusto podemos concluir que
a Península Ibérica comportava um total de 26 colónias e 24 municípios.
139
Dopico Caínzos, 1986: 266.
133
134
38
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
província,140 sendo hoje considerados uma criação de Augusto, apesar da historiografia tradicional
os considerar obra dos imperadores Flávios.141
Os conventos foram importantes mecanismos de romanização da Hispânia, contribuindo,
para a organização e integração de comunidades indígenas, tendo desempenhado um importante
papel administrativo e religioso, designadamente no âmbito do culto imperial, que se desenrolava
nas suas capitais. No NO peninsular existiam três conventos, cujas áreas correspondem
aproximadamente às grandes divisões étnicas pré-romanas (Astures, Callaeci bracarensis e
Callaeci lucensis). As cujas capitais correspondem aos três centros urbanos fundados por Augusto
(Bracara Augusta, Asturica Augusta e Lucus Augusti). Neles são conhecidos sacerdotes do culto
imperial, cujos nomes nos chegaram por via do hábito epigráfico, que documenta as funções
religiosas destas cidades.
Figura 4 - Divisão dos conventos jurídicos da Hispânia por Províncias (Martins et al., 2012).
No período posterior ao governo de Augusto, os sucessores Júlio-Claudianos não adotaram
nenhuma medida de grande envergadura no quadro administrativo das províncias. Somente com
Estas circunscrições subdividiram as províncias da Dalmácia, Ásia e da Hispânia.
Segundo Dopico Caínzos (1986: 266), a historiografia que defende autoria flaviana para os conventos jurídicos aponta o imperador Vespasiano
(69 – 79 d.C.) como o responsável pela criação destas circunscrições.
140
141
39
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
a ascensão de Vespasiano como imperador, no ano de 69 a.C., que instaurou uma nova dinastia
em Roma, a dos imperadores Flávios, é que as fontes históricas passam a retratar uma mudança
político-administrativa imperial mais contundente. Cabe salientar que durante o reinado dos
imperadores Flávios, além de novas medidas administrativas, inaugurou-se uma nova perspetiva
urbana, traduzida na intensificação da monumentalidade dos centros urbanos. O principal
instrumento desta transformação foi a ampliação do direito latino aos municípios provinciais.
Segundo Le Roux, a partir do ano de 73 e 74 d.C. todas as cidades estipendiárias e peregrinas
obtiveram o estatuto de centro urbano latino,142 medida que facilitava a plena integração dos
antigos e novos municípios na esfera cultural romana. No entanto, devemos argumentar que este
processo não foi isolado e instantâneo, pois prescindia de méritos e serviços prestados ao Império.
Sendo assim, é possível apontar os centros urbanos das regiões mais romanizadas como os
primeiros a obterem o estatuto municipal e o ius Latii.143 Para Le Roux, o estatuto de municipium
latinorum assemelhava-se aos padrões das cidades latinas da Península Itálica, pois, além de
aumentarem seu grau de importância e autonomia, serviam como contexto para a atuação e
ascensão das suas elites à carreira pública.
No século III, durante o reinado de Caracala, o território da Hispânia beneficiou, à
semelhança das demais províncias, da extensão da cidadania romana através da Constitutio
Antoniniana.144 Com esta medida, todos os habitantes livres do Império passaram a usufruir do
direito romano, salvo os das cidades de tipo dediticiae, cuja condição de populações anteriormente
resistentes à ocupação romana não permitia a concessão do Ius Romanii.
Por fim, foi no governo de Diocleciano145 que a Hispânia, a exemplo de todo Império,
experimentou importantes transformações administrativas, tendo conhecido, no ano de 298, uma
nova divisio, com a fragmentação da Provincia Citerior Tarraconensis e a criação de duas novas
províncias, a Callaecia e a Carthaginensis.146
Em jeito de conclusão, percebemos que as reformas augustanas na Hispânia significaram
o reflexo de uma nova estrutura político-administrativa globalizante, adotada num contexto de
reorganização do espaço territorial da Península Ibérica, na passagem da antiga República romana
Le Roux, 2006: 123.
Le Roux, 2006: 126.
144
Le Roux, 2006: 126.
145
Governou sozinho nos anos de 284 a 286 d.C. Durante os anos de 286 a 305 d.C. fez parte do governo conhecido como tetrarquia onde detinha
o cargo de Augusto do Império do Oriente.
146
Tranoy, 1981: 402.
142
143
40
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
para o Império. Neste sentido, podemos admitir que a reorganização do espaço peninsular no
âmbito administrativo e urbano durante o período Flávio e Antonino representou o crescente
processo de romanização e urbanização do território que culminou na expansão do direito romano,
com impacto mais imediato nas províncias mais romanizadas, como era o caso da província da
Bética, mas que não deixou de se repercutir também nas regiões setentrionais do NO que
conhecem um processo de monumentalização significativo. Cabe igualmente destacar a promoção
municipal de alguns centros urbanos secundários que adoptam a onomástica Flávia no seu nome,
honrando desse modo a melhoria do seu estatuto, como é o caso de Aquae Flaviae, ou Iria Flavia.
2. A romanização e urbanização do NO peninsular
2.1 A ocupação pré-romana e a questão dos oppida
Os estudos sobre as sociedades pré-romanas remontam há mais de um século tendo
conhecido nas últimas décadas uma importante renovação teórica e metodológica.147 Em Portugal
podemos destacar o pioneirismo do investigador F. Martins Sarmento, entre finais do século XIX e
início do XX, que realizou explorações nas citânias de Briteiros e Sabroso,148 contribuindo, com os
seus estudos para valorizar a ocupação dos castros do NO peninsular. 149 Nos anos 20 do século
passado, P. Bosch Guimpera, com as suas análises arqueológicas sobre os castros, referentes a
arquitetura e os artefactos metálicos, passa então a padronizar estas sociedades como ‘cultura
castreja’.150
Atualmente os estudos das sociedades pré-romanas estão polarizados em diferentes
interpretações. Em termos gerais, ao longo do século XX, estas sociedades foram interpretadas
como formações sociais igualitárias e hierarquizadas, tendo sido consideradas como celtas.151 De
Castro Pérez, 2010: 17.
Localizadas no concelho de Guimarães, no distrito de Braga.
149
M. L. Albertos propôs a definição destas estruturas sociais denominadas castrum através de critérios epigráficos e histórico linguísticos
referenciadas pelo símbolo de um ‘C’ invertido, que o investigador associou à terminologia castrum ou castellum. Este símbolo passou a associarse aos núcleos de habitações indígenas inseridos recintos fortificados, os castros. (Tranoy, 1981: 76; Pereira Menaut, 1982: 149). Baseando-se
nos estudos de A. Del Castillo, Tranoy estimou em 5.800 o número de castros existentes para a região do Noroeste. (Tranoy, 1981: 76).
150
Silva, 2006: 156.
151
O autor acredita que o vínculo da Irlanda e do Noroeste hispânico ao mundo celta, desde a Idade do Bronze, é bastante complexo, havendo
divergência entre investigadores em relação à presença de Celtas no Noroeste e, em caso afirmativo, em qual período teriam chegado e em que
regiões. De todo o modo, Castro Pérez (2010: 12) propõe uma manifestação clara da cultura céltica a partir da Idade do Ferro na região central e
ocidental do Noroeste.
147
148
41
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
acordo com Castro Pérez esta visão é resultado dos estudos positivistas dominantes até à década
de 80, altura em que se afirma um novo paradigma de investigação que ultrapassa a discussão
étnica e se centra na valorização da cultura material propiciada pelas escavações, que adquirem,
a partir de então, maior rigor metodológico.152 Este caminho levou os investigadores a analisarem
o complexo processo histórico evolutivo das comunidades proto-históricas do Noroeste peninsular
à luz dos dados arqueológicos.153 Neste sentido, numa perspectiva mais abrangente, os autores
passaram a considerar três fases de desenvolvimento principais nos castros do NO. A primeira
fase remonta à Idade do Bronze, mais concretamente, ao Bronze Final. De acordo com Helena
Carvalho154 e González Ruibal155 este período caracteriza-se, essencialmente, pela organização de
sociedades segmentárias traduzidas em pequenos castros autossuficientes e autónomos. Estas
povoações estabeleceram-se, num primeiro momento, nas encostas dos relevos montanhosos e,
num momento final, em cabeços e pequenas colinas nos vales.156
Na primeira metade do I milénio a.C., mais especificamente entre 1000 e 700 a.C.,157 as
populações do Bronze Final diversificaram os seus habitats, sobretudo nos contextos morfológicos
e topográficos, fomentados por uma necessidade de exploração dos recursos naturais e
económicos, processo que desencadeou alterações socioeconómicas associadas ao surgimento
de lideranças locais e à hierarquização das comunidades tendo dado início à ocupação de lugares
de destaque na paisagem.158
De acordo com alguns autores, neste período a região do NO intensificou as rotas
comerciais já anteriormente ativas com o Norte da Europa e ampliou contactos comerciais com
outras regiões do Mediterrâneo159 e, numa fase final, com a Europa central.160 Sendo assim, as
sociedades castrejas passaram a utilizar novos produtos e inovações vindos de outros cantos do
espaço mediterrânico, facto que contribuiu para a transformação socioeconómica destas
A questão do celtismo das populações do NO peninsular passa a ser questionada a partir da transição da década de 70 para a década de 80,
tendo por base a valorização da documentação literária antiga, da filologia e arqueologia. Deste modo, como afirma Castro Pérez, cria-se um cenário
mais ‘rico, equilibrado e aberto’ relativo às comunidades proto-históricas do NO (Castro Pérez, 2010: 18).
153
Silva, 1986; Martins, 1990.
154
Carvalho, 2008: 67.
155
González Ruibal, 2005: 268.
156
Carvalho, 2008: 71; Martins, 2009a: 192.
157
Utilizamos o espaço de tempo adotado pela investigadora Helena Paula Abreu de Carvalho, porém alguns autores atribuem o final do bronze de
1250 a 700 a.C. (Silva, 2006: 54).
158
Carvalho, 2008: 69; Castro Pérez, 2010: 18.
159
Carvalho, 2008: 70; Rodríguez Colmenero, 2010: 28; De acordo com Tranoy (1981: 103-104), a partir do século X a.C., a região do Noroeste
já estava integrada com o comércio atlântico, tendo o comércio com o Mediterrâneo sido desenvolvido posteriormente e estando associado ao
comércio de minerais com os povos do sul da península, Fenícios e Gregos, que frequentavam os portos Ártabros. De acordo com o autor existem
indícios de moedas de origem púnica na parte ocidental da Galécia, provenientes de Gades, Sexi e Abdera, e de moedas Gregas no Norte de
Portugal, sobretudo no vale do Douro e nas regiões ribeirinhas.
160
Relações que intensificaram gradativamente durante da presença romana na península e sua pressão militar para Oeste (Tranoy, 1981: 105).
152
42
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
sociedades. Este processo determinou uma maior hierarquização entre as comunidades criando
uma esfera de conflitividade, que explicaria a criação dos primeiros povoados fortificados em
relevos proeminentes na paisagem.
No período compreendido entre 500 e 200 a.C. regista-se o aumento do número de
povoados que poderá atestar uma maior pressão pelo controle e posse da terra e uma maior
autarcia, assistindo-se a uma diferenciação socioeconómica entre as diferentes comunidades
indígenas do NO peninsular.161 Como consequências destas transformações percebemos uma
dinamização nas estruturas defensivas, agora, em maior número e com o uso cada vez mais
frequente da pedra enquanto material construtivo. Estes fatores também se expressam nas
habitações, maioritariamente feitas de pedra.162 Este processo representa uma sedentarização
definitiva das comunidades, organizando um novo cenário de povoamento, resumido nos
processos de nuclearização, fortificação e territorialização.163
O período que decorre entre o primeiro contacto romano com a região da Galécia
bracarense, com a campanha de Décimo Junio Bruto (138 – 136 a.C.) e as reformas flavianas,
na segunda metade do século I, corresponde a uma terceira fase de desenvolvimento interno dos
povoados do NO peninsular. Neste contexto destacamos a questão da proto-urbanização dos
grandes povoados e o reordenamento territorial das comunidades.164 Este processo é
particularmente visível na região bracarense, a primeira a sofrer o impacto precoce das tropas
romanas que, regista mudanças na estrutura de povoamento, assistindo-se ao aparecimento de
novas aglomerações com organização proto-urbana, designadas por oppida, que funcionariam
como lugares centrais que controlavam outros povoados mais pequenos. Assiste-se, assim, a uma
maior diversificação nos povoados e à estruturação de unidades sóciopolíticas mais amplas que o
próprio castro.165 Os grandes povoados centrais (oppida) oferecem um ordenamento ortogonal,
com arruamentos que se cruzam e definiam quarteirões, possuindo funções diferenciadas e
complementares podendo dominar extensos territórios.166 A região mais meridional do NO é onde
Silva, 1986; Martins, 1990; González Ruibal, 2005: 281; Carvalho, 2008: 71.
A muralha era o principal elemento defensivo dos castros. Podia ser unitária ou variadas, dependendo do formato do relevo. A muralha ainda
podia associar-se a fossos, com tamanhos diferenciados (Tranoy, 1981: 84).
163
Carvalho, 2008: 72-73; Martins, 2009a: 192.
164
Silva, 2006: 49.
165
Para Burillo Mozota (2002: 279), o opiddum era um recinto defensivo, circunscrito por uma muralha e sem especificação jurídica. Estava numa
posição intermediária, entre o castro e a cidade e define-se em termos gerais como grandes povoados de formações políticas diferentes. Para o
autor, os oppida são classificados como locais com dimensões superiores a cinco hectares, podendo, em casos excecionais, chegar a quarenta
hectares.
166
Carvalho, 2008: 80; Martins, 2009a: 193; outro termo utilizado para designar oppida no NO, é Citânia. Conforme Tranoy (1981: 74), a
diferenciação de castro para citânia está diretamente associado a sua amplitude territorial, podendo até mesmo admitir que algumas eram
verdadeiras cidades.
161
162
43
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
a hierarquização do povoamento parece ter sido mais intensa durante o século I a.C. Referimonos muito particularmente ao território do Entre-Douro e Minho e Trás-os-Montes Ocidental onde
se concentra este tipo de povoados, alguns dos quais extensamente escavados como Sanfins,
Briteiros, Santa Luzia, Romariz, entre outros.167
Em relação à cronologia dos oppida cabe sublinhar que alguns autores, apontam o seu
surgimento numa fase anterior à ocupação romana, a partir de finais do século II a.C., tendo como
causa a incursão de Décimo Junio Bruto, entre 138-136 a.C. Este fato resultou na pacificação da
região e da maior abertura da região meridional ao comércio com o Mediterrâneo, o que não
ocorreu com as outras regiões mais interiores e setentrionais do NO.168 O episódio dos confrontos
entres os povos bracari com as tropas romanas terá resultado numa maior integração dos
diferentes castros que passaram a promover novas formas de aliança que se traduziu na criação
de novos povoados de grandes dimensões.169
Segundo González Ruibal170, esta explicação rejeita a proposta de alguns autores que
defendem que os oppida correspondem a estruturas sociais indígeno-romanas relacionadas ao
período Júlio-Claudiano e Flávio. Na verdade, é possível admitir que a hierarquização territorial das
sociedades indígenas, testemunhada no último século antes da nossa era, na parte ocidental da
região bracarense, não pode vincular-se diretamente com a presença romana, podendo, todavia,
ter sido influenciada pelos conflitos militares empreendidos por Roma na Península Ibérica, que
teriam indiretamente potenciado a promoção das hierarquias na periferia dos conflitos, como foi
o caso do gradativo surgimento dos grandes oppida do Noroeste.171
Numa explicação mais geral, Gonzáles Ruibal engloba o surgimento das oppida num
fenómeno que classifica como sinecismo dos povoados castrejos. O autor atribui a explicação do
sinecismo a García Quintela,172 que o considera um processo variado, onde alguns grupos se
uniam sem necessariamente dar origem a novas formas de povoados de dimensões maiores.
Neste sentido, entende-se sinecismo como um movimento que também admite a segmentação de
Carvalho, 2008: 78.
Houveram outras três importantes incursões romanas no território do NO, anteriores a Augusto, porém sem objetivos de dominação e que
possivelmente intensificaram as relações com a região. Em 96-94 a.C., o governador da Província da Ulterior, Publio Crasso, adentra o território
Galaico com o objetivo de abrir uma nova rota comercial com o Sul da península. No ano de 74 a.C., Perpena faz uma incursão punitiva até Cale
na foz do Douro. E no ano de 60 a.C. Júlio César empreende uma expedição naval com fins económico pela costa Galaica até Brigantium,
atualmente Coruña (Martins, 2009a, p.196).
169
Martins, 2009a: 194.
170
González Ruibal, 2005.
171
González Ruibal, 2005: 281.
172
García Quintela, 2002.
167
168
44
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
antigas aglomerações, ou unificação de dois povoados centrais, ou mesmo a substituição de um
oppidum por outro.173
A ocupação pré-romana do NO peninsular, vulgarmente incluída na ‘cultura castreja’,
revela uma acentuada diversidade entre as diferentes regiões que integraram aquele território,
independentemente de se estruturar com base no castro, ou seja, tendo por base povoados
fortificados como unidades de residência. Na verdade, à data da integração daquele território no
Império romano registavam-se grandes assimetrias no desenvolvimento dos povoados das
diferentes regiões, quer na organização do povoamento, quer nas características da interação
entre eles e com o exterior, quer ainda na sua cultura material. Essas assimetrias parecem
decorrer do maior ou menor isolamento das regiões e das comunidades relativamente aos
impulsos tecnológicos que durante o I milénio a.C. afetaram a região a partir do Mediterrâneo, os
quais beneficiaram a área litoral e muito particularmente a região meridional do NO, ou seja, a
área bracarense.174 Neste contexto é necessário reconhecer que as mudanças registadas ao longo
da II e I Idade do Ferro estão ancoradas numa esfera regional, onde existiram assimetrias
consoante as distintas regiões e épocas. Cabe destacar que a fachada ocidental do NO, esteve ao
longo do I milénio a.C. sujeita a influências exteriores continuadas através das vias comerciais
atlânticas, iniciadas na Idade do Bronze, que influenciaram de forma diferenciada as distintas
regiões, nas suas múltiplas fases evolutivas.175 Esta maior abertura da região meridional e
ocidental da Callaecia ao exterior pode explicar as características particulares da organização do
povoamento que se desenvolve posteriormente à campanha de Brutus. De facto, o processo de
criação dos oppida parece constituir uma resposta, simultaneamente organizativa e identitária,
associada a um novo modelo de povoados, com elevada densidade populacional, que pode
decorrer de processos de sinecismo, ou seja, da reunião no mesmo espaço de populações
oriundas de castros que teriam sido, entretanto abandonados.
O carácter proto-urbano dos oppida é reconhecido na sua particular organização interna,
representada por arruamentos que se cruzam ortogonalmente e que definem quarteirões,
ocupados por unidades domésticas, que integravam várias construções com diferentes
funcionalidades, unidas por pátios lajeados, aspetos bem representados nos povoados mais
González Ruibal,2005: 281.
Silva, 1986; Martins, 1990; Gonzalez Ruibal, 2006-07; Lemos, 2009; Cruz, 2015.
175
Silva, 2006: 69.
173
174
45
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
extensamente escavados, como Briteiros, ou Sanfins.176 Mas o carácter urbano destes povoados
não resulta apenas da sua particular organização interna, podendo ser igualmente testemunhado
pela presença de equipamentos públicos, como as casas do conselho, ou os balneários rituais,
pela hipotética existência de santuários no seu interior e pelo facto de constituírem locais de
concentração de atividades artesanais e comerciais.177 Podendo ter servido como lugares centrais,
que controlavam outros povoados mais pequenos, estes oppida, podem, pelas suas características
testemunhar a existência de um original urbanismo pré-romano, cujas características carecem
ainda de ser melhor definidas pela investigação arqueológica.
Com o término das guerras cantábricas Augusto organizou os novos territórios pacificados
do NO peninsular. As medidas tomadas pelo Princeps basearam-se em outras já aplicadas noutras
regiões do Império. Neste sentido, Augusto procurou fixar um plano administrativo coerente,
procurando integrar as populações indígenas através da criação de províncias e conventos jurídicos
e da fundação de centros urbanos, que funcionaram como marcos administrativos e de
representação ideológica do poder romano. Paralelamente a estas medidas o Princeps construiu
uma eficiente rede viária que ligou os novos territórios ao resto do Império. 178 A reforma
administrativa de Augusto relevou-se de enorme eficácia na consolidação do poder de Roma sobre
o NO peninsular e permitiu a sua rápida integração no modo de vida romano, fomentando um
modelo de desenvolvimento baseado na exploração intensiva dos recursos, no comércio e na
produção artesanal. Essa integração será reforçada pelos imperadores Flávios, com a concessão
do ius Latii e o processo de municipalização dos núcleos urbanos, que fomentou a integração dos
povos do NO no Império romano e monumentalização das suas cidades.179
2.2 Augusto e a fundação das capitais jurídicas
Com o final das guerras civis romanas, o que ocasionou a conquista e pacificação das
províncias do Império, Augusto consolidou um sistema político baseado no Principado, onde o
poder do Pinceps ganha um carácter divino, à semelhança do que alguns autores associam às
monarquias helenísticas e à figura de Alexandre.180 Neste sentido, Augusto inaugura um novo
Cruz, 2015; Silva, 2006: 505-546.
Lemos, 2008; Cruz, 2015.
178
Martins, 2009a: 197; Martins e Carvalho, 2016.
179
Martins, 2012; Martins e Carvalho, 2016.
180
Bendala Galán, 1998: 144.
176
177
46
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
momento no âmbito governamental, pois passa a ser o unificador do Império e o pacificador dos
problemas oriundos de um século de crises da República, marcada por uma série de conflitos
internos que abalaram a base estrutural dos domínios territoriais romanos.
No caso da Hispânia, mais especificamente do NO, após as guerras cantábricas, Augusto
procurou reorganizar esta região de modo a responder aos interesses romanos, estabelecendo um
quadro administrativo que desse resposta às necessidades de controle da região, do ponto de vista
político, militar e económico. Para tanto, criou novos centros urbanos nas províncias dividindo
estas em subdivisões, ou circunscrições de segundo grau, denominadas conventos jurídicos.181
As primeiras informações que temos sobre a existência dos conventos jurídicos está
registada na documentação literária antiga, que fornece elementos variados relativos ao NO
peninsular, atribuídos a autores como Estrabão, Dião Cássio, Floro, Orósio, Plínio, Pompónio Mela
e Ptolomeu, cujas obras se encontram incluídas nas Fontes Hispaniae Antiquae. É em Estrabão e
Plínio que encontramos passagens importantes que indicam a realidade sociocultural e
organizacional de inícios do Império, mesmo que sejam insuficientes e por vezes discordantes.
Neste sentido, para o período entre 29 e 7 a.C. a Geographia de Estrabão182 constitui uma
referência obrigatória que aborda questões pertinentes como a composição indígena nos anos
posteriores ao fim das guerras cantábricas. Nos seus relatos, mesmo que pese o ponto de vista
do autor, onde relaciona a oposição civilização/barbárie, cabe ressaltar a quantidade de populi
que enumera e a descrição que elabora do quotidiano destas comunidades.183 Meio século
posterior a Estrabão, a Naturalis Historia184 de Plínio remete-nos novamente para dados
relacionados com os conventos jurídicos. Assim, as informações contidas nesta obra dão margem
a uma valiosa noção populacional dos povos fixados em cada um dos três conventus.185 Por outro
lado, as coordenadas geográficas que Plínio nos disponibiliza são insuficientes para um estudo
mais aprofundando do tema da organização conventual do território.186
Por via dos textos antigos e dos dados arqueológicos a historiografia moderna considera
a origem dos conventos jurídicos bastante controversa, a ter na própria palavra diferenciadas
Martins, 2009a: 196.
Estrabão, Geographia, III, 3.
183
Carvalho, 2008: 88.
184
Plinio, Naturalis Historia, III, 4, 28.
185
Conforme Plinio existiam 24 civitates para o conventus Bracaraugustanus, onde só 21 são conhecidas (Martins, 2009a: 200); 22 para o
conventus Asturum e 16 para o conventus Lucensis (Carvalho, 2008: 92).
186
Dopico Caínzos, 1986: 267; Martins, 2009a: 200.
181
182
47
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
traduções do latim.187 Para alguns autores a existência destas subdivisões remonta a Júlio César,
definindo o conventus como uma associação de cidadãos romanos, pertencentes a uma cidade,
que também tinha por função servir para visitas do Governador da província.188 De facto, sabemos
que os conventos jurídicos eram circunscrições apontadas como subdivisões provinciais,
presentes nas províncias da Dalmácia, Ásia e na Hispânia, onde tanto as fontes textuais quanto
as epigráficas são mais abundantes.189 Todavia, no caso da Hispânia, sabe-se atualmente que a
criação dos conventus foi obra de Augusto, facto que contraria as antigas hipóteses que incidiam
na sua origem flaviana,190 sobretudo defendida por Robert Etienne191 nos seus estudos
relacionados ao culto imperial.192 Tal problemática ainda coexiste com uma terceira proposta que
situa temporalmente a origem dos conventos jurídicos no final do governo de Augusto e início de
Tibério.193 De qualquer modo, em reforço da cronologia augusta para os conventos jurídicos cabe
referir a importante fonte epigráfica, conhecida como tabula lougeiorum. Este documento
representa um pacto de hospitalidade encontrado nas proximidades de Lugo, datado do ano
1.d.C., momento que coincide com os nomes dos cônsules registados no documento, ao mesmo
tempo que cita a existência do temporário conventus Arae Augustae, possivelmente antecessor ao
conventus Asturum.194 As informações contidas neste documento correspondem ao período em
que se realiza o programa de reorganização administrativa e territorial da Hispânia.195
Rodríguez Colmenero, 2011: 63.
Conforme Alain Tranoy (1981: 152), durante o período de Júlio César o termo conventus representava uma reunião de cidadãos romanos na
Hispânia durante a guerra civil contra Pompeu.
189
Temos em Plínio a principal obra literária antiga que reporta a questão dos conventus iuridicus e os respectivos povos que os abrangem (Martins
e Carvalho, 2010: 2). Apesar do contributo pliniano não há indicações geográficas precisas que possam nos ajudar a estabelecer a territorialização
conventual do NO. Também as fontes epigráficas são de suma importância ao fazerem menções aos conventus hispânicos, incluindo os conventus
do NO, tendo nas menções a sacerdotes e flâmines as principais alusões (Dopico Caínzos, 1986: 266).
190
De acordo com Dopico Caìnzos (1986: 277), as teorias mais antigas pautadas nos estudos de E. Albertini (Tranoy, 1981: 152) e C. H. V.
Southerland, investigadores que se utilizaram unicamente de Plínio como fonte, relacionavam a criação dos conventos jurídicos com a época do
imperador Cláudio. Posteriormente, outros autores associaram a criação destas unidades administrativas ao imperador Vespasiano, interpretação
que vem sendo revista, pois os novos estudos arqueológicos e epigráficos apontam para uma datação augustana destas circunscrições.
191
Etienne, R. (1974). Le culte impérial dans la peninsule Ibérique: d’Auguste a Dioclétien. Paris: Éditions E. de Boccard.
192
Tranoy (1981: 153) também defende a cronologia flaviana dos conventus, sustentando esta datação mediante a presença de um praefectus
Callaeciae durante o reinado de Vespasiano, ao mesmo tempo que o associa ao recenseamento da região do NO descrita por Plinio, que utiliza a
terminologia conventus. Tranoy atribui a criação dos conventus ao governo de Vespasiano, momento que considera de integração definitiva do NO
com a aparição dos legati iuridici.
193
Martins (2005: 26) da como referência desta proposta os investigadores Fernández Ochoa e Morillo Cerdán (1999).
194
Martins e Carvalho, 2010: 4.
195
Dopico Caínzos, 1986: 277; Roldán Hervás, 1988: 184.
187
188
48
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
Figura 5 - Tabula Lougeiorum (Fonte: AE 1997 = Rodríguez Colmenero, A. 1997. “La Nueva Tabula Hospitalitatis de
La Civitas Lougeiorum. Problemática Y Contexto Histórico.” ZPE 117: 213–26).
Neste sentido, podemos definir conventus iuridicus na qualidade de divisões
administrativas das províncias, com finalidade jurídica, que recebiam periodicamente a visita do
governador para estabelecimento da justiça na região.196 Para Dopico Caínzos, além dos encargos
jurídicos, os conventos também possuíam uma tarefa fiscal de recolhimento de impostos e outros
encargos de natureza administrativa.197 Esta informação é retomada com Montenegro Duque que
reforça o papel fiscal e jurídico dos conventos definindo-os como mecanismos administradores da
justiça, em especial no tocante aos conflitos dentro dos seus domínios e, em eventuais casos,
também a função de recrutamento militar.198 Para Rodríguez Colmenero, as incumbências que
não fossem de âmbito jurídico tiveram uma maturação mais tardia.199 De facto, podemos afirmar
que gradativamente os conventus ganharam importância administrativa nas províncias, em
especial no NO, onde se encontra muito articulado com o culto imperial.200
Para Alain Tranoy (1981: 162) os conventus introduziam a noção de unidade num contexto de povoamento profundamente fracionado,
facilitando desta forma as funções jurídicas.
197
Dopico Caínzos, 1988: 277.
198
Montenegro Duque, 1988: 184.
199
Rodríguez Colmenero, 2010: 64.
200
Tranoy, 1981: 167.
196
49
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
A função dos conventos parece assim ultrapassar o mero carácter jurídico,201 podendo ser
entendidos enquanto espaços geográficos, com uma capital, onde operava um legatus iuridicus202
supervisionado pelo governador da província,203 que cumpria igualmente outras funções, de
carácter religioso, social e económico.204
Deve-se a Augusto a fundação das três capitais de conventos, Bracara Augusta (conventus
Bracaraugustanus), Lucus Augusti (conventus Lucensis) e Asturica Augusta (conventus Asturum),
com uma datação que coincide com os anos posteriores ao fim das guerras cantábricas, ou seja,
depois do ano 19 a.C., e antes da última estadia do imperador na Hispânia, em torno de 16 a 13
a.C.205 Mesmo havendo certa dificuldade em precisar a data de fundação destas capitais jurídicas,
as fontes epigráficas e arqueológicas contribuem para indicar os últimos anos do século I a.C.
como o período de povoamento destas cidades, melhor conhecido no caso de Bracara Augusta,
onde se documentam inscrições que referem os bracaugustanos anteriormente à mudança da
era, como é o caso da que se reporta ao pedestal de estátua erguida a Augusto no dia do
aniversário Paulus Fabius Maximus, datada entre 3/2 a.C.206 A arqueologia documenta igualmente
sepulturas na necrópole da Via XVII que podem ser atribuídas ao mesmo período, documentando,
por isso, que a cidade se encontrava então já ocupada.207
Para Manuela Martins, a fundação das capitais conventuais serviu como suporte para
consolidação da política imperial promovida por Augusto, pois atuavam como polos agregadores
das regiões recém ocupadas por Roma e ainda pouco romanizadas.208 Logo, estas cidades
caracterizaram-se por serem centros administrativos e residência das elites, algumas das quais
oriundas dos castros, estando interligadas entre si, e com o resto do Império, através de uma
eficaz malha viária, que começa a ser construída ainda em época de Augusto.
O carácter jurídico conventual foi reflexo de maior aproximação entre as províncias e o governo romano que, por uma necessidade administrativa,
recorria com maior frequência a tribunais locais (Roldán Hervás, 1988: 184).
202
De acordo com Rodríguez Colmenero (2010: 64), o legatus iuridicus, acompanhado do seu comitê (consilium), realizava anualmente uma
inspeção pelos conventus de sua jurisdição.
203
Rodríguez Colmenero, 2011: 64.
204
Curchin, 1996: 82.
205
Dopico Caínzos, 1986: 279; Martins e Carvalho, 2010: 2.
206
Martins e Carvalho,(2016).
207
Martins et al., 2010.
208
Martins, 2009a: 197; Martins e Carvalho 2010: 4
201
50
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
Figura 6 - As três circunscrições conventuais do Noroeste hispânico e suas respectivas capitais jurídicas (Carvalho,
2008: 77).
De qualquer modo, o papel desempenhado pelas três capitais conventuais do NO deve
ser entendido de acordo com as regiões em que se encontravam inseridas, levando em conta os
fatores sociais e culturais singulares do povoamento pré-romano dos respetivos espaços
geográficos que controlavam.209
Sabemos que Lucus Augusti e Asturica Augusta foram cidades que sucederam a antigos
acampamentos militares associados às campanhas de conquista e pacificação do NO durante as
guerras cantábricas. No caso de Bracara Augusta, e tendo por base os dados arqueológicos e
epigráficos disponíveis, é possível considerar a sua fundação civil e ex novo, circunstância que se
reflete na origem do seu povoamento, que comporta uma forte componente indígena.210
Estas três capitais conventuais representaram os pilares da organização e pacificação da
região que há séculos se encontrava na zona periférica do palco de atuação romana na Hispânia.
Por esse motivo, foi muito importante o culto da figura de Augusto, 211 que precede a organização
colegial do culto imperial que será já da época de Tibério,212 inserindo-se, deste modo, a noção
divina do imperador como instrumento de idealização do poder de Roma entre as comunidades
recém integradas no Império.213
Carvalho, 2008: 97; Martins e Carvalho, 2010: 2.
Martins et al., 2005: 261; Martins e Carvalho, 2010: 4.
211
O culto imperial não foi unicamente inserido nos três conventos jurídicos do Noroeste sendo também testemunhado no conventus cluniensis e
no conventus carthaginensis, ambos na Provincia Tarraconensis (Dopico Caínzos, 1986: 274).
212
Rodríguez Colmenero, 2011: 63.
213
De acordo com Curchin (1996: 34) podemos perceber o culto a Augusto desde os primórdios da organização conventual sinalizada na
nomenclatura do conventus Arae Augustae, que dará origem ao conventus Asturum.
209
210
51
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Para além da criação das capitais jurídicas nas circunscrições conventuais cabe salientar
a organização das civitates ou populi214 na região do NO, durante o governo de Augusto, conforme
registado na Tabula Lougeirorum,215 datada do ano 1 d.C., onde está gravado o nome da civitas
Lougeiorum. Este documento reforça a defesa de uma cronologia augusta para estas
circunscrições, contrariando a posição daqueles que defendem para as mesmas uma cronologia
flaviana.216 O uso dos dois termos está testemunhado a partir de fontes textuais e epigráficas que
relacionam estas unidades territoriais com os três conventus do NO. O sistema de civitates
correspondia ao conjunto de unidades territoriais onde estavam alojadas as populações recém
conquistadas por Roma, possuindo uma capital administrativa e governo próprio gerido pelas
próprias elites.217 Nos estudos sobre a Galécia, Delgado Borajo e Grande Rodríguez defendem que
as civitates representaram a conversão dos povoados não urbanos em entidades territoriais,
administrativas e fiscais, à semelhança dos centros urbanos,218 tendo também por função o
controle do recenseamento local.219
Mesmo tendo convicção da existência destas civitates como circunscrições de terceiro
grau fixadas nos conventos jurídicos do NO as opiniões dos investigadores divergem em relação à
sua natureza estrutural. De facto, alguns sustentam a ideia de que as civitates foram sobreposições
de estruturas territoriais e étnicas pré-romanas, ancorando-se no facto de que Roma teria
aproveitado as organizações étnico-culturais indígenas para estabelecer uma nova forma de
administração, mais condizente com os seus mecanismos de controle.220 Por outro lado, outros
autores admitem que os populi ou civitates correspondem a territórios político-jurídicos claramente
definidos por Roma, fruto da reorganização das comunidades indígenas impulsionada pelo
imperialismo romano. 221 De qualquer modo, é possível assumir, como defende Manuela Martins,
O emprego das duas terminologias, civitates e populi, tem sua raiz em Plinio, que as utilizam no mesmo trecho e em outros excertos. De acordo
com Carvalho (2008: 92), trata-se de um caso de diversidade de formulae (interpretação dos termos), possivelmente explicado pelo autor ter
utilizado para consulta fontes de diferentes épocas.
215
Inscrição: C(aio) Casear Aug(usto) f(ilio) L(ucio) Aemilio Paullo co(n)s(ulibus) / ex gente Asturum conventus Arae / August(a)e / civitas
214
Lougeiorum hospitium fecit cum / C(aio) Asinio Gallo libereis postereisque eius / eumque liberos posterosque eius sibi libe/reis postereisque suis
patronum cooptarunt / isque eos in fidem clientelamque suam suo/rumque recepit / egerunt legati / Silvanus Clouti / Nobbius Andami . (Fonte:
http://eda-bea.es/pub/record_card_1.php?rec=14896). Tradução: Sendo cônsules C. Caesar, filho de Augusto (e) L. Aemilius Paullus, a civitas
lougeiorum da gens Asturum do Conventus Ara Augusta realizou um pacto com C(aius) Asinium Gallus, seus filhos e descendentes, no qual ambas
as partes acordaram aceitá-lo a ele, seus filho e descendentes como patrono, acolhendo-os este, por seu lado, sobre a sua fides e clientela, sua e
dos seus. Assinaram Silvanus, filho de Cloutius (e) Nobbius, filho de Andamius, na quali-. (Garcúa Martínez, 1997: 43).
216
Alarcão, 1995-1996: 25.
217
Martins et al., 2005: 261.
218
Delgado Borrajo e Grande Rodríguez, 2009: 74.
219
Martins et al., 2005: 261.
220
Tranoy, 1981: 149-150; Alarcão, 1995-1996: 25-26.
221
Sastre Prats, 1998: 34-35.
52
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
que estas circunscrições eram unidades territoriais autónomas, de variadas dimensões, com um
centro urbano que podia ser, tanto de origem indígena como um novo aglomerado.222
Para Helena Carvalho, a dissensão de opiniões relativamente a estas circunscrições está
relacionada a sua heterogeneidade nos diferentes espaços jurídicos do NO hispânico.223 Neste
sentido, se tomarmos por exemplo a região mais ocidental do convento bracaugustano,
empiricamente conhecida por ser mais desenvolvida e dinâmica, onde predominava uma
organização social mais hierarquizada no momento da sua integração no Império, podemos
considerá-las como um modelo de territórios étnicos previamente demarcados e consolidados em
época pré-romana. Deste modo, parecem ter sido poucas as intervenções de Roma no intuito de
criar novas estruturas étnico-políticas. Este segundo procedimento, para Helena Carvalho, seria
mais compatível com a realidade da zona asturiana, onde as unidades de controle e administração
territorial não estavam vinculadas a nenhuma forma organizacional pré-romana, tendo sido
impostas em função dos interesses romanos relativos a exploração económica, comércio e
tributação, os principais fatores de intervenção.224
Numa percepção generalizante, o que cabe salientar é que as civitates serviram como
mecanismos de administração, cobrindo o território, que tinha por característica a componente
populacional que, nos diferentes ritmos de desenvolvimento, estavam numa posição ainda
marginal do Império, numa sociedade onde a cultura castreja ainda se fazia muito presente.
Por fim, assinalamos que o processo de povoamento e aculturação na região do Noroeste
estabeleceu ritmos diferenciados, com evidentes particularismos na organização dos novos
centros urbanos. Cabe ressaltar que as ocupações dos vários territórios tiveram motivações
condicionadas por variantes económicas, urbanísticas, sociais e singularidades histórico-culturais.
Portanto, percebemos que as medidas tomadas por Roma, tiveram muitas vezes por prioridade a
especificidade de atuação para cada realidade regional.
Martins et al., 2005: 261.
Carvalho, 2008: 96.
224
Sastre Prats, 1998: 35-36; Carvalho, 2008: 97.
222
223
53
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
2.3 A consolidação do urbanismo entre os Flávios e os Antoninos
Durante os anos que se seguiram ao principado de Augusto, tanto na Península Ibérica
quanto na região do NO, não houveram significativas transformações na administração das
províncias e nos estatutos jurídicos das cidades. Na sequência do governo de Augusto, os
sucessores Júlio-Claudianos, entre 14 d.C. – 69 d.C., deram prosseguimento às obras iniciadas
pelo Princeps, sobretudo no referente à política de urbanização dos antigos e novos aglomerados
urbanos. Esta dinastia terá o seu fim com a morte do imperador Nero, em 68 e a ascensão de
Vespasiano, em 69, após um ano de conflitos civis marcado pela sucessão de quatro imperadores.
Com o advento de Vespasiano ao poder inicia-se uma nova dinastia, a dos Flávios, que
perdurou até o ano de 96. Este acontecimento sinalizou um novo panorama na administração
imperial, podendo-se afirmar que durante o governo dos Flávios, e com a dinastia Antonina, (96 –
192), em especial com os imperadores Trajano e Adriano, a Península Ibérica passou por um
processo de intensa monumentalização das suas cidades,225 em parte determinada pela
universalização do direito latino promulgado por Vespasiano, no ano 70,226 atestado por Plínio na
sua Naturalis Historia.227
A obra pliniana, até o momento, é a única fonte literária disponível para entender o decreto
respeitante ao ius Latii, que, ao longo dos anos, foi alvo de diferenciadas interpretações.228
Também podemos conferir a lista de cidades fornecidas por Ptolomeu, datada do século II, onde
percebemos a utilização da nomenclatura latina contendo a derivação Flavii, como são os casos
de Iriae Flaviae (povos Copori, Padrón) e Flavia Lambri (povos Bediori), no conventus Lucensis,
Bergidum Flavium (Torre del Bierzo) e Interamnio Flavio (Bembibre), para o conventus Asturum e
Aquae Flaviae (Chaves), para o conventus Bracaraaugustanus.229
Apesar de estarmos cientes da importância do municipium flavium e do seu estatuto
jurídico de direito latino na revitalização urbana das cidades da Hispânia,230 Geoffaux manifesta a
opinião de que não basta considerar a monumentalização das cidades, associada à sua condição
Carvalho, 2008: 117-118.
Tranoy, 1981: 205; Jiménez Salvador, 1998: 164.
227
‘Vniuersae Hispaniae Vespasianus Imperator Augustus iactatum procellis rei publicae Latium tribuit.’ (Plinio, Nauralis Historia, III, 30).
228
Andreu Pintado, 2004b: 5; 2004c: 189.
229
Ptolomeu, Geographia, II, 6, 23-39.
230
Para Andreu Pintado (2004c: 193-197), a concessão do ius Latii na Hispânia foi muito mais amplo que nas outras regiões do Império pelos
seguintes motivos: por ter acolhido dois de seus adversários durante as guerras civis de 69, Galba e Otão; por terem Cláudio e possivelmente
Vitélio, prometido anteriormente a extensão do ius Latii aos seus partidários; pelo facto da Hispânia ser já possuidora de tal privilégio em algumas
áreas e pelo facto deste direito permitir aumentar a cobrança de impostos indiretos aos novos cidadãos.
225
226
54
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
jurídica, como causa determinante e globalizante para a urbanização, sendo necessário interpretar
de maneira cautelosa os diferentes casos.231 Para o autor, o desenvolvimento urbano não foi
imediatista nem sincrónico com o reconhecimento de um estatuto jurídico fixado pelas autoridades
romanas, apesar de que, em inúmeras circunstâncias, estes dois fatores parecerem coincidir. Por
isso, Geoffaux aponta para a existência de ritmos particulares de urbanização, sem desconsiderar
as grandes tendências, argumentando que as distintas regiões da Hispânia sofreram cadências
variadas de urbanização nas épocas Flávia e Antonina.
Assim, tendo por base a noção de que a vinculação à tribo Quirina232 por parte de
indivíduos das elites indígenas constitui um produto da adesão à cidadania latina, possibilitada
pelos municípios Flávios, torna-se importante a valorização do dossiê epigráfico.233 Através das
inscrições alusivas à tribo Quirina, datadas do período Flávio, podemos contabilizar um total de
sessenta epígrafes, vinte e duas das quais podem ser consideradas fidedignas e trinta e oito
passivas de valorização cronológica. Além destas inscrições existem outras cento e cinquenta,
datadas do período Antonino, que indicam um contexto municipal Flávio de finais da dinastia.234
Sendo assim, podemos considerar a existência de distintos ritmos de municipalização.235 Quanto
à sua duração, Le Roux manifesta a opinião de que as promoções jurídicas deram resultados
urbanísticos consideráveis, de modo gradual e progressivo, indicando que, em muitos casos, o
apogeu urbanístico se estendeu ao longo da época Antonina.236
Figura 7 - Inscrição epigráfica proveniente de Asturica Augusta que faz referência a L. Pempeius Faventinus, inscrito
na tribo Quirina (CILII, 2637).
Geoffaux, 2003: 147.
Os cidadãos dos municípios Flávios eram inscritos na tribo Quirina (Andreu Pintado, 2004c: 203).
233
Andreu Pintado, 2004a: 344.
234
Andreu Pintado, 2004a: 334.
235
Geoffaux, 2003: 148.
236
Para Le Roux (2006: 151), as colónias e municípios mais antigos incorporaram mais precocemente os complexos arquitetónicos monumentais,
o que nos leva a crer que o processo tenha sido mais tardio nas cidades mais periféricas, onde a conquista romana foi tardia, como é o caso das
capitais de conventus no NO hispânico.
231
232
55
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Figura 8 - Inscrição epigráfica proveniente de Bracara Augusta que faz referência a L. Terentius Rufus, inscrito na
tribo Quirina (CIL II, 2424).
Além da concessão de estatuto privilegiado e do ius Latii, também foi concedida às elites
dos municípios Flávios a ascensão ao direito romano mediante o desempenho de magistraturas
do cursus honorum.237 Neste contexto, o caminho das magistraturas tornou-se o principal artifício
para alcançar a plena cidadania,238 o que provavelmente se tornou num estímulo substancial para
a manifestação do sentimento de orgulho cívico.239 A categoria de municipium, expandida para
antigos e novos centros urbanos de origem indígena, necessitava de uma gama de exigências
administrativas de âmbito material e arquitetónico, o que, consequentemente, possibilitou o
fenómeno da revitalização urbana, muito bem documentado pelos estudos arqueológicos,240 o qual
se deveu ao evergetismo ou munificência.241 De acordo com a historiografia, este processo
caracterizava-se por doações financeiras de particulares, expressamente dos representantes do
poder público, que contribuíam para o embelezamento da cidade, através de investimentos em
obras públicas, garantindo-se, desta forma, uma infraestrutura que fosse digna da nova condição
privilegiada das cidades.242 Este procedimento aumentava o prestígio e mérito pessoal das elites,
atitude vista pelo povo como importante virtus inerente a candidatos a cargos públicos,
aumentando a dignitas da cidade, traduzida na sua monumentalização urbana.
Na região do NO hispânico é possível perceber uma notória monumentalização das
capitais dos conventos, bem como dos novos municípios. Conforme alegam Andreu Pintado243 e
Conforme Andreu Pintado (2007: 44) o municipium flavium é uma evolução do estatuto intermediário de oppidum Latinum, encontrando-se
entre a recepção da latinidade e a confirmação da municipalização por parte de uma comunidade.
238
Por um decreto do imperador Vespasiano, no ano de 74, os habitantes de centros urbanos que fossem suficientes romanizadas poderiam
adquirir a cidadania romana, agregando também a sua família após ter exercido cargos públicos, como o de duunviro, edil, questor, sacerdote, ou
mesmo como membro do Senado durante um ano (Andreu Pintado, 2006: 388; Rodríguez Colmenero, 2011: 62).
239
Andreu Pintado 2004b: 40.
240
Jiménez Salvador, 1998: 164; Andreu Pintado, 2004: 41.
241
Andreu Pintado, 2004a: 40; Le Roux, 2006.
242
As doações poderiam partir de particulares ou coletivos de pessoas, em honra a algum determinado magistrado ou dinastia vigente. Existe um
total 16 inscrições que documentam referências à tribo Quirina relacionados a atos de munificência (Andreu Pintado, 2006).
243
Andreu Pintado, 2004c: 200.
237
56
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
Rodríguez Colmenero,244 os três conventus do NO contavam com um Procurator Augusti Asturiae
et Gallaeciae, que, juntamente com o Legado Propretor da Citerior, assegurava os assuntos
financeiros da região. Esta especificidade no quadro administrativo do NO é explicada pela
abundante e singular riqueza mineira da região,245 intensamente explorada a partir do último
quarto do século I,246 facto este que ocasionou a ampliação da rede viária,247 remodelações dos
arruamentos urbanos, obras de saneamento e a construção e ornamentação de numerosos
edifícios públicos.248 Para mais, eram de responsabilidade daqueles agentes os assuntos militares,
designadamente associados com a Legio VII Gemina, instalada na região Astur e a
representatividade oficial da região do NO junto a capital da província, Tarraco.
As implicações flavianas no NO tiveram menor impacto que noutras regiões da Hispânia,
tendo, entretanto, assumido um papel fundamental na monumentalização das três capitais de
conventus, Bracara Augusta, Lucus Augusti e Asturica Augusta, bem como na criação de novos
municípios, de que são exemplo Aquae Flaviae, Brigaecium (Benavente) e civitas Limicorum
(Nocelo da Pena).249
O período Flávio também marcou um momento de grande migração das comunidades
castrejas do NO para os vales, onde se intensifica a produção agropecuária associada à fundação
de villae.250 Ao longo dos eixos viários vão também surgir novos aglomerados populacionais
abertos, que podemos designar de vici, que densificam a rede urbana, uma vez que constituem
pequenas cidades, com atividades comerciais e artesanais, dispondo de equipamentos de banhos
e, nalguns casos, de praças centrais.251 Logo, parece possível admitir que nas épocas Flávia e
Antonina se reforça a rede urbana e são promovidos novos e velhos aglomerados, o que
proporcionou uma nova reconfiguração do território, sob a jurisdição dos conventus e das
civitates,252 ocasionando, deste modo, mudanças urbanísticas e culturais.253 Para efeito de
Rodríguez Colmenero, 2011: 65.
De acordo com Burón Álvarez (2006: 294), o período Flávio representa o marco da exploração mineira na região do NO. Para o autor a
exploração em grande escala era realizada em torno dos rios Duerna, Jerga, Turienzo e Las Médulas.
246
Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 123, 131; Andreu Pintado, 2004c,: 197-198; Martins, 2009a: 220.
247
Vicente González (2008-2009: 58-60) apresenta o exemplo da rota Astorga-Bierzos, datada de 79, que tinha por funcionalidade primordial o
escoamento do ouro das regiões de Argañoso, Boeza e Tremos e a comunicação entre Interamnio e Bergido, que facilitava o acesso à região
durante o inverno.
248
Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 131; Martins, 2005; Martins et al., 2012; Martins et al., 2013.
249
Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 131.
250
Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 124; Andreu Pintado, 2004a: 44; Carvalho, 2008.
251
Carvalho, 2008; Martins, 2009a.
252
Martins et al., 2006.
253
A combinação deste fenómeno é demonstrada pela arqueologia na forma arquitetónica doméstica que já não está tão vinculada às habitações
castrejas, agora, compostas por técnicas e materiais de influência cultural romana, expressando uma perspetiva mais formal e funcional, facto
este, que provoca novos estilos de vida (Fernández Veja e Iglesias Gil, 2002-2003: 131).
244
245
57
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
manutenção da paz, integração e crescimento económico do Império, estas transformações,
proporcionaram às comunidades indígenas a oportunidade de adotarem o estilo de vida romano,
passando a inserir-se gradativamente na esfera urbana.
Um outro factor complementar na consolidação do urbanismo Flávio-Antonino foi a
questão do culto imperial, repensado e reformulado em todas as províncias do Império. As
medidas adotadas por Vespasiano não seriam possíveis sem um forte poder imperial que havia
sido fragilizado pelos últimos governos turbulentos que teve por seguimento uma guerra civil de
sucessão. Assim, o imperador realizou um trabalho propagandístico objetivando a renovação da
tradição dinástica, negligenciada por Nero, consolidando, desta forma, a dinastia emergente.254
Podemos, por isso, admitir que o culto imperial se tornou o principal instrumento para alcançar a
lealdade das populações provinciais através da divinização dos imperadores Flávios, e
posteriormente os Antoninos.255
Em resultado desta estratégia, o culto imperial foi reforçado na Bética, na Citerior e na
Lusitânia, tendo sido retomado o culto dos antigos imperadores, os divi, somando-se ao culto dos
imperadores vivos e à respetiva casa imperial, tendo sido criados e expandidos antigos e novos
cargos de sacerdócio,256 que davam acesso à civitas romana, com base no mérito e na honra do
desempenho do flaminado provincial. Este fenómeno propiciou a máxima promoção política e
social das elites indígenas.
No caso do NO é importante destacar o culto imperial, que ganha novo fôlego com a
concessão do ius Latii. Este facto suscitou a inclusão do ambiente indígena na esfera da vida
urbana e municipal, permitindo a aproximação das comunidades periféricas com a realidade dos
conventus e, numa dimensão maior, com a vida provincial, pois, a partir das medidas flavianas os
seus representantes puderam desempenhar os insignes cargos de flamine Provinciae Citeriori257
e flâmines municipais,258 estendendo e generalizando, assim, o culto por toda Hispânia.
Etienne, 1974: 448.
Andreu Pintado, 2004b: 31.
256
Os cargos de sacerdócios faziam parte do cursus hornorum romano, sendo, portanto, também eletivos (Le Roux, 2006: 143).
257
Para Andreu Pintado (2004b: 35), o flaminado foi a instituição que representou os laços entre as comunidades conventuais, a autoridade central
e o poder imperial.
258
Etienne, 1974: 452.
254
255
58
Parte II – Romanização e urbanismo na Hispânia romana
Figura 9 - Exemplo de epígrafe com o registo a sacerdoti Romae Augustorum conventus com referência a tribo
Quirina (CIL 2426 (p 900); RAP 549; HEp 13, 2003/2004, 819).
O culto imperial, em conjunto com a promoção jurídica das cidades, induziu um efeito de
legitimação do poder imperial, promovendo as elites indígenas dos conventus à cidadania romana
e potenciando um denso efeito urbanizador e monumentalizador.259 Com isso, reforçou-se o poder
de Roma, forjando-se um ambiente integrador com maior autonomia para as províncias,
permitindo que o domínio romano atingisse as localidades mais remotas do Império.
No NO assistimos a uma série de obras públicas nos centros urbanos, quer nas capitais
conventuais, quer nos novos municípios Flávios, onde os membros destacados da comunidade
cívica patrocinam a monumentalização urbana, através da construção e/ou remodelação de novos
espaços e edifícios.260
Portanto, entre Augusto e o fim da dinastia Antonina, o NO hispânico é palco de um longo
período de mutação e aculturação, que não segue necessariamente apenas uma lógica política e
económica.261 Na verdade, o desenvolvimento urbano segue um processo gradual, que se otimiza
durante o século II nas capitais conventuais e nas cidades promovidas a município, resultando,
essencialmente, das políticas iniciadas com o advento da dinastia Flávia e a continuação e produto
destas medidas durante o governo dos Antoninos.
Andreu Pintado, 2004b: 35.
Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 131; Andreu Pintado, 2004b: 38.
261
Le Roux, 2006: 155-156.
259
260
59
Parte III
_______________________________
As cidades do NO peninsular à luz das diferentes
fontes
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
1. As capitais jurídicas
1.1 Bracara Augusta
A atual cidade de Braga teve origem romana e está associada à cidade de Bracara
Augusta, fundada por Augusto no fim das guerras cantábricas, juntamente com Lucus Augusti e
Asturica Augusta. Se analisarmos a onomástica do nome da cidade perceberemos que Bracara é
o testemunho da importância do povo denominado de Bracari que ocupava o território entre
Lima e Ave em cujo centro assentou a cidade262 e Augusta é retirado do epíteto do próprio
imperador.263
A data de fundação da cidade é bastante controversa. De facto, apesar da data sugerida
pela inscrição de um pedestal de estátua dedicado a Augusto pelos bracaraugustanos, no dia do
aniversário do legado Paulus Fabius Maximus264, datado entre os anos 3 e 2 a.C.,265 sugerir que a
cidade já existia quando a estátua foi erguida, persistem dúvidas quanto à cronologia da sua
criação. Tendo por base o conjunto dos dados epigráficos e arqueológicos conhecidos é,
contudo, possível considerar que a fundação das três cidades do NO peninsular por Augusto
possa ter ocorrido entre 15 e 13 a.C., data que corresponde à terceira estadia do imperador na
Hispânia.266
O contexto de fundação está enquadrado no período que se refere à organização do
território das províncias da Hispânia, a partir do fim das guerras cantábricas, constituindo um
dos três centros urbanos criados por Augusto no NO peninsular. 267 Sabemos que esta
organização ocorreu entre os anos de 27 e 12 a.C.,268 mediante o encargo de Vipsânio Agripa,
muito provavelmente a partir do ano 19 a.C., data do último embate dos romanos contra as
forças de resistência cantábricas.
Partindo da documentação textual, em particular dos escritos de Plínio, primeiramente
Agripa teria integrado os territórios de Callaecia e Asturia na província de Lusitânia. Porém
Martins e Carvalho, 2010: 5.
Morais, 2005: 125.
EE, VIII, 280 = ILER, 1028.
Outras inscrições dos bracaraugustanos: dedicada a Caius, ou Lucius César – CIL, II, 2422 = AE 2010, 624; a Agrippa Postumus – AE, 1974,
392 = RAP 485; à consagraçao do sol abadito pela luz (Tranoy, 1981: 328) – CIL, II, 2421 = Horster p 363; outros dois pedestais de tipologia
igual ao já citado, dedicada ao Genius Caesaris e ao Genius Augusti (para Tranoy, com incerteza cronológica) – CIL, II, 5123 = RAP 261. Estas
evidências demonstram que na virada do milénio já existia na localidade um corpo cívico organizado capaz de produzir inscriçoes monumentais
em honra ao imperador (Martins e Carvalho, 2010: 7).
Martins, 2009a: 206; Martins e Carvalho, 2010: 7; Martins et al., 2012: 31.
Os três centros urbanos criados por Augusto no Noroeste correspondem aos respetivos conventus iuridicus bracaraugustanus, lucensis e
asturum.
O ano de 12 a.C. marca o falecimento de Vipsiàno Agripa, personagem importante a quem Augusto conferiu a responsabilidade sobre a
reorganização da província da Hispania Citerior Tarraconensis após os conflitos civis e o termino de conquista do território provincial. (Martins e
Carvalho, 2010: 3).
262
263
264
265
266
267
268
63
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
sabemos que os novos territórios foram incluídos na província da Hispania Citerior
Tarraconensis, em data incerta que oscila entre 16 e 13 a.C.,
269
ou entre 12 e 7 a.C.270 De
qualquer modo, a reorganização provincial da Hispânia, que ocorreu logo após a conclusão do
conflito cantábrico terá constituído um processo dinâmico que envolveu diversos compromissos
entre o poder romano e os representantes das comunidades indígenas,271 facto que justificará as
sucessivas integrações da Callaecia e Asturia em diferentes províncias num curto espaço de
tempo.
A cidade nasceu do imperativo de dotar a região situada a Norte do Douro de estruturas
sociais e políticas no intuito de solidificar a presença romana na região e promover a integração
das suas populações.272
A região onde foi fundada a cidade era um importante epicentro viário e possuía solos
férteis e abundância de água,273 essenciais para o seu desenvolvimento futuro.274 Outros fatores
que podem ter contribuído para a escolha do local de fundação da cidade são de cunho
topográfico, mas também social, económico e político, sendo admitido que o mesmo possuía já
em época pré-romana uma centralidade em termos regionais e diversidade de atividades ali
exercidas,275 e ter servido como ponto de reunião política das elites dos bracari originários dos
castros circundantes, podendo ter desempenhado igualmente o papel de mercado e de ponto de
encontro para celebração de cultos e rituais.276
Os dados arqueológicos disponíveis indicam uma fundação ex novo, sendo de destacar
que a documentação textual antiga, designadamente Plínio,277 a classifica como oppida peregrina.
Sabemos, contudo que a cidade será capital de conventus iuridicus, talvez desde Augusto, ou
Tibério, de acordo com os dados epigráficos disponíveis, que situam a criação dos conventos por
Augusto,278 contrariando a tese dos investigadores franceses que a situavam na época Flávia.279
O intuito da fundação de Bracara Augusta tinha o objetivo de organizar uma nova
coletividade que centralizasse as atividades de carácter jurídico, religioso e económico, funções
Tranoy, 1981: 146.
Alföldy, 1961: 207.
Para Martins e Carvalho (2010: 4) esta hipótese está reforçada pelos dados epigráficos referidos na obra de Dopico Caínzos, Mª. D. (2009). A
transformação dos pobos do Noroeste hispánico na época de Augusto: a evidencia epigráfica. In: D. Dopico Caínzos et al. (Eds), Do castro á
Cidade: A romanización na Gallaecia e na Hispânia indoeuropea (pp. 31-52). Lugo: [s.n.].
Esta estratégia estava associada ao programa imperial de reorganização administrativa da Península Ibérica (Martins, 1991-92: 177).
Importante ressaltar que a água, além de ser fundamental à vida, é também importante no convívio em sociedade, onde é fundamental para
as superestuturas é mais apreciada ainda para a cultura romana que estimava seu uso nas fontes, banhos públicos e privados. Sendo assim
uma importante particularidade para a fundaçao duma cidade e futuramente seu desenvolvimente urbano.
Martins e Carvalho, 2010: 6.
Martins e Carvalho, 2010: 7.
Tranoy, 1981: 194; Martins, 2009b: 185.
Plinio, Naturalis Historia, IV, 112. Também dispomos de uma referência em Ausônio, na Ordenação das cidades famosas (XI-XIV), que aponta
Bracara Augusta como uma cidade rica e, equivocadamente, com abertura ao mar.
Dopico Caínzoz, 1986, 2009.
Tranoy, 1981: 32.
269
270
271
272
273
274
275
276
277
278
279
64
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
que podem ser documentadas pelos dados arqueológicos e epigráficos que permitem registar o
povoamento e desenvolvimento da cidade durante a dinastia Júlio-Cláudia.280 Assim, a
arqueologia documenta a ocupação do novo aglomerado desde finais do século I a.C., tendo por
base os enterramentos conhecidos da necrópole da Via XVII,281 registando-se também uma
ocupação das áreas envolventes do forum na primeira metade do século I.282 Por sua vez, os
dados epigráficos, em especial as inscrições funerárias, testemunham uma forte componente
indígena no povoamento da cidade e a presença de cidadãos romanos, tanto do meio militar,
como civil. Com base na epigrafia sabemos que a comunidade cívica bracarense era composta
de forma diversificada onde coabitavam indígenas, imigrantes, alguns ex militares, escravos e
libertos.283 Graças à epigrafia, podemos igualmente identificar a promoção de indígenas à
cidadania romana, supostamente durante os períodos Flávio e Antonino. Um exemplo dessa
situação é-nos fornecida por uma inscrição,284 datada do século II, que menciona o cidadão L.
Terentius Rufus por decreto decuriorum, que sugere a promoção jurídica das elites da cidade e a
sua inclusão na ordo decuriorum. A epigrafia funerária assinala vários indivíduos de origem
indígena inscritos na tribo Quirina, provavelmente a partir da dinastia Flávia.285
A partir da segunda metade do século I Bracara Augusta irá viver um período de
consolidação urbana que terá continuidade com a dinastia Antonina. Este impulso urbanístico
teve como principal expoente a construção de vários edifícios públicos e de ricas habitações
urbanas, cujos vestígios chegaram até nós graças à arqueologia urbana desenvolvida em Braga
desde 1976.
Relativamente aos edifícios públicos, cabe destacar a construção de um teatro e de
várias termas públicas, nos inícios do século II.286 Bracara Augusta tinha também um anfiteatro,
parcialmente ainda visível no século XIX.287 Cabe igualmente referir a existência de um edifício
público que ocuparia a área sob a atual Sé catedral, que poderá corresponder a um macellum, a
fazer fé na inscrição votiva encontrada no local que refere o génio do mercado.288
Sobre o forum e respetivos edifícios pouco se sabe, pois a área urbana correspondente
àquele espaço nunca foi escavada. No entanto, conhecem-se vários elementos arquitetónicos de
grandes dimensões (bases e capitéis), procedentes das imediações do local onde se supõe a sua
280
281
282
283
284
285
286
287
288
Martins et al., 2012.
Martins et al. 2010.
Martins et al., 2012: 39-44.
Le Roux e Alain Tranoy, 1989/90.
CIL II, 2424 = AE 2005, 838.
Martins, 1991-91: 179; Martins, 2009a: 216, 243.
Martins, 2004: 150, 2009a: 207; Martins et al., 2012: 30; Ribeiro, 2010b: 31; Magalhães, 2013a: 18.
Morais, 2001.
Fontes, 1997/98; Martins et al., 2012.
65
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
existência, que sugerem corresponder aos elementos arquitetónicos característicos dos espaços
forais.289
A arqueologia tem permitido documentar a existência de várias domus, cujo estudo tem
permitido compreender a adaptação dos modelos de casa itálica à topografia da cidade e à
organização dos seus quarteirões.290
A partir do ano de 1976, através do ‘Projeto Bracara Augusta’, atualmente em pleno
desenvolvimento de análise dos dados arqueológicos obtidos nos últimos quarenta anos,
realizaram-se várias escavações e estudos referentes ao urbanismo e arquitetura do período altoimperial bem como à sua evolução no Baixo Império.291 Nesta perspetiva, é possível compreender
hoje a dinâmica da evolução do espaço urbano da cidade romana, ainda que a continuidade das
investigações possa vir a alterar algumas das hipóteses defendidas e a abrir novas perspetivas
de abordagem sobre as suas características.
Neste sentido, sabemos que a cidade foi construída a partir de um plano ortogonal, que
tinha como eixos principais o decumanus maximus, cuja parte ocidental está fossilizado na Rua
de S. Sebastião,292 desconhecendo-se onde passaria exatamente o seu tramo oriental e o cardus
maximus, reconhecido arqueologicamente na sua parte norte na zona do antigo Albergue
Distrital,293 que perdurou na medieval Rua Verde.294
A cidade foi materializada com base numa malha de quarteirões quadrados, de
orientação NO/SE e SO/NE, com 156 pés de lado, entre o eixo das vias principais,
correspondendo as áreas construídas a cerca de 120 pés, ou seja, a 1 actus. A restituição da
planimetria do projeto fundacional de Bracara Augusta resultou do cruzamento dos dados
arqueológicos que permitiu demonstrar a orientação dominante dos edifícios, facultando
igualmente vestígios de ruas e de pórticos. Assim, sabemos que o cardus maximus possuía
cerca de 24 pés, de largura, presumivelmente a mesma dimensão do decumano principal. A
média de largura dos restantes eixos viários ronda os 12 pés, valor igualmente característico dos
numerosos pórticos que rodeavam as casas e se distribuíam ao longo das ruas.295
A malha urbana fundacional, extremamente regular, sofreu ligeiras alterações com as
atividades construtivas realizadas ao longo dos séculos, mas a cidade manteve até à Antiguidade
289
290
291
292
293
294
295
Ribeiro, 2010b.
Martins, 1997/98; Martins et al., 2012; Magalhães, 2010, 2012, 2015.
Martins, 2009a; Martins et al., 2012; Ribeiro, 2010b.
Ribeiro, 2010b: 24.
Ribeiro, 2010b: 24.
Martins e Ribeiro, 2013.
Martins, 2009a: 207; Magalhães, 2013a: 16.
66
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Tardia uma fisionomia muito geométrica, pautada pela regularidade das ruas e pelos pórticos,
que foram genericamente integrados nas domus nas reformas do século IV.296
Apesar do escasso número de indícios sobre os primeiros anos de Bracara Augusta,
sobretudo em termos arqueológicos,297 é possível presumir que a urbe conheceu um programa
de povoamento acelerado, cuja máxima expressão económica e urbana se fará sentir no período
dos imperadores Flávios e Antoninos.298 Os resultados arqueológicos apontam que a cidade
atingiu sua máxima extensão, no século II, concomitantemente com a construção de grandes
obras públicas, sobretudo nos reinados de Trajano e Adriano.
A partir da segunda metade do século I Bracara Augusta irá viver um período de
consolidação urbana que terá continuidade com a dinastia Antonina. Este impulso urbano teve
como principal expoente a construção de vários edifícios públicos e de ricas habitações urbanas,
cujos vestígios chegaram até nós graças à arqueologia urbana bracarense.
Relativamente aos edifícios públicos cabe destacar a construção de um teatro, situado
no Alto da Cividade, erguido juntamente com umas termas públicas, edifícios que se encontram
datados dos inícios do século II.299 Bracara Augusta possuiu também um anfiteatro, parcialmente
ainda visível no século XIX,300 presumivelmente com a mesma cronologia do teatro. No século II
assistimos à construção de outras termas públicas, identificadas na zona arqueológica da Rua
Afonso Henriques.301 Já o presumível macellum, que se situava fora da área planificada da
cidade, no local onde se ergue hoje a Sé catedral, deve remontar ao período Flávio, 302 momento
que assinala a remodelação da fonte/santuário da Fonte do Ídolo, situada nos subúrbios da
cidade,303 de presumível origem pré-romana, dedicada à deusa Nabia, monumentalizada nos
inícios da ocupação da cidade.304
Os edifícios dedicados ao ócio são os melhores conhecidos, com destaque para o teatro,
identificado em 1999 e ainda em processo de escavação, datado de inícios do século II. Os
dados disponíveis até ao momento permitem conhecer as dimensões do edifício, a estrutura das
Martins et al., 2016.
Como já apontados nas inscrições dedicada a Caius, ou Lucius César e aos dois pedestais dedicados ao Genius Caesaris e ao Genius Augusti.
Martins, 2009b: 185; Ribeiro, 2010b: 24.
Martins, 2004: 161.
Morais, 2001.
Martins et al., 2014.
A avaliar pelos dados obtidos nas escavações realizadas na Rua Nossa Senhora do Leite (Gaspar, 1985) e no interior da Sé Catedral (Fontes,
1997/98).
Elena Garrido, et al., 2008.
De acordo com Martins (2014: 165), por meio dos vestígios arqueológicos é possível assinalar que a cidade foi possuidora de um importante
sistema hidráulico, com presença de aquedutos subterrâneos para o abastecimento das termas públicas. Acredita-se que o fornecimento de água
era procedente da zona das Sete Fontes, a 5km de distância de Braga.
296
297
298
299
300
301
302
303
304
67
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
suas partes orgânicas, facto que possibilitou a sua restituição planimétrica.305 Trata-se de um
edifício alicerçado na vertente da colina da Cividade, com cerca de 72,63 m de diâmetro
máximo, limitado por um robusto muro perimetral, com contrafortes dispostos a intervalos
regulares. Os dados arqueológicos apontam ainda para que a frente cénica tivesse cerca de
13,10 m de altura.306
São igualmente bem conhecidos dois edifícios termais de carácter público, um dos
quais construído juntamente com o teatro, ambos localizados na Colina do Alto da Cividade.307
Trata-se de um edifício com uma área de banhos de dimensão modesta, com uma ampla
palestra panorâmica, cujo limite norte se adapta à escadaria que separa o complexo balnear do
teatro. Estas pequenas termas públicas reaproveitaram parte de um edifício anterior datado do
século I, tendo sofrido várias remodelações até ao seu abandono nos inícios do século V. O
conjunto do edifícios composto pelas termas e pelo teatro estavam localizadas numa área
privilegiada da cidade, praticamente contígua ao forum, parecendo fazer parte do programa de
monumentalização deste setor da cidade, iniciada, provavelmente em época Flávia, mas que
atingirá a sua maior expressão nos inícios do século II.308
Um outro edifício termal, de maiores dimensões, datado de época Antonina, foi
identificado nas escavações da zona arqueológica da Rua Afonso Henriques. 309 O edifício, situado
a nordeste do forum, ocuparia dois quarteirões, dispondo-se no sentido E/O, sendo presumível
que pudesse corresponder a umas termas mistas.310 A construção deste balneário implicou a
desafetação de um cardo e o arrasamento de duas domus, datadas de meados do século I,
identificadas nas escavações da Rua Afonso Henriques e da zona arqueológica da Frei Caetano
Brandão/Santo António das Travessas.
A arqueologia tem permitido documentar a existência de várias domus, cujo estudo
possibilitou compreender a adaptação dos modelos de casa itálica à topografia da cidade.311
Entre as domus melhores conhecidas de Bracara Augusta podemos apontar a identificada nas
escavações do Ex. Albergue Distrital,312 outra na zona arqueológica da Escola Velha da Sé,313 outra
Martins et al., 2014: 41-43; Martins et al., 2015.
Martins et al., 2014, 2015.
Martins, 2005.
Martins, 2005; Martins et al., 2015: 328.
Martins et al., 2011; Martins et al., 2014; Martins, 2015.
Martins, 2015.
De acordo com Magalhães (2013: 26), existem duas tipologias das domus em Braga. Sendo assim, poderiam ser compostas por atrium e
peristilium, como acontece no caso da domus das Carvalheiras, ou somente por peristilium, como é o caso das outras casas escavadas na
cidade, a ser esta última mais frequente por toda a Hispânia romana. A partir do século II será comum a presença de banhos privados nas
habitações (Magalhães, 2010).
Torres, 2014.
Magalhães, 2010.
305
306
307
308
309
310
311
312
313
68
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
na da zona Frei Caetano Brandão/Santo António das Travessas 314 e uma outra na zona
arqueológica das antigas Cavalariças,315 além de vestígios de outras reconhecidas com base nas
escavações de vários setores da cidade, designadamente no claustro do Seminário de Santiago,
na Rua Afonso Henriques316 e no quadrante sudeste nos terrenos da Misericórdia.317
Contudo, a domus melhor conhecida de Braga foi identificada na zona arqueológica das
Carvalheiras, onde foi possível escavar a totalidade de uma casa, rodeada por ruas.318 Trata-se de
uma domus de atrium e peristilium, construída na época Flávia, que ocupa a totalidade de um
quarteirão da cidade, possuindo uma área construída de cerca de 1 actus. A casa organiza-se
em duas plataformas, com um desnível de cerca de 3 m entre si, processo que permitiu adequar
a habitação ao pendor da vertente. Possui duas entradas, uma a sul com acesso ao atrium e
dependências associadas, designadamente um tablinum e outra a norte com acesso ao peristilo,
em torno do qual se desenvolvem vários compartimentos.319 Nos lados sul e oeste a domus era
envolvida por várias tabernae, que abriam para os pórticos, que ladeavam as ruas. Por ser a
única habitação romana totalmente escavada em Braga, a domus das Carvalheiras representa o
melhor exemplar de arquitetura doméstica conhecido até ao momento, tendo permitido
compreender a organização interna das domus de Bracara Augusta, designadamente quanto à
distribuição dos espaços de representação característicos da casa itálica, que se desenvolvem
em torno do atrium e do peristilium.320
Em meados do século II a domus sofreu uma profunda reforma, com a construção de
um balneário, que pelo facto de ser acessível a partir da rua poente foi interpretado como
balneum público, que passou a ocupar toda a parte norte da anterior habitação. A área de
321
banhos ocupava o quadrante noroeste e estava associado a uma palestra, correspondente ao
antigo peristilium da casa. Em torno deste novo espaço organizavam-se várias tabernae que
ocuparam os antigos espaços de representação da habitação flaviana.322 Assim, desaparece a
domus, sendo presumível que apenas a sua parte sul tenha continuado a funcionar como área
de habitação mais modesta, reaproveitando os espaços anteriores.
A domus das Carvalheiras representa o único exemplar de habitação com atrium e
peristilium conhecido até ao momento em Braga, sendo as outras domus reconhecidas todas de
314
315
316
317
318
319
320
321
322
Magalhães, 2013a: 22-26.
Magalhães, 2010.
Magalhães, 2013b: 56.
Silva, 2013; Magalhães, 2015: 75.
Martins, 1997-98; Magalhães, 2010: 21, 2013a: 19.
Magalhães, 2010.
Magalhães, 2015.
Martins et al., 2011; Martins, 2015.
Martins, 2015.
69
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
peristilo.323 Sabemos que todas as domus conhecem reformas substantivas nos finais do século
III/inícios do IV, tornando-se então mais requintadas graças à introdução de banhos privados,
tendo todas merecido programas decorativos sofisticados, com estuques nas paredes e
mosaicos a cobrir os pavimentos. Simultaneamente, as domus ganham espaço, avançando a
construção sobre os pórticos que são integrados nas áreas construídas.324 Estes aspetos estão
bem documentados na domus da Escola Velha da Sé,325 mas também na do Albergue Distrital326 e
na domus de Santiago.327
Os dados disponíveis permitem considerar que Bracara Augusta estava ligada a várias
cidades através de seis itinerários principais. As vias mais antigas são a via XVI, que ligava a
cidade a Olisipo, por Cale328 e a via XVII, com ligação a Asturica por Aquae Flaviae, ambas
iniciadas a construções ainda no tempo de Augusto, sendo provável que a construção da via XIX,
com ligação a Lucus Augusti, tenha arrancado entre Augusto e Tibério.329 De mais tardia
construção é a via XVIII, datável do período flaviano, que reforçou a ligação a Asturica Augusta,
pelo interior da zona mineira do Bierzo e a via que ligava Bracara Augusta a Emerita Augusta,
que não é referida no Itinerário de Antonino, mas que sabemos que existiu a partir da
identificação de numerosos miliários, também ela datável da época Flávia. 330 Referida no
Itinerário temos ainda a registar a via XX, que ligava Bracara a Lucus Augusti per loca marítima,
cujo percurso até ao litoral tem sido objeto de discussão entre os investigadores331, mas que seria
de enorme importância para o comércio da cidade, assegurando o seu abastecimento a partir da
rota atlântica.332
De um ponto de vista arqueológico cabe destacar a identificação de um troço da via XVII,
com múltiplas reformas, identificado em 2009 nas escavações realizadas na área do edifício dos
antigos CTT de Braga.333
As escavações realizadas em Braga permitiram detetar as áreas de necrópole da cidade,
sendo conhecidos vestígios de seis, que se associavam às principais vias que ligavam a cidade
aos outros centros urbanos da Tarraconense e da Lusitânia.334 No entanto, a necrópole melhor
323
324
325
326
327
328
329
330
331
332
333
334
Magalhães, 2010, 2013; Silva, 2013; Torres, 2014; Magalhães et. al., 2016.
Martins et al., 2016.
Magalhães, 2010.
Torres, 2014.
Martins et al., 2016.
Mantas, 2016: 146.
Carvalho, 2008.
Carvalho, 2008.
Carvalho, 2008.
Morais, 2005.
Martins et al., 2010; Braga, 2010.
Martins e Delgado, 1989-1990; Braga, 2010.
70
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
conhecida é aquela que se associa à via XVII, que ligava Bracara Augusta a Asturica Augusta por
Aquae Flaviae, escavada numa extensa área, em 2009, graças aos trabalhos arqueológicos
realizados, pela UAUM, no antigo edifício dos CTT e na área de Av. da Liberdade. 335 Os
conhecimentos disponíveis permitem considerar que esta necrópole começou a ser estruturada
ainda em época de Augusto, tendo continuado a ser utilizada até finais da Antiguidade Tardia,
sendo conhecidas centenas de enterramentos de cremação e de inumação,336 bem como
mausoléus e recintos, que definiam diferentes áreas de tumulação da necrópole em diferentes
momentos. Cabe igualmente referir que a maior parte da epigrafia funerária de Braga procede
desta necrópole,337 tendo sido possível identificar numerosos socos ainda enterrados de estelas
dispostos ao longo da via, bem como fragmentos de monumentos que terão sido inutilizados
entre finais do século III/inícios do IV.338
Sobre a ocupação da periferia da cidade de Bracara Augusta e, para além das
necrópoles, pouco conhecemos, ainda que seja certo que deveria ser pontuada por áreas
artesanais e edifícios de culto. Na verdade, tudo converge para que as principais zonas
artesanais da cidade se situassem fora da área habitacional, existindo vestígios de fornos, de
tanques e de escórias de vidro na parte sudoeste e sul da cidade.339 No entanto, a única oficina
cuja planimetria é conhecida está representada por um edifício reconhecido na escavação da
área dos antigos CTT, anexa à via XVII, que produziu vidro entre os séculos IV e V.340
Em finais do século III/inícios do IV a cidade passa por um importante programa de
renovação urbana, bem documentado arqueologicamente.341 Neste contexto serão remodelados
significativos edifícios públicos e privados, sendo possível identificar como principal fator desta
nova fase da urbanização a promoção da cidade à categoria jurídica de capital da província da
Gallaecia, criada pelo Imperador Diocleciano.
335
336
337
338
339
340
341
342
342
Martins et al., 2010; Fontes et al., 2010.
Braga, 2010, 2013; Martins e Braga, 2015; Braga e Martins, 2016.
Le Roux e Tranoy, 1989-1990.
Martins et al., 2010.
Morais 2005; Martins et al., 2012.
Martins et al., 2010; Cruz, 2009.
Martins et al., 2012.
Tranoy, 1981.
71
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Figura 10 - Malha urbana de Bracara Augusta (Arquivo UAUM).
1 - Domus das Carvalheiras; 2 - Domus do Ex. Albergue; 3 – Domus da Escola Velha da sé; 4 –Domus da
Frei Caetano Brandão e Santo António das Travessas; 5 – Domus do Seminário Santiago; 6 – Domus da
Afonso Henriques; 7 – Domus das Cavalariças; 8 – Termas, teatro e edifício pré-termal do Alto da
Cividade; 9 – Fonte do ídolo; 10 – Balneário; 11 – Templo.
1.2 Asturica Augusta
A atual cidade de Astorga, localizada na região central da província de León, na
comunidade autónoma de Castilla e León, teve origem romana, tendo sido fundada, tal como
Bracara Augusta, no fim das guerras cantábricas. Com origem num acampamento romano, foi
capital de convento da Provincia Hispania Citerior Tarraconensis, consolidando-se como um
relevante centro urbano de uma região conhecida pelas suas extensas áreas de jazidas auríferas,
controladas e exploradas diretamente por Roma.343 Mediante a exploração mineira a importância
da cidade desenvolveu-se ao longo das duas primeiras centúrias da nossa era.
343
Metalla publica.
72
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
A nomenclatura de Asturica Augusta sugere que a cidade foi fundada por decreto de
Augusto, em território dos Astures, um dos grandes grupos étnicos pré-romanos do NO
peninsular.344 Asturica está situada sobre uma colina em forma de quebra-mar, no interflúvio dos
rios Jerga e Tuerto, numa região estratégica e privilegiada, pois estabelece-se como uma
interseção de comunicações entre o NO e outras importantes áreas da Hispânia Citerior, da
Bética e da Lusitânia. Esta circunstância, associada à riqueza mineira do seu território,
determinará o impulso urbanístico da cidade, como podemos observar pela documentação
literária antiga quando da denominação de urbs magnífica,345 registado por Plínio.346
Mau grado a sua importância, que vem sendo reconhecida pela arqueologia e pela
epigrafia, Asturica Augusta mereceu poucas referências nas fontes escritas da época romana.
A referência mais antiga é devida a Plínio, o Velho (23-79 d.C.), que cita as principais
civitates e populi do conventus Asturum, bem como as respetivas capitais. Posteriormente a
347
Plínio temos Ptolomeu (90-168 d.C.) que inclui a denominada Asturia na sua lista de cidades da
Provincia Tarraconensis, como capital dos Ámacos. Na verdade, é a Geographia de Ptolomeu
348
que constitui o principal documento que favoreceu a interpretação de que a cidade teria tido
origem indígena, hipótese que pode ser contestada com base nos dados arqueológicos, uma vez
que não existem quaisquer níveis estratigráficos que comprovem uma ocupação pré-romana do
local.349 A cidade é ainda referida no Itinerarium provinciarum Antonini Augusti e no Itinerário do
Anónimo de Ravena, a propósito das vias que a ligavam a outros centros urbanos da Hispânia.350
No período tardio temos citações da cidade na obra de Cipriano, bispo de Cartago (200259), que menciona León e Astorga nas suas 67 cartas dirigidas aos fiéis destas cidades, nas
quais condena os bispos Basilides e Marcial. Temos ainda algumas menções à cidade em
Hidácio de Chaves (338-470), Isidoro, bispo de Sevilha (560-636) e na obra do historiador
Blázquez Martínez, 1984: 9.
Plinio, Naturalis Historia, 3, 28.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 918.
Plinio, Naturalis Historia, 3, 28.
Em Ptolomeu (Geographia, 3, 5) o autor cita uma lista de cidades (comunidades), com suas coordenadas de longitude e latitude que são:
Lucus Asturum, Labernis, Interamnium, Argenteola, Lanciati, Maliaca, Gigia, Rio Bergidum, Rio Interamnium, Legio VII Germanica e os brigaecini.
González Fernández, 1996: 1021; Conforme Fernandéz Corral (2005: 11), a referência ao povo Amaci apontada por Ptolomeu tem de ser
contextualizado na realidade organizacional romana da época. O argumento de Ptolomeu não implica necessariamente que a cidade se tenha
situado sobre um habitat indígena preexistente, sendo possível argumentar que, no momento de reorganização do território romano recém
conquistado, Asturica Augusta foi transformada no centro político-administrativo das etnias indígenas do território.
Fernández Corral, 2005: 12. As vias assinaladas são: a Via XVII Item a Bracara Asturica 247 m.p., a Via XVIII Item alio itinere a Bracara
Asturica 215 m.p., a Via 19. Item a Bracara Asturica 299 m.p., a Via XX Item per loca marítima a Bracara Asturicam usque Asturica 207 m.p., a
Via 26 Item ab Asturica Caesaraugustam 497 m.p., a Via XXVII Item a Asturica per Cantrabria Caesaraugusta 301 m.p. Além destas, mediante
estudos arqueológicos posteriores podemos citar a via XXVII-XXVII, que formava a Rota da Prata, a Via XXVII, que coincide com XXVI e as vias
XXXII e XXXIV que discorrem pela atual província de León, terminando em duas bifurcações.
344
345
346
347
348
349
350
73
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Jordano que viveu por volta de 550.351 No entanto, estas fontes não referem nada relevante
quanto à origem e evolução urbana da cidade.
Assim, tal como acontece com Bracara Augusta, devemos o essencial das informações
referentes ao urbanismo e à arquitetura da cidade às inúmeras intervenções arqueológicas,
iniciadas no século passado, que se intensificaram nas últimas três décadas. No entanto, a
composição social da cidade e o seu protagonismo económico pode ser estimado com base no
seu rico corpo epigráfico, um dos mais expressivos de toda a Península Ibérica.352
A partir de 1984, quando a ‘Comunidade Autónoma de Castilla e León', com
colaboração do ‘Ayuntamiento de Astorga’, assumiu as competências em matéria de património
cultural, começam a multiplicar-se as intervenções arqueológicas de urgência, tendo em vista
salvar o património material romano da antiga Astorga,353 facto que contribuiu de maneira
decisiva para o conhecimento do seu quadro urbano.354
Alguns resultados de estudos mais recentes demonstram que a fundação de Asturica
Augusta está ligada à organização do território asture, realizada por Augusto, sendo possível
estimar, com base nos materiais mais antigos descobertos até o momento, que a intervenção
romana em Astorga data dos anos 15-10 a.C.355 A sua raiz fundacional aponta um carácter
militar, afirmação reforçada pela epigrafia e pela arqueologia. De facto, foram encontradas na
cidade inúmeras epígrafes que fazem referência à Legio X Gemina,356 sendo de destacar que os
níveis mais antigos reconhecidos arqueologicamente forneceram materiais cerâmicos (sobretudo
de sigillata itálica) e moedas,357 com fortes analogias com os reconhecidos no acampamento da
Legio III Macedonica, em Herrera de Pisuerga (Palencia) e León.
358
359
A hipótese da presença da Legio X Gemina no local da futura cidade de Asturica é aceite
por vários investigadores, muito embora existam alguns problemas sobre o modo como se
processou a fundação de cunho militar, pois o acampamento desta Legio estava situado a 45
Km de distância, ao sul de Astorga, sendo, por isso, admissível a hipótese duma ocupação
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 912.
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 93.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 911.
Burón Álvarez, 2006: 290.
Burón Álvarez, 2006: 290; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 95; Sevillano Fuertes, 2014: 16.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 913-15; Burón Álvarez, 2006: 290.
Estes achados arqueológicos foram detetados nos estratos mais antigos de vários setores escavados, como a ‘Casa del Pavimento’ de opus
signinum, no nível III do solar da rua ‘Puerta Obispo’ nº 13, no nível baixo do pavimento inferior do solar da rua ‘López Peláez’ nº 5 e no nível I
do setor da rua ‘General Mola’ nº 8. Burón Álvarez, 1997; Morillo Cerdán, 1999; Morillo Cerdán e García Marcos, 2006; informações sobre a
quantidade e detalhes dos materiais encontrados pode ser verificado em González Fernández: (1996b) Las defensas campamentales de Asturica
Augusta (pp. 1026-1035).
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 913-15; Morillo Cerdán e García Marcos, 2000: 598; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 94.
Morillo Cerdán e García Marcos, 2000: 598; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 94.
351
352
353
354
355
356
357
358
359
74
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
temporária duma Uexillatio360 da Legio X Gemina que acabaria por mudar-se para Petavinum
(Rosinos de Vidriales, Zamora), onde permaneceu até o ano de 63 a.C., quando por decreto do
imperador Nero foi enviada praa a província da Panónia.361
Os achados arqueológicos da Casa del Pavimento de opus signinum representam um
importante testemunho da origem militar da cidade. Neste setor foram identificados restos de
estruturas no formato de trincheiras, ou valas de cimentação, com a função de conter estruturas
de madeira.362 Também na borda da escarpa noroeste da colina foi identificado um duplo fosso
de tipo fossae fastigatae,363 sugestivo de um acampamento, sobre o qual foi construída a
primitiva muralha de pedra da cidade, com três torres semicirculares,364 achado que torna
inequívoco o carácter militar da primitiva ocupação de Astorga365 e descredencia uma possível
origem pré-romana366.
A origem militar de Astorga também está documentada pela epigrafia. Nas escavações
próximas da muralha baixo imperial foram descobertos diversos blocos de granito, de grandes
dimensões, deslocados e reutilizados em obras posteriores. A importância deste achado resulta
de duas inscrições onde se lê L.XG, registadas em grandes letras capitais quadradas, que
podem ser interpretadas como referindo a Legio X Gemina.367
Os achados arqueológicos permitem considerar que o acampamento de Asturica teve
uma curta duração e que no início do reinado de Tibério a configuração do espaço físico ganha
corpo de cidade, estabelecendo-se em função de um traçado ortogonal, que servirá de matriz à
construção de edifícios públicos e privados.368 Este traçado tem vindo a ser reconhecido pela
arqueologia, tendo por base a rede de cloacas que passavam sob as ruas romanas.369
Encontramos referências em Costa García (2011: 221) e em Baroja de Quiroga et al. (2004: 292) que apontam a uexillatio como um
destacamento legionário acantonado em outro sítio com a finalidade de guarnição ou qualquer outra função específica. Para Gonzáles Fernández
(1996: 88) a base da Legio X Gemina encontrava-se em Petavonium, numa mansio próximo a Rosino de Vidriales. Para García Marcos e Vidal
Encinas (1996: 915-916) esta guarnição militar instalada em Astorga estava encarregada da vigilância e controle dum amplo território
recentemente anexado e ainda em fase de pacificação.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 916; González Fernández, 1996b: 1022.
Este tipo de estruturas em madeira encontrado em Astorga equivale a modelos específicos da arquitectura militar romana. Estas estruturas
ficam seladas no nível de preenchimento onde se concentra a maior parte dos materiais da fase militar (Morillo Cerdán e García Marcos, 2000:
598-599). Do mesmo modo foram encontrados materiais em que equiparariam a uma fortificação em pedra da época imperial, possivelmente
em substituição da estrutura de madeira, o que representa uma tendência geral dos romanos (González Fernández, 1996a: 86-88).
Conforme González Fernández (1996a: 85, 1996: 1023-1024), o fosso exterior caracteriza-se por ser menos profundo e de formato mais
aberto, apresentando dimensões variáveis, desde os 3,50 m de largura e 1,85 de profundidade a norte do setor escavado. De acordo com
González Fernández também havia um fosso interno com 2,40 m de profundidade e com largura imprecisa, pois não pôde ser escavado.
Cuervo Álvarez, 2014: 77.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 915-916; Burón Álvarez, 2006: 290; González Fernández, 2006a: 85-90; Orejas e Morillo Cerdán, 2013:
95.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 913-15; Morillo Cerdán e García Marcos, 2000: 598; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 94.
Tranoy, 1981: 140; González Fernández, 1996a: 88; Burón Álvarez, 2006: 290; Orejas, 2013: 95.
Até ao ano 35 foram levantados os primeiros edifícios de Asturica Augusta antes da grande remodelação ocorrida entre os governos de
Claudio e Vespasiano (Cuervo Álvarez, 2014: 76).
Sevillano Fuertes, 2014: 31-37.
360
361
362
363
364
365
366
367
368
369
75
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Os dados disponíveis permitem considerar que o traçado da cidade está diretamente
associado ao seu passado castrense, apresentando um esquema ortogonal adaptado às
condições topográficas do terreno. Este plano deixa perceber os eixos principais,
designadamente, o decumanus maximus370 com direção NO/NE e o cardus maximus, com
sentido NO/SE.371 A largura das vias que compunham o traçado da cidade variou ao longo dos
séculos entre 4-8 m, com distinção para os eixos principais, melhor escavados, com uma
variação de 6-7 m. 372 A planimetria da cidade assinala um nó que serviu como referência para
compreender o traçado primitivo e a articulação urbana, correspondente a um ponto em que se
cortam dois dos coletores principais, o que corre sob o cardus maximus e o que se desenvolvia
sob o decumanus maximus, que se dirigia em direção à Puerta de Rey.373 Neste sentido,
sublinha-se a estreita relação entre os eixos viários e a rede de cloacas, estudadas por Luengo
Martínez,374 que permitiu estabelecer uma significativa mudança nas técnicas de construção a
partir da dinastia Flávia. Para além das cloacas cabe sublinhar a importância dos pórticos para a
definição das ruas que compunham Asturica, também inseridos naquele período.
Datam do período tiberiano as primeiras edificações de carácter público monumental e
as primeiras habitações,375 sendo possível que esta explosão urbanística assinale a importância
da nova civitas como capital de conventus iuridicus.376 A importância administrativa da cidade,
associada à exploração aurífera do território, determinarão a monumentalidade e riqueza das
construções que têm vindo a ser reveladas pela arqueologia nos últimos 30 anos.377
A cidade de Asturica Augusta floresceu ao longo do século I e as estruturas urbanas do
período Júlio-Claudiano serão consolidadas a partir do período Flávio, sendo de registar
modificações que privilegiam a monumentalidade. Durante esta etapa concretiza-se o plano do
tecido urbano, tendo o antigo traçado Júlio-Claudiano sido retificado nalguns setores, substituído
por uma nova trama urbana, que se irá adaptar na zona sul ao formato acidentado da colina.378
Sabe-se que no extremo meridional da colina o traçado perde regularidade devido ao
relevo, tendo a zona sido reservada para erguer um espaço público quadrado, que se considera
Para mais informações estudar as escavações realizadas em 2001 (Burón Álvarez, 2003).
Burón Álvarez, 2006: 292, 295.
Burón Álvarez, 2006: 294.
Burón Álvarez, 2006: 292.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 920.
Burón Álvarez, 2006: 291.
Sobre a criação augustana dos conventos jurídicos veja-se Dopico Caínzos (1986), hipótese que contraria a sugerida pelos investigadores
franceses que a situam na época Flávia (Tranoy, 1981).
Ferdández Corral, 2005: 10; Orejas, 2013: 95.
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 96.
370
371
372
373
374
375
376
377
378
76
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
correspondente ao forum,379 com cerca de 30.000 m².380 Neste vasto recinto têm sido
identificados vários elementos construtivos sugestivos de uma área central sobrelevada por um
criptopórtico, identificado como ergastula, que permitia criar um podium, para erguer um templo
ou um altar.381 Nas escavações da Rua Gabriel Franco Manuel Gullón, no antigo hospício,
também foram encontradas estruturas relacionadas a uma cúria e uma basílica.382
Na envolvência do forum encontra-se a maioria das estruturas domésticas conhecidas
até ao momento e nos quarteirões de maiores dimensões inscrevem-se alguns dos edifícios
públicos conhecidos, como é o caso das Termas Mayores, situadas na parte central da cidade.383
Localizadas na Rua Padre Blanco encontram-se as chamadas Termas Menores, mais afastadas
dos outros edifícios urbanos centrais e próximas da muralha.384 Os dois edifícios públicos têm a
sua origem no século I, registando o seu pleno desenvolvimento durante os períodos Flávio e
Antonino quando passam a apresentar a planimetria que é atualmente conhecida.385 O abandono
das construções estima-se a partir do século III, momento que assinala o processo de
decadência de Asturica Augusta.386
As intervenções arqueológicas realizadas até ao momento permitiram registar a
existência de um bom número de edifícios domésticos, alguns dos quais ricamente decorados
com estuques e mosaicos.387 As domus mais notáveis de Asturica Augusta concentravam-se na
parte central, em volta do forum, chegando a ocupar quarteirões inteiros, que agregavam,
também, estabelecimentos comerciais e artesanais, dispostos na parte baixa das casas e
abertos aos pórticos.388
As domus escavadas partilham entre si uma composição estrutural semelhante, com
pátios e pórticos organizadas no estilo itálico de atrium e peritilium.389 Este tipo de habitações
encontra-se na parte central e no extremo-oriental da cidade, nas imediações do forum, como é
o caso das designadas Casa de los denarios,390 Casa de la Pinturas Pompeyanas,391 Casa de Gran
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 96-97.
O foro de Astorga foi amplamente estudado por María Ángeles Sevillano Fuertes que registou as investigações numa publicação monográfica
titulada ‘El Forum de Asturica. Cuadernos Municipales’ (2005).
Num primeiro momento a construção foi interpretada como sendo um criptopórtico (Balil Illana, 1987: 143-146).
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 922.
Burón Álvarez, 2006: 291; Orejas, 2013: 96.
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 97; Cuervo Álvarez, 2014: 79.
Sevillano Fuertes, 1996: 1000-1001; Burón Álvarez, 2006: 296.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 927-928, 937; Burón Álvarez, 2006: 296; Cuervo Álvarez, 2014: 79; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 97.
As primeiras domus a serem escavadas em Astorga datam de 1954 e 1955 e posteriormente a partir de 1985 (Burón Álvarez, 2006: 300).
Burón Álvarez, 2006: 301.
Burón Álvarez, 2006: 301.
O seu nome deve-se ao facto de ter sido encontrada grande quantidade de moedas do período republicano, mais precisamente: 28 denários
referentes a Augusto e Tibério e 1 a Marco Antônio (Cuervo Álvarez, 2014: 84).
Burón Álvarez, 2006: 303.
379
380
381
382
383
384
385
386
387
388
389
390
391
77
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Peristilo,392 Casa de la Muralha, Casa do Mosaico del Oso y los Pájaros393 e da Casa del
Pavimento de opus signinum.394 Uma outra domus conhecida como Casa de las Columnas
Pintadas está localizada na parte oeste do antigo acampamento militar. Estas domus foram
escavadas maioritariamente na década 90 do século passado, exceto a Casa de las Pinturas
Pompeyanas onde os trabalhos de escavação se iniciaram em 1954.
Os dados arqueológicos indicam que estas domus possuem em comum uma origem no
século I, possuindo, todavia, distintas fases de remodelação, durante o período Flávio-Antonino e
na época da dinastia dos Severos, quando adquirem o formato de planta que chegou até nós. A
partir do século III estas luxuosas domus entram em processo de abandono, facto que coincide
com o início da decadência da cidade, articulado com o fim da exploração mineira do ouro, que
deixou de justificar a presença na cidade de membros das classes senatorial e equestre.
De facto, reconhece-se que o desenvolvimento da Asturica Augusta se encontra
intimamente associado à exploração do ouro da zona do Bierzo, ao longo das duas primeiras
centúrias da nossa era, o que teria justificado a intenção de a promover a capital da Provincia
Hispania Citerior Antoniana, criada pelo imperador Caracala, mas que nunca chegou a
concretizar-se.395
Através dos objetos encontrados nas escavações foi possível confirmar o
desenvolvimento da vitalidade económica da cidade no último terço do século I, o qual se
mantem ao longo do século II e nas primeiras décadas do século III.396 Neste sentido, Asturica
Augusta configura-se como um importante centro económico do NO peninsular, com impacto na
região e no Império.397
Para a cidade convergiam duas das principais vias da Hispânia, ambas indicadas no
Itinerário de Antonino, designadamente a via que ligava a Emerita Augusta, conhecida como ‘Via
da Prata’ e a que ligava a Tarraco por Cesaraugusta. A cidade era ainda servida por outras vias
que a ligavam aos portos cantábricos, em direção à região central da costa asturiana, além das
três vias que a ligavam às terras dos conventus Lucensis e Bracaraugustanus, nomeadamente, a
via XVII (Bracara Augusta/Aquae Flaviae/Asturica Augusta), XVIII (Bracara Augusta/Asturica
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 928.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 933; para Cuervo Álvarez (2014: 81) a domus é datada do começo da dinastia dos Severos (Sétimo
Severo 193-211 d.C.). A adoção deste nome para caracterizar a construção deve-se ao facto do mosaico melhor conservado possuir a figura de
um urso, enquanto um outro revela representações de vegetais e pássaros, ambos datados do século II e III d.C. (Burón Álvarez, 2006: 305).
Cuervo Álvarez, 2014: 84.
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 98.
Morillo Cerdán, 1999: 138-139; Burón Álvarez et al., 1999; Morillo Cerdán et al., 2005: 147-149; Morillo Cerdán e García Marcos, 2006;
Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 97.
Alcançam a capital astur produtos cerâmicos de todos os tipos e procedência como ânforas, destinadas ao transporte de vinho, azeite e
salgaduras, cerâmicas finas (terra sigillata sudgálica e hispânica), peças de paredes finas emeritenses e de Melgar de Tera (Zamora), lucernas
itálicas e norte africanas, entre outros (Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 97).
392
393
394
395
396
397
78
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Augusta), atravessando a Serra do Gerês e a via XX (Bracara Augusta/Lucus Augusti/Bracara
Augusta), por via marítima.
398
Ao longo das vias que saíam de Asturica Augusta foram detetadas necrópoles na parte
exterior da muralha,399 designadamente, próximo da Estación de Oeste,400 junto da saída
setentrional da cidade, na Puerta Obispo e outras mais a sudeste, onde foi localizado um
conjunto de epígrafes ao longo das muralhas, espalhadas pelo bairro San Andrés.401
Na zona periférica da cidade, mais precisamente na região do Polígono Industrial de
Astorga, foram identificados vestígios correspondentes a estabelecimentos artesanais e possíveis
moinhos, que terão tido o seu pleno funcionamento entre os séculos II e III.402
Por fim, mediante as escavações realizadas entre as ruas Paseo Blanco de Cela e Río
Eria403 identificou-se um fosso do acampamento militar sobre o qual se ergue uma muralha com
dois metros de largura e torres circulares, datada de finais do século IV. A construção desta
muralha assinala a retração da cidade de Asturica Augusta, sendo o perímetro urbano fortificado
tardio torna-se menor que a cidade alto-imperial.404
Na sequência das reformas administrativas de Diocleciano e da promoção de Bracara
Augusta a capital da Gallaecia, Asturica Augusta perde importância política,
405
facto que é
explicado pelo gradativo abandono da exploração mineira no século III, associado ao contexto de
crise que então assolou o Império romano, que conduziu a uma retração económica da cidade e
à sua progressiva decadência.406
O dossiê epigráfico de Asturica Augusta dá conta da composição social da cidade nos
dois primeiros séculos da nossa era.407 Das inscrições recuperadas dentro do recinto urbano
cabe destacar as mais antigas, datadas do século I d.C., relacionadas com o ambiente militar
que caracterizou a cidade, sendo de referir cinco que mencionam soldados em serviço da Legio
Rodríguez Colmenero, 2004; Moreno Gallo, 2006.
González Fernández et al., 2003: 297-308. Conforme Orejas e Morillo Cerdán (2013: 97), sabe-se que existiam várias necrópoles extramuros,
muitas das quais nunca intervencionadas arqueologicamente. Deve-se a González Fernández et al. (2003: 297-308) o primeiro estudo de uma
intervenção arqueológica de uma necrópole, sendo as outras conhecidas por notícias históricas.
Luengo Martínez, J. M. (1962). Astorga Romana: Excavaciones del plan nacional 1954-55. Noticiario Arqueológico, 2, s.l., pp. 159-164.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 937.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 939.
Para mais informações consultar: González Fernández, 1996b.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 918-919; Fernández Corral, 2005: 10.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996: 941; Fernández Corral, 2005: 10; Orejas e Morillo Cerdán, 2013: 308; García Marcos e Vidal Encinas
completam a informação ao indicar que mesmo num processo de decadência urbana Asturica Augusta ainda atuará como sede episcopal
mantendo funções administrativas e fortes elos com regiões próximas.
Pérez Centeno, 1999: 273.
Essa informação está em Gacía Marcos e Vidal Encinas (1996: 913). No site de dados epigráficos do Clauss/Slaby (http://db.edcs.eu/), são
contabilizados duzentas e seis inscrições com procedência de Astorga.
398
399
400
401
402
403
404
405
406
407
79
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
X Gemina. A grande maioria das epígrafes restantes remetem para os séculos II e III, sendo
408
duas delas escritas em alfabeto grego.
A importância administrativa e económica da cidade pode ser testemunhada pelas
inscrições que registam a presença de cidadãos com cargos importantes, tanto políticos quanto
religiosos, associados à Pronvicia Hispania Citerior Terraconensis. Em relação aos cargos
sacerdotais ligados ao culto imperial, cabe referir duas inscrições, uma das quais, datada do
século II, que menciona um sacerdos de Romae et Augustus.409 Trata-se de C. Iulio Fido, cidadão
romano inscrito na tribo Quirina, natural de Asturica Augusta. A segunda inscrição refere o cargo
de flamen Hispaniae Citerioris de um personagem de nome Memmio, que também exerceu
funções de tribuno da Legio I Italica.410
Outras inscrições dão conta de cargos militares e políticos. Esse é o caso de Pompeio
Faventino, pertencente à tribo Quirina, que foi praefectus cohortis VI asturum, tribunus militum
legioms VI victrix, praefecus equitum alae Sulpiciae civium romanorum e flamen da Provincia
Hispania Citerior Tarraconensis.
411
Também de suma relevância é a inscrição que refere um
procurador Asturiae et Gallaeciae, Dalmatiae et Histriae, entre os anos de 106 e 138,
denominado Truttedius Clemens,412 bem como outras que reportam indivíduos que tinham
cargos administrativos públicos e militares,413 que foram Praeses Provinviae,414 Legati Iuridici,415 e
Procuratores Augusti.
416
Assim, as fontes epigráficas de Astorga assinalam a importância da cidade romana
enquanto capital de convento jurídico, mas também a sua relevância económica no contexto do
NO peninsular devido à sua proximidade relativamente a uma das mais importantes áreas
mineiras da Hispânia romana, com interesse estratégico para Roma, durante os dois primeiros
séculos da nossa era. A elite administrativa ligada à mineração seria a principal usuária das
luxuosas domus que se conhecem na cidade, com base nos dados arqueológicos. Por outro
lado, as elites mais associadas às funções da cidade enquanto capital de convento jurídico em
muito terão contribuído para a monumentalização da cidade, igualmente documentada pelas
fontes arqueológicas.
Citadas em Tranoy (1981: 140); e em González Fernández (1996A: 88).
CIL 2, 5124 (p XLV, 911) = HEp-10, 342.
CIL 2, 2638 (p 911) = ERPLeon 205.
CIL 2, 2637 (p 911) = AE 2011, 511.
CIL 02, 02643 (p 707, 911) = ERPLeon 00203.
CIL 2, 2644 = ERPLeon 99; CIL 02, 2645 = ERPLeon 123.
CIL 2, 2635 = ERPLeon 43.
ILAstorga 21; AE 1923, 102 = ERPLeon 78.
CIL 2, 2642 = ERPLeon 187; AE 1968, 233 = HEp-10, 341; AE 1968, 234 = ERPLeon 36; AE1982, 577 = ERPLeon 39; ERPLeon 81; AE
1968, 232 = ERPLeon 59.
408
409
410
411
412
413
414
415
416
80
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Figura 11 - Malha urbana de Asturica Augusta (Sevillano Fuertes, 2005: 57).
1 – Foro; 2 – Galeria abobadada; 3 – Termas Mayores; 4 – Termas Menores; 5 – Domus de las Columnas
Pintadas; 6 – Domus de las Pinturas Pompeyanas; 7 – Domus del Gran Peristilo; 8 – Domus del Pavimento de
Opus Signinum; 9 – Domus de Mosaico del Oso y los Pájaros; 10 – Domus de la Muralla; 11 – Domus de los
Denarios; 12-13 – Outras Domus; 14-15 – Possíveis habitações domésticas; 16-20 – Edifícios artesanais; 21-29 –
Outros edifícios; 30 – Edifícios administrativos; 31 – Possível edifício religioso
1.3 Lucus Augusti
Lucus Augusti, atual Lugo, foi fundada por Augusto, uma vez terminadas as guerras
cantábricas, tal como as outras capitais conventuais do NO peninsular, no contexto da
reorganização administrativa da Hispânia. No entanto, diferentemente de Bracara Augusta,
Lucus Augusti terá surgido a partir de um acampamento militar, para assentar as legiões dos
417
lugares tenentes Caio Anistio (o velho) e Firmio.418 Conforme Orósio, o acampamento de Anistio
tinha por objetivo estratégico e militar controlar o mar e o interior, reduzindo os focos de
resistência das populações.419
A fundação da cidade é explicada de dois modos distintos, tendo por base os estudos
onomásticos e os dados arqueológicos e epigráficos. Tendo por referência a onomástica,
entende-se que a nomenclatura da cidade indica uma raiz céltica, que estaria associada a uma
possível comunidade pré-romana420 contendo a toponímia Lucus, palavra procedente da raiz Luc,
Conforme Colmenero (1998: 29), a hipótese da fundação da cidade ter por base um acampamento foi defendida por outros investigares, como
A. Schulten e García-Bellido. Os estudos realizados assinalam uma estruturação quadrangular formada por algumas ruas centrais da cidade
moderna.
Rodríguez Colmenero, 1998: 26.
Orósio, Historias, 6, 21.
Arias Vilas, 1972: 14.
417
418
419
420
81
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Llug ou Lug, identificadas como as divindades Apolo e Mercúrico. A outra interpretação apoia421
se nos resultados dos estudos arqueológicos que se desenvolveram desde os anos 80 do século
passado, bem como nas fontes epigráficas disponíveis. Em particular, cabe salientar os
primeiros, que demonstram a inexistência de qualquer ocupação pré-romana. Por outro lado,
graças às intervenções arqueológicas realizadas na Rua dos Clérigos e na Rua do Miño foram
encontrados alguns silhares graníticos, com a marca L.VI,422 entendidos como sendo da Legio VI
Victrix de León. Também na parte norte da cidade foram descobertos vestígios do que parece
423
ser o acampamento de um destacamento militar (uexillatio), cuja função teria sido a de construir
as infraestruturas base da nova cidade.424 Por outro lado, a concentração de moedas de caetra,
descobertas nas escavações,425 datadas de 24 e 23 a.C., espaço de tempo que coincide com o
fim das guerras cantábricas,426 pode ser considerada um argumento em favor da origem militar
da cidade.427
Assim, é possível admitir que a inscrição dedicada por Paulo Fábio Máximo a Augusto,428
datada dos anos 3 e 2 a.C., manifeste uma intervenção militar sob a diligência do imperador,
muito embora ela possa estar associada ao início do processo de urbanização da cidade, pois
coincide com a chegada do legado Paulo Fabio Máximo.429
O presumível acampamento teria 500 x 240 metros, compondo um retângulo limitado
pela Rua Nueva, a oeste, as ruas de San Marcos e Reina, a leste, a muralha, a norte e a Praça
España, a sul.430 O acampamento situava-se numa área com excelente localização geoestratégica
para o controle das terras galaicas setentrionais, numa zona próxima ao rio Minho.431 Neste
contexto, a fundação de Lucus terá tido por objetivo dotar a metade setentrional da Callaecia de
um centro urbano que garantisse a administração do território e a integração das suas
populações nos hábitos de vida romanos. Neste sentido, Lucus foi dotada de instituições
Arias Vilas, 1972: 13-14; González Fernández, 2005: 24; esta toponímia também é encontrada em outras partes da Europa, como o exemplo
de Lugdunum, na Gália.
HEp 7, 1997, 396.
Rodríguez Colmenero, 1998: 30; Suárez Piñeiro, 2006-2008: 312; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 14-15. Para aprofundar esta
temática ver García Marcos (2004: 167-198).
Conforme Costa García (2009: 218) sobre a presença da cohors I celtiberorum e suas evidências arqueológicas em solo hispânico: ‘[...] dando
por seguras únicamente las marcas de la base hispana y teniendo en cuenta que sus estructuras constructivas atestiguan una presencia intensa
y constante en el lugar, su dislocamiento sólo podría realizarse mediante uexillationes [...]’.
Rodríguez Colmenero, 1998: 30; González Fernández, 2005: 24; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 15.
Alonso Troncoso, 1996: 55.
Para Rodríguez Colmenero (1998: 31), partindo do pressuposto da toponímia de Lucus Augusti, existe a possibilidade de anteriormente, no
local de instalação do acampamento militar, ter existido um estabelecimento religioso.
CIL II 2581 (p 907) = IRLu 19; AE 1993, 1030 = HEp 8, 1998, 335.
Rodríguez Colmenero, 1998: 32; González Fernández, 2005: 25; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 15.
Arias Vilas, 1972: 14-15.
Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 14.
421
422
423
424
425
426
427
428
429
430
431
82
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
próprias outorgadas mediante uma carta fundacional,432 facto que propiciou a transformação
paulatina do estatuto jurídico dos seus habitantes. Neste arranjo a nova cidade seria um núcleo
urbano com cidadãos inscritos na tribo Galeria,433 possuindo um território envolvente não muito
extenso, que integrava a área anteriormente ocupada pelos Copori.434
Sabemos que Lucus Augusti foi uma importante cidade do NO peninsular que desde o
início foi dotada de funções administrativas, jurídicas e religiosas bem definidas, características
das capitais conventuais.435 Além de ter sido capital do conventus Lucensis436, como relata Plinio,
as recentes investigações indicam que poderá ter sido designada, em meados do século III,
como capital da Província Hispania Superior Callaecia,437 capitalidade que seria justificável pela
sua importância como centro administrativo e económico.
Pese embora a sua relevância política e a sua origem augustana, a arqueologia
documenta que a cidade só terá alcançado o seu apogeu entre finais do século I e meados do II,
graças a um ambicioso programa de monumentalização que se reforçará com o advento da
dinastia Flávia e prosseguiu certamente na Antonina. 438 O facto da cidade se ter tornado uma
espécie de tabularium, com uma possível função vinculada ao procurator Asturiae et Callaeciae,
contribuiu bastante para o desenvolvimento urbanístico da cidade.439 Para além deste facto, como
a exemplo de outras cidades da Hispânia, é possível que Lucus Augusti tenha conhecido uma
importante atividade evergética, resultante das doações provenientes dos seus cidadãos mais
ilustres relacionados com cargos públicos significativos. Contudo, o acervo epigráfico de Lucus
Augusti, que na sua maioria comporta inscrições votivas e sepulcrais, somente nos legou uma
inscrição que nos pode orientar sobre o possível desenvolvimento da cidade, pois menciona um
princeps Copororum, membro da elite indígena local.
440
Apesar da grande quantidade de escavações realizadas na área urbana de Lugo sabe-se
ainda pouco sobre a planimetria de Lucus Augusti, designadamente quanto à estrutura dos
quarteirões e organização dos eixos viários, facto que resulta de um reduzido investimento
No caso empregado em Lucus Augusti a lex não estaria sancionada por voto popular, mas por iniciativas de magistrados. Conforme Grimal
(2009: 343), este tipo de lei denominava-se leges datae e resultava na autoridade do magistrado em virtude do seu imperium, ou em virtude de
uma missão particular que lhe fosse conferida.
Tranoy, 1981: 203.
Plinio, Naturalis Historia, IV, 20; Ptolomeu, Geographia, II, 6, 23; Rodríguez Colmenero, 1998: 29, 2011: 61.
Arias Vilas e Villa Valdés, 2003: 278.
Através da documentação textual antiga, nomeadamente Plinio (Naturalis Historia, 3, 28), o conventus Lucensis detinha a autoridade sobre
dezesseis povos e sessenta e seis mil homens livres.
Rodríguez Colmenero, 2011: 60.
Andreu Pintado, 2004: 64-65; González Fernández, 2005: 27; Suárez Piñeiro, 2006-2008: 312-313.
Andreu Pintado, 2004: 64-65.
CIL II 2585 (p 907) = AE 1946, 122.
432
433
434
435
436
437
438
439
440
83
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
realizado no estudo dos dados arqueológicos resultantes das escavações de salvamento que têm
sido realizadas nos últimos 30 anos.
Os estudos sobre Lucus Augusti iniciaram-se a partir de 1972 com a publicação da
primeira monografia sobre as muralhas de Lugo, escrita por Felipe Arias Vilas. Posteriormente,
os resultados das investigações sobre a cidade romana foram publicados, em 1976, no Colóquio
Internacional sobre o Bimilenário de Lugo e, em 1977, no XV Congresso Nacional de
Arqueoloxía.441 Apesar de uma continuada produção académica até finais da década de 80, os
conhecimentos sobre a malha urbana de Lucus Augusti continuaram inexplorados e os estudos
concentraram-se unicamente em temáticas relativas à muralha, à epigrafia, aos mosaicos ou às
esculturas.442 Só após as escavações da Praça do Ferrol e da Praça de Santo Domingo 443 se
começa a fazer sentir um maior interesse pelo traçado urbano da cidade
Tendo por base seu reduzido corpo epigráfico444 e os dados da arqueologia urbana
posteriores a 1986 foi possível sistematizar alguns dados relativos à malha urbana da cidade.
Esta distribuía-se em quadrículas que seguiam os eixos principais, oriundos da parte mais alta
da cidade, onde estaria localizado o forum, na atual Praça Maior.445 O traçado do cardus
maximus tem o seu percurso ligado à Rua Nova e à Rua Quiroga Ballesteros, com direção N/S,
enquanto que o decumanus maximus seguia o trajeto pela Rua Amanyá desde a Porta Miña,
com direção E/O.446 Os estudos arqueológicos evidenciam que as vias possuíam entre 3 e 7 m
de largura, sendo ladeadas por pórticos em pelo menos um dos seus lados.447
Relativamente às infraestruturas urbanas cabe destacar que a cidade era composta de
uma rede de coletores, com cerca de 1,5 m de altura, que obedecia ao traçado dos eixos viários
principais, tendo sido documentada uma grande cloaca abobadada que atravessava a cidade de
este a oeste.448 Conhece-se igualmente o sistema de abastecimento de água à cidade,
fundamentando-se nos restos de um aqueduto, com cronologia flávia, que transportava a água
proveniente da zona de Castiñeiro, na Piringalla e a conduzia para reservatórios do perímetro
urbano,449 de onde seria posteriormente canalizada sob as ruas da cidade.
Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 16.
Mosaicos encontrados em 1842, na antiga Rua Batitales, hoje Rua Doutor Castro. Atualmente estão em exposição no Museo Arqueológico de
Lugo.
Suárez Piñeiro, 2006-2008: 313; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 17.
Dopico Caínzos, 2013: 84.
Tranoy, 1981: 198.
Suárez Piñeiro, 2006-2008: 313; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 5.
González Fernández, 2005: 25-26; Suárez Piñeiro, 2006-2008: 313. Para González Fernández as larguras das vias variavam entre 4 e 8 m.
Suárez Piñeiro, 2006-2008: 314; Fernández Vega e Iglesias Gil, 2002-2003: 128.
Rodríguez Colmenero, 1998: 37; González Fernández, 2005: 27; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 15; Álvarez Asorey et al., 2003.
441
442
443
444
445
446
447
448
449
84
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
O forum de Lucus Augusti pode ser datado do período de Tibério e nele foram
identificados alguns edifícios públicos como um tabularium,450 uma basílica e uma cúria, templos,
um macellum e algumas tabernae. Todo este complexo possuía uma dimensão de cerca de 1,7
ha, apresentando significativas mudanças estruturais durante o período baixo-imperial.451
Não há evidências arqueológicas relativas aos edifícios de ócio da cidade, apesar da
descoberta de máscaras cerâmicas, encontradas nas escavações, apontarem para a existência
de um teatro. Sabemos, no entanto, que na margem do rio Minho existia um balneário público
com função de banhos minero/medicinais, datado do século I, localizado nas cercanias da ponte
romana que servia de passagem à Via XIX. Para além destas termas públicas cabe referir a
existência de quatro termas privadas,452 com destaque para um edifício termal encontrado entre
as ruas Armanyá, Catedral e Bispo Basulo, com adições construtivas de finais do século III.453
Dentre as construções de cunho privado cabe registar vestígios de várias domus,
conhecidas como insula de Santo Domingo, domus de Dédalo e Pasifae, domus do Mitreo e a
domus do Oceano, as últimas das quais com cronologia alto-imperial, contendo importantes
remodelações do Baixo-Império, o que torna difícil aprofundar os estudos sobre a arquitetura
doméstica durante os séculos I e II.454 No entanto, sabe-se que ambas habitações possuíam um
estilo de casa itálica de atrium e peristilium, com banhos privados,455 sendo ricamente
ornamentadas com belas pinturas e mosaicos, reflexo do florescimento económico da cidade
durante os séculos III e IV.456
As necrópoles que se distribuíam ao longo das vias, que ligavam Lucus a outras cidades,
estão bem testemunhadas, quer pela arqueologia, quer pela epigrafia. 457 Cabe destacar um
conjunto de 40 sepulturas de incineração encontradas nas escavações realizadas na Praza do
Ferrol, que permitiram igualmente identificar sepulturas de inumação.458
Conforme Casal García e Acuña Castroviejo (2011: 15) a cidade contava com um tabularium visto que a presença de personagens como Iulio
Rufino Leontio, cidadão asturicense, está inserido num registo proveniente de Lugo; EE-8-2, 310 = ILAstorga 96.
450
Suárez Piñeiro, 2006-2008: 314.
Migallón Millán e Swedzky Sarudiansky, 2011; González Soutelo, 2010; foi constatado um grande edifício termal nas escavações próximas as
ruínas de Amanyá, Catedral e bispo Basulto (Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 15).
González Fernández, 2005: 27.
González Fernández, 2005; Rodríguez Cao, 2011.
Um exemplo é um compartimento titulado de Mitreo, nome dado devido ao aparecimento de restos estatuários da divindade do mesmo nome
(Rodríguez Cao: 2011; Alvar Ezquerra, 2011).
Um exemplo é o mosaico de batitales encontrado na domus Oceani e conservado no Museo Arqueológico de Lugo (González Fernández, 2005:
30-47).
CIL II 5647 (p 1040) = IRLu 44; IRG II, 29 = Mañanes Pérez, 2000, nº 92; AE 1974, 387 = Rodríguez Colmenero, 1997, nº 312 ; IRLu 33 =
IRG II, 46; IRLu 42 = IRG II, 74 ; IRLu 43 = IRG II, 43; HEp 12, 2002, 342 = Montenegro Rúa, 2010, 145–60; HEp 11, 2001, 309; HEp 15,
2006, 250 = Álvarez Asorey, 2006, p. 243; HEp 11, 2001, 311 ; AE 2001, 1213 = HEp 11, 2001, 320; CIL II 2586 = IRLu 30; CIL II 2591 (p
907) = IRLu 46.
Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 16.
451
452
453
454
455
456
457
458
85
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Localizando-se numa zona estratégica de comunicação com os distintos aglomerados
secundários e próxima de zonas mineiras, Lucus Augusti servia como ponto de passagem de
duas importantes vias do NO peninsular: as vias XIX e XX, que ligavam Bracara Augusta a
Asturica Augusta, devidamente documentadas pelo Itinerário de Antonino. Cabe salientar que era
por Lucus que passavam ramificações destas duas rotas em direção a Iria Flavia (Padrón) e ao
porto de Brigantium (Corunha),459 bem como a outros aglomerados menores.460
A crise política, militar, social e económica, que assolou o território do Império romano,
durante o século III, originando um ambiente de tensões sociais, fez com que a cidade de Lucus
Augusti fosse palco da construção de uma muralha defensiva com datação incerta.
461
As
escavações arqueológicas dos últimos anos revelaram que o recinto inserido dentro da muralha
baixo-imperial deixou de fora uma parte da cidade ocupada no período alto-imperial, situada a
SO, que englobava os atuais bairros Recatelo e Carme, tendo, por sua vez, integrado uma outra
zona periférica, situada a NE. A parte em que a muralha se expande para além do antigo recinto
alto-imperial, mais especificamente na zona da Praza do Ferrol, evidencia restos de construções
de habitações domésticas, sobrepostos a anteriores espaços de necrópoles. Este fenómeno
ocorre de maneira inversa nas áreas onde a muralha corta áreas anteriormente ocupadas.462
Assim, a construção da muralha teve um forte impacto na fisionomia urbana da cidade, que se
adaptou, a partir do Baixo-Império, à nova área intramuros, com cerca de 35 ha.463
Apesar da crise do Império, os séculos III e IV foram marcados por um evidente
florescimento, facto que determinou que Lucus, juntamente com Bracara fossem dois
importantes centros económicos no conjunto da Hispânia romana. 464 No entanto, entre finais do
século IV e inícios do V a cidade foi palco de invasões, tendo sido conquistada, em 411, pelos
Vândalos e em 460 invadida e massacrada pelos exércitos suevos, como nos relata Hidácio de
Chaves.465 Esta nova conjuntura política determinou o declínio da cidade, ao contrário de Bracara,
que conheceu ainda um importante desenvolvimento até ao século VI.
459
460
461
462
463
464
465
Suárez Piñeiro, 2006-2008: 313.
Rodríguez Colmenero, 2010: 60; Casal García e Acuña Castroviejo, 2011: 15.
Arias Vila e Abel Vilela, 1975: 21.
Rodríguez Colmenero, 1998: 32; González Fernández, 2005: 28.
González Fernández, 2005: 28-29.
Rodríguez Colmenero, 2010: 66.
Hidácio, Cronic, 462, 4; González Fernández, 2005: 29.
86
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Figura 12 - Malha urbana de Lucus Augusti (González Fernández, 2005: 26).
1 – Domus Oceani; 2 – Domus de Dédalo e Pasifae; 3 – Insula de Santo Domingo; 4 – Insula das termas públicas;
5 – Edifício religioso; 6 – Domus do Mitreo.
A – Forum; C – Cardo Maximus; D – Decumanus Maximus; N(a) – Necrópoles de incineração; N(b) – Necrópoles
de inumação.
2. A rede de capitais regionais
2.1 Aquae Flaviae
A antiga Aquae Flavie corresponde atualmente à cidade portuguesa de Chaves, situada no
distrito de Vila Real e banhada pelo rio Tâmega. As condições geomorfológicas e hidrogeológicas
da região em que se insere propiciaram o seu desenvolvimento como centro urbano ligado a
banhos minero/medicinais desde o período romano.466
466
Ribeiro, 2010a: 51.
87
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
A fundação da cidade é objeto de ampla discussão, sobretudo relacionada com sua
cronologia e com o objetivo da sua criação. Todavia, cabe referir que Aquae Flaviae teria sido
uma importante sede de civitas,467 integrada no conventus bracaraugustanus, tendo adquirido o
estatuto jurídico de município durante a dinastia Flávia, após a concessão do ius Latii à Hispânia,
com o Imperador Vespasiano, facto que determinou o seu desenvolvimento urbano.468
Não se sabe ao certo a data e as razões da fundação da cidade, mas é lógico admitir
que o local se tivesse desenvolvido como importante epicentro viário, associado à passagem da
via XVII e à exploração das águas minero/medicinais que exsurgem no local,469 cabendo
igualmente destacar a sua proximidade relativamente a importantes áreas mineiras. Todos estes
aspetos terão determinado o seu desenvolvimento como capital regional, intermediária entre
Bracara Augusta e outros aglomerados de menores dimensões e importância.
470
A afirmação
dessa capitalidade parece ter tido o seu momento de apogeu em torno do ano de 104, com a
construção da ponte de pedra sobre o rio Tâmega, durante o governo de Trajano,471 assinalada
no monumento conhecido como Padrão dos Povos472.
É possível que o início do projeto urbano de Aquae Flaviae, anterior à sua promoção
municipal, possa ser cronologicamente inserido no período de Augusto ou de Tibério.473 Contudo,
existem autores que defendem que o núcleo urbano tenha sido projetado ex nihilo, logo após o
fim das guerras cantábricas,474 configurando-se como núcleo integrador da região oriental do
conventus Bracaraugustano. Em contrapartida existem outros autores que defendem que a
475
cidade terá resultado da expansão de uma antiga mansio, adjacente a via XVII, tendo sido
estruturada com traçado ortogonal no momento da sua municipalização durante os Flávios. 476
Desconhece-se qual seria o povo que ocupava a região no momento da integração do
NO peninsular no Império romano, ainda que a documentação literária antiga,477 designadamente
Alarcão, 1993: 209.
Tranoy, 1981: 199-200; Andreu Pintado, 2004: 55; Lemos e Martins, 2010: 90; Ribeiro, 201a0: 36-37; Fonseca Sorribas, 2012: 522-523.
Fonte, 2009.
Fonseca Sorribas, 2012: 524.
CIL II 2478 (p 902, 1040) = RAP 498; a ponte teria sido maior durante o período romano do que a atual devido à expansão urbanística de
Chaves (Ribeiro, 2010a: 37, 66).
Tranoy, 1981; Fonte, 2006.
García Marcos e Vidal Encinas, 1996; Rodríguez Colmenero e Cavadonga Carrenõ, 1999; Morais, 2005; Martins, 2000, 2009a, 2009b;
Ribeiro, 2010a: 36.
Esta afirmação é sustentada pelo registo arqueológico das escavações realizadas a leste da Rua dos Açougues, onde foi encontrado um canto
granítico que marcava a trama urbana no período inicial com datação da época de Augusto (Lemos e Martins, 2010: 90; Fonseca Sorribas,2012:
520, 525).
Amaral, 1993: 118.
Alfenim, 1995; López Quiroga, 2001; Nuñez Hernández, 2007; Fonseca Sorribas, 2012: 520. Estes autores indicam o estabelecimento de
uma mansio anterior à cidade denominada Ad Aquas, que possuía estreitas ligações com o uso dos recursos termais. Esta hipótese credita a
expansão da cidade nos arredores da mansio, carecendo, contudo, de comprovação arqueológica (Ribeiro, 2010a: 38-39).
Tranoy, 1981; Alarcão 1995-1996; Fonte, 2006.
467
468
469
470
471
472
473
474
475
476
477
88
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Ptolomeu,478 refira como entidade étnica desta área os Turodi,479 facto que não é sustentado pela
epigrafia. A exemplo de Bracara Augusta o corpo cívico da cidade terá agregado o território de
diversos populi, como os Turodi, além dos Caladuni, dos Tamacani,480 os Praeni e os Coroci,481
que terão contribuído para a construção da ponte sobre o Tâmega.
A arqueologia, bem como a epigrafia sugerem a importância regional de Aquae Flaviae,
uma cidade que beneficia da proximidade relativamente a solos férteis para a agricultura e a
territórios mettalorum circundantes.482 Neste sentido, a economia da cidade era baseada na
mineração, especificamente na extração de prata,483 ouro e estanho, que compunham os
recursos minerais das regiões envolventes.484 Soma-se à atividade mineira a prática agrícola, com
o cultivo intenso de cereais ao longo da Veiga, zona ocupada por pequenas villae agrícolas e a
criação de gado bovino e ovino, que garantiam a autossuficiência da cidade em produtos
alimentares.485
Os primeiros estudos monográficos sobre as intervenções arqueológicas empreendidas
durante a década de 80 do século passado, iniciam-se com Rodríguez Colmenero e a
colaboração de Firmino Aires, no ano de 1990.486 A tese de mestrado de Pedro Amaral,487
defendida em 1993, bem como os estudos arqueológicos da antiga cidade de Chaves e da sua
envolvência contribuíram decisivamente para compreender a evolução urbana de Aquae Flaviae
e a sua relação com o território.488
Assim, sabemos hoje que a cidade foi projetada com traçado ortogonal,489 ainda que se
desconheçam muitos aspetos da mesma, designadamente relativos aos seus eixos viários e às
características dos quarteirões. Porém foi possível sugerir o traçado dos eixos principais, 490 sendo
possível que o cardus maximus corresponda à Rua da Trindade e o decumanus maximus à Rua
Direita, ou à Rua do Bispo Idácio, prolongando-se até à ponte de Trajano, que também fazia
Ptolomeu, Geographia, II, 6, 39.
Entre as teorias fundacionais de Aquae Flaviae podemos apontar a sua criação pré-romana defendida por Alain Tranoy e aceite, num primeiro
momento, por Rodríguez Colmenero e Armando Coelho, tendo por base o testemunho de Ptolomeu. Num estudo aprofundado de onomástica, A.
Guerra (2005) acredita que Ptolomeu se tenha equivocado e que a nomenclatura correta do aglomerado seria Turolobriga, ou alguma variante
semelhante.
Lemos e Martins, 2010: 90.
CIL II 2489 = RODRÍGUEZ COLMENERO, 1997, nº 614; Fonseca Sorribas (2010: 521) considera que estes dois últimos populi estariam
subordinados aos Turodi.
Lemos e Martins, 2010: 90.
Fonseca Sorribas, 2012: 525.
Em Bobadela, Poço das Freitas Águas Fria, Outeiro Seco e em Vila Pouca de Aguiar (Lemos e Martins, 2008, 2010; Fonseca Sorribas, 2012:
524).
Lemos e Martins, 2010: 98-100; Fonseca Sorribas, 2012: 524.
Ribeiro, 2010a: 19.
Intitulada O Povoamento Romano no Vale Superior do Tâmega – Permanência e mutações na Humanização de uma Paisagem.
Ribeiro, 2010a: 20.
Lemos e Martins, 2010: 90; Martins; 2000, 2009a.
Lemos e Martins, 2010, 100.
478
479
480
481
482
483
484
485
486
487
488
489
490
89
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
parte do percurso da via XVII em direção a Asturica Augusta.491 Os dados arqueológicos sugerem
a existência de cloacas e canalizações de drenagem, bem como de pórticos, o que induz a
admitirmos que havia ruas com passeios cobertos.492
Tal como aconteceu com outras cidades romanas da Hispânia, Aquae Flaviae teria
vivenciado uma intensa atividade construtiva, durante os séculos I e II, sobretudo posteriormente
à sua promoção municipal sofrendo, ao longo dos séculos III e IV, uma crescente retração.493
Tendo por base o registo epigráfico de carácter público,494 a topografia da cidade495 e os
vestígios arqueológicos conhecidos, designadamente restos de colunatas,496 encontradas na
esquina da Rua Direita com o Largo do Anjo, próximo a Igreja de Santa Maria, foi possível propor
a existência de um espaço público no local mais alto do perímetro urbano, que foi interpretado
como um forum.497 A área seria delimitada a oeste pela Rua da Tulha, a leste pela Rua da
Trindade, a norte pela Rua do Bispo Idácio, estando limitada a sul pela muralha medieval
parcialmente conservada.498
Os investigadores especulam sobre a possível existência de um teatro entre a Rua dos
Açougues e a Rua Verde, ao mesmo tempo que a epigrafia sugere a existência de um
anfiteatro,499 devido a uma inscrição encontrada em Outero Seco, que alude a possíveis
espetáculos com jogos de gladiadores.500
Nas escavações do Largo do Arrebalde foram detetados, a 6 metros de profundidade,
vestígios de umas termas romanas do tipo minero/medicinal, com muitas semelhanças ao
edifício de banhos encontrado em Lucus Augusti.501 Não se sabe a cronologia do edifício no
momento de sua construção, porém os dados arqueológicos clarificam o seu período de
abandono em finais do século IV.502
Além do edifício termal foi ainda detetada uma epígrafe, mais especificamente uma ara,
que sugere a possível existência de um Nimpheum.503 Pese embora a riqueza das suas fontes
aquíferas, que exsurgem a elevadas temperaturas, a cidade tinha que ser abastecida de água
Ribeiro, 2010a: 61, 66-67; Fonseca Sorribas,2012: 519.
Os estudos até agora empreendidos em Aquae Flaviae servem somente para apresentar um esboço do que seria o traçado das vias da cidade.
As recentes descobertas são confrontadas com os relatos de Tomé de Távora e Abreu do século XVIII. (Ribeiro, 2010a: 60).
Ribeiro, 2010a: 37.
Respetivamente duas epígrafes votivas dedicadas a Iupiter Optimus Maximus (Amaral 1993: 11, nº 7 = Colmenero 1997a:50, nº4; CIL II 5615
= Rodríguez Colmenero, 1997, nº 29; RAP 353), uma dedicada pelo município à Concórdia municipal (AE 1973, 304 = Rodríguez Colmenero,
1997) e uma última dedicada ao imperador Antonino Pio (Amaral, 1993: 16, nº29 = Colmenero 1997a: nº 590).
Amaral, 1993: 124.
Ribeiro, 2010a: 47.
Rodríguez Colmenero, 1997: 69; Lemos e Martins, 2010: 100; Fonseca Sorribas, 2012: 520.
Ribeiro, 2010a: 46.
CIL II 2473 (p 902) = AE 1959, 84.
Martins, 2009a: 242; Ribeiro, 2010a: 49; Fonseca Sorribas, 2012: 520.
Silva et al., 2006-2007: 556.
Ribeiro, 2010a: 53.
Ribeiro, 2010a: 54.
491
492
493
494
495
496
497
498
499
500
501
502
503
90
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
corrente, sendo conhecido um aqueduto que conduzia a água proveniente do campo do
Tabolado, junto ao Forte de São Francisco504. Este aqueduto estava relacionado a um reservatório
de água numa barragem descoberta nas escavações de Abobeleira (Valdanta, Chaves), durante
a década de 80 do século passado.505
Sobre os edifícios privados pouco se sabe, faltando evidências arqueológicas que
possam ser relacionadas com domus, para além dos vestígios que foram encontrados nas
escavações realizadas na Cadeia Velha de Chaves, na esquina da Rua Bispo Idácio e da Rua da
Trindade.506
Aquae Flaviae foi ponto de paragem obrigatório no trajeto da Via XVII, entre Bracara e
Asturica,
507
facto que muito contribuiu para o desenvolvimento da cidade.508 Outras quatro
ramificações da via XVII iniciavam-se nas suas portas de entrada, seguindo caminhos
secundários509, que cruzavam os territórios mettalorum de Tresminas e Jales, em Vila Pouca de
Aguiar.510
Ao longo dos caminhos que saíam do recinto urbano foram localizadas sete zonas de
necrópole, ainda que apenas duas estejam confirmadas como sendo romanas, contendo
sepulturas de incineração e inumação de cronologia baixo-imperial. Referimo-nos às necrópoles
do Largo das Freiras e da Pensão Jaime.511
A cidade foi fortificada com uma muralha baixo imperial, datada da segunda metade do
século III, cujos vestígios foram encontrados na base da muralha medieval localizada na Rua do
Postigo das Manas.512
A importância adquirida pela cidade ao longo dos séculos está bem documentada pelo
facto de ter sido sede de bispado no século V.513
De acordo com Ribeiro (2010a: 51, 69), e tendo como referência os estudos de Rodríguez Colmenero, existem duas hipóteses para o traçado
do aqueduto que abastecia a antiga Aquae Flaviae. A primeira seria um traçado retilíneo, num prolongamento que ligava Sanjure à cidade,
encerrando-se no Largo do Anjo. A segunda seria um traçado em direção norte, próximo ao Regimento de Infantaria e à Avenida dos Aliados, por
entre o Terreiro da Cavalaria até ao Largo do Anjo.
Lemos e Martins, 2010: 100; Ribeiro, 2010a: 67-68; Fonseca Sorribas,2012: 520.
Carneiro, 2002.
Ribeiro, 2010a: 70.
Fonte, 2006.
Os caminhos secundários de Aquae Flaviae estão testemunhados por miliários encontrados no seu território: CIL II 4782 (p 1045) = Rodríguez
Colmenero, 1997, nº 400 ; CIL II 4783 = Rodríguez Colmenero, 1997, nº 402; CIL II 4779 (p 994) = Rodríguez Colmenero, 1997, nº 404; CIL II
4780 = Rodríguez Colmenero, 1997, nº 405.
Ribeiro, 2010a: 71; Fonseca Sorribas, 2012: 524-525.
Ribeiro, 2010a: 72-74.
Apesar desta referência não é possível precisar o traçado da muralha romana (Ribeiro, 2010a: 63).
Ribeiro, 2010a: 37; Fonseca Sorribas, 2012: 525.
504
505
506
507
508
509
510
511
512
513
91
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Figura 13 - Malha urbana de Aquae Flaviae (Ribeiro, 2010a).
1 – Possível localização do teatro romano; 2 – Possível localização do foro 3 – Ponte de pedra de Trajano; 4 –
Insulae fossilizada; N – Necrópole romana registrada.
2.2 Tongobriga
Diferentemente dos exemplos já abordados, Tongobriga corresponde a um aglomerado
urbano que foi abandonado, posteriormente ao século VII e parcialmente reocupado na Idade
Média, constituindo hoje um sítio arqueológico parcialmente ocupado pela pequena aldeia do
Freixo, na freguesia do Marco, próximo ao rio Tâmega. Durante o período romano Tongobriga foi
capital de civitas,514 tendo alcançado, pela sua importância, o estatuto de capital regional,
situando-se numa região demarcada por colinas e serras, onde a prática agrícola era bastante
intensa, sobretudo na parte norte do seu território de influência.515
Alarcão, 1993: 209, 1995-1996; Dias, 1999, 2013, 2014, 2015.
Utilizaremos a delimitação geográfica de Lino Tavares Dias (2013: 114) para apontar a área de influência jurídica de Tongobriga como sendo
‘[...] um espaço geomorfogicalmente limitado e muito marcado a nascente pela serra do Marão com os cerca de 1.400 metros de altitude e a sul
pela serra do Montemuro com cerca de 1.380 metros de altitude. Em contrapartida, a poente e a norte o espaço alonga-se por terrenos agrícolas
à altitude média de 150 ou 200 metros, já na margem direita do rio Tâmega. Neste espaço evidenciam-se, como marcas naturais determinantes,
os rios Douro e Tâmega, assim como o Ovil, o Teixeira, o Bestança, o Paiva e o Cabrum’. Ainda conforme o mesmo autor foi detectado no seu
território algumas villae e fundi, designadamente em Vilarinho e em Urró, na margem direita do Tâmega, no Outeiro (Tuías), na margem
esquerda, como também sobre o Rio Ovil, em Esmoriz (Ancede).
514
515
92
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Tongobriga terá tido origem num povoado indígena, construído no final do século I a.C, o
qual poderá ter resultado da deslocação de populações de outros castros, circunscrito por uma
muralha de 1,7 m de espessura, que englobava aproximadamente 13 ha de zona habitacional,
onde foram encontradas várias casas de planta circular. Datará da mesma época, muito
provavelmente do período de Augusto a construção de um balneário indígena, situado a sul do
povoado e no exterior do recinto fortificado.516 A partir da dinastia Flávia, desenvolvem-se
expressões arquitetónicas romanas,517 quer no interior do recinto fortificado, quer na zona sul,
onde são construídas umas termas, anexas ao balneário e um forum. Estes espaços e edifícios
públicos virão a ser cercados por novos troços de muralha, tendo a cidade passado a dispor de
uma área cercada com cerca de 21 ha.
De certo modo, podemos considerar que o surgimento de Tongobriga documenta o
processo de migração relatado por Estrabão,518 que assinala a transposição das populações
castrejas para zonas mais próximas das planícies.519 De facto, o sítio onde se desenvolveu a
cidade possui cerca de 300 m de altitude, estando envolvido por castros em posições mais
destacadas, que rondam os 400 m de altura.520
Os estudos arqueológicos realizados desde os anos 80 do século passado documentam
que Tongobriga521 terá sido fundada ex nihilo, tendo adquirido o estatuto de capital de civitas,
desempenhando, por isso, funções de centro administrativo e económico, que adquirem
expressão urbanística e arquitetónica, particularmente visíveis no seu forum, construído entre
finais do século I e inícios do II.522 Tal como Aquae Flaviae, a cidade exerceria um importante
papel jurídico-administrativo sobre os vici e os opidda
523
da região, integrada no convento
bracaraugustano, o qual terá contribuído para a difusão dos usos e práticas romanas,
fomentando a interação social e o intercâmbio comercial, facilitados pela rede viária e pela
matriz agrícola do seu território.524
Dias, 2013: 117, 2015: 70.
Conforme Dias (2013: 117-118) estas casas poderiam ser do tipo sequencial, corredor, de pátio com impluvium central e cobertas por telhas
feitas de cerâmica.
Estrabão, Geographia, III, 3, 8.
Dias, 2015a: 70, 2015b.
Dias, 2013: 115, 2015: 67-68, 70.
A toponímia do nome da cidade possivelmente tem sua origem nalgum populi pré-romano cerca ao recinto da urbe. Esta informação é
bastante sustentada por um achado de 1882, identificado enquanto uma ara votiva consagrada ao genius tongobriensium (CIL II 5564 = HEp 11,
2001, 700), divindade protetora da cidade (Dias, 2013: 119). Também podemos fazer referência a documentação literária antiga,
nomeadamente Ptolomeu, onde existem autores (Alarcão, 1995-1996; Rodríguez Colmenero, 1996) que consideram o populi dos Tuntobriga
(Ptolomeu, Geographia, II, 6, 38) correspondente ao povo pré-romano de Tongobriga.
Dias, 1996: 32, 48, 2013: 118, 2014: 172-173, 2015: 67.
Le Roux e Tranoy, 1984: 206-207.
Dias, 1996: 32, 45, 2015: 69.
516
517
518
519
520
521
522
523
524
93
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
As intervenções arqueológicas no local iniciaram-se em 1979, tendo justificado um longo
projeto de investigação, iniciado em 1980 e concluído em 2013, que viria a revelar a existência
deste importante aglomerado e legitimar a sua classificação enquanto monumento nacional,
envolvendo uma área de cerca de 50 ha.525
As descobertas dos últimos 37 anos de trabalhos arqueológicos traduziram-se em
inúmeras evidências que testemunham o desenvolvimento urbano da cidade, que perdurou até
ao século VII. No entanto, a maioria das intervenções urbanísticas e arquitetónicas,
principalmente ao nível dos espaços públicos, foi empreendida entre o governo dos imperadores
Flávios e os inícios do século II, essencialmente nos governos de Trajano e Adriano, momento
que assinala o apogeu da urbe e a sua consolidação enquanto capital regional.526 Datará desse
período a construção de um complexo monumental de edifícios públicos com traçado ortogonal,
que se adapta às condições morfológicas e geológicas do terreno, tendo permanecido em uso
até finais do Império romano527.
Construído a sul da área habitacional, o complexo do forum, a julgar pelas observações
estratigráficas, terá sido construído em época de Adriano, sofrendo no século IV uma
remodelação nos pavimentos.528 Estamos perante o centro económico, político e religioso de
Tongobriga, que embora constituindo o espaço mais representativo da cidade não ocupava o seu
centro, mas sim uma zona periférica da mesma.529
Trata-se de um forum com invulgares dimensões, com cerca de 10.000 m² de área
(149 m de comprimento, por 68,5 m de largura), projetado de maneira a ser atravessado pelo
cardus maximus, o que sugere ter sido ponto de passagem obrigatório para quem ingressasse
na cidade. Por essa razão a sua entrada fazia-se pelo lado norte, perpendicularmente ao seu eixo
maior, não existindo indícios do posicionamento do decumanus maximus.530 Seguindo o sentido
da entrada do forum, a oeste encontrava-se um espaço religioso onde estava posicionado um
podium e o templo.
531
No centro estava localizada uma praça de 90 m de comprimento e 60 m
de largura, enquanto que a leste, no lado de menores dimensões da praça, se situava uma
Dias, 2014: 172.
Dias, 1999: 279, 2014: 172.
Dias, 1999: 280.
Dias, 1999: 283.
Dias, 1999: 283, 2013: 120, 2015: 72.
Dias, 1999: 280, 2013: 119, 2015: 72.
Com relação ao aspeto religioso foram encontradas inscrições votivas dedicadas a Júpiter Óptimo Máximo (CIL II 2385 = CIL II 5557; HEp 10,
2000, 739 ) e outra a Fortuna (AE 1997, 854 = HEp 7, 1997, 1194), entre outras sem certeza quanto a natureza da dedicatória (HEp 10,
2000, 740; HEp 10, 2000, 741).
525
526
527
528
529
530
531
94
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
basílica, ou um espaço de natureza comercial. Na parte norte, junto a uma parede de
delimitação do forum, identificaram-se duas absides.532
A análise da fotografia aérea permitiu reconhecer a possível existência de um teatro e de
um anfiteatro, identificados a partir de uma rua diagonal, que talvez tenha sido um eixo que
cruzava transversalmente o setor ocidental da cidade.533 Esta rua, correspondente ao cardus
maximus, que constituía a espinha dorsal da cidade, estruturadora da urbanização, segue uma
matriz ortogonal na parte poente da cidade. Ainda tendo por base a interpretação da fotografia
aérea julga-se que Tongobriga terá tido um circo, que se situaria numa zona extramuros, situado
a noroeste.534
Os espaços habitacionais do povoado correspondem a cerca de 10 ha, contemplando
habitações de planta itálica, com cronologias desde o século II, com várias plantas, estando
documentada a casa de atrium com impluvium. A cronologia avançada das habitações de
tipologia romana sugere, entretanto, que os habitantes do sítio,535 maioritariamente oriundos dos
castros da região, terão usado as suas habitações tradicionais durante o século I. A arqueologia
documenta que as habitações castrejas foram desmontadas para ser construídas várias domus
com impluvium.536
Através da análise dos miliários encontrados na região foi possível estabelecer uma
relação do eixo de acesso à cidade com uma via que, apesar de não estar mencionada no
Itinerário de Antonino, ligava Bracara Augusta a Emerita Augusta, tendo Tongobriga como ponto
de passagem e certamente de paragem obrigatória.537 Esta via estabelecia a ligação entre Oculis
(Caldas de Vizela)/Tongobriga (Freixo), atravessando o territorium da civitas numa extensão de
40 km.538 Na saída sul da cidade, ao longo do percurso da via foram identificadas duas zonas de
necrópole de cremação, mantidas após a remodelação do complexo do forum, além de várias
outras sepulturas espalhadas ao longo do eixo viário539.
Por fim, a zona urbana da cidade permaneceu praticamente inalterada até finais do
século IV.540 Entretanto, a partir do século VI, a arqueologia aponta uma mudança do espaço
central da cidade, agora não mais na região sul, mas ao centro da atual zona habitacional, onde
Dias, 1999: 281-283, 2013: 119, 2015: 72.
Alarcão, 1995-1996: 26; Martins, 2009a: 242; Dias, 2015: 73, 2015b.
Dias, 1997: 32.
Dias, 2015a: 10, 2015b
Dias, 2011.
De acordo com Sousa (2012: 2) foi possível registrar o percurso através de dois miliários encontrados em Marco de Cavaneses,
especificamente em Tuías, datados do período dos imperadores Valentiniano e Valente (362-375), e outro em Freixo, datado entre os séculos III e
IV (Tranoy, 1981: 394).
Sousa, 2012: 1-2.
Dias, 2013: 118, 2014: 172, 2015: 70.
Dias, 2014: 173.
532
533
534
535
536
537
538
539
540
95
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
foi construída uma basílica paleocristã, entre os séculos V/VI, que certifica que Tongobriga terá
sido sede de uma paróquia sueva e que está na origem da atual Igreja Paroquial de Santa Maria
do Freixo. Os efeitos da queda do Império romano e a predominância do Cristianismo como
religião oficial fez com que a cidade romana fosse deixada em ruínas, tendo-se resgistado a
transposição de materiais para outras construções, podendo ser referido, como exemplo, o uso
das pedras do forum na edificação dos conventos de Alpendurada e Tuías.541
Os trabalhos arqueológicos realizados nas áreas públicas de Tongobriga permitiram
identificar duas inscrições votivas. Uma delas procede de uma das absides laterais do forum e
está dedicada às Matronae ou Matres. Trata-se de uma consagração oficial visando-se a proteção
da entidade política e administrativa de que o forum é o fulcro, pelo que a consagração àquelas
divindades pode ter uma dimensão política, ligada à civitas, sendo datada, por A. Redentor, entre
101 e 150.542 A outra inscrição foi encontrada reutilizada nas termas anexas ao forum, sendo
dedicada a Fortuna, com os epítetos de dea sancta, por Valerius Paternus, podendo datar de
meados do século II.543
O corpus epigráfico de Tongobriga integra ainda três inscrições dedicadas a Júpiter
Optimo Maximo, constituindo duas prováveis iniciativas de notáveis locais544 e uma outra
dedicada por alguém do meio servil.545
O conjunto de inscrições conhecidas permitem considerar que o corpo cívico da cidade
incluía cidadãos romanos546 e indígenas, que podem ter sido promovidos pelo desempenho de
cargos. Esse poderá ser o caso de Anicius [Anc]eiti f. […]Rufus, cujo epitáfio, datado do século II,
testemunha a filiação por meio do patronímico indígena,547 ou de Cat(ius) Celer, que dedicou
uma inscrição a Júpiter.548
541
542
543
544
545
546
547
548
Dias, 2013: 120.
Redentor, 2011, II, nº 101.
Redentor, 2011, II, nº 46.
Redentor, 2011, II, nºs 69 e 91.
Redentor, 2011, II, nº 65.
Caso de Valerius Paternus (Redentor, 2011, II, nº 46).
Redentor, 2011, I: 107.
Redentor, 2011, II, nº 69.
96
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
Figura 14 - Malha urbana de Tongobriga (Dias, 2013).
1 – Recinto intramuros habitacional; 2 – Muralha com dimensões
de 13 ha; 3 – Muralha com dimensões de 21; 4 – ha Complexo
do forum; 5 – Edifício termal; 6 - Teatro/Anfiteatro; N –
Necrópole; s – Sepulturas.
3. Os aglomerados secundários
Parece indiscutível considerar que o processo de romanização no NO da Hispânia está
diretamente associado com o seu complexo e singular processo de urbanização. Sendo assim,
percebemos, ao longo dos capítulos anteriores, o esforço de Roma em promover um programa
que integrasse as regiões mais afastadas do Império, no momento da reorganização
administrativa, operada por Augusto, o qual foi reforçado com as iniciativas dos imperadores
Flávios, designadamente associadas à concessão do ius Latii, que consolidou o processo de
urbanização do NO peninsular.
97
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
A criação de novas províncias, bem como com a criação dos conventos jurídicos e das
suas respetivas capitais cidades, empreendidas por Augusto, constituiu a matriz organizacional
que enquadrou o progressivo desenvolvimento de outros centros urbanos, com destaque para as
capitais regionais, como Aquae Flaviae, ou Tongrobriga, a que se somam também as caput
civitates, que se foram urbanizando, em diferentes graus, ao longo dos dois primeiros séculos da
nossa Era. Todos estes aglomerados urbanos serviram como mecanismos eficientes para a
consolidação da urbanização dos novos territórios recém conquistados.
Neste contexto, durante o Alto Império, o NO peninsular passa por um processo de
expansão urbana, para o qual contribuiu o processo de municipalização, que acompanha um
gradativo e evidente abandono de muitos povoados castrejos, cujas populações migrantes
passaram a incorporar os mais variados tipos de aglomerados,549 cabendo destacar a emergência
de núcleos urbanos secundários, conhecidos, por vezes, pelo nome de vici e fora
Este último tipo de aglomerados urbanos teve uma origem orgânica e não planificada,
sendo, na sua grande maioria, de carácter civil e heterogéneos na sua composição populacional.
Com funcionalidades diferenciadas, acabaram por constituir um importante meio de integração
das populações indígenas, disponibilizando alguns dos equipamentos e espaços característicos
das cidades romanas, como era o caso dos espaços comerciais, ou das termas.550
Estes aglomerados são retratados pela historiografia recente enquanto núcleos urbanos
de segundo e terceiro nível hierárquico,551 funcionando alguns como capitais de civitates e até
mesmo capitais regionais, assumindo deste modo, funções de autoridade sobre civitates
menores552. Estes núcleos de carácter semiurbano foram bastante comuns na região do NO
peninsular e são tratados pela documentação literária antiga e epigráfica como vici e fora. As
interpretações relacionadas com a sua natureza, origem e funcionalidade, continuam a ser alvo
de discussão.553
Os vici eram aglomerados abertos,554 sem recinto amuralhado,555 dependendo de uma
cidade,556 apresentando diversas morfologias e equipamentos funcionais diversificados.557 São
Martins et al., 2003: 266; Andreu Pintado, 2004b: 48.
Carlsson-Brandt, 2010: 162.
Durante os séculos III e IV desempenharam um papel importante para o desenvolvimento rural nos períodos de crise do Império romano
(Fernández Ochoa et al., 2014: 112.). No NO, mais especificamente na Galiza, a historiografia constatou grandes quantidades e variedade destes
núcleos, com nomenclaturas variadas, facto este que resulta numa dificuldade de consolidar uma discussão cientifica mais coesa das suas
evidências arqueológicas. Alguns destes aglomerados são conhecidos como vici, casae, tuguriae, conciliabula, canabae, fora, mutatio, mansio,
oppidum, castella, villae, casae, aedificia, pagi, civitas, castrum etc. (Carlsson-Brandt, 2010: 162-163; Fernández Ochoa et al., 2014:112, 117).
Martins et al., 2003: 266.
Pérez Losada, 2002.
Festos, de verborum significatu, 70.
Isidoro, etimologia, 15, 2, 5, 7.
Iglesias Gil, 1998: 153; conforme Santo Isidoro de Sevilha (etimologia, 15, 2, 11) sua população estava inscrita em cidades maiores.
549
550
551
552
553
554
555
556
98
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
considerados núcleos de formação espontânea,558 com desenvolvimento orgânico progressivo,559
emergindo em zonas menos romanizadas, sem necessariamente implicarem rituais de
fundação.560
Tendo por base as fontes arqueológicas e epigráficas podem ser considerados lugares
centrais, reunindo no seu espaço físico templos, termas e, por vezes, outros edifícios lúdicos,
sendo providos de um sistema económico de base agropecuária e de mercados regionais
temporários.561 A arqueologia sugere que alguns vici evoluíram para capitais de civitates,562
assumindo serviços fiscais e administrativos próprios regulados por magistri, praefecti e cargos
municipais.563
Os vici termais e os vici viarii, encontrados ao longo das vias romanas e relacionados
com o comércio e os serviços termais, foram os aglomerados mais frequentes no NO
peninsular.564 Alguns autores destacaram sítios que possivelmente podem ter sido sede de vici
viarii, como é o caso de Iria Flavia (Padrón), Tude (Tuy), vicus Elani (Vigo), Limia (Ponte de
565
Lima), Salacia (Via XVII no Itinerário Antonino) e Salaniana (Via XVIII no Itinerário de Antonino),
além do vicus viário e termal de Auria (Ourense) e um possível vicus viário em Verín.
A localidade de Caldelas, no concelho de Amares, presumivelmente foi sede de um vicus
termal, estando testemunhado pela arqueologia através de vestígios de uma necrópole
encontrada na zona e de duas aras votivas dedicadas às Ninfas. A arqueologia e a epigrafia
permitem ainda identificar vici termais e viários em Caldas de Cavaneses, Santa Marinha do
Zézere, Várzea do Douro, Alvarelhos, Caldas de Taipas e Caldas de Vizela e Meinedo. 566 A
epigrafia testemunha ainda na região oriental do conventus Bracaraaugustanus o provável vicus
Vargonica,567 próximo à aldeia de Fiães e o vicus Labr, situado em Pombal (Vila Real), ambos
568
com dedicatórias a Júpiter.569
Conforme Lemos e Martins (2010: 94), a classificação de um vici é complexa e possuí diferenciadas interpretações. Contudo, é possível
apontar três fatores indissociáveis na sua identificação: o contexto territorial, a área de dispersão dos vestígios arqueológicos e as inscrições
epigráficas de carácter votivo, em especial as aras dedicadas a Júpiter ou a uma divindade indígena tutelar, pois a partir deste tipo de
testemunho é possível identificar o estatuto do aglomerado. Através deste último indicador foi possível identificar o vicus Autacusiensis (CIL II
6287 = RAP 324), na Quinta de Pascoais (Martins et al., 2003: 267).
Montenegro Duque, 1988: 267.
Conforme Tácito (opera minora, 16, 2), na perspetiva arquitetónica possuíam um plano urbanístico coerente, comparável aos bairros urbanos
de uma grande cidade.
Pérez Losada, 2002; Martins et al., 2003: 267. Fernández Ochoa et al., 2014: 118.
Martins, 1992: 403-404; Martins et al., 2003: 267; Carvalho, 2008.
Martins et al., 2003: 267.
Rodríguez Colmenero, 2011: 63; Fernández Ochoa et al., 2014: 114.
Martins et al., 2003: 267; Lemos e Martins, 2010: 85; Fernández Ochoa et al., 2014: 115.
Rodríguez Resino, 2007: 136.
Martins, 1992: 403-404; Martins et al., 2003: 267-268; Martins, 2009a: 128; os vicus de Baños de Bande, Verín e Vigo tornaram-se com o
tempo em capitais de civitates.
AE 1982, 567 = Rodríguez Colmenero, A., Aquae Flaviae: I. Fontes epigráficas da Gallaecia meridional interior, Chaves, 1997, nº 5.
J. Alarcão, Roman Portugal, Warminster 1988, II, 44, nº 2/96 = RAP 340 (HEp 4, 1994, 1016).
Martins et al., 2003: 268; Carvalho, 2008.
557
558
559
560
561
562
563
564
565
566
567
568
569
99
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Um outro tipo peculiar de vicus encontrado no NO da Hispânia, na sua grande maioria
de cronologia Flávia, foram os vici militares. Situavam-se na envolvência dos acampamentos de
legionários ou de auxiliares,570 onde constituíram importantes centros cosmopolitas de
aprovisionamento das tropas.571 Estes aglomerados não dispunham de um estatuto jurídico
próprio, mas dispunham de autonomia em relação à administração militar dos acampamentos
com os quais estavam intimamente relacionados.572 Na região do NO peninsular a arqueologia
regista vici militares em Sobrado dos Montes (Corunha), Aquis Querquennis (Baños de Bande), o
vicus de Herrera de Pisuerga, considerado o mais antigo já estudado, associado à Legio III
Macedonia e um vicus pertencente à Legio VII Gemina (León).
573
Os testemunhos arqueológicos, literários e epigráficos documentam uma menor
representação de fora nas províncias do Império, quando comparado aos vici. Este tipo de
aglomerados secundários teve a sua origem no início do processo de integração das populações
indígenas nos governos de Augusto e Tibério. Deste modo, foram organizados por iniciativa
política do poder romano, com o objetivo de dotar as populações pré-romanas com um centro
cívico, localizando-se em zonas rurais e dispersas do NO,574 onde pudessem ordenar num
mesmo espaço funções administrativas, políticas e comerciais.575 Esta forma de núcleo urbano
coincide com o momento de expansão das vias imperiais,576 que permitiam o controle das
autoridades romanas sobre o território.577
Na região do NO, mais especificamente na parte ocidental do convento bracaraugustano,
foram identificados alguns fora, através da arqueologia, dos registos epigráficos e da
documentação literária antiga. Entre eles cabe destacar o forum Limicorum,578 com cronologia
entre finais do século I e o século V, localizado em Xinzo de Limia, tendo alcançado a categoria
de município e os seus habitantes sido inscritos na tribo Quirina.579 É considerado um
aglomerado semiurbano, possível capital da civitas Limicorum.580 Ainda no mesmo convento, mas
Morillo Cerdán e Salido Rodríguez, 2012: 519. Para Vega Avelaira (1996: 1265, 2007) os núcleos urbanos relacionados com os
acampamentos de auxiliares recebiam a nomenclatura de vici, em contrapartida, kanabae era a nomenclatura utilizada para os que estivessem
na envolvência de acampamentos de legionários.
Morillo Cerdán et al., 2014: 114. Vega Avelaira, 1996: 1268, 2007: 76; Rodríguez Colmenero, 2010: 60; de acordo com Chevalier (1986: 5)
os cargos municipais seriam de aediles, quaestore, curatores, actores e decemlecti.
Vega Avelaira, 1996: 1265, 2007: 75.
Morillo Cerdán e Salido Rodríguez, 2012: 523-524; em Leão foram encontrado dois vicus circundantes ao antigo acampamento militar (Morillo
Cerdán et al., 2014: 125).
Ptolomeu, Geographia, 2, 6.
Pérez Losada, 2002.
Muitos fora possuem a nomenclatura das vias próximas, indicando a sua toponímia a sua origem étnica (Ferández Ochoa et al., 2014: 121).
Dopico Caínzos, 1986: 272; Ferández Ochoa et al., 2014: 121.
Ptolomeu, Geographia, 2, 6,43.
CIL, II, 4215.
Martins et al., 2003: 267.
570
571
572
573
574
575
576
577
578
579
580
100
Parte III – As cidades do NO peninsular à luz das diferentes fontes
sem se saber ao certo a sua localização, podemos mencionar o forum Bibalorum,581 possível
capital da civitas dos Bibali, o forum Iriensis (Iria),582 o forum Gigurrorum (A Proba de
Valdeorras/Orense),583 o forum Narbaserorum (Orense), da civitas dos Narbasi584 e o forum dos
povos Lemavi.585
Por fim, e apesar dos esforços em caracterizar este tipo de aglomerados, importa referir
que não é possível ter uma ideia clara sobre a sua organização, que permita claramente
diferenciá-los de outros estabelecimentos, como é o caso das villae.586 Tendo sido muito
disseminados na região do NO, uma zona periférica e predominantemente rural, com uma
densa população indígena e pouco romanizada, estes aglomerados semiurbanos de segunda
categoria serviram como importantes e eficazes polos de romanização e desenvolvimento das
populações indígenas em áreas distanciadas de outros aglomerados urbanos.
Para Blázquez Martínes (1991: 212), a localização do forum Gigorrorum estaria nas imediações de Orense, na Galiza. Com base na
documentação literária antiga, especificamente Ptolomeu (Geographia, 2,6, 48), o autor aponta como sendo o forum Narbolorum.
CIL II 5629 = HEp 4, 1994, 338.
Ptolomeu, Geographia, 2, 6, 37; CIL II 2610 (p 909) = Rodríguez Colmenero, A., Aquae Flaviae: I. Fontes epigráficas da Gallaecia meridional
interior, Chaves, 1997, 209.
Ptolomeu, Geographia, 2, 6, 48.
A localização é imprecisa, porém a principal fonte que atesta a sua existência é Plinio (Naturalis Historia, 3,28).
Fernández Ochoa et al., 2014: 114.
581
582
583
584
585
586
101
Considerações Finais
_______________________________
Considerações Finais
Tal como foi referido no início do trabalho procurámos estabelecer, ao longo da nossa
investigação, os caminhos que conduziram ao desenvolvimento urbanístico romano do NO da
Hispânia, articulando, enquanto base empírica, as inscrições conhecidas, a documentação literária
antiga, amplamente estudada e organizada nas Fontes Hispaniae Antiquae e os vestígios
arqueológicos, resultantes da investigação realizada nas últimas décadas, divulgados na
bibliografia da especialidade.
Para tanto, com o objetivo de tornar este estudo mais elucidativo, na Parte I do trabalho,
procurámos estabelecer um panorama teórico sobre o surgimento do conceito de romanização,
inicialmente pensado pelos estudiosos do século XIX, tendo em Theodor Mommsen o seu principal
expoente. Vimos que o conceito de romanização desde o século XIX vem sofrendo um processo
de construção teórica, que foi intensificada nos séculos XX e XXI, onde não podemos deixar de
destacar os grandes movimentos socioculturais, políticos e económicos que afetaram a
configuração geopolítica mundial, facto esse que implicou uma revisão do conceito no pensamento
académico, sustentando, ainda hoje, algumas discussões. Neste contexto, percebemos uma
mudança de postura na investigação, correspondente à evolução da matriz do pensamento teórico
europeu, que arrancou de uma leitura explicativa positivista do passado, associando os grandes
impérios coloniais à maneira de pensar o mundo romano. A evolução da compreensão do processo
de romanização e, dentro dele, o do urbanismo romano, nasce do desmantelamento dos
paradigmas oitocentistas, da influência do pensamento étnico-cultural, com base nos estudos das
periferias e do desagregamento de um pensamento eurocentrista, sendo encabeçado por Edward
Said, bem como pelos notáveis avanços do conhecimento facultados pela investigação
arqueológica que conheceu uma grande evolução na Europa do pós-guerra.
Neste sentido, emeriram novas perspetivas de abordagem da História romana, centradas
na valorização das periferias do Império, enfatizando os estudos da matriz das sociedades
provinciais. Portanto, as cidades e os respetivos territórios passaram a ser vistos sob um ângulo
interdisciplinar, que se traduz em abordagens que valorizam, tanto o espaço urbano na sua matriz
física, como as perspetivas sociais, onde os aspetos económicos e religiosos passam a ganhar
sentido, a par dos políticos e administrativos.
Na Parte II deste trabalho procurámos discutir as diferentes formas do urbanismo romano,
levando em consideração a rede hierárquica de cidades que compunham o Império romano. Vimos
que as cidades eram detentoras de estatutos jurídicos específicos, que qualificavam o seu grau de
105
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
importância na escala provincial, regional e local, podendo ser desde meros núcleos semiurbanos
a capitais de províncias e capitais de conventos jurídicos e, em menor escala, capitais regionais e
de civitates, funcionando como mediadoras entre as povoações do interior e as circunscrições
conventuais.
Consoante o grau de importância das cidades destacámos os diferentes níveis de
urbanização que conheceram, sobretudo identificados com base nos edificados de prestígio, que
pressupunham uma elevada manifestação da romanitas por parte das elites indígenas, servindo
como pilares essenciais para a instauração de um ideal romano nos territórios integrados. Logo,
essas elites foram as precursoras da adesão à cidadania romana no seio das populações
indígenas, a qual decorreu mediante o desempenho dos cargos públicos, que permitia ao final do
mandato, serem beneficiadas pela cidadania romana, processo que potencializou a prática do
evergetismo e a monumentalização das cidades.
O processo de integração dos territórios do NO peninsular pouco avançou além das
medidas iniciadas com Augusto. Contudo, percebemos que a universalização do direito latino,
outorgada pelo imperador Vespasiano, desencadeou efeitos muito positivos na promoção jurídica
de algumas cidades, bem como na monumentalização dos núcleos urbanos nas regiões mais
periféricas do Império, como foi o caso do NO hispânico. Por outro lado, emergem novos
aglomerados urbanos secundários e afirmam-se núcleos urbanos que adquirem o papel de capitais
regionais, fomentando a deslocação das populações indígenas dos seus castros para os centros
urbanos.
A partir dos resultados obtidos pela arqueologia, epigrafia e documentação literária antiga
procurámos esboçar as linhas gerais do desenvolvimento urbano das três capitais de conventos
do NO, nomeadamente, Bracara Augusta, Lucus Augusti e Asturica Augusta. Por outro lado,
tentámos compreender como alguns núcleos urbanos foram promovidos, ou beneficiaram das
vantagens concedidas pelo ius Latii. Assim aconteceu no convento Bracaraugustanus, com Aquae
Flaviae e Tongobriga, centros urbanos que tiveram um processo de urbanização singular e que,
apesar de terem sido sujeitos a políticas globais de integração, primeiramente com Augusto e
depois com os imperadores Flávios e Antoninos, revelam objetivos diferenciados nos seus
processos de criação e desenvolvimento, facto que justifica os seus ritmos variados de urbanização
e nos adverte para a complexidade do processo e para a necessidade que aprofundar a
compreensão dos núcleos urbanos secundários.
106
Considerações Finais
Para além das capitais jurídicas e regionais, procurámos equacionar a funcionalidade dos
aglomerados secundários, exemplificados pelos vici e fora, cujos modelos de desenvolvimento
vêm sendo conhecidos a partir da arqueologia e que revelam uma notável densidade no interior
dos conventos jurídicos do NO. Estes aglomerados agregaram um papel de centros urbanos nas
regiões rurais, associando-se, na maior parte dos casos, ao traçado das vias que atravessavam os
territórios e ligavam as capitais dos conventos.
A nossa investigação sobre a urbanização no NO hispânico permitiu-nos perceber que os
resultados das escavações empreendidas nos últimos 40 anos representam um importante
contributo para novos questionamentos relativos ao processo de consolidação das cidades no seio
do Império romano. Quer os dados disponíveis, quer aqueles que possam ser facultados por novos
trabalhos arqueológicos, decorrentes da legislação de proteção do património, quer ainda dos
resultados que possam resultar de uma mais rigorosa avaliação dos vestígios já escavados, mas,
por vezes, deficientemente interpretados, permitem-nos concluir que estamos no meio de um
processo dinâmico de investigação que se irá traduzir numa total renovação do discurso relativo
ao urbanismo romano do NO peninsular. Por isso, é da mais elementar justiça reconhecer que a
arqueologia constitui uma fonte fundamental para a compreensão do processo de urbanização do
mundo antigo, pois é ela que permite restituir o traçado das cidades, a natureza dos equipamentos
que permitiam o seu funcionamento, a variabilidade das soluções construtivas adotadas, os
espaços residenciais e a pujança das elites, as atividades económicas, ou o uso dos espaços
urbanos. Enfim, um enorme manancial de dados que tem indiscutível alcance para reescrever a
História de uma região pouco referida pelos autores antigos.
Em jeito de conclusão, e face aos resultados apresentados, salientamos a importância da
continuidade de novos trabalhos de síntese, que enfatizem o inestimável contributo da arqueologia
e cruzem as fontes arqueológicas com os dados historiográficos e epigráficos de forma a permitir
contrapor os processos de ocupação romana do NO peninsular com os que se conhecem para
outras diferentes províncias da Hispânia.
107
Referências Bibliográficas
_______________________________
Referências Bibliográficas
Alarcão, J. (1995-1996). Las ciudades romanas de Portugal. In M. Bendala (Org), La ciudad
hispanorromana (pp. 160-189). Barcelona: [s.n.].
Alarcão, J. (1995-1996). As civitates do norte de Portugal. Cadernos de arqueologia, 12-13, Braga,
25-35.
Alfenim, R. (1995). A barragem de Aquae Flaviae. Revista Aqvae Flaveae, 13, Chaves, pp. 9-34.
Alföldy, G. (1961). Fasti Hispanienses. Senatorische Reichsbeamte und Offiziere in den spanischen
provinzen des römischen Reiches von Augustus bis Diokletian. Wiesbaden: [s.n.].
Alonso Troncoso, V. (1996). Primeras etapas en la conquista romana de Gallaecia. Militaria, 8,
Madri, pp. 53-66.
Alvar Ezquerra, J. (2011). O mitreo de Lucus Augusti no contexto do mitraísmo hispano. In R. C.
Cao., et al. (Coords), A Domus do Mitreo (pp. 14-19). Santiago de Compostela:
Universidade de Santiago de Compostela.
Álvarez Asorey, R., Carreño Gascón, Mª. C. e González Fernández, E. (2003). Aqva Vrbi. Historia
do abastecemento de auga á cidade de Lugo (época romana – século XX). Lugo:
Ayuntamiento de Lugo.
Álvarez Ordás, J. C. (1996). Contribuición a la trama urbanística de Astorga. Un cruce de Calles
de Obispo Grau vuelta com Obispo Marcelo. In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do
Congreso Internacional: Los Orígenes de la Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 10071018). Lugo: Faculdade de Humanidades.
Amaral, A. P. G. (1993). O povoamento romano no vale superior do Tâmega. Tese de Mestrado,
Universidade do Porto, Porto, Portugal.
Andreu Pintado, J. (2004a). Apuntes sobre la Quirina Tribus y la municipalización flavia de
Hispania. Revista Portuguesa de Arqueologia, vol. 7, nº 1, Lisboa, pp. 343-364.
Andreu Pintado, J. (2004b). Construcción pública y monumentalización en la Provincia Hispania
Citerior: La época Flávia. Iberia, 7, Logroño, pp. 39-75.
Andreu Pintado, J. (2004c). Latinización y Municipalización en el Alto Imperio: Nuevas perspectivas
para el estudio de la Hispania de los Flavios. In F. Beltrán (Coord), Antiqua Iuniora: en
torno al Mediterráneo en la Antigüidad (pp. 173-188). Saragoça: Prensas Universitarias de
Zaragoza.
Andreu Pintado, J. (2006). Munificiencia y promoción política de las élites hispanas em época
Flavia: ideología y procedimientos. In J. F Neila e E. Melchor (Eds) Poder Central y
Autonomía Municipal: La Proyección Pública de las Élites Romanas de Occidentes. (pp.
385-415). Córdoba: Universidade de Córdoba.
111
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Andreu Pintado, J. (2007). En torno al ius Latii flavio en Hispania: a propósito de una nueva
publicación sobre latinidad. Faventia, 29, Barcelona, pp. 37-46.
Arias Vilas, F. (1972). Las murallas romanas de Lugo. Studia Archaelogica, vol. 14, Santiago de
Compostela.
Arias Vilas, F. (2002). Las fases de la cultura Castreña em Galicia; Um debate aberto. In M. A.
Blas Cortina e A. Villa Valdés (Coords) Anais do Coloquios de Arqueología em la Cuenca
del Navia (pp. 127-137). Navia: Ayuntamiento de navia.
Arias Vilas, A. e Abel Vilela, A. (1975). Guia arqueológica romana de Lugo y su Provincia. Lugo:
Editorial la voz de la verdad.
Arias Vilas, F. e Villa Valdés, A. (2003). El poblamiento romano en el territorio de los galaicos
lucences. In C. Fernández Ochoa e P. García Díaz (Eds) Anais do III Coloquio Internacional
de Arqueología en Gijón (pp. 277-287). Gijón: Achaeopress.
Arisóteles (1988). Politica. Madri: Editorial Gredos.
Ascher, F. (2004). Los nuenos princípios del urbanismo. Madri: Alianza Editorial.
Ausonio (1990). Obras. Livro I. Madri: Editorial Gredos.
Balil Illana, A. (1976). Las ideas urbanísticas em época augustea. In F. Burillo Mozota (Ed.) Anais
do Symposion de Ciudades Augusteas (pp. 29-79). Saragoça: Universidad de Zaragoza.
Bancalari Molina, A. (2005). Theodor Mommsen, el mundo romano y sus proyecciones: A
propósito del centenário de su muerte. Atenea, 492, Concepción, pp. 135,146.
Bendala Galán, M. (1998). La paz Augustea y la romanización. In O. Cuevas Fernandez (Org) ,
Hispania Romana: el legado de Roma en el año de Trajano (pp. 127-137). Madri: Ministerio
de educación, cultura y deporte.
Blázquez Cerrato, C. (2006). Circulación monetária en Asturica Augusta. In Mª. P. García-Bellido
(Coord), Los campamentos romanos em Hispania (27 a.C. – 192 d.C.): El abastecimento
de monedas (pp. 118-170). Madri: Anejos de Gladius.
Blázquez Martínez, J. M. (1984). El urbanismo romano entre los Astures. Memorias de Historia
Antigua, vol. 6, Oviedo, pp. 113-136.
Blázquez Martínez, J. M. (1991). Urbanismo y sociedad e Hispania. Madri: Ediciones Istmo.
Bloch, M. (2001). Apologia da História: ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar.
Braga, C. (2010). Rituais funerários em Bracara Augusta: o novo núcleo de necrópole da Via XVII.
Relatório de Mestrado, Universidade do Minho, Braga, Portugal.
112
Referências Bibliográficas
Braga, C. (2013). Os contextos Tardo-antigos do novo núcleo da necrópole da via XVII em Braga.
In G. Branco; L. Rocha; C. Duarte; J. Oliveira e P. B. Ramírez (Eds.) Actas do II Congresso
Internacional Sobre Arqueologia de Transição: O Mundo Funerário (pp. 366-381). Évora:
CHAIA.
Braga, C. e Martins, M. (2016). The funerary topography of the Via XVII Necropolis in Late Antiquity
(Braga). In F. Sabaté e J. Brufal (Dirs.) Arqueologia Medieval: Hàbitas Medievals (vol. VIII)
(pp. 17-33). Lleida: Pagès Editors.
Bondioli, N. P. (2011). Limites da Romanização: Uma Reflexão acerca da Interação Cultural entre
os Mundos Clássico e Celta. In M. M. Ferreira (Org.) Anais do XXVI Simpósio Nacional de
História (pp. 1-11). São Paulo: Anpuh-SP.
Braudel, F. (1992). Escritos sobre História. São Paulo: Perspectiva.
Burillo Mozota, F. (1996). Oppida y “ciudades estados” celtibéricos. Complutum, vol. 22, Madri,
pp. 277-295.
Burón Álvarez, M. (1996). Una gran domus en las proximidades del foro de Asturica Augusta: la
casa del pavimento de opus signium. In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do Congreso
Internacional: Los Orígenes de la Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 1039-1056). Lugo:
Facultade de Humanidades.
Burón Álvarez, M. (1997). El trazado urbano en las proximidades del Foro en Asturica Augusta: La
casa del pavimento de opus signinum. Arqueología en Castilla y león, 2, Valladolid, pp.
289-312.
Burón Álvarez, M. (2006). El trazado urbano de Asturica Augusta: Génesis y Evolución. In I. Moreno
Gallo (Coord.) Actas do III Congreso de las Obras Públicas Romanas: Nuevos elementos
de ingeniería romana (pp. 289-312). Astorga: Junta de Castilla y León.
Burón Álvarez, M., García Giménez, R. e Suárez Vega, R. (1999). Composición mineralógica de
materiales cerámicos romanos de época altoimperial producidos en Asturica Augusta.
XXIV CNA, vol 14, Murcia, pp. 323-330.
Canto y de Gregorio, A. M. (1990). La Tabula Lougeiorum: um documento a debate. Composición
mineralógica de materiales cerámicos romanos de época altoimperial producidos em
Asturica Augusta. CuPAUM, 17, Madri.
Carneiro, S. (2002). Escavações arqueológicas na Cadeia Velha de Chaves. Revista Aquae Flaviae,
28, Chaves.
Carlsson-Brandt, E. (2010). El poblamiento rural en la Galicia Romana. Um ejemplo: las villae.
Metodología y Problemática en su estudio. Estrat Crític, vol. 1, n. 5, Barcelona, pp. 156167.
113
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Carvalho, H. P. (2008). O povoamento romano na fachada ocidental do Conventus Bracarensis.
Tese de doutoramento, Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Casal García, R. e Acuña Castroviejo, F. (2011). Lvcvs Avgvsti e a Universidade de Santiago de
Compostela. In R. C. Cao et al. (Coords), A Domus do Mitreo (pp. 14-19). Santiago de
Compostela: Universidade de Santiago de Compostela.
Castro Pérez, L. (2010). Veinte años de investigaciones sobre la Cultura Castrexa (1988-2008).
Minius, 18, Ourense, pp. 9-36.
Catroga, F. (2009). Os Passos do Homem como Restolho do tempo: Memória e Fim do Fim da
História. Coimbra: Almedina.
Cavada Nieto, M. (1995). La historia antigua en la Europa del siglo XIX. Minius, 4, Ourense, pp.
61-69.
Chevalier, R. (1986). Les sources de la recherche. In Actas do Colloque Le vicus gallo-romain (pp.
2-8). Paris: Errance.
Costa García, J. M. (2009). Tras los pasos de la Cohors I Celtiberorum: evidencias arqueológicas.
BSAA Arqueología, 75, Valladolid, pp. 201-222.
Costa García, J. M. e Casal García, R. (2015). Fotografía aérea histórica, satelital moderna y lidar
aéreo en algunos recintos militares romano de Castilla y León. Portugalia, vol. 36, Porto,
pp. 143-158.
Corral, C. F. (2005). La pervivencia de la Ciudad Romana: La pervivencia del mundo romano em
Castilla y Léon. Madri: Gráficas Santamaria.
Cruz, G. P. C. (2015). O surgimento do espaço urbano no Noroeste da Ibéria. Um reflexão sobre
os oppida pré-romanos. In R. Martínez Peñin e G. Cavero Domínguez (Eds), Evolución de
los espacios urbanos y sus territorios en el Noroeste de la Península Ibérica (pp. 403-424).
Leão: El Forastero S.L.
Cruz, M. R. D. (2009). O vidro romano no Noroeste peninsular: Um olhar a partir de Bracara
Augusta. Tese de doutoramento. Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Cuervo Álvarez, D. B. (2014). La urbs Asturica Augusta. Historia Digital, vol. 14, n. 24, Madri, pp.
72-110.
Curchin, L. A. (1996). La España Romana: Conquista y Asimilación. Madri: Editorial Gredos.
Delagado Delgado, J. A. (2003). La obra de Theodor Mommsen en España: la traducción de la
Römische Geschichte. Gérion, 2, Madri, pp. 47-60.
114
Referências Bibliográficas
Delgado Borrajo, M. e Grande Rodríguez, M. (2009). La Gallaecia antigua: diversidad, paijase rural,
estructura social y poblamiento. Herakleion, 2, Madri, pp. 61-92.
Dias, L. A. T. (1996). Contributo para a análise do ordenamento romano no território marginal do
rio Douro. DOURO- Estudos e Documentos, vol. 1, n. 2, Porto, pp. 31-56.
Dias, L. A. T. (1997). Tongobriga. Lisboa: IPPAR/Ministério da Cultura.
Dias, L. A. T. (1999). Novos contributos sobre o forum de Tongobriga. In M. Jorge Barroca (Coord),
Carlos Alberto Ferreira de Almeida: in memorian (pp. 279-285). Porto: Faculdade de Letras
da Universidade do Porto – FLUP.
Dias, L. A. T. (2011). Urbanization and architecture on the outskirt of the Roman Empire. In T.
Nogalas e I. Rodà (Orgs), Roma y las provincias: modelo e difusion (vol.I) (pp. 707-715).
Roma: L’erma.
Dias, L. A. T. (2013). O momento e a forma de construir uma cidade no noroeste da Hispânia,
periferia do Império romano e fronteira atlântica. Ciências e técnicas do património, vol.
13, Porto, pp. 113-126.
Dias, L. A. T. (2014). Tongobriga. Do século de Augusto ao obscurantismo. Ciências e técnicas do
património, vol. 13, Porto, pp. 171-181.
Dias, L. A. T. (2015a). Tongobriga: civitas “Transduriana” na Tarraconense. In J. López Vilar (Ed.)
Actas do II Congrés Internacional d’Arqueologia i Món Antic: Augusti i les Províncies
Occidentals 2000 Aniversari de la Mort d’August (pp. 67-74). Tarragona: Fundació Privada
Mútua Catalana.
Dias, L. A. T. (2015b). Tongobriga, a cidade que há no futuro. In D. Rocha, L. A. Dias, e J. Alarcão
(Dirs) Tongobriga. Reflexões sobre o seu desenho urbano (pp. 5-23). Porto:
CITCEM/Edições Afrontamento
Dião Cassio (2011). Historia Romana. Livro L-LX. Madri: Editorial Gredos.
Dopico Caínzos, Mª. D. (1976). Ciudades hispanas de la época de Augusto. In F. Burillo Mozota
(Ed.) Anais do Symposion de Ciudades Augusteas (pp. 79-137). Saragoça: Universidad de
Zaragoza.
Dopico Caínzos, Mª. D. (1986). Los conventus iuridici: origen, cronología y naturaleza histórica.
Gérion, 4, Madri, pp. 265-283.
Dopico Caínzos, Mª. D. (2009). As transformacións dos pobos do noroeste hispánico em época
de Augusto: a evidencia epigráfica. In Mª. D. Dopico Caínzos, M. V. Acuña e P. R. Álvarez
(Eds), Do castro á cidade: A romanização na Gallaecia e na Hispania indoeuropea (pp. 3154). Lugo: Servizo de Publicacións da Deputación.
115
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Dopico Caínzos, Mª. D. (2013). Nuevas formas de administración, nuevas formas de control: la
fundación de Lucus Augusti y su conventus. Portugalia, vol. 34, Porto, pp. 83-100.
Estrabão. (1992). Geografia. Livro III-IV. Madri: Editorial Gredos.
Etienne, R. (1974). Le culte impérial dans la Péninsule Ibérique d’Auguste a Diocletien. Paris:
Éditions E. de Boccard.
Fernández, G. (1998). Theodor Mommsen: patriarca de la historiografia antigua. Panta Rei. [s.l.]:
[s.n.].
Fernández Ochoa, C., Salido Domínguez, J. e Zarzalejos Prieto, M. (2014). Las formas de
ocupación rural en Hispania: Entre la terminología y la praxis arqueológica. CuPAUAM, 40,
Madri, pp. 111-136.
Fernández Ochoa, C. e Morillo Cerdán, A. (1999). La tierra de los astures. Nuevas perspectivas
sobre la implantación en la antigua Asturia. Gijón: Ed. Trea S.L.
Festus (1846). De la significations de mots. Paris: Panckoucke.
Fernández Vega, P. A. e Igliesias Gil, J. M. (2002-2003). El urbanismo del Norte de Hispania en
época Flavia. Memorias de historia antiga, 23-24, Oviedo, pp. 119-137.
Florus (1865). Abregé de l’Histoire Romaine. Paris: Panckoucke.
Fonseca Sorribas, D. (2012). El municipium romano de Aquae Flaviae y su problemática.
Antesteria, 1, Madri, pp. 519-528.
Fontan, A. (1978). Theodor Mommsen: Um gigante de la ciencia histórica (1817-1903). Forjadores
del mundo contemporáneo, 2, Barcelona, pp. 351-362.
Fonte, J. M. M. (2006). O “Padrão dos Povos” de Aquae Flaviae. Al-madan,14, Almada, pp. VI(1)VI(7).
Fonte, J. M. M. (2009). Lesenho e Aquae Flaviae: dois modelos de Assentamento Central e duas
lógicas locacionais de epoca pré-romana e romana. Projeto de investigação, Universidade
de Santiago de Compostela, Santiago de Compostela, Espanha.
Fontes, L., Lemos, F. e Cruz, M. (1997-1998). Mais Velho que a Sé de Braga: Intervenção
Arqueológica na Catedral Bracarense: noticia preliminar. Cadernos de Arqueologia, 14-15,
Série 2, Braga, pp. 137-164.
Fontes, L., Braga, C., Braga J., Sendas, J. e Magalhães, F. (2008). Escavações Arqueológicas no
Quarteirão dos Antigos CTT (Braga): resultados preliminares. Al-madan, 2, Almada, pp. 19.
116
Referências Bibliográficas
Gallo Moreno, I. (2006). Vías romanas de Astorga. In I. Moreno Gallo (Coord.) Actas do III Congreso
de las Obras Públicas Romanas: Nuevos elementos de ingeniería romana (pp. 23-65).
Astorga: Junta de Castilla y León.
Gaspar, A. (1985). Escavações arqueológicas na Rua de N. Sra. do Leite, em Braga. Cadernos de
Arqueologia, 2, Série 2, Braga, pp. 51-125.
García Martínez, S. M. (1997). Regulamento Jurídico do Noroeste peninsular: os pactos de
hospitalidade e outras formas jurídicas. Douro – Estudos & Documentos, vol.2, n.4, Porto,
pp. 39-62.
García Marcos, V. (2004). Los campamentos de las legiones VI Victrix e VII Gemina de León. In C.
Pérez González e E. Illarregui Gómez (Coords.) Actas do Congreso de Segovia: Arqueología
militar romana en Europa (pp. 167-198). Segóvia: Universidad Internacional SEK y Junta
de Castilla y León.
García Marcos, V. e Vidal Encinas, J. M. (1996). Asturica Augusta: De asentamiento militar a urbs
magnífica. In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do Congreso Internacional: Los
Orígenes de la Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 911-944). Lugo: Facultade de
Humanidades.
García Quintela, M. V. (2002). La organización socio-política de los Populi de Noroeste de la
Península Ibérica. Un estudio de antropología política histórica comparada. Santiago de
Compostela: Instituto de Estudios Galegos Padre Sarmiento.
Garrido Gaitán, E. G., Mar Medina, R. e Martins, M. (2008). A Fonte do ídolo: análise, interpretação
e reconstituição do santuário de Bracara Augusta. In M. Martins (Coord) Bracara Augusta:
escavações arqueológicas (pp. 1-73). Braga: UAUM/NARQ.
Geoffaux, B. (2003). Promotions juridiques et monumentalisation des cités Hispano-romaines.
Saldvie, 3, Saragoça, pp. 143-161.
González Fernámdez, E. (2005), Domvs Oceani: aproximación á arquitetura doméstica de Lucus
Augusti. Lugo: Concello de Lugo.
González Fernández, Mª, L. (1996a). Consideraciones sobre el origen militar de Asturica Augusta.
In C. Fernández Ochoa (Coord.) Actas do Coloquio de Arqueologia: Los Finisterres
Atlánticos en la Antigüidad: Época Prerromana y Romana (pp. 85-90). Gijón: Ayuntamiento
de Gijón.
González Fernández, Mª. L. (1996b). Las defensas campamentales de Asturica Augusta: Avance
de su estúdio. In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do Congreso Internacional: Los
Orígenes de la Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 1019-1038). Lugo: Facultade de
Humanidades.
González Fernández, Mª. L. (2003). Un recinto funerário romano em Asturica Augusta: Astorga,
León. Bolskan, 20, Huesca, pp. 297-308.
117
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Gonzáles Ruibal, A. (2005). El Castro de Saceda y la jerarquización territorial de la segunda edad
del hierro em el Noroeste ibérico. Zephyrus, 58, Salamanca, pp. 267-284.
González Soutelo, S. (2012). El balneario romano de Lugo: una nueva interpretación arquitéctonica
y funcional. Saguntum, 44, Valência, pp. 167-182.
Grimal, P. (2009). A civilização Romana. Lisboa: Edições 70.
Guerra, A. (2005). Povos, cultura e língua no ocidente peninsular: uma perspectiva, a partir da
toponomástica. Paleohispanica, 5, Saragoça, pp. 793-822.
Harouel, J. L. (1990). O urbanismo romano. Campinas: Papirus.
Hidacio (1906). Cronicon. Ourense: A. Otero.
Hingley, R. (2005). Globalizing Roman Culture: Unity, diversity and Empire. Londres: Routledge.
Iglesias Gil, J. M. (1998). Ciudad y territorio. In O. Cuevas Fernandez (Org), Hispania Romana: el
legado de Roma en el año de Trajano (pp. 153-158). Saragoça: Ayuntamiento de Zaragoza.
Isidoro (2004). Etimologia. Madri: Biblioteca de Autores Cristianos.
Jiménez Salvador, JL. (1998). Urbanismo y obras públicas. In O. Cuevas Fernandez (Org) ,
Hispania Romana: el legado de Roma en el año de Trajano (pp. 159-167). Saragoça:
Ayuntamiento de Zaragoza.
Lemos, F. S. (2008). A transformação do habitat e da paisagem castreja no contexto da
romanização: o exemplo dos grandes castros. In D. Dopico Caínzos, M. Villanueva Acuña
e P. Rodríguez Álvarez (Eds), Do Castro á Cidade. A Romanización na Gallaecia e na
Hispânia Indoeuropea (pp. 109-141). Lugo: [s.n.].
Lemos, F. S. e Martins, C. M. B. (2008). Civitates aurífera romana no Noroeste da Península
Ibérica. In J. M. Mata-Perello, L. T. Abat e N. Fuentes Prieto (Orgs) Actas do V Congreso
Internacional sobre Minería y Metalurgia História en el Suroeste Europeo (pp. 503-512).
Leão: SEDPGYM.
Lemos, F. S. e Martins, C. M. B. (2010). Povoamente e rede viária no território de influência de
Aquae Flaviae. In: C. B. Martins (Coord.) Mineração e Povoamento na Antiguidade no Alto
Trás-os-Montes Ocidental (pp. 79-105). Porto: CITEM.
Le Roux, P. (1977). Lucus Augusti, capitale administrative au Haut-Empire. In J. M. Motes y Nicolau
(Org) Actas do Coloquio Internacional Sobre el Bimilenario de Lugo (pp. 83-105). Lugo:
Patronato del Bimilenario do Lugo.
Le Roux, P. (1994). Cités et territoires en Hispanie: l’épigraphie des limites. Mélanges de la Casa
des Vélazquez, vol. 30, n. 1, Madri, pp. 37-51.
118
Referências Bibliográficas
Le Roux, P. (1996). Las ciudades de la Callaecia romana durante el Alto Imperio. Gérion, 14,
Madri, pp. 363-379.
Le Roux, P. (2006). Romanos de España: Ciudade y política en las províncias (siglo II a.C. – siglo
III d.C.). Barcelona: Bellaterra.
Le Roux, P. e Tranoy, A. (1984). Villes et fonctions urbaines dans le Nord-Ouest hispanique sous
domination romaine. Portugalia, 4-5, Porto, pp. 199-207.
Le Roux, P. e Tranoy, A. (1989-1990). B. Les inscriptions funéraires. Cadernos de Arqueologia.
vol. 6-7, Braga.
Lintott, A. (1994). The crisis of the Republic: sources and source-problems. In J. A. Crook e A.
Lintott (Org) The Cambriedge Ancient History (vol. 9, 2º ed.) (pp. 1-15). Cambridge:
Cambridge University Press.
López Quiroga, J. (2001). Romanización y Impulso Romanizador del Noroeste Peninsular en Época
Flavia. In L. Hernández Guerra, L. Sangredo San Eustaquio e J. M. Solana Sáinz (Coords.)
Actas del I Congreso Internacional de Historia Antiga: la Península Ibérica hace 2000 años
(pp. 291-297). Valladolid: Universidad de Valladolid.
Mantas, V. G. (2016). Bracara Augusta e a rede viária augustana do Noroeste peninsular. In R.
Morais, M. Bandeira e Mª, J. Sousa (Eds) Celebração do bimilenário de Augusto: Ad
nationes/Ethnous Kallaikon (pp. 137-150). Braga: Câmara Municipal de Braga.
Magalhães, F. (2010). Arquitectura doméstica em Bracara Augusta. Tese de mestrado,
Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Magalhães, F. (2013a). Arquitectura doméstica em Bracara Augusta. Interconexões, vol.1, n.1,
Braga, pp. 13-30.
Magalhães, F. (2013b). As áreas residenciais de circulação e representação das domus de Bracara
Augusta. Estudios Humanísticos Historia, 12, Leão, pp. 39-63.
Magalhães, F. (2015). Espaço doméstico e sociabilidades: as domus de Bracara Augusta. In G. V.
Silva et al. (Orgs.) Actas do Coloquio Luso-Brasileiro de Estudos Clássicos: Cotidiano e
Sociabilidade no Império Romano (pp. 67-81). Vitória: GM Editora.
Martins, M. (1989). Algumas Perspectivas da Evolução do Povoamento do Vale do Cavado entre o
1.º Milenio A.C. e a Romanização. Cadernos do Noroeste, 2-3, Braga, pp. 155-177.
Martins, M. (1991-92). Bracara Augusta: a memória de uma cidade. Cadernos de Arqueologia,
8/9, Série 2, Braga, pp. 177-197.
Martins, M. (1991). "As vilas do Norte de Portugal" de Alberto Sampaio. Importância da obra no
estudo do povoamento antigo. Revista de Guimarães, 102, Guimarães, pp. 387-409.
119
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Martins, M. (2000). Bracara Augusta: Cidade romana. Braga: UAUM.
Martins, M. (2004). Urbanismo e Arquitectura em Bracara Augusta. Balanço dos contributos da
Arqueologia Urbana. Actas do Congresso Internacional “Simulacra Romae. Roma i les
Capitals provincials de l’Occident” (pp. 149-175). Tarragona: Fundación biblioteca virtual
Miguela de Cervantes.
Martins, M. (2005). As termas romanas do Alto da Cividade: Um exemplo de arquitectura publica
de Bracara Augusta. In M. Martins (Coord) Bracara Augusta: escavações arqueológicas I
(pp. 1-121). Braga: UAUM.
Martins. M. (2009a). A Romanização. In P. Pereira (Coord) Minho. Traços de Identidade (pp. 191269). Braga: Ed. do Conselho Cultural da Universidade do Minho.
Martins, M. (2009b). Bracara Augusta: panorama e estado da questão sobre o seu urbanismo. In
M. Martins, Mª. D. Dopico Caínzos, M. V. Acuña e P. R. Álvarez (Eds) Do castro á cidade:
A romanização na Gallaecia e na Hispania indoeuropea (pp. 181-211). Lugo: Servizo de
Publicacións da Deputación de Lugo.
Martins, M. (2014). Projeto de Bracara Augusta: 38 anos de descoberta e estudo de uma cidade
romana. Revista da Faculdade de Letras, vol.13, Porto, pp. 159-169.
Martins, M. e Delgado, M. (1989-1990). As necrópoles de Bracara Augusta. Os dados
arqueológicos. Cadernos de Arqueologia, 6-7, Série 2, Braga, pp. 41-186.
Martins, M., Lemos, F. S. e Pérez Losada, F. (2005). O povoamento romano no território dos
galaicos bracarenses. In C. Fernández Ochoa e P. García Díaz (Eds) Unidad y diversidad
em el Arco Atlántico em época romana (pp. 259-276). Gijón: Archaeopress.
Martins, M; Ribeiro, J. e Magalhães, F. (2006). Arqueologia urbana em Braga e a descoberta do
teatro de Bracara Augusta. Forum, 40, Braga, pp. 9-30.
Martins, M. e Ribeiro, M. C. (2009-2010). A arqueologia urbana e a defesa do patrimônio das
cidades. Forum, 44-45, Braga, pp. 149-177.
Martins, M. e Carvalho, H. P. (2010). As transformações do território: Bracara Augusta e seu
cadastro. Projeto de Investigação PtDC/HIS-ARQ/121136/2010, Braga, Portugal.
Martins, M. e Fontes, L. (2010). Bracara Augusta: balanço de 30 anos de investigação arqueológica
na capital da Galécia Romana. Mémória do Simulacra Romae II: Roma, les capitales de
province (capita prouinciarum) et la création d’un espace commum européen. Une
approche archéologique (pp. 255-262). Reims: Université de Reims.
Martins, M., Fontes, L., Ribeiro, M. C. F. e Carvalho H. P. (2010). A Cidade de Braga e o seu
território nos séculos V-VII. In A. García (Coord) Espacios urbanos en el Ocidente
mediterráneo (S. VI-VIII) (pp. 255-262). Toledo: Toletvm Visigodo.
120
Referências Bibliográficas
Martins, M., Ribeiro, J., Magalhães, F. e Braga, C. (2012). Urbanismo e Arquitetura de Bracara
Augusta: sociedade, economia e lazer. In M. C. Ribeiro e A. S. Melo. (Coords) Evolução da
paisagem urbana: sociedade e economia (pp. 29-69). Braga: CITCEM.
Martins, M., Mar Medina, R., Ribeiro, J. e Magalhães. F. (2013). A construção do teatro romano
de Bracara Augusta. In: M. C. Ribeiro e A. S. Melo (Coords.) História da construção:
Arquitetura e técnicas construtivas (pp. 41-75). Braga: CITCEM.
Martins, M. e M. C. Ribeiro (2013). Em torno da Rua Verde: a evolução urbana de Braga na longa
duração. In M. C. Ribeiro e A. S. Melo (Coords) Evolução da paisagem urbana:
Transformação morfológica dos tecidos históricos (pp. 11-45). Braga: CITCEM.
Martins, M., Armandino, C., Magalhãe, F., Braga, C., Martínez Peñin, R., Ribeiro, J., Adolfo, F. e
David, M. (2014). Rua D. Afonso Henriques, 42-56 (BRAGA). In L. Fontes e M. Martins
(Dirs.) Salvamento de Bracara Augusta: Relatório (pp. 1-90). Braga: UAUM.
Martins, M. e Braga, C. (2015) Bracara Augusta: Rituais e espaços funenários. Férvedes, 8, Vilalba,
pp. 301-310.
Martins, M., Ribeiro, J., Mar Medina, R., Magalhães, F. e Martínez Peñin, R. (2015). El teatro
romano de Bracara Augusta y la urbanización del Noroeste peninsular. Férvedes, 8,
Vilalba/Lugo, pp. 321-330.
Martins, M., Ribeiro, J., Magalhães, F. e Martínez Peñin, R. (2016). The housing evolution of Braga
between Late Antiquity and the Early Middle Ages. In F. Sabaté, F. e J. Brufal (Dirs.)
Arqueologia Medieval: Hàbitas Medievals (vol. VIII) (pp. 35-52). Lleida: Pagès Editors.
Martins, M. e Carvalho, H. (2016). Bracara Augusta no contexto da reorganização da Hispânia.
Urbanismo e povoamento rural, Gérion, Madrid.
Mattingly, D. J. (1997). Africa: a landscape of opportunity? In D. J. Mattingly (Org.) Dialogues in
Roman Imperialismo: Power, discourse, and discrepant experience in the Roman Empire
(pp. 117-139). Portsmouth: JRA.
Millett, M. (1990). The Romanization of Britain: an essay in archaeological interpretation.
Cambridge: Cambridge University Press.
Molina Gómez, J. A. (2001). Theodor Mommsen (1817-1903) y la Antigüidad Tardía. Antig. Crist,
18, Múrcia, pp. 445-468.
Mommsen, T. (2003). História de Roma: Libros I y II. Desde la fundación de Roma hasta la reunión
de los Estados itálicos. Madri: Tuner.
Montenegro Duques, A. (1988). Augusto en Hispania. In A. Blázquez et al. (Orgs.) História de
Hispania Romana (Tomo II) (pp. 254-282). Madri: Catedra.
121
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Morais, R. (2001). Breve ensaio sobre os anfiteatros de Bracara Augusta. Forum, 30, Braga, pp.
55-76.
Morais, R. (2005). Ab vrbe condita: desde a fundação de Bracara Augusta. Saguntum, 37,
Valência, pp. 125-138.
Morillo Cerdán, A. (1999). Lucernas romanas en la región septentrional de la Península Ibérica:
contribuición al conocimiento de la implantacióin romana en Hispania. Monographie
Instrumentum, 8, Montagnac.
Morillo Cerdán, A. e García Marcos, V. (2000). Nuevos testemonios acerca de las Legiones VI
victrix y X gemina en la región septentrional de la Península Ibérica. In Anais do Congrès
de Lyon sur l’Armée Romaine: Les legions de Rome sous le Haut-Empire (pp. 589-607).
Lyon: [s.n.].
Morillo Cerdán, A., García Marcos, V. e Taffala Amaré, Mª. (2005). Asturica Augusta como centro
de producción y consumo cerámico. In C. Fernández Ochoa e P. García Díaz (Eds.) Anais
do III Coloquio Internacional de Arqueologia: Unidad y Diversidade en el Arco Atlántico en
Época Romana (pp. 139-161). Gijón: Archaeopress.
Morillo Cerdán, A. e García Marcos, V. (2006). Asturica Augusta: cronologia estratigráficas. In Mª.
P. García-Bellido (Coord.) Los campamentos romanos em Hispania (27 a.C. – 192 d.C.):
El abastecimento de monedas (pp. 109-117). Madri: Anejos de Gladius.
Morillo Cerdán, A. e Salido Domínguez, J. (2012). Military vici in Roman Spain. In L. Vagaliski (Ed.)
Actas do XXII International Congress of Roman Frontier Studies (pp. 519-530). Ruse: [s.n.].
Morillo Cerdán, A., Salido Domínguez, J. e Durán Cabello, R. M. (2014). Aglomeraciones
secundarias de carácter militar em Hispania. Anejos CuPAUAM, 1, Madri, pp. 117-131.
Morris, A. E. J. (1984). Historia de la forma urbana. Desde sus orígenes hasta la Revolución
Industrial. Barcelona: Editorial Gustavo Gili.
Moudon, A. V. (1997). Urbain morphology as an emerging interdisciplinary field. Urbain Morpholy,
1, [s.I.], pp. 3-10.
Nuñuz Hernández, S. I. (2007). Arquitectura y urbanismo en las ciudades romanas del valle del
Duero: los grandes conjuntos monumentales. Bordeaux: De Boccard.
Orejas, A. e Morillo Cerdán, A. (2013). Asturica Augusta: reflexiones sobre su estatuto y su papel
territorial (finales del siglo I a. C. – princípios del siglo III d..C.). In R. M. Cid López e E. B.
García Fernández (Eds), Debita Verba II. Estudios em homenaje al professor Julio Mangas
Manjarrés (pp. 93-120). Oviedo: Universidad de Oviedo.
Orosio (1982). Historia. Livros V-VII. Madri: Editorial Gredos.
122
Referências Bibliográficas
Pacione, M. (2009). Urbain Geography: a global perspective. Nova York: Routledge.
Pérez Centeno, Mª. R. (1999). Un enclave romano de primer orden en el norte peninsular: Asturica
Augusta en el s. III d.C. Gallaecia, 18, Santiago de Compostela, pp. 265-273.
Pérez Losada, F. (2002). Entre a cidade e a aldeia: estudo arqueohistórico dos “aglomerados
secundários” romanos em Galicia. Brigantium, vol. 13, Corunha.
Pereira Menaut, G. (1982). Los castella y las comunidades de Gallaecia. Zephyrus, 34-35,
Salamanca, pp. 249-267.
Plinio (1998). Historia Natural. Livro III-VI. Madri: Editorial Gredos.
Porto, M. E. M. (2010). Cultura Histórica pós anos 70: entre dois paradigmas. In C. E. Cury e E.
C. Cordeiro (Org), Cultura histórica e historiografia: legados e contribuições do século 20
(pp. 207-223). João Pessoa: Editora Universitária/UFPB.
Ptolomée (1828). Traitée de Geographie. Paris: Imprimeur du Collége Royale de France.
Redentor, A. J. M. (2011). A cultura epigráfica no conventvs Bracaravgvstanvs (pars occidentalis):
percursos pela sociedade brácara da época romana (vol I-II). Tese de doutoramento,
Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal.
Revell. L. (2009). Roman Imperialismo and Local Identities. Cambridge: Cambridge University
Press
Ribeiro, J. M. G. (2010a). O tecido urbano flaviense: de Aquae Flaviae a Chaves medieval. Tese de
mestrado, Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Ribeiro, J. M. P. (2010b). Arquitectura romana em Bracara Augusta: uma análise das técnicas
edilícias. Tese de doutoramento, Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Ribeiro, Mª. C. (2008). Braga entre a época romana e a Idade Moderna: Uma metodologia de
anásile para a leitura da evolução da paisagem urbana. Tese de doutoramento,
Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Ribeiro, Mª. C. (2016). O papel das vias romanas na formação e desenvolvimento periférico da
cidade de Braga, desde a época romana até à atualidade. In C. Silva et al. (Orgs.) Actas
da V Conferência Internacional da Rede Lusófona de Morfologia Urbana: Espaços da
Morfologia Urbana (pp. 27-38). Braga: PNUM.
Rodríguez Cao, C. A. (2011). A domus do mitreo. In C. R. Cao et al. (Coords), A Domus do Mitreo
(p. 14-19). Santiago de Compostela: Universidade de Santiago de Compostela.
123
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Rodríguez Colmenero, A. (1996). La integración de la Gallaecia en los dominios romanos: fases
de su conquista. In A. Rodríguez Colmenero (Coord), Lucus Augusti: Tomo I – El amanecer
de uma ciudad (pp. 245-264). Corunha: Fundación Pedro Barrié de la Maza.
Rodríguez Colmenero, A. (1997). Aquae Flaviae II: O tecido urbanístico da cidade romana. Chaves:
Câmara Municipal de Chaves.
Rodríguez Colmenero, A. (1997-1998). Sobre dos nuevas estelas monumentales de Lucus Augusti.
In F. Villar Liébana e F. Beltrán Lloris (Eds.) Actas do VII Coloquio sobre Lenguas y Cultura
Paleohipánicas: Pueblos, lenguas y escrituras en la Hispania Prerromana (pp. 79-90).
Salamanca: [s.n.].
Rodríguez Colmenero, A. (1998). Lucus Augusti: Epicentro integrador da Gallaecia do Abrente.
Santiago de Compostela: Universidade de Santiago de Compostela.
Rodríguez Colmenero, A. (2011). Lvcvs Avgvsti: a cidade romano-xérmanica da finisterra ibérica:
xénese e evolución histórica (14 a.C.-711 d.C.). Lugo: Concello de Lugo.
Rodríguez Colmenero, A. e Cavadonga Carreño, M. (1999). Lucus Augusti, capital del finisterre
hipánico. In L. T. Dias, J. S. Araújo e P. Le Roux (Orgs.) Actas da Mesa Redonda:
Emergência e Desenvolvimento das Cidades Romanas no Norte de Península Ibérica (pp.
115-132). Porto: Escola Profissional de arqueologia/IPPAR.
Rodríguez Colmenero, A, Sierra, S. F. e Asorey R. D. A. (2004). Miliarios e outras inscricións viarias
romanas do Noroeste hispánico: conventos bracarense, lucense e asturicense. Santiago
de Compostela: Conselho da cultura galega/Sección de patrimonio historico.
Rodríguez Resino, A. (2007). Ciudades, vicus, castra y villae en el NW durante la tardoantigüedad:
ensayo de um modelo arqueohistórico para el período. Gallaecia, 26, Santiago de
Compostela, pp. 133-161.
Roldán Hervás, J. M (1988). La Romanización. In J. M. Blázquez Martínez et al. (Orgs), História
de Hispania Romana (Tomo II) (pp. 175-210). Madri: Catedra.
Roldán Hervás, J. M. e Wulff Alonso, F. (2001). Citerior y Ulterior: Las províncias romanas de
Hispania en la era republicana. Madri: Ediciones Istmo.
Rui, M. L. S., Bandeira M. e Pinho E. M. (2013). Itineraria sacra: Bracara Augusta fidelis et sacra.
Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra.
Rykwert, J. (1985). La idea de ciudad: Antropología de la forma urbana em el Mundo Antiguo.
Madri: Hermann Blume.
Said, E. W. (1995). Cultura e Imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras.
Said, E. W. (2008). Orientalismo. Barcelona: Debolsillo.
124
Referências Bibliográficas
Saéz Geoffroy, A. (2012). La expansión y la Crisis de la República Romana. Barcelona: Ed.
Universidad de Barcelona.
Sánchez-Migallón Millán V. e Swedzky Sarudiansky, G. (2011). Patrimonio historico Español del
juego y del deporte: las termas Romanas de Lugo. Madri: PHEJD Museu del juego.
Sastre Prats, I. (1998). Formas de dependencia social en el noroeste peninsular: Transición del
mundo prerromano al romano y época imperial. Ponferrada: Intituto de Estudios
Bercianos.
Sevillano Fuertes, Mª. A. (1996). Aportaciones a la Arqueología de Asturica Augusta: 1993/1996.
In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do Congreso Internacional: Los Orígenes de la
Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 993-1006). Lugo: Facultade de Humanidades.
Sevillano Fuertes, Mª. A. (2005). A. El Museo Romano de Astorga. Croa, 15, Lugo, pp. 57-61.
Sevillano Fuertes, Mª A. (2014). Apuntes arqueológicos para la historia antigua de Astorga.
Astorga: CEAMM.
Sevillano Fuertes, Mª. A. e Vidal Encinas, J. M. V. (2001). Urbs magnifica: una aproximación a la
arqueologia de Asturica Augusta (Astorga, León): Museo Romano (guía-catalog). Astorga:
Ayuntamiento de Astorga.
Silva, A. C. (1983-1984). A cultura Castreja no Noroeste de Portugal: Habitat e Cronologias. In
Actas do Colóquio Inter-Universitário de Arqueologia do Noroeste (pp. 123-129). Porto:
[s.n.].
Silva, A. C. F., Pinto, F. S., Quintino, N. e Teixeira, V. (2006-2007). Novos dados sobre o urbanismo
e história da cidade de Chaves. Ciência e técnicas do patrimônio (vol V-VI) (pp. 549-565).
Porto: [s.n.].
Silva, B. S. (2011a). Nas margens do mundo antigo: a questão da romanização e os estudos sobre
antiguidade. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História (pp. 1-12). São Paulo: AnpuhSP.
Silva, B. S. (2011b). Romanização e os séculos XX e XXI: A dissolução de um conceito. Mare
Nostrum, 2, São Paulo, pp. 57-75.
Silva, J. F. (2013). A domus da zona arqueológica das antigas Carvalariças de Braga: contributo
para o estudo da arquitetura doméstica de Bracara Augusta. Relatório de mestrado,
Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Silva, M. F. M. (2006). O povoamento proto-histórico e a romanização da bacia superior do rio
Coura: Estudo, Musealização e divulgação. Tese de doutoramento, Universidade de
Granada, Granada, Espanha.
125
A urbanização romana no Noroeste da Hispânia: fontes e especificidades
Sousa, L. (2012). Eixo viário romano Oculis – Tongobriga: sua presença no concelho de Lousada.
Revista municipal Suplemento de arqueologia, 94, Lousada, pp. 1-4.
Storey, G. R. (2006). Urbanism in the Preindustrial world: Cross-Cul Approaches. Tuscaloosa: The
University of Alabama Press.
Suárez Piñeiro, A. Mª. (2006-2008). O desenvolvemento territorial dunha cidade com 2000 anos
de historia: Lucus Augusti. Boletín do Museo Provincial de Lugo, 13, Lugo, pp. 311-323.
Taffala Amaré, Mª., García Marcos, V. e Morillo Cerdán, A. (2006). Asturica Augusta: introducción
histórica y arqueológica. In Mª. P. García-Bellido (Coord), Los campamentos romanos em
Hispania (27 a.C. – 192 d.C.): El abastecimiento de monedas (pp. 91-108). Madrid:
Anejos de Gladius.
Torres, A, C. M. S. (2014). Sequência de ocupação da Zona arqueológica do Ex. Albergue Distrital.
Contributo para análise evolutiva e funcional de uma unidade doméstica em Bracara
Augusta. Relatório de Mestrado, Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Tranoy, A. (1981). La Galice Romaine: Recherches sur le nord-ouest de la péninsule ibérique dans
l’Antiquité. Paris: Diffusion Boccard.
Trillmich, W. (1998). Las ciudades Hispanorromanas: Reflejos de la Metrópoli. In O. Cuevas
Fernandez (Org), Hispania Romana: el legado de Roma en el año de Trajano (pp. 183195). Saragoça: Ayuntamiento de Zaragoza.
Vega Avelaira, T. (1996). Las aglomeraciones civiles (vici y kanabae) de los campamentos
romanos: aspectos urbanísticos. In A. Rodríguez Colmenero (Org.) Anais do Congreso
Internacional: Los Orígenes de la Ciudad en el Noroeste Hispánico (pp. 1265-1289). Lugo:
Facultade de Humanidades.
Vega Avelaira, T. (2007). Los campamentos permanentes del ejército romano como semilla de
núcleos civiles: el desarrollo de los vici militares. Larouco, 4, Alicante, pp. 73-98.
Vicente González, J. L. (2008-2009). Bellum Asturicum: uma hipótesis ajustada a la historiografía
romana y al marco arqueológico y geográfico de la comarca de “Los Valles de Benavente”
y su entorno. Brigecio, 18-19, Benavente, pp. 13-77.
Wallace-Hadrill, A. (2008). Rome’s Cultural Revolution. Cambridge: Cambridge University Press.
Woolf, G. (1998). Becoming: the origins of Provincial Civilizations in Gaul. Cambridge: Cambridge
University Press.
Woolf, G. (2003-2004). Cultural Change in Roman Antiquity: Observation on Agency. Kodai Journal
of Ancient History, v.13-14, Tóquio, pp. 157-157.
126