Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
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APONTAMENTOS
de Arqueologia e Património
MAR 2015
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ISSN: 2183-0924
Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
Título: Apontamentos de Arqueologia e Património
Propriedade: Era-Arqueologia S.A.
Editor: ERA Arqueologia / Núcleo de Investigação
Arqueológica – NIA
Local de Edição: Lisboa
Data de Edição: Março de 2015
Volume: 10
Capa: Falange decorada proveniente do Sepulcro 2 dos Perdigões
(Foto: António Valera)
Director: António Carlos Valera
ISSN: 2183-0924
Contactos e envio de originais:
[email protected]
Revista digital.
Ficheiro preparado para impressão frente e verso.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
ÍNDICE
EDITORIAL ................................................................................. 05
António Carlos Valera
“ÍDOLOS” FALANGE, CERVÍDEOS E EQUÍDEOS.
DADOS E PROBLEMAS A PARTIR DOS PERDIGÕES ............ 07
Beatriz Bastos
POTENTIAL OF LIPID ANALYSIS ON PREHISTORIC
PORTUGUESE POTTERY …………………………….................. 21
José Carlos Quaresma, Alexandre Sarrazola, Inês M. da Silva
PRODUÇÃO DE VIDROS E IMPORTAÇÃO DE TERRA
SIGILATTA EM FINAIS DO SÉCULO V / PRIMEIRA METADE
DO SÉCULO VI: O CASO DA MARINHA BAIXA, AVEIRO ........ 63
António Carlos Valera, Rui Ramos e Patrícia Castanheira
OS RECINTOS DE FOSSOS DE COELHEIRA 2
(SANTA VITÓRIA, BEJA) ............................................................ 33
António Carlos Valera
CIEMPOZUELOS BEAKER GEOMETRIC PATTERNS:
A GLIMPSE INTO THEIR MEANING .......................…….…....… 47
Alexandre Sarrazola, Mónica Ponce,
Teresa Freitas, Marta Macedo
A RAMPA DOS ESCALERES À REAL CORDOARIA,
BELÉM / JUNQUEIRA (SÉCULO XVIII) ...................................... 77
Patrícia Castanheira
MISERICÓRDIA II (BERINGEL, BEJA):
ALGUMAS NOTAS PARA O ESTUDO DO BRONZE FINAL
NAS TERRAS DE BARROS ....................................................... 53
Ana Olaio, Pedro Angeja, Álvaro Pereira,
Gonçalo Sá-Nogueira, André Texugo
ACTIVIDADE ARQUEOLÓGICA E DIVULGAÇÃO DO
PATRIMÓNIO EM SANTARÉM ...................................................83
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
EDITORIAL
Chegamos, com a presente edição, ao número dez dos volumes
publicados da Apontamentos de Arqueologia e Património. Dez
números em oito anos, com algum abrandamento e irregularidade
nos últimos tempos relativamente aos primeiros. Nestes dez
volumes publicaram-se 94 artigos, nos quais foram autores 80
colaboradores, que em vários casos aqui realizaram as suas
primeiras publicações.
O projecto inicial, conforme se declarava no editorial do número
um da revista, visava a “publicação de pequenos textos
informativos ou problematizantes cuja divulgação por outros meios
não se justifica por si só ou poderá ser demorada.” Pretendia-se
“contribuir para a rápida difusão, referenciável e citável, de
informações, ideias, pequenos estudos ou análises, cuja
disponibilização mais imediata seja importante para o desenrolar
da investigação e da actividade arqueológica colectiva”,
respondendo desta forma às crescentes dificuldades financeiras
que se colocavam às edições em papel e à proliferação da
actividade arqueológica no âmbito da Arqueologia de Salvamento.
A intenção inicial, porém, viria a ser progressivamente alterada
pela realidade. A tradicional tendência para publicar pouco, que
sempre caracterizou a Arqueologia portuguesa nos seus mais
variados âmbitos, tem mais a ver com uma postura que com
qualquer ausência de meios.
Como resultado, a revista acabou por enveredar pela publicação
de alguns textos de maior fôlego (que fogem a um Apontamento) a
par de outros que melhor respondiam às intenções originais e o
seu ritmo de publicação adaptou-se à produtividade daqueles que
se disponibilizaram a colaborar.
O resultado, contudo, tem sido positivo, e a julgar pelas citações
que, no país e no estrangeiro, os textos da Apontamentos têm
merecido, a iniciativa ganhou já o seu espaço no panorama
editorial da Arqueologia portuguesa.
Justifica-se, pois, o esforço e, como desde o início, a revista
continuará aberta a todos os que com ela queiram colaborar
António Carlos Valera
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
OS RECINTOS DE FOSSOS DE COELHEIRA 2
(SANTA VITÓRIA, BEJA)
António Carlos Valera1
Rui Ramos 2
Patrícia Castanheira3
Resumo:
No presente texto apresentam-se os resultados de uma intervenção de minimização de impactes realizada pela empresa Omniknos Lda para a
Edia S.A., no âmbito do empreendimento da rede de rega de Alqueva. Os trabalhos permitiram identificar dos pequenos recintos de fossos, um
possível hipogeu, várias fossas, maioritariamente de cronologia calcolítica, assim como duas cistas (estas já da Idade do Bronze). As várias
estruturas são caracterizadas no que respeita à sua morfologia e enchimentos e um estudo tipológico dos materiais (essencialmente cerâmicos) é
apresentado. Por último, assinalam-se algumas questões relativas aos pequenos recintos circulares, entre os quais se parecem integrar os de
Coelheira 2, e que começam também a pontuar a paisagem alentejana da Pré-História Recente.
Abstract:
The ditched enclosures of Coelheira 2 (Santa Vitória, Beja)
The present paper presents the results of a rescue archaeological excavation done by Omniknos Company for EDIA S.A. in the context of the water
supply network of Alqueva dam. In this intervention two small ditched enclosures, one possible hypogeum and several pits were identified, the
majority dating from the Chalcolithic, as well as two cists dating from Bronze Age. The several features are characterized in their morphology and
fillings and a typological study of pottery is presented. In the end some issues regarding the Recent Prehistory small circular enclosures (in which
the two of Coelheira 2 can be integrated) that are appearing in Alentejo region are analysed.
1. Introdução
O sítio do Monte de Coelheira 2 situa-se na freguesia de
Santa Vitória, concelho e distrito de Beja, apresentando as
seguintes coordenadas: M-212082.46, P-113210.40 (Datum
73) a uma altitude de 161m. Está implantado em plena
planície, numa muito suave e quase imperceptível elevação
entre o Barranco da Corte Negra, a Norte, e uma linha de
água subsidiária daquele, a Sul. A sua visibilidade é restrita
a Este pela suave subida do terreno até à zona do marco
geodésico de Lança (localizado a cerca de 900 metros do
sítio), abrindo-se mais ao longo do percurso do referido
barranco que apresenta uma orientação Nordeste –
Sudoeste.
________________________________________________
1
NIA- ERA Arqueologia; ICArEHB.
(
[email protected])
2 Omniknos Lda.
3 Estagiária do NIA-ERA Arqueologia.
Figura 1 – Localização da Coelheira 2 na C.M.P., 1:25000, fl. 520.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
Do ponto de vista geológico a zona apresenta rochas de
idades várias, sendo possível identificar no local a presença
de magras e rochas metamórficas, ígneas e carbonatadas.
Figura 2 – Vista de Coelheira 2 a partir de Este, do sítio de Coelheira 3.
O sítio foi intervencionado pela empresa Omniknos, sob
direcção de campo de Rui Ramos e coordenação de projecto
de Miguel Rodrigues, com assessoria do Núcleo de
Investigação Arqueológica (NIA) da Era Arqueologia S.A., no
âmbito da minimização de impactos do Circuito Hidráulico
Cinco Reis - Trindade e Respectivo Bloco de Rega,
empreendimento da EDIA E.P.. No total da intervenção
foram escavados 58 m2, divididos por 10 sondagens. As
sondagens foram implantadas sobre as estruturas negativas
identificadas durante o acompanhamento arqueológico,
sendo posteriormente alargadas de acordo com as
dimensões das ocorrências. As sondagens 4, 6 e 8
correspondem a secções de dois recintos, o Recinto 1 a sul
e o recinto 2 a norte separados por 15 metros (Figura 3),
enquanto as restantes correspondem a estruturas tipo fossa,
um possível hipogeu e a duas cistas da Idade do Bronze.
2. O fosso do Recinto 1
O Recinto 1 foi identificado através de dois troços
aparentemente de um mesmo fosso (Fosso 1), um localizado
do lado Sudeste e outro a Norte (Figura 3).
O troço Sudeste, intervencionado numa extensão
aproximadamente de 4m, apresentava paredes algo
irregulares, convergentes para um fundo ligeiramente
côncavo, formando uma secção em “U”. A largura no topo
varia entre os 1,80m e os 2m e na base entre os 0,80m e os
1,30m. A profundidade média é de 0,60m. Apresentava-se
preenchido por três depósitos. O depósito de base [2012] era
composto por argila de coloração alaranjada, compacta e
homogénea. Era coberto por um depósito de composição
areno-argilosa e composição vermelha, pouco compacto e
homogéneo [2008]. Por fim, o topo da estrutura negativa era
colmatado por um depósito de composição areno-argilosa e
coloração castanha escura e cinzenta, pouco compacto e
heterogéneo [2011]. Sobre este depósito foi identificada uma
camada bastante circunscrita de composição argilosa e cor
cinzenta, bastante compacta, [2009], delimitada a Oeste por
6 blocos de gabro de pequena e média dimensão [2010].
Esta última realidade poderá corresponder a restos de uma
lareira realizada sobre o fosso já colmatado. As UE [2009],
[2010] e [2011] eram cobertas pelo depósito superficial de
composição argilosa e coloração castanha, com inclusão
abundante de bolsas de caliço desagregado e material
cerâmico, UE [2001].
A extremidade Sudeste deste troço continuava pelo corte,
enquanto do lado oposto, Nordeste, o fosso revelava uma
interrupção, apontando para a existência de uma entrada.
Apesar de solicitado, não foi realizado um ligeiro
alargamento da decapagem no sentido obter o registo
integral da mesma (Figuras 4 e 5). Esta entrada apresentase orientada a 1020 relativamente ao centro estimado deste
recinto, o qual terá uma planta de tendência circular com um
diâmetro aproximadamente de 15m.
Figura 3 – Planta geral das sondagens e das estruturas identificadas
em Coelheira 2. A linha vermelha corresponde ao traçado da vala para
implantação da conduta de água.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
É ainda de referir que na extremidade Sudeste este troço de
fosso apresenta o que parece ser uma descontinuidade na
sua escavação, observando-se um estreitamento das
paredes do fosso que depois voltam a alargar. Esta situação
sugere uma escavação do fosso por secções, como já foi
observado em vários outros recintos de fossos (Valera,
2014), embora neste caso os depósitos de preenchimento
revelem continuidade ao longo de todo o traçado escavado.
Relativamente ao troço norte do Fosso 1, este apresenta
paredes mais regulares, convergentes para uma base
aplanada, com uma largura no topo variável entre os 0,70 e
os 1,30m e uma largura na base variável entre os 0,70 e os
0,90m e uma profundidade média de 0,80m.
Apresentava-se colmatado por 3 depósitos. O primeiro
enchimento é composto por um depósito de composição
argilosa e coloração alaranjada, bastante compacto [4004],
que em perfil apresenta uma pendente de cerca de 45 graus,
quase desde o topo do fosso do lado interno até à base.
Este depósito era coberto por um outro de composição
argilosa e coloração castanha, mediamente compacta e com
inclusão de algum caliço [4002]. O topo da estrutura era
colmatado por um depósito de composição argilosa e
coloração amarela e cinzenta, compacto e com inclusão
abundante de caliço [4001].
Sobre o depósito [4001] identificamos uma camada
circunscrita ao limite Sudoeste da intervenção,
desenvolvendo-se para fora da área escavada, de
composição areno-argilosa e coloração cinzenta,
mediamente compacta e homogénea [4005].
Figura 4 – Aspecto final da escavação do troço Sudeste do
Fosso 1, sendo visível a interrupção correspondente à entrada.
Figura 5 – Aspecto da escavação do troço Norte do Fosso 1. É
visível a pendente do depósito de base.
Figura 5 – Aspecto da escavação do troço Sudeste do Fosso 1.
É visível o estreitamento do fosso em primeiro plano.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
Figura 7 – Vista do fosso do Recinto 2 definido ao nível do topo
dos seus enchimentos.
O seu enchimento revela uma estratigrafia bastante diferente
da observada no fosso do Recinto 1. Era colmatado por 6
depósitos gerais. Na base apresentava o depósito [6006],
composto por sedimentações lenticulares de argila de
coloração escura intercaladas com areia de coloração
amarela, sugerindo uma sedimentação natural por acção
hídrica. Este depósito, pontualmente cortado junto à parede
externa, era coberto por um aglomerado pétreo regular de
gabros de pequena e média dimensão [6005] que abrangia
toda a área intervencionada do fosso (Figura 8).
Figura 6 – Cortes do Fosso 1. Em cima no troço Norte e em
baixo no troço Sudeste.
O aglomerado pétreo era coberto parcialmente por uma
camada de argila escura [6007] encostada à parede externa
e por um depósito mais espesso [6002] de composição
areno-argilosa e coloração castanha-clara e que, do lado
interno do fosso se prolongava até ao topo. Definia-se assim
um interface verticalizado [6004], que continuava até ao topo
com cerca de 50 centímetros de largura, onde era
preenchido no topo por um aglomerado pétreo composto por
gabros de pequena e média dimensão [6003] do lado interno
e por um depósito argiloso de cor preta [6001] que
encostava à parede externa (Figuras 9, 10 e 11).
3. O fosso do Recinto 2
Do Recinto 2 foi identificado e escavado um troço de fosso
do quadrante Sudoeste com uma extensão de cerca de
14,5m. A sua curvatura sugere uma planta de tendência
subcircular, que terá um diâmetro interno aproximadamente
de 19m. Apresenta paredes regulares convergentes para
uma base plana formando um perfil trapezoidal, com uma
largura no topo variável entre os 1m e 1,35m e largura na
base variável entre os 0,40m e 1,15m e uma profundidade
variável entre 0,80m e 1m.
Figura 8 – Aspecto do enchimento pétreo [6005], abrangendo praticamente toda a área escavada do fosso de forma relativamente homogénea.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
A
B
B
A
Figura 11 – Perfis A e B e sua localização no traçado do fosso
do Recinto 2.
Figura 9 – Aspecto do empedrado [6003], topo da [6002] pelo
lado interior e espaço já escavado do depósito de argilas
escuras [6007].
Esta sequência estratigráfica, genérica a todo o traçado
intervencionado do fosso, parece apontar para dois
momentos distintos de operacionalidade do fosso.
A fase mais antiga, consubstanciada na [6006], indicia um
momento em que o fosso estaria aberto, permitindo a
sedimentação natural de depósitos por acção hídrica,
responsável pelo carácter lenticular dos mesmos.
Um segundo momento, em que a estratigrafia revela uma
clara diferenciação verticalizada entre a metade interna e a
metade externa, é indiciador da presença de uma paliçada.
Calçados na base por um empedrado [6005] ou perfurando
pontualmente o depósito natural subjacente (como sugere o
perfil A), a sequência de postes seria encostada à parede
externa do fosso e sustentada pelo interior por outro
aglomerado pétreo [6003] e um espesso depósito argiloso
[6002]. Posteriormente, numa fase em que a paliçada já
estava desactivada, possivelmente por decomposição das
madeiras, o espaço junto à parede externa foi ocupado por
dois depósitos de cor escura, [6007] e [6001], enquanto em
alguns pontos o aglomerado pétreo [6003] se deslocava um
pouco, aproximando-se, mas nunca atingindo a parede
externa.
O fosso teria assim tido a sua última utilização como infraestrutura de uma paliçada, circunstância que também é
consistente com o facto de praticamente não ter fornecido
materiais, resumindo-se os mesmos a 8 fragmentos de bojos
manuais e um grande fragmento de um recipiente esférico,
ao contrário do fosso do Recinto 1, o qual forneceu bastante
material cerâmico (ver ponto 7).
Figura 10 – Perfis do fosso do Recinto 2. Perfil B em
cima; perfil A em baixo.
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Apontamentos de Arque
Arqueologia e Património – 10 / 2015
saibrosa e coloração amarela
ela e compacto
c
[2028], sobre o
qual se desenvolvia um nível
vel pétreo
pét pouco concentrado,
composto por gabros de média
édia dimensão
d
e sem
estruturação evidente [2027].
7]. Esta
Est unidade e a maior parte
da [2022] eram cobertas por
or um depósito de composição
areno-argilosa e coloração vermelha,
verme
pouco compacto e com
a presença de muito material
rial cerâmico
cer
[2021]. Este depósito
era por sua vez coberto porr um depósito
d
circunscrito de
composição saibrosa e coloração
loração amarela, pouco compacto
[2019], correspondente à desagre
esagregação do caliço e por um
nível de blocos de gabros de média
méd dimensão, que perfila
um alinhamento bastante incipien
cipiente com orientação SE-NO
[2020]. Por fim, o enchimento
nto de topo desta estrutura era
composto pela já referida unidad
nidade [2001].
4. O hipogeu
Junto à entrada do Recinto 1 foi identificada
ficada uma
u realidade
relativamente complexa.
ficado um depósito
Sobre a colmatação do fosso foi identificado
circunscrito de composição argilosa e cor cinzenta,
cin
bastante
compacto [2009], delimitado a Oeste por
or 6 blocos
bl
de gabro
de pequena e média dimensão [2010]. Estas duas unidades
poderão corresponder a restos de uma lareira.
lareir Era coberta
por um depósito de composição argilosa
sa e coloração
co
castanha, com inclusão abundante de bolsas de caliço
desagregado e material cerâmico [2001],, que também cobria
parcialmente o fosso preenchido, revelando
lando a ocupação do
local após a amortização deste recinto.
Se a morfologia da estrutura
ra sug
sugere que estamos em
presença de um hipogeu, a estratigrafia
estra
observada parece
indicar uma situação de reutilizaç
utilização, não sendo possível
determinar a distância temporal
poral entre
e
uma eventual primeira
utilização funerária e esta reutilização.
reutiliz
Este mesmo depósito [2001] cobria e parcialm
arcialmente preenchia
o topo de uma estrutura negativa, cuja arquitectura
arquit
parece
corresponder a um hipogeu, ainda que nela nnão tenham sido
registados restos osteológicos humanos.
Este hipogeu localiza-se a aproximadamente
mente 2 metros a
Noroeste do troço de fosso, sensivelmente
ente em frente à
entrada do Recinto 1. Trata-se de uma estrut
estrutura negativa
(adiante designada por câmara) com um
m interface
inte
circular
com aproximadamente 2,30m de diâmetro
etro no topo, 2,70m na
base e 1,70m de profundidade, paredess irreg
irregulares, perfil
tronco-cónico e fundo plano. Na parede Este
ste desta estrutura,
junto à base, foi identificado um nicho escavado
escava no
substrato, de planta ovalada e com cerca
rca de 1,40m no seu
eixo maior, com o fundo bastante irregular
ular e com uma cota
mais baixa em relação à base da câmara.
ara. Na parte
diametralmente oposta a este nicho, parece
arece pperfilar-se um
corredor ou uma entrada orientada a Oeste,, cuja
c base se
encontra em rampa e mais elevada aproxima
roximadamente 0,30m
em relação à base da câmara. O facto deste possível acesso
se encontrar afastado da área a ser directam
rectamente afectada
pela implantação do projecto, levou a que não
nã fosse
integralmente escavado (decisão da tutela
tela e do dono de
obra).
A colmatação da base desta estrutura foi feita com uma
camada de composição saibrosa e coloração
oração cinzenta,
bastante compacta e homogénea [2024] e que
qu ocupava toda
a área da câmara e o nicho. O plano bastante
astante regular desta
camada e o facto da sua superfície apresenta
resentar um aspecto
alisado pode sugerir um piso de circulação.
ção. A entrada do
nicho encontrava-se selada incipientemente
ente por um conjunto
de blocos de gabros de média dimensão
ão [202
[2025], alguns
tombados para o seu interior e inclusoss no depósito
de
que o
colmatava, composto por argila intercalada
lada por
p bandas
siltosas, pouco compacto e com abundância
ância de material
cerâmico [2026]. Quer a selagem, quer o dep
epósito que
colmatava o nicho desenvolviam-se sobre
bre a UE
U [2024].
Na câmara, sobre o depósito [2024], registou
gistou-se uma
camada argilosa de coloração castanhoo avermelhada,
aver
bastante compacta [2023], coberta por uma ccamada argilosa
de coloração cinzenta, pouco compactaa [2022].
[202 Esta unidade
era parcialmente coberta por um depósito
sito bastante
ba
circunscrito identificado no possível corredor,
rredor, de composição
Figura 12 – Plano final e perfil longitudinal da estrutura
tipo hipogeu.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
heterogénea [UE 3002], coberta pelo depósito de topo de
composição argilosa e coloração escura, mediamente
compacto e homogéneo, UE [3001]. Forneceu 2 bordos e 60
bojos manuais concentrados nos dois depósitos mais
superficiais.
Na Sondagem 5, localizada entre os dois recintos foi
escavada uma fossa ovalada (Fossa 3). Revelou um
diâmetro de 1,30m e 1,70m de profundidade, paredes
regulares, um perfil ovalado, com ligeiro estrangulamento na
boca. A colmatação era composta por uma sequência linear
de 4 depósitos. Um depósito de fundo de composição
argilosa e coloração castanha avermelhada, compacto e
homogéneo [5004], coberto por um depósito argiloso de
coloração castanha, pouco compacto e homogéneo [5003].
Este era coberto por um depósito de composição arenosa e
coloração amarela, mediamente compacto e heterogéneo
[5002]. O enchimento era completado por um depósito
argiloso, castanho-escuro, compacto e homogéneo [5001].
Apenas o depósito de topo forneceu alguns fragmentos de
cerâmica manual (8 bojos).
Figura 13 – Vista final da escavação do hipogeu.
Por outro lado, o facto de o último depósito de enchimento
desta estrutura [2001] cobrir igualmente parte de um troço de
fosso (e uma possível lareira realizada no seu topo) poderá
indicar que esta reutilização terá ocorrido já num momento
em que o fosso estaria totalmente colmatado.
A Sondagem 9 localizava-se entre a Sondagem 1 e o
Recinto 1, sensivelmente a 7,5m a sudeste deste último. Aí
foi intervencionada uma fossa (Fossa 4) de planta circular
com 1,05m de diâmetro e 0,35m de profundidade, paredes
regulares e perfil troncocónico com fundo convexo. A
colmatação era composta por um único depósito de
composição argilosa e coloração castanha, pouco compacto
e heterogéneo [9001]. Não forneceu materiais arqueológicos.
A posterioridade da reutilização do hipogeu relativamente ao
Recinto 1 não nos esclarece sobre as relações temporais na
fase de construção e eventual utilização funerária desta
estrutura. Contudo, face à sua localização praticamente à
entrada do recinto, dificilmente hipogeu e recinto poderiam
ter funcionado simultaneamente.
5. As fossas
B
No traçado da vala de obra foram ainda intervencionadas
cinco fossas.
A
Na Sondagem 1, localizada a cerca de 15m a sudeste do
Recinto 1 (Figura 3), foi escavada uma fossa (Fossa 1) de
planta sub-circular com 1,70m de diâmetro e 0,80m de
profundidade, apresentando paredes regulares, fundo plano
e um perfil troncocónico de boca estrangulada. A sua
colmatação era composta por dois depósitos: no fundo um
depósito de composição areno-argilosa de coloração
castanha-clara, compacto e heterogéneo [1002], coberto por
um depósito de topo de composição argilosa e coloração
castanha escura, mediamente compacto e heterogéneo
[1001]. Ambos os depósitos forneceram material cerâmico
manual, no total de 20 bordos e 77 bojos.
C
E
Na Sondagem 3 foi escavada uma outra fossa (Fossa 2) de
planta sub-circular, localizada no interior do Recinto 1, à
direita da entrada. Apresentava 1,10m de diâmetro e 1,60m
de profundidade, paredes regulares e secção rectangular
com fundo ligeiramente côncavo. A colmatação era
composta por uma sequência linear de quatro depósitos. Um
depósito de base pouco espesso, de composição arenosa de
coloração castanha, compacto e heterogéneo [3004],
coberto por um depósito de composição argilosa e coloração
escura, mediamente compacto e heterogéneo [UE 3003].
Este último era coberto por uma camada de composição
arenosa e coloração amarela, pouco compacta e
D
Figura 14 – Perfis estratigráficos das fossas: A- Fossa 4; B- Fossa 3;
C- Fossa 1; D- Fossa 2; E- Fossa 5 (nível amarelo corresponde aos
restos osteológicos humanos).
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
direito e posição flectida, sendo acompanhado por uma taça
tipo Odivelas localizada entre as mãos e crânio.
Estas duas cistas serão provavelmente parte integrante de
uma necrópole da Idade do Bronze, correspondendo a uma
das muitas que existem em torno a Santa Vitória. De acordo
com o rendeiro da propriedade, várias sepulturas terão sido
destruídas ao longo dos anos naquela área, facto que indicia
a presença de uma extensa necrópole.
De momento não é possível determinar se existe alguma
relação cronológica entre estas cistas da Idade do Bronze e
as deposições de restos osteológicos humanos no interior da
Fossa 5, localizada cerca de 20m para sudeste em relação
às cistas. Os poucos bojos cerâmicos ali recolhidos não
permitem inferências, pelo que a questão terá que ficar em
aberto e só poderá ser esclarecida através da datação
absoluta daquele conjunto esteológico.
Figura 15 – Restos humanos na fossa 5.
Por último, na Sondagem 10 (localizada entre a Sondagem 1
e a 9), foi escavada uma fossa (Fossa 5) de planta subcircular, com 1,40m de diâmetro e 1,80m de profundidade,
paredes irregulares e perfil ovalado, fundo convexo e boca
ligeiramente estrangulada. A colmatação era composta por
um depósito de fundo de composição argilosa e coloração
castanha, pouco compacto e heterogéneo [10002]. Sobre
este depósito e no centro da estrutura negativa, registou-se
um conjunto de ossos humanos [10003], essencialmente
composto por diáfises de ossos longos, alguns dos quais
poderão apresentar conexões anatómicas (relatório
antropológico não está ainda disponível), sem espólio
associado. Esta deposição era coberta pelo depósito de topo
do enchimento, de composição argilosa e coloração
castanha, pouco compacto e heterogéneo [10001]. No
depósito [10002] foram registados 2 fragmentos de bojo de
cerâmica manual.
6. As cistas da Idade do Bronze
Embora o presente texto incida particularmente sobre os
contextos de cronologia calcolítica registados em Coelheira
2, cabe ainda referir a presença de dois enterramentos em
cista da Idade do Bronze.
Figura 16 – Enterramento da Cista 1 e respectivo material votivo.
A Cista 1 foi escavada no substrato geológico e parcialmente
sobre o troço sudeste do Fosso 1 (Recinto 1). Apresenta-se
revestida com quatro lajes de xisto e tem uma orientação
noroeste-sudeste (lado da cabeceira). No interior foi
registado um indivíduo depositado em decúbito lateral
esquerdo em posição flectida. Era acompanhado por dois
recipientes: um pequeno vaso brunido de colo estrangulado
com decoração em gomos sugeridos por decoração
ligeiramente incisa e brunida; uma taça de carena baixa. A
primeira localizava-se no canto da cista em frente à cabeça e
a segunda junto às mãos.
Quanto à Cista 2, localizada a cerca de 1,5m para nordeste
da Cista 1, estava escavada no depósito [2001] que cobria o
hipogeu. Apresentava quatro lajes de revestimento e ainda
duas da cobertura. Apresenta igualmente uma orientação
noroeste-sudeste, mas a cabeceira está para nordeste. No
interior estava depositado um indivíduo em decúbito lateral
Figura 17 – Enterramento da Cista 2 e respectivo material votivo.
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Apontamentos de Arque
Arqueologia e Património – 10 / 2015
Seguem-se os recipientes fechados,
fechad de tendência globular
com ou sem colo estrangulado,
lado, esféricos
e
e recipientes tipo
saco com colo troncocónicoo mais ou menos fechado. As
taças e as tigelas são pouco
co representativas
repr
e um recipiente
fechado, de carena alta e bordo ligeiramente
l
exvertido é
caso único. As taças carenadas
adas estão
e
totalmente ausentes.
A distribuição das formas pelas
elas pprincipais estruturas que
forneceram cerâmica é relativam
ativamente homogénea. Na
globalidade, este conjunto cerâmico
cerâm aponta para uma
cronologia do Calcolítico Pleno.
7. Os materiais dos fossos, fossas e hipogeu
hipog
Os materiais arqueológicos provenientes
es de fossos,
f
fossas e
hipogeu são quase que exclusivamentee constituídos
cons
por
fragmentos de recipientes cerâmicos, sendo a indústria lítica
muito escassa (ver adiante) e estando ausentes
ausen pesos de
tear, indústria óssea, metal ou evidências
ias de metalurgia,
elementos de adorno ou objectos relacionado
ionados com o
sagrado.
No que respeita à cerâmica, foram contabiliza
tabilizados 322
bordos e 1170 fragmentos de bojo. A quase
uase totalidade
t
deste
material é proveniente de apenas quatro
ro con
contextos: o Fosso
1 (Recinto 1), a Fossa 1, o hipogeu e o depósito
depó
[2001] que o
cobria.
Relativamente à indústria lítica, esta
e provém essencialmente
do depósito [2001], onde see recolheram
reco
dois percutores de
quartzo inteiros e fragmentos
tos de outros dois, um fragmento
de seixo de quartzito, duas lascas
lasca de quartzo e mais um
fragmento. No hipogeu foram
am ainda
ain recolhidos um fragmento
de dormente e outro de movente
vente de mó manual, três
percutores e fragmentos dee outros
outro dois em rochas ígneas e
um fragmento de seixo de quartzito.
quartz Não há registo de
qualquer outro tipo de artefacto
facto lílítico.
Entre os bordos, 164 permitiram classificação
ficação morfológica.
As formas presentes são dominadas pela
ela presença
pre
de
pratos de bordo simples ou com uma significa
ignificativa variedade
de bordos espessados (entre os quais o almendrado).
alme
Figura 18 – Tabela tipoló
tipológica das formas cerâmicas dos contextos calcolíticos de Coelheira
elheira 2.
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Apontamentos de Arque
Arqueologia e Património – 10 / 2015
Figura 19 – Distribuição
ição da
das morfologias cerâmicas por contexto (números absolutos).. Para além destes
contextos, o Fosso 2 apre
apresenta um recipiente tipo 5 e a Fossa 9 um recipiente tipo 7.2.
8. Discussão
Uma das particularidades mais interessantes
santes de Coelheira 2
é apresentar dois pequenos recintos circulare
irculares lado a lado
em vez de um integrar o outro de formaa mais ou menos
concêntrica, como acontece na maioriaa dos recintos
r
múltiplos.
Esta circunstância já tinha sido sugeridaa noutro
nou sítio, mas
não de forma tão evidente como em Coelheir
oelheira 2. De facto,
no sítio vizinho de Murteira 6, localizado a apenas
ap
4km a
norte de Coelheira 2 (Figura 20), foram identi
identificados troços
de fossos muito semelhantes em tamanho
nho que
qu aparentam
corresponder a diferentes recintos, quee inclusivamente
inclus
se
cortam, apresentando uma cronologia,, estab
estabelecida a partir
da componente cerâmica, igualmente integrá
grável no
Calcolítico (Porfírio et al., 2012). A sobreposi
reposição de troços
de fossos em Murteira 6 claramente demonst
monstra a existência
de diferentes momentos de construção de recintos
re
na
mesma área, sugerindo uma periodicidade
ade de usos,
abandonos e construções num mesmo sítio, que não utilizam
infra-estruturas anteriores. Já em Hortaa Nova 4 (Alvito), a
cerca de 50m de um recinto em escavação (e que poderá
apresentar mais que um fosso) foi identificad
tificado em imagem
aérea um outro mais pequeno e circular (Figura
(Figu 21C).
Figura 20 – Localização de Coelheira
ra 2 (1),
(1) Murteira 6 (2) e Bela Vista 5
(3) na planície entre Santa Vitória e Beringel.
Bering Por trás de Murteira 6 é
visível a elevação do Outeiro do Circo
co (imagem
(ima
Google Earth).
Por outro lado, os dois recintos
intos de
d Coelheira 2 apresentam
diferenças entre si, tanto noo que respeita às dimensões dos
fossos (nomeadamente no que re
respeita a profundidades)
como relativamente ao tipo de en
enchimentos, o que pode
indiciar funcionalidades distintas
tintas ou simplesmente estádios
distintos de um mesmo tipoo de pluralidade
pl
funcional. A
própria relação com as estruturas
ruturas tipo fossa não pode ser
estabelecida numa base dee simu
simultaneidade, ainda que
aquelas que forneceram materiai
ateriais classificáveis indiquem
uma contemporaneidade em
m termos
term cronológico-culturais. A
fossa com restos humanos só poderá
po
ser cronologicamente
referenciada depois dos mesmos
esmos datados por radiocarbono.
A questão da contemporaneidade de usos
sos é precisamente
um dos problemas de Coelheira 2. Com
m base na informação
existente, não é possível dicidir se os dois re
recintos aqui
identificados funcionaram de forma simultâne
ultânea ou sucessiva,
tanto mais que, se o Recinto 1 apresenta
nta abundante
abu
cerâmica que claramente o coloca num Calco
Calcolítico Pleno, o
Recinto 2 apenas forneceu alguns fragmento
mentos cerâmicos,
que tanto podem corresponder a uma ocupação
ocupaç do mesmo
período ou mais antiga (Neolítico Final).
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Apontamentos de Arque
Arqueologia e Património – 10 / 2015
Na realidade, e com base em critérios de relação
rela
estratigráfica e de localização de estruturas,, apenas
podemos dizer que o enchimento final do hipogeu
hip
é feito
quando o Fosso 1 já estava colmatado e que a sua
localização, praticamente na entrada do Reci
ecinto 1, sugere
que não terão tido um funcionamento simultâneo,
simultâ
embora os
materiais cerâmicos sejam totalmente equiparáveis.
equipa
Assim, Coelheira 2 e Murteira 6 sugerem
m a existência,
e
na
extensa planície entre Santa Vitória e Beringe
Beringel, de vários
pequenos recintos (eventualmente agrupado
upados em zonas
específicas) durante o 3º milénio AC, entre
ntre os
o quais
poderemos integrar o recinto cerimonial
al de Bela
B Vista 5
(Valera, 2014) (Figura 20). Associados a fossas
foss e estruturas
com uso funerário, estes recintos parecem
cem revelar
re
situações
de construção e reconstrução periódica,, indiciando
indic
ocupações de curta duração e intermitentes,
entes, próprias de
projectos finitos e repetidos periodicamente.
ente.
A
É igualmente interessante sublinhar o progressivo
progre
aumento
do número de pequenos recintos que aparentemente
aparen
apresentam apenas um fosso de plantaa circular
circu ou subcircular. Para além dos dois agora registados
istados em Coelheira
2, há a referir o já conhecido recinto do Torrão
Torrã (Elvas), com
cerca de 60m de diâmetro e atribuível ao Neo
Neolítico Final
(Lago e Albergaria, 2001) e vários outros
os aind
ainda inéditos: o
recinto do Carrascal 2 (Ferreira do Alentejo)
ntejo), com cerca de
20m de diâmetro (Figura 21: A), o recinto
nto de Borralhos
(Serpa), cuja imagem satélite sugere a existê
existência de um
único fosso com cerca de 80m, podendo existir
exis mais não
totalmente perceptíveis na imagem (Figura
gura 221: B), o recinto 2
de Horta Nova 4 (Alvito) com cerca de 25m
m (Figura
(F
21: C), o
recinto do sector 4 da Sª da Alegria (Coimbra
oimbra), com um eixo
maior de cerca de 8/10 m e atribuível aoo Neo
Neolítico Médio
(Figura 22: A), ou os recintos de Olhas 2 e Lavajos
La
(Ferreira
do Alentejo), ambos identificados em imagen
magens satélite e com
38m e 50m de diâmetro respectivamente
te (Fig
(Figura 22: B e C).
Nos casos de Nobre 2 (Beja) e Folha doo Ouro 1 (Serpa)
existem recintos circulares semelhantes,
s, mas as imagens
revelam que existem vários fossos concêntric
cêntricos (Valera e
Pereiro, 2013).
B
Estes pequenos recintos circulares e sub-circ
circulares
compostos por um único fosso lembram
m os ring ditches
britânicos, também eles correspondentes a estruturas
e
de
pequenas dimensões definindo recintoss de diâmetro
d
variável,
mas normalmente de reduzidas dimensões.
sões. Em
Northamptonshire, por exemplo, a média
ia é de 23m de
diâmetro, concentrando-se 56% dos recintos
cintos entre os 20m e
os 39m. Em 30% apresentam valores inferiores
inferior a 18m de
diâmetro, podendo atingir apenas 6 ou 8m (c
(como o recinto
interior de Bela Vista 5) ou mais raramente
ente chegar
ch
aos 100m
(Deegan, 2008). Podem igualmente serr comparáveis,
comp
em
dimensões, aos roundels do centro e leste
este eu
europeus, ainda
que estes sejam mais antigos. Se a maioria
aioria tende a
apresentar fossos duplos ou triplos, associaç
sociações a paliçadas,
taludes e várias entradas, frequentemente
nte 2 ou 4 alinhadas,
também existem casos com apenas um fosso (Andersen,
1997; Varndell, Topping, 2002; Belinskiy,
iy, Fassbinder,
Fas
Reinhold, 2011), estando em muitos articulad
rticulados com
contextos funerários (Spatzier et al. 2014).
C
Figura 21 – A. Excerto do magnet
agnetograma de Carrascal 2 (autoria de
Helmut Becker), B. imagem aérea de Borralhos, C. recinto 2 de
Horta Nova 4, localizada a cerca de
d 50m a SE do recinto 1 no qual
foi escavado um troço de fosso
sso pela
pe Era Arqueologia no âmbito da
implementação da rede de rega dde Alqueva.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
Por outro lado, o que Coelheira 2 revela, concretamente
através do seu Recinto 2, é a importância que a arquitectura
de madeira terá tido na região durante a Pré-História
Recente. Embora se tenha várias vezes evocado a
existência de paliçadas, estas nunca foram claramente
identificadas, nem através de restos carbonizados de
madeiras, nem através de buracos de poste e nem através
de estratigrafias internas de pequenos fossos. Apenas no
magnetograma do recinto de Moreiros 2 são perceptíveis
alinhamentos de implantação de postes correspondentes a
paliçadas em alguns dos recintos (Valera, Becker e
Boaventura, 2013), evidência à qual se soma agora a
proporcionada pela estratigrafia interna do Fosso 2. Outros
contextos, porém, têm igualmente apontado para a
existência de estruturas em madeira, como é o caso do
círculo rodeado por hipogeus do Neolítico Final no Outeiro
Alto 2, Serpa (Valera e Filipe, 2012) ou os alinhamentos de
postes registados em Estácio 6 (Beja).
A
B
A arquitectura monumental com recurso a madeira estará
ainda insuficientemente documentada na Pré-História do
território português, mas os indícios já existentes começam a
ser suficientes para que se comece a ponderar a sua
efectiva importância, ultrapassando a imagem ilusoriamente
hegemónica da construção em pedra. A importância das
arquitecturas em madeira será tanto maior quanto maiores
forem os condicionalismos de matéria-prima e se a raridade
de pedra em muitas zonas de barros do Baixo Alentejo pode
ajudar a explicar a inexistência de sepulcros megalíticos e a
solução subterrânea em fossa ou hipogeu, pode igualmente
ter incentivado o recurso à madeira na edificação de
espaços monumentais. Infelizmente esta forte possibilidade
não tem sido contemplada em muitas decisões tomadas no
âmbito das minimizações de impactos, ficando muitas vezes
por esclarecer a dúvida relativamente a possíveis
alinhamentos de fossas.
Este é igualmente um problema que se coloca a muitos
destes recintos que são cortados por empreendimentos
lineares e onde a minimização apenas inside sobre a zona
afectada, não se desenvolvendo qualquer trabalho no
sentido de tentar perceber a planimetria dos sítios e o
desenho dos fossos, ficando à felicidade de cada caso o ter
uma imagem aérea que permita visualizar um pouco do que
será o recinto (como acontece, por exemplo, com o recinto 1
de Horta Nova 4). Este não é o caso, contudo, dos recintos
de Coelheira 2, para os quais existem ainda significativas
lacunas de conhecimento.
C
De facto, falta ainda muita informação relativamente a estes
pequenos recintos circulares para que os possamos
compreender na sua real complexidade arquitectónica,
funcionalidade, cronologia e relações espaciais
estabelecidas no âmbito da construção de paisagens
significantes. Os dados que foi possível recolher em
Coelheira 2, contudo, vêm contribuir para uma melhor
percepção da diversidade que caracteriza o fenómeno dos
recintos de fossos na região e para começarmos a ter uma
ideia do tipo de contextos poderemos encontrar nos
pequenos recintos circulares que têm vindo a ser
identificados com recurso às imagens aéreas.
Figura 22 – A. Recinto do sector 4 da Senhora da Alegria; B.
Olhas 2, vendo-se uma entrada a norte; C. Lavajos.
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Apontamentos de Arqueologia e Património – 10 / 2015
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