• Adri Coelho Silva (@vivaacoroa)
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Adri Coelho Silva (Foto: Igor Reis/Divulgação)

Adri Coelho Silva (Foto: Igor Reis/Divulgação)

Tenho dois apelidos: Adri e “coroa”.  É assim que sou conhecida há quase 3 anos, desde que criei o Viva a Coroa, canal dedicado ao envelhecer bem, e que está no SUA IDADE do site da Vogue Brasil.  Sou uma coroa de 56 anos, que até pouco tempo atrás tinha pavor de envelhecer

Pois é, o envelhecimento, que hoje me dá voz, que é a minha força e o meu meio de expressão, me colocava em um lugar de vulnerabilidade extrema. Teria sido fácil se essa virada tivesse sido fruto de uma dessas finas ironias do destino, mas foi resultado de muita terapia, de informação, do apoio dos que me amam e da minha vontade de mudar na prática. E reforço que estar aberta para tentar mudar foi determinante.

Para você ter uma ideia do quanto o envelhecimento me pegava, aos 30, diante de um espelho, direcionava a minha energia e atenção para o que “já não estava assim tão bom”. Hoje acho risível, mas era sério. Ao chegar perto dos 50, eu me via como velha e me sentia velha por fora e por dentro. Os sintomas da menopausa gritavam, eu tinha fechado a minha loja de decoração em São Paulo, um sonho que tinha virado um pesadelo, meus filhos já não precisavam de mim. 

A estética ainda era uma questão importante, mas não estava mais sozinha.  A minha vulnerabilidade se tornou maior que eu, caí na escuridão. Terapia, família, amigos, informação eram os meus faróis nesse lugar. E insisti neles — e eles em mim (obrigada)  — até que avistei um clarão e ele, o meu monstro, o envelhecimento. Era imenso, dava medo, mas tive coragem de me aproximar, de ouvir o que tinha para me dizer. E fui percebendo que quanto mais o entendia, mais minha vulnerabilidade diminuía.

Eu o criei muito forte, em uma collab com a sociedade, que ainda valoriza muito a ideia do forever young. Faltava essa luz de dentro ir para fora para que o meu mundo mudasse. E passei a agir para tanto. O autoconhecimento é confundido com ensimesmamento, mas só se mostra legítimo em contato e através do coletivo. Tinha que promover esse encontro, contudo ainda não estava fácil ir para vida com o meu monstrinho. A solução foi partir para o digital.

Entrei em um grupo de WhatsApp com quase 100 mulheres de uns 50 anos. Conhecia poucas pessoalmente, mas logo estava vibrando com as boas notícias pessoais compartilhadas. Eram conquistas imensas e pequenas, todas devidamente honradas. Entrei na onda, comecei a acreditar na possibilidade de uma nova vida pós 50, abracei meu monstrinho e ao ver aquelas mulheres realizadas, me senti inspirada a investigar o que faria eu vibrar por mim.

Encontrei a resposta naquilo que tinha deixado de fazer e que não podia mais esperar: estudar.  Fiz matrícula em um curso de fotografia, aos 51 anos. Era 2018 e o curso era presencial. Senti que poderia ser bom mudar de cenário, ter mais tempo com o meu monstro. Fui morar sozinha pela primeira vez. Ah, e detalhe, na Califórnia. Meu marido e meus filhos apoiaram muito, algo tão fundamental quanto a coragem de “aplicar" para um visto de estudante com mais de meio século de vida.

Fui. E só no dia a dia vi que voltar para a sala de aula era colocar o meu monstro em evidência,  eu era a mais velha e fui me percebendo bem. Vi a minha finitude e tive pressa de viver uma vida mais alinhada com os meus sonhos. Minha vulnerabilidade fez eu correr atrás do que eu queria ser, a partir do reconhecimento do que eu já era.

Essa transformação ficou clara quando ouvi a minha própria voz contando que faria um projeto com mulheres 50+, quando a professora perguntou sobre os meus planos futuros.  Eu queria me ver nelas e ver elas em mim, tinha feito isso com minha vulnerabilidade com bons resultados, afinal.

Não creio que exista uma receita para transformar vulnerabilidade em força, mas tenho certeza que a ajuda de profissionais, de amigos, da família são tão cruciais quanto estar aberta para ser ajudada e para tentar o novo.

Levou tempo para entender que o enigma do monstro tem a ver com a escolha entre viver uma nova velhice ou ser uma velha caricatura do que você já foi. Bem depois dessa conclusão, encontrei minhas ações nas palavras de Simone De Beauvoir. Ela dizia que “para que a velhice não seja uma irrisória paródia de nossa existência anterior, só há uma solução — continuar a perseguir fins que dêem sentido à nossa vida (…) paixões fortes o bastante para evitar que façamos um retorno sobre nós mesmos”.

A quem possa interessar, o trecho que citei acima está na página 661, do lindo livro “A velhice”, em edição da Nova Fronteira. E também em mim e no meu monstrinho. Aliás, já ouviu e abraçou os seus monstros hoje?