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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)

A blindagem de Galípolo

Decisão do Copom de estender aumento dos juros para 2025 preserva novo presidente do BC de críticas do governo Lula

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 dez 2024, 14h59 - Publicado em 16 dez 2024, 13h20

Desde a transição de governo entre FHC e Lula, em 2002, não se via um processo tão eficiente de passagem de poder quanto o de Roberto Campos Neto para Gabriel Galípolo no comando do Banco Central. Na quarta-feira, dia 11, a última reunião do Comitê de Política Econômica (Copom) da gestão Campos Neto, indicado por Bolsonaro, aumentou os juros em 1 ponto percentual e prometeu outros 2 pontos em alta em janeiro e março, quando Galípolo, nomeado por Lula, já terá assumido. Para além do debate sobre a dimensão dessa alta de juros, a postura de continuidade de uma gestão para a outra mostrou que o BC passou no teste da independência.

Campos Neto e Galípolo pertencem a escolas econômicas diferentes, adotam estilos distintos e tiveram tropeções quando começaram a trabalhar juntos em agosto do ano passado. A desastrada decisão do Copom de maio, quando os indicados por Bolsonaro e os de Lula votaram uns contra os outros, mudou a relação. Ambos passaram a trabalhar para recuperar a unidade e preservar o papel do BC como entidade não partidária.

Num período de desancoragem das expectativas, ter uma transição suave no BC é uma bênção. Por meses, o mercado financeiro tinha a divisão da instituição como um dos maiores fatores de risco, e semanas atrás o ministro da Casa Civil, Rui Costa, falava em “o nosso BC” quando se referia à mudança que esperava com a posse de Galípolo. A indicação do economista Nilton David como novo diretor de política monetária foi um sinal prático de que a gestão Galípolo não será a imaginada por Rui Costa. A decisão de que o BC majoritariamente lulista vai levar a Selic a, no mínimo, 14,25% em março acabou com qualquer ilusão.

No domingo, na sua primeira entrevista exclusiva depois da alta hospitalar, o presidente Lula da Silva voltou a bater nos juros. “A única coisa errada nesse país é a taxa de juros, está acima de 12%. Essa é a coisa errada, não há nenhuma explicação. A inflação está quatro e pouco, é uma inflação totalmente controlada. A irresponsabilidade é de quem aumenta a taxa de juros todo dia, não é do governo federal”, afirmou. Será curioso observar como Lula e o PT vão lidar com as altas de juros a partir do ano que vem, quando elas serão assinadas por sete diretores indicados pelo atual governo.

A transição pacífica no BC dá a Galípolo a blindagem para começar sua gestão com dois aumentos expressivos de juros previamente anunciados. Diante disso, a pressão do governo deve vir de duas frentes. A mais óbvia é o dólar. A segunda será a liberação dos empréstimos compulsórios dos bancos, que daria fôlego para o crédito e, indiretamente, prejudicaria o esforço do BC em segurar a economia.

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Na quinta, sexta e nesta segunda-feira, o BC fez leilões com contrato de recompra (chamado de leilão de linha) com resultados pífios. A cotação caiu e logo depois retomou o mesmo lugar. Embora parte do mercado tenha interpretado a série de leilões na casa dos 7 bilhões de dólares como uma intervenção, o montante ridiculamente baixo para se obter um resultado efetivo indica uma operação sazonal. Dezembro é historicamente o mês com maior saída de dólares e, diante das circunstâncias, este ano está sendo pior que os anteriores.

Haverá com certeza pressões gigantes para que a gestão Galípolo intervenha no câmbio, mas o que está ocorrendo agora parece ser apenas uma ação para evitar disfuncionalidades no mercado.

Durante décadas, o dólar serviu de termômetro para Brasília aferir a saúde da economia. O governo FHC 2 terminou antes de começar em janeiro de 1999 com a desastrada mudança da política cambial, quando o dólar explodiu 87% em duas semanas. O mandato Dilma 2 estava condenado já no final de 2015, quando o real se desvalorizou 49%. Em julho deste ano, a política econômica do governo Lula 3 mudou de direção quando o dólar bateu os 5,70 reais e foram decretados os bloqueios de gastos que permitiram cumprir a meta de déficit. Mas desde que o pacote fiscal foi anunciado, três semanas atrás, o dólar saltou de 5,80 reais para 6,05 reais, e a reação de Brasília é um grande nada. O termômetro quebrou.

Brasília se acostumou nesses últimos dias a um patamar de dólar acima de 6 reais como parte da decoração de Natal, sem os usuais temores do efeito da alta na inflação. No fim de semana passado, por muito pouco o PT não aprovou uma resolução de negacionismo financeiro contra o pacote fiscal. Os bolsonaristas, por sua vez, passam os dias falando apenas com o seu cercadinho e votando a favor de mais armas nas ruas e menos abortos legais nos hospitais. O Centrão está ocupado chantageando o governo por mais emendas sem fiscalização. O presidente do STF, Roberto Barroso, abusou da inteligência alheia ao dizer que a Justiça não tem responsabilidade na crise fiscal. Parte do governo está de fato preocupada com a possibilidade de um 2025 de juros altos, inflação de alimentos e queda no PIB, mas a maior parte dos ministros se preocupa mais em manter os seus empregos numa futura reforma ministerial. Só restou o Banco Central como ilha de sanidade em Brasília.

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