O pessimismo com as negociações internacionais em torno da crise climática se estende às promessas individuais dos países. Nenhuma das contribuições nacionalmente determinadas (NDCs) já apresentadas oficialmente conseguiria manter o aquecimento do planeta na meta de 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, segundo análise do Climate Action Tracker (CAT), consórcio internacional de ONGs climáticas. E nem mesmo a segunda versão brasileira está à altura de suas ambições, aponta David Tsai, gerente de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).
As novas contribuições deverão incluir uma meta de redução de emissões válida para 2035, em substituição ao prazo anterior, que ia até 2030. Oficialmente, o prazo para a apresentação das novas NDCs é fevereiro de 2025, para que possam ser discutidas na COP30, em Belém (PA), no ano que vem. Brasil e Emirados Árabes Unidos (EAU), porém, já se adiantaram e apresentaram a primeira versão da meta renovada a tempo da COP29.
O Brasil propõe que suas emissões fiquem entre 850 e 1050 milhões de toneladas de carbono equivalente em 2035, com cortes de 67% e 59%, respectivamente, em relação a 2005. Tsai assinala que é uma meta muito confortável, porque 2005 foi um ano de emissões particularmente altas, devidas ao desmatamento na Amazônia. “Mesmo o limite mais ambicioso é fácil de atingir. Só com as tendências atuais, em termos de controle de desmatamento, políticas de energia e resíduos, calculamos que seria possível chegar a 650 milhões de toneladas”, aponta.
O CAT mostra, em um mapa mundi, o resultado de suas análises entre as principais economias e os maiores poluidores do planeta. A análise é dividida em cinco categorias, que correspondem às metas anunciadas: compatível com o Acordo de Paris (isto é, a meta de 1,5ºC); quase insuficiente; insuficiente; altamente insuficiente; criticamente insuficiente. Os dados são baseados nas estimativas nacionais realizadas pelo Climate Analytics, entidade que faz parte do consórcio, sobre as medidas necessárias para atingir o objetivo estipulado.
A categoria “compatível” está vazia. Entre os “quase” suficientes, há apenas sete nações: Noruega, Marrocos, Quênia, Nigéria, Etiópia, Nepal e Butão. São “insuficientes” os esforços de quase todas as maiores economias, incluindo União Europeia, Reino Unido, EUA e o Brasil. China e Índia, dois dos países que mais crescem atualmente, são considerados “altamente insuficientes”. A nota mais vermelha de todas, porém, vai para México e Argentina. Este último se retirou da COP de Baku e especula-se que possa abandonar o Acordo de Paris.
EAU e Azerbaijão, que junto com o Brasil compõem a “troika” de países que presidem a última COP, a atual e a próxima, já tiveram suas metas analisadas pelo consórcio. Foram ambas julgadas insuficientes. No caso dos Emirados Arábes Unidos, o principal problema é que praticamente todo o aumento de esforço está atribuído ao período entre 2030 e 2035. Para os próximos seis anos, nada de novo foi proposto, o que sugere uma aceleração irrealista na próxima década.
Já o Azerbaijão, que ainda não apresentou as novas metas, mas entregou uma atualização da anterior no ano passado, recebeu o selo de “criticamente insuficiente”. O país não apenas não projeta chegar à neutralidade de carbono, como ainda deve aumentar suas emissões em 20% até 2035, em parte devido ao crescimento de 30% na extração de gás.
Os países desenvolvidos não oferecem um retrato muito mais animador. A União Europeia, que revisou suas NDCs do primeiro ciclo em outubro do ano passado, aumentou as ambições para 2040, mas manteve inalteradas as expectativas para 2030, contrariando as determinações da ONU para aumentar a ambição de curto prazo. O CAT também alerta que as metas europeias são dependentes demais da captura de carbono, tecnologia considerada ainda incipiente.
“Os governos precisam entrar no modo de emergência agora”, diz a analista Maria José de Villafranca Casas, da ONG NewClimate Institute, ligada ao CAT. “As NDCs precisam ser ambiciosas e justas. Os países desenvolvidos devem acelerar as finanças climáticas, de modo crível e transparente”, acrescenta. A pesquisadora lembra que o CAT projeta um aquecimento de 2,7ºC com as metas atuais, valor que não muda desde 2021.
No fim de novembro, o governo japonês anunciou que pretende incluir em sua nova NDC um corte de emissões de 60% até 2035, comparando com os níveis de 2013. Atualmente, a meta é de 46%. Para 2050, Tóquio estima que o corte necessário será de 73%. Os números apresentados pelos estatísticos do CAT são bem mais altos: até 2035, os cortes teriam de ser de 80%.
A Suíça, por sua vez, apresentou uma atualização de suas contribuições (primeira geração) em novembro. A meta de redução de 35% nas emissões de carbono em 2030, em comparação com 1990, subiu para 50%. O CAT estima que as medidas apresentadas até agora são insuficientes para atingir até mesmo a meta anterior. Já o Reino Unido anunciou, durante a última COP, que suas contribuições revisadas envolverão um corte de emissões até 2035 de 81% em relação a 1990.