Seguindo um movimento em cadeia iniciado por Citigroup, Bank of America, Wells Fargo e Goldman Sachs, na semana passada foi a vez de a BlackRock, gestora de US$ 11 trilhões em ativos, anunciar a saída de alianças climáticas comprometidas com o Acordo de Paris e a descarbonização da economia. O movimento tem sido interpretado por analistas como uma tendência e um sinal político de empresas para fugir do confronto com o novo governo do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, que toma posse no dia 20.
Em novembro, três das maiores gestoras dos EUA - BlackRock, State Street e Vanguard - sofreram ação federal antitruste de Estados americanos republicanos. Em janeiro, foi a vez do Morgan Stanley deixar a Net-Zero Banking Alliance (NZBA) e seguir os concorrentes.
A Glasgow Financial Alliance for Net Zero (GFANZ), a maior coalizão global do mercado financeiro, foi lançada em 2021 durante a COP climática de Glasgow e opera como um guarda-chuva de várias alianças empresariais. Foi fundada pelo empresário Michael Bloomberg e pelo canadense Mark Carney, ex-presidente dos BCs do Canadá e da Inglaterra, que pode anunciar sua candidatura para substituir o primeiro-ministro Justin Trudeau nos próximos dias.
Depois do êxodo, a GFANZ decidiu mudar sua relação com os subgrupos, segundo a Bloomberg. Empresas poderão buscar a GFANZ para orientação, mas não precisarão alinhar operações com o Acordo de Paris. A GFANZ tem mais de 700 membros e se tornou alvo dos republicanos, que acusam alianças do gênero a agir como cartéis anticombustíveis fósseis.
Estas alianças sofreram baixas em 2024. A Net Zero Insurance Alliance, das seguradoras, foi descontinuada depois que a alemã Allianz, as francesas AXA e SCOR, a japonesa Sompo e a britânica Lloyds a abandonaram. Nenhuma explicou a decisão. Fontes citaram preocupações de se envolverem em disputas com republicanos.
As instituições financeiras dizem que seguirão comprometidas em ajudar o mundo na descarbonização e a reportar sobre seus esforços de atingir metas para 2030. “Essas saídas revelam a inadequação de compromissos voluntários e a urgência de regulamentação estadual”, disse à “Reuters” Vanessa Fajans-Turner, diretora da Environmental Advocates NY.
“Como habitante do planeta, lamento que instituições tão importantes estejam retrocedendo em seus compromissos ambientais, justamente no momento em que se confirma que o aquecimento ultrapassou a barreira do 1,5o C e eventos como os incêndios de Los Angeles evidenciam os enormes riscos que isso implica”, disse ao Valor Candido Bracher, executivo do setor financeiro por 40 anos.
“Mas evito fazer julgamentos sobre decisões de empresas e executivos que estão submetidos a uma circunstância política diferente da nossa.” Bracher presidia o Itaú Unibanco quando o banco, o Santander e o Bradesco se uniram para lançar o Plano Amazônia em 2020.
Eduardo Viola, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas e pesquisador sênior do IEA/USP, diz que “o efeito da vitória de Trump é devastador”. “Não só porque foi eleito presidente, mas porque tem maioria nas duas Câmaras e sua política é totalmente contrária à mitigação climática.” Contudo, “a lógica no mercado é de internalização de iniciativas de descarbonização, e isso não muda.” Viola alerta para o fato de os bancos lucrarem mais com investimentos em combustíveis fósseis do que em renováveis.
Diretora sênior de política climática federal e de programas subnacionais do WWF US, Elizabeth Lien diz que “é importante que as instituições financeiras pensem no risco climático como parte de suas responsabilidades fiduciárias”. Ela lembra que a SEC (a CVM americana) publicou regra sobre divulgação de investimentos relacionados a clima de empresas, “mas não acredito que isso avance no novo governo”. A executiva afirma que “é preocupante que essas instituições financeiras não estejam considerando o risco climático da maneira que deveriam”.