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Por , Folhapress — São Paulo


Na cidade mineira de Araxá, conhecida pelas águas termais e a fabricação de queijo, uma mineradora australiana tenta contestar o monopólio na extração de nióbio dos Moreira Salles. A família, uma das mais ricas do Brasil, é controladora da CBMM, dona de 80% do mercado mundial.

A St. George iniciou no ano passado o processo de aquisição de um projeto de extração de nióbio — metal importante para a transição energética — no município mineiro, a 360 quilômetros de Belo Horizonte, e na terça-feira (7) lançou ações na Bolsa de Sydney para captar 20 milhões de dólares australianos (R$ 76 milhões).

A empresa, controlada por investidores australianos, quer extrair 5.000 toneladas de nióbio a partir de 2027 na cidade, onde também estão as instalações da CBMM.

A quantia não representa nem 5% das 150 mil toneladas que a mineradora dos Moreira Salles consegue produzir por ano, mas a chegada da mineradora nas redondezas de uma empresa hegemônica há 60 anos é sinal de ousadia dos australianos, que disputarão mão de obra local com a CBMM.

A St. George foi fundada há 14 anos para pesquisar jazidas de lítio, níquel e cobre na Austrália. Não chegou a extrair os minerais, mantendo em seu portfólio projetos passíveis de serem vendidos para mineradoras maiores — estratégia comum entre as “junior mining companies”, como essas empresas são conhecidas.

Mas a empresa viu o valor de seus ativos caírem nos últimos anos à medida que cresciam as barreiras financeiras e tecnológicas para a transição energética — lítio, níquel e cobre são metais associados à eletrificação, alternativa de vários setores para a queima de combustíveis fósseis.

Assim, segundo Thiago Amaral, diretor da St. George no Brasil e executivo da CBMM até julho de 2024, a mineradora foi atrás de metais com mercados mais consolidados, como o do nióbio — o metal ficou conhecido entre investidores australianos após as ações de uma mineradora dispararem com a descoberta de reservas no deserto australiano.

“O nióbio traz um mercado mais estável ao longo do tempo e tem previsão de crescimento bem delineada”, diz Amaral.

O governo americano considera o nióbio o segundo metal mais crítico para a transição energética, devido a sua concentração — 90% estão no Brasil.

O mercado mundial de nióbio foi desenvolvido pela própria CBMM, que na década de 1950 encontrou grandes reservas do metal em Araxá e em 1973 firmou acordo de partilha com o governo de Minas Gerais — até hoje, 25% do lucro líquido da empresa vai para os cofres do Estado. O repasse somou R$ 1,1 bilhão até setembro do ano passado, cerca de 1% da receita do governo, atolado em dívidas com a União.

Coincidentemente, Araxá é a cidade do governador mineiro, Romeu Zema, e onde sua família iniciou seus negócios milionários.

Quase todo nióbio extraído hoje é usado na confecção de ferronióbio, matéria-prima de aços mais resistentes, como aqueles usados em gasodutos, automóveis e na indústria imobiliária. Esse tipo de aço também compõe a estrutura de turbinas eólicas e de alguns carregadores de carros elétricos.

“As torres eólicas e os motores estão ficando maiores e mais pesados, então o nióbio na estrutura da torre ajuda a aumentar sua resistência e deixá-la mais leve. Com 300 gramas de nióbio por tonelada de aço, você muda a estrutura do aço”, explica Gustavo Macedo, diretor comercial da Boston Metal e especialista no mercado de nióbio. “Economicamente falando, em termos da atribuição das propriedades, o nióbio é imbatível”.

Outra rota do metal é na produção de óxido de nióbio, matéria-prima de motores e turbinas de avião. Recentemente, a CBMM também anunciou a criação de baterias para veículos feitas a partir do óxido de nióbio — o dispositivo, ainda muito caro para ser lançado no mercado, foi recarregado em apenas dez minutos durante um teste feito com ônibus elétrico.

A mineradora dos Moreira Salles é a única das três produtoras mundiais de nióbio (ainda há a chinesa CMOC, em Goiás, e a Niobec, no Canadá) a fazer óxido. No final do ano passado, a empresa inaugurou uma planta em Araxá capaz de produzir 3.000 toneladas do material e até 2030 pretende expandir para 20 mil toneladas, já prevendo demanda por essas baterias.

A St. George ainda não bateu o martelo sobre qual rota seguirá, mas é provável que priorize a fabricação de óxido.

Independentemente de qual caminho escolher, os australianos devem encontrar barreiras. A começar pelo teor do mineral encontrado nas reservas, muito menor do que o da CBMM. Além disso, como sua produção também será em Araxá, a St. George também seria afetada por eventuais riscos de fornecimento da CBMM causados por desastres ou legislações locais — ou seja, não haveria alteração na criticidade do metal.

E os australianos sabem disso. “O nosso volume é muito pequeno, então seria muita prepotência dizer que a gente está entrando numa concorrência grande com a CBMM”, afirma Amaral. “Mas existem clientes e produtos que não são 100% atendidos pela CBMM e, por isso, acabam utilizando outros elementos em vez do nióbio. Queremos trabalhar nessas lacunas para atender nichos e, com isso, ganhar o mercado”.

Agora, a St. George tenta concluir a aquisição do projeto, de US$ 21 milhões. A tarefa não é fácil, já que no ano passado, ainda durante as negociações, a empresa tentou levantar 21,25 milhões de dólares australianos (US$ 13,3 milhões), mas conseguiu apenas 3 milhões de dólares australianos (US$ 1,87 milhão). Paralelamente, a empresa tenta também fechar um acordo de “offtake” (antecipação de recursos em troca de parte da produção) com uma “trading” chinesa.

Questionado sobre se a empresa poderia vender o projeto para outra grande mineradora, como é comum entre as “junior mining companies”, Amaral diz: “Dentro de um negócio, existe sempre a possibilidade de vendas, mas não é esse o objetivo”.

 — Foto: Ministério de Minas e Energia
— Foto: Ministério de Minas e Energia
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