A Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO - International Organization of Securities Commissions), que congrega as comissões de valores mobiliários (CVM) em mais de 130 países, incluindo a do Brasil, está reforçando sua orientação para que os membros implementem os novos padrões de contabilidade corporativa que incluem parâmetros de sustentabilidade.
Em coletiva de imprensa nesta quarta-feira (18), Jean-Paul Servais, Presidente do Conselho da IOSCO, anunciou o lançamento oficial de uma rede dedicada a apoiar a adoção ou a adaptação dos padrões internacionais de relatórios de sustentabilidade - IFRS Sustainability Disclosure Standards (Normas ISSB), com o apoio do International Sustainability Standards Board (ISSB), responsável por definir os frameworks contábeis com foco em sustentabilidade. A rede começará com um grupo de 32 membros do Comitê de Crescimento e Mercados Emergentes (GEM) da IOSCO.
A Rede GEMC para Adoção ou Adaptação de Padrões ISSB conta já com Abu Dhabi, Argentina, Bahamas, Bahrein, Bangladesh, Belize, Brasil, Brunei, Chile, China, Egito, Geórgia, Gana, Índia, Indonésia, Jordânia, Quênia, Kuwait, Malásia, México, Marrocos, Panamá, Catar, Arábia Saudita, África do Sul, Sri Lanka, Tailândia, Turquia, Uruguai, Zâmbia e Zimbábue. Outros países manifestaram interesse em aderir nos próximos meses.
"Temos visto um forte interesse de nossos membros, incluindo países emergentes, em introduzir as Normas ISSB em suas respectivas estruturas regulatórias”, comentou Servais. “Esses membros estão dispostos a implementar padrões internacionais que melhorem a consistência internacional e a comparabilidade das divulgações relacionadas ao clima e outras divulgações relacionadas à sustentabilidade para os investidores”, acrescentou.
O foco central dessa rede daqui em diante, segundo Servais explicou após questionamento do Prática ESG, será oferecer suporte especializado com a ajuda do ISSB e de outros parceiros para que as jurisdições possam entender e eventualmente aderir às novas normas. “Nós queremos contribuir para a qualidade do acesso das jurisdições à implementação dos padrões e à qualidade das informações”, destaca.
Ele comentou na coletiva que a IOSCO tem um poder de mobiliação importante para adoção de novas regras, o que foi visto, por exemplo, no apoio à própria adoção dos padrões IFRS para a contabilidade corporativa.Fundada em 1983, a IOSCO, se tornou o principal fórum internacional para as autoridades reguladoras dos mercados de valores e derivativos, sendo reconhecida hoje como o principal ´órgão de padronização internacional em matéria de mercado de capitais.
A Comissão de Valores Mobiliários brasileira, que é um dos membros da nova rede, foi um dos primeiros países do mundo a aprovar a inclusão de dados ESG (sigla em inglês para questões ambientais, sociais e de governança corporativa) nos formulários de referência de empresas de capital aberto e também exigir, a partir de 2026, que as empresas de capital aberto divulguem juntamente com seus relatórios financeiros também dados contábeis de Sustentabilidade.
Um exemplo de informação que passará a ser cobrada é a do inventário de emissões de gases de efeito estufa (GEE). O objetivo, segundo o órgão explicou na época, é dar mais transparência sobre o impacto ambiental das empresas e permitir ao investidor e à sociedade comparar a atuação de diferentes companhias.
Na coletiva de imprensa, o Brasil foi citado como um dos países do grupo mais avançado na implementação das Normas ISSB, ao lado de Turquia, China, Chile, Arábia Saudita, e outros.
Emmanuel Faber, presidente do ISSB, diz ter ficado contente com o interesse crescente especialmente dos mercados emergentes em adotar as normas globais de divulgação de sustentabilidade do órgão. Ele destacou a importância da colaboração com a IOSCO, ajudando as jurisdições a alinhar suas exigências de divulgação com as normas globais, o que facilitará o acesso a investidores e oportunidades globais. “Esse avanço também beneficiará as empresas multinacionais, que terão acesso a dados comparáveis ao longo de suas cadeias de suprimentos, facilitando o comércio.”
A International Financial Reporting Standards (IFRS), quem dita as regras contábeis usadas em mais de 140 países, incluindo o Brasil, trabalha há alguns anos em frameworks que considerem os múltiplos aspectos ESG nos relatórios de divulgações contábeis de empresas. A materialização da emergência climática, com a frequência de eventos extremos crescendo ao redor do mundo, acelerou o processo.
Em resposta à demanda dos investidores e outros participantes dos mercados de capitais mundiais por informações comparáveis e úteis para decisões, em junho de 2023, o ISSB publicou suas normas relacionadas à sustentabilidade. Ainda em 2023, a IOSCO endossou as Normas ISSB para uso no mercado de capitais e solicitou a seus membros que considerassem maneiras pelas quais poderiam adotar, aplicar ou ser informados pelas Normas ISSB em suas jurisdições.
Desde o endosso da IOSCO, um total de 56 mercados, tanto desenvolvidos quanto emergentes, já tomaram medidas para adotar ou usar as Normas ISSB, sendo que metade deles já finalizou a adoção das Normas ISSB. Juntos, esses países representam quase 60% do PIB global, mais de 40% da capitalização de mercado global e mais da metade das emissões globais de GEE (gases de efeito estufa).
Em 2024, a IOSCO intensificou sua colaboração com o ISSB e com o Banco Mundial para ajudar as jurisdições a adotarem os padrões do ISSB. Em maio de 2024, a Fundação IFRS lançou o Guia Jurisdicional e o Esboço do Programa de Implementação Regulatória, que têm sido recursos valiosos para as jurisdições. Desde então, a IOSCO tem apoiado essas jurisdições com um programa de capacitação aprimorado, ajudando-as a desenvolver a experiência necessária para adotar os padrões ISSB.
Aqui no Brasil, em novembro de 2023, a CVM lançou o “Plano de Ação de Finanças Sustentáveis: a Resolução CVM nº 193”, que trata sobre a elaboração e divulgação, pelas companhias abertas, companhias securitizadoras e fundos de investimento, de relatórios de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade. Em 20 de outubro, publicou, oficialmente, a Resolução CVM Nº 193 com detalhes.
Próximos standards
Questionado sobre quais os próximos standards IFRSS que serão divulgados pela ISSB, Emmanuel Faber, do ISSB, afirmou que o foco até 2026 será na implementação do que já foi lançado, o IFRS S1 e IFRS S2. No caso do S1, o texto discorre sobre as divulgações de sustentabilidade em geral, abrangendo temas como estratégia, governança, riscos, oportunidades, desempenho e metas ESG.
Já o S2 trata especificamente das divulgações relacionadas ao clima, exigindo que as empresas divulguem informações sobre o impacto climático das suas operações, como, por exemplo, emissões de gases de efeito estufa, exposição a riscos climáticos, estratégias de mitigação, processos, controles e procedimentos de governança e outras.
O mapeamento das cadeias de fornecedores ainda é um desafio para empresas divulgarem informações de impacto mais fidedignas. A despeito das jurisdições do GEM da IOSCO terem se interessado em adotar parâmetros para a cadeia de valor, Mohamed Farid Saleh, Presidente do Comitê GEM e vice-presidente do Conselho da IOSCO comenta na coletiva que a complexidade é maior. “Ainda vamos evoluir para ver com mais clareza os riscos e oportunidades da cadeia de suprimentos. Mas falamos com reguladores que querem ver isso e a enxergam como uma oportunidade. Nossa plataforma consegue adotar uma linguagem comum que pode ajudar a cristalizar melhor os riscos e oportunidades”, diz.
Contudo, Faber, da ISSB, explicou que há temas que também estão sendo discutidos e que serão tratados em algum momento em novas normas, como o capital humano (e entra aí respeito a direitos humanos) e capital natural (natureza e biodiversidade).
Outro aspecto que deve ser objeto de análise mais profunda é a parametrização do setor industrial.“Há uma clara necessidade de discussões da indústria especificamente”, apontou. “Nós estamos trabalhando agora para trazer algo apropriado para os standards da indústria em si.” E acrescentou que o SASB (Conselho de Padrões Contábeis de Sustentabilidade), um framework com detalhamentos setoriais e que é um bom ponto de partida.
“Tenho certeza que teremos uma abordagem comum para desenhar os padrões setoriais. Precisamos dar informações para a indústria se comparar com seus pares”, comentou Servais, da IOSCO.