Existe um bordão famoso entre as startups que tenta ressignificar a nossa relação com o erro: “erre rápido, aprenda rápido”. A ideia é que, em vez de encararmos uma falha com culpa e vergonha, nós deveríamos tratá-la como algo natura e, principalmente, como fonte de aprendizado. É só quando tropeçamos que aprendemos a levantar.
No entanto, se de fato a vida funciona assim, por que continuamos caindo nos mesmos lugares? Por que depois de sacudir a poeira da roupa, nos erguer e ver o que nos derrubou, levamos um novo tombo?
Sei que é frustrante admitir isso, mas a verdade é que, por mais que tantos bordões sugiram o contrário, não é tão simples assim aprender com os erros e mudar de rota. O que não significa que você e eu devemos nos conformar, é claro.
O meu ponto é que, talvez, exista uma visão um pouco simplista por trás da cultura do erro no mundo corporativo, o que pode atrapalhar o progresso individual e a empresa. Veja, não é que toda essa “filosofia” está equivocada, não estou afirmando que, na verdade, somos incapazes de aprender com as experiências mal sucedidas e vamos ficar em uma repetição eterna. Contudo, acho que precisamos conversar abertamente sobre quão desafiador é, de fato, aprender com as nossas falhas e fazer diferente da próxima vez. E essa dificuldade não tem a ver com falta de vontade ou de resiliência, mas com a nossa natureza.
Sim, errar é humano, mas repetir o erro também. Então, como é que quebramos esse ciclo de vez? Porque, convenhamos, em um ambiente de negócios competitivo, não dá para nos conformamos com um looping eterno de falhas - as empresas demandam bons resultados.
Existe um termo cunhado pelo psicanalista Sigmund Freud que se relaciona de alguma forma com esse fenômeno e que pode nos ajudar na resolução desse dilema: a “compulsão da repetição”. Tal conceito não foca especificamente nessa questão do “apego” aos erros, mas explica como eventos e experiências, muitas vezes traumáticos ou não resolvidos, podem nos levar a reviver situações semelhantes de forma inconsciente. Para Freud, repetimos não porque queremos, mas porque há algo em nosso inconsciente que tenta dominar ou elaborar eventos pendentes.
Hoje em dia, estudos na área da psicologia cognitiva olham para essa questão com uma perspectiva mais neurológica e comportamental. Descobriu-se que, ao revisitarmos nossos erros, criamos caminhos neurais que podem reforçar padrões negativos em vez de nos ajudar a evitá-los no futuro. O cérebro, muitas vezes, prioriza compreender o que deu errado, mas nem sempre chega à solução prática, o que nos mantém presos a ciclos repetitivos.
Diante disso, o que fazer? Como líderes, precisamos não só aprender a superar esse ciclo vicioso, mas ajudar a nossa equipe a driblar barreiras - e a boa notícia é que isso é possível.
Apesar de termos uma tendência de repetir os nossos erros, existem algumas formas de, aos poucos, rompermos o padrão. Uma delas é criar um sistema de reflexão estruturada, que não apenas analise o que deu errado, mas também explore as circunstâncias e decisões que levaram ao resultado indesejado. Estudos mostram que o simples ato de revisar um erro pode ajudar a evitar repetições, desde que haja um esforço consciente em conectar a falha a ações concretas para o futuro.
Outra estratégia é buscar perspectivas externas. O feedback de colegas ou mentores ajuda a identificar padrões que podem estar atrapalhando o trabalho, mas que são difíceis de enxergar por conta própria. Escutar a perspectiva de outra pessoa ajuda a ter insights sobre a resolução de problemas, descobrir outras formas de lidar com uma situação e ampliar nossa visão sobre alternativas.
Há ainda uma abordagem que visa uma mudança de foco: em vez de fixar-se no erro, relembre os acertos. Não se trata de ter “pensamento positivo” para atrair boas coisas. Existe uma lógica por trás dessa ideia.
Em uma série de experimentos realizados pela pesquisadora Kelly Haws, da Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos, foi verificado que a obsessão pelo fracasso tem, naturalmente, um impacto grande sobre o nosso bem-estar. E com o desânimo proveniente dessa situação, vem também uma tendência de “pisarmos na jaca”. Isso porque, ao focarmos excessivamente nos erros, criamos um ciclo de autossabotagem que piora a nossa autoestima e diminui a motivação, gerando mais erros.
Sendo assim, uma boa ideia pode ser lembrar dos acertos. Como foi a jornada de um projeto bem-sucedido? Quais foram as práticas que garantiram um bom alcance de resultado? Como foi a interação entre a equipe? Neste caso, recordar o passado - mais especificamente, o seu aspecto positivo - não tem a ver com um saudosismo ou romantização, mas com a busca dos fatores que conduziram ao sucesso a fim de reforçar as boas práticas e resgatar a confiança perdida.
Com essas dicas, espero que aquela angústia de cometer as mesmas falhas fique no passado. Desejo também que, em 2025, nós possamos construir uma cultura que saiba realmente lidar com os erros e, sobretudo, relembre constantemente dos acertos para que estes, sim, nos guiem ao longo do ano.
Sofia Esteves é fundadora da Cia de Talentos, Bettha.com e Instituto Ser+