Ana Paula Padrão ainda se lembra do conselho da mãe, Shirley Padrão, uma radialista que largou a profissão para construir a sua família, de que “uma mulher que não gera a própria renda, não pode fazer as próprias escolhas”. A primogênita do lar de três filhos se orgulha de aos 59 anos ter levado a sua vida do jeito que queria.
E foram muitas escolhas como o de deixar Brasília para atuar como correspondente internacional da Globo em Londres, o de retornar ao Brasil para iniciar a carreira como âncora do telejornal do fim da noite na emissora e o de se reinventar como apresentadora de entretenimento.
Recentemente, após dez anos no comando do reality de culinária MasterChef Brasil, ela surpreendeu mais uma vez os seus admiradores ao anunciar que seguiria um novo rumo. Ana Paula investe agora em outras mulheres por meio de uma escola de cursos de liderança feminina.
"Para que tenhamos sociedades mais justas, a participação da mulher no âmbito profissional deve ser mais sólida e numericamente mais relevante. Como fazer isso? Mostrando para elas que há instrumentos para administrar segurança, conforto e ambição - no sentido mais puro da palavra - com outras qualidades historicamente consideradas mais femininas. Ou seja, você pode ser quem deseja ser e ter uma carreira de sucesso, sendo respeitada pelos seus pares e tendo resultados eficientes, e ainda ter uma vida familiar equilibrada”, explica.
Ela também fala com propriedade sobre essa dosagem entre o lado profissional e pessoal. Após anos com uma rotina voltada para o jornalismo, o entretenimento lhe deu a oportunidade de administrar melhor o seu tempo e dar a atenção que desejava Ana Paula fora das câmeras.
“Nada como cuidar da vida pessoal para ter uma vida profissional produtiva e plena. Há um ano, meu marido foi assaltado e se machucou muito gravemente na fuga. Não pensei no que eu deveria fazer naquele momento. Parei minhas atividades e fiquei com ele, em casa, garantindo a recuperação plena depois do período de risco que passamos. Minha vida é minha vida e entendo meu trabalho como outra coisa. Trabalho é muito importante, mas não me define”, pontua ela, casada com Gustavo Diament.
Em entrevista exclusiva para a Quem, Ana Paula relembrou a trajetória profissional e como chega no ano que vem aos 60 anos. “Enxergo o etarismo, mas não me permito ser vítima dele. Não serei uma pessoa invisível! Continuarei trabalhando como um agente provocador e isso me dá muito prazer. Espero que se lembrem de mim, quando eu não estiver mais aqui, como uma mulher que fez as próprias escolhas e bancou as consequências delas em todas as etapas da vida. Uma mulher que não atendeu ao que se esperava dela e construiu um caminho individual e sólido. Espero inspirar outras mulheres a escolherem por si", diz.
Você surpreendeu a todos ao anunciar sua saída do MasterChef. Há quanto tempo vinha cozinhando esse desejo e o que te fez tomar essa decisão?
Nunca desejei sair do MasterChef. Adoro o programa e os amigos que fiz ali são para a vida toda. A oportunidade que apareceu para mim fora do Master e que me seduziu é que justificou a minha saída. Há pelo menos 20 anos estudo o comportamento feminino como uma agenda paralela ao meu trabalho e não cheguei a imaginar que ela um dia se tornaria minha atividade principal. Quando a Conquer Business School me propôs montar uma nova unidade de negócios apenas para cursos de liderança feminina, a Conquer Unna, optei por me dedicar a isso 100%. Transformei propósito em trabalho e estou muito feliz com essa decisão.
O que você pode nos contar sobre isso?
Já lancei o meu primeiro curso nesta escola para formação de liderança feminina, que entrega habilidades técnicas para mulheres que querem dar o próximo passo na carreira e também ferramentas de soft skills para manejar esse compromisso com a administração da vida profissional. Temos neste momento 600 alunas e vamos lançar outros cursos ao longo de 2025. Temos uma metodologia muito baseada em formação de rede e engajamento, coisas que não são práticas usuais para mulheres porque elas têm sempre a agenda muito lotada com a administração de várias frentes e jornadas. Ensinamos como fazer isso e construir relacionamentos profissionais duradouros com outras mulheres.
Como pessoa pública, sua luta sempre foi o de empoderar outras mulheres?
Acredito que mais mulheres líderes fazem empresas mais diversas e resultados melhores para todos - inclusive para os acionistas. A lógica da mulher é mais plural. Para que tenhamos sociedades mais justas, a participação da mulher no âmbito profissional deve ser mais sólida e numericamente mais relevante. Como fazer isso? Mostrando para elas que há instrumentos para administrar segurança, conforto e ambição - no sentido mais puro da palavra - com outras qualidades historicamente consideradas mais femininas. Ou seja, você pode ser quem deseja ser e ter uma carreira de sucesso, sendo respeitada pelos seus pares e tendo resultados eficientes, e ainda ter uma vida familiar equilibrada.
Sua mãe era radialista, mas parou de trabalhar após se casar. Você foi atrás da sua realização profissional antes da pessoal. Como a sua mãe de influenciou ou te inspirou a buscar sua realização?
Nunca vi a mãe profissional das fotos da época do radialismo. Ela parou de trabalhar quando nasci e não tive essa experiência de ter uma mãe que se dividia entre as tarefas do cuidado e da carreira. Mas ela sempre me disse que eu nunca deveria depender de outra pessoa para sobreviver e que a liberdade financeira ditava a nossa possibilidade de escolhas. Esse conselho guardei, segui e considero válido para qualquer geração de mulheres. Quando uma mulher não gera a própria renda, não pode fazer as próprias escolhas.
"Quando uma mulher não gera a própria renda, não pode fazer as próprias escolhas"
Ser âncora de um jornal exige muito. Como era a sua rotina naquela época?
Muito dura, mas não mais intensa do que a de hoje. Algo que consigo administrar bem melhor agora são meus fins de semana e momentos de férias. No jornalismo, quando uma notícia acontece, você se voluntaria para estar na redação cobrindo aquele fato. Em outras profissões é mais tranquilo preservar seus momentos de lazer. Apesar de ser uma pessoa que tem alguma dificuldade em lidar com o ócio, hoje sei o quanto é importante, inclusive para a produtividade, descansar e tento preservar esse tempo para mim.
Você conseguia ter uma vida social e pessoal como outra pessoa qualquer ou teve que abrir mão disso para se realizar profissionalmente?
Não sou uma pessoa especialmente social, que precisa estar em grupo sempre ou que não abre mão de festas e shows. Um fim de semana normal meu começa na sexta-feira, em casa, depois do trabalho, e termina ainda em casa, na segunda de manhã, quando vou para o trabalho. Não faço questão de sair e por isso não considero ter aberto mão de atividades sociais para exercer meu lado profissional - que é público. Faço tudo que qualquer pessoa faz durante a semana com a diferença que me pedem muitas fotos no meio do caminho e acho esse um gesto de carinho dos meus seguidores e fãs.
Quando você saiu do jornalismo, você queria, além de um novo desafio, ter mais tempo para a sua vida pessoal. Qual a importância de cuidar do pessoal também para alcançar a realização profissional?
Nada como cuidar da vida pessoal para ter uma vida profissional produtiva e plena. Há um ano, meu marido foi assaltado e se machucou muito gravemente na fuga. Não pensei no que eu deveria fazer naquele momento. Parei minhas atividades e fiquei com ele, em casa, garantindo a recuperação plena depois do período de risco que passamos. Minha vida é minha vida e entendo meu trabalho como outra coisa. Trabalho é muito importante, mas não me define.
O que ainda mantém daquela rotina do jornalismo no seu dia a dia?
Não acho que mantenha grandes rotinas do jornalismo… O que mantenho é o apego à verdade, ao gosto pelo diálogo, à disposição para ouvir os diversos pontos de vista sobre uma questão. Me preocupam as fake news e a falta de disposição generalizada em separar o que tem fundamento do que é simplesmente uma invenção. E me aborrece muito que qualquer conversa tenha como objetivo final a desqualificação do interlocutor e não a escuta atenta para que cada um tenha mais argumentos para reforçar seus próprios pontos de vista. Todo mundo perde com a radicalização.
No entretenimento, você tem o desejo de fazer um programa de entrevistas, voltado para a mulher?Nunca pensei detidamente sobre isso. Sou de avaliar possibilidades que se apresentam - bem mais do que planejar o que eu gostaria de fazer e às vezes não cabe nas expectativas do mercado. Trabalho com o possível - e o possível não é pouco.
"Temos vários lados e exercitar todos eles é uma libertação"
O que vimos só após sua transição para o entretenimento foi uma versão sua mais leve, livre e solta. Como foi deixar seu lado mais sensual aflorar sem medo de julgamentos?
Eu certamente tinha uma couraça do jornalismo que me impedia de me emocionar em público. Aprendi a transmitir notícias sem me deixar abalar visivelmente por elas. No entretenimento, compreendi que a emoção fazia parte do relacionamento que eu devia estabelecer com a audiência, o que me fez muito bem porque pude ser mais parecida comigo, ou seja, mais bem-humorada, risonha, piadista, provocativa, ácida e sensual, enfim, uma pessoa mais real do que a do jornalismo. Temos vários lados e exercitar todos eles é uma libertação.
Você faz 60 anos no ano que vem. Correspondeu as suas expectativas chegar a essa idade?
Caramba, eu acho que não tinha expectativas sobre os 60, mas acho que a proximidade está sendo melhor do que nas gerações anteriores. Temos mais visibilidade, estamos deixando pra trás a invisibilidade das mulheres na maturidade e continuamos ativas profissionalmente. Temos voz social, temos propósito e estamos no caminho de mostrar que escolhemos estar aqui e bancamos essa escolha e suas consequências. Cada vez que uma mulher mais velha se expõe do jeito que acha adequado para ela, está mostrando que não há expectativa de papel social mais forte do que a decisão individual e isso é muito bom para mudar a cultura. Somos livres e estamos exercendo essa liberdade. Isso incomoda muita gente? Sim! Mas nunca houve movimento de mudança de cultura que não gerasse estresse e ranger de dentes. Me sinto muito feliz em fazer parte dessa geração e estarei na arena enquanto tiver vontade e fazendo o que tiver vontade. Os incomodados que se incomodem.
Como você lida com o etarismo?
Enxergo o etarismo, mas não me permito ser vítima dele. Não serei uma pessoa invisível! Continuarei trabalhando como um agente provocador e isso me dá muito prazer. Espero que se lembrem de mim, quando eu não estiver mais aqui, como uma mulher que fez as próprias escolhas e bancou as consequências delas em todas as etapas da vida. Uma mulher que não atendeu ao que se esperava dela e construiu um caminho individual e sólido. Espero inspirar outras mulheres a escolherem por si.
Sou de 1982, lembro que na minha época muitas mulheres aos 60 se fechavam para o amor. Você está muito bem com o Gustavo Diament. É mais gostoso viver uma história de amor nesta fase?Certamente estou mais preparada para viver um relacionamento mais real e baseado em uma decisão do que tentar replicar um amor romântico que só existe nos livros e filmes de Hollywood. A convivência cotidiana não é simples e não pode depender de algo etéreo: o que a gente constrói a dois tem que ter fundamentos acordados, debatidos e batalhados sempre. Amar é uma decisão. Seja fiel à sua decisão e não espere que te entreguem a felicidade, ela é responsabilidade sua. Adoro a vida a dois, amo a possibilidade de ter projetos domésticos conjuntos e ser feliz apenas observando o outro e seus movimentos.
"Meu jeito de maternar é outro: sou mãe de projetos, de ideias, de pessoas que caminham comigo..."
Como foi entrar na menopausa. Foi complicado ou conseguiu fazer essa transição de forma tranquila?
Para mim foi tranquilo porque planejei esse momento da minha vida. Procurei médicos especialistas para cuidar de mim antes de entrar no climatério e optei, com a assistência deles, na hora certa, pela reposição hormonal. Não tive sintomas incômodos da menopausa que são comuns nas mulheres da minha idade e acredito que isso se deva ao que antecipei em tratamentos e cuidados específicos para essa fase da vida.
Em relação aos sonhos, ser mãe é um deles?
Nunca pensei em adotar filhos. Não acho que eu tenha uma vocação frustrada para a maternidade. Meu jeito de maternar é outro: sou mãe de projetos, de ideias, de pessoas que caminham comigo, de mulheres que querem ser autônomas e precisam encontrar modelos para isso. Sou bastante feliz com essa decisão, não permito cobrança sobre ela e também não faço disso uma bandeira. Não acho que mulheres tem que ser ou não tem que ser mães. É uma decisão que deve ser vocacionada. Serei uma pessoa realizada tendo filhos? Ótimo! Serei uma pessoa realizada não tendo filhos? Ótimo também. No dia em que pararem de cobrar que mulheres devem ser assim ou assado teremos uma sociedade mais justa, menos machista e menos pesada individualmente para todos.