O período entre o fim de um ano e o início do outro costuma motivar as pessoas a considerar o que querem fazer no ciclo que está começando. Um desses planos pode ser finalmente tirar do papel aquela ideia de empreender e fundar uma startup.
Como o ecossistema tem uma dinâmica particular, com agentes que atuam em fases distintas, desenvolvemos um guia com informações sobre os caminhos possíveis para fundadores que estão na fase inicial do negócio, de incubadoras e hubs de inovação até as rodadas de investimento.
É importante ressaltar que esse tipo de jornada não é obrigatório – existem startups de sucesso que não passaram por essas etapas –, mas as iniciativas podem auxiliar os fundadores que enfrentam dificuldades para estruturar os empreendimentos por conta própria. “Quem está empreendendo precisa ter claro qual é a necessidade, qual é o gap de conhecimento e onde precisa de apoio para crescer mais depressa”, aponta Maria Rita Spina Bueno, conselheira da Anjos do Brasil.
Ela afirma que, se há alguns anos, os programas eram mais genéricos e tentavam abraçar todos os tópicos, mas o cenário mudou com o amadurecimento do ecossistema brasileiro. “Existem iniciativas que olham para casos individuais e ajudam o empreendedor, e outras especializadas por vertical ou estágio. Mas isso exige do time fundador uma visão clara de suas forças e fraquezas”, pontua.
Neste texto você vai entender o que são:
- Incubadoras
- Hubs de inovação
- Aceleradoras
- Venture builders
- Investimento anjo
- Equity crowdfunding
Incubadora
As incubadoras costumam estar associadas a universidades, como o SandPit do Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). São iniciativas que costumam apoiar startups em fase inicial e que precisam de um espaço físico para fazer suas pesquisas. Também oferecem mentorias em aspectos técnicos do desenvolvimento do produto ou serviço e em assuntos como gestão, finanças e desenvolvimento do modelo de negócio.
“A incubadora foca nos estágios iniciais, quando a startup tem apenas uma ideia, mas nada concreto. Depois do processo, os empreendedores desistem dela ou se sentem mais seguros para continuar porque o produto ou serviço está mais maduro, o modelo de negócio está mais claro e já conseguiram alguns clientes,”, afirma Cristiano Coelho Araújo, professor adjunto da UFPE e coordenador do Sandpit.
O tempo da incubação vai variar de acordo com a instituição, podendo ir de alguns meses a um ano, com casos de tecnologias mais sofisticadas ultrapassando esse período. No caso da UFPE, os fundadores precisam ter algum vínculo com a universidade para se inscrever – ex-alunos precisam ter se formado há menos de cinco anos para ingressar. As interessadas passam por um processo seletivo em que especialistas avaliam o produto proposto, o modelo de negócios e a equipe, a fim de determinar se há potencial ou se é apenas um projeto de pesquisa.
Startups com faturamento inexistente ou mínimo não precisam pagar para participar, mas aquelas que já registram faturamento fazem um pagamento variável e proporcional. A empresa também pode precisar pagar royalties se licenciar a tecnologia à universidade.
Araújo conta que, no momento, a incubadora tem quatro startups: iCure, que desenvolve uma solução para diagnóstico inteligente de feridas para clínicas e enfermeiros; CloudInControl, que criou uma solução para o hóspede controlar o quarto do hotel e ter acesso aos serviços do estabelecimento pelo celular; InSpace, que utiliza realidade aumentada e inteligência artificial para criar ambientes industriais mais seguros, identificando riscos; e LoveCripto, que atua na popularização das criptomoedas e blockchain no dia a dia a partir da transferência de renda internacional.
Aceleradora
A aceleradora auxilia fundadores que já têm um negócio, mas ainda não se sabem exatamente a melhor forma de vender ou estão com dificuldade para amadurecer o empreendimento e crescer. As organizações montam times para ajudar os empreendedores a encontrar os erros da jornada, além de facilitar o contato com pessoas do ecossistema.
Geralmente, as aceleradoras trabalham com programas que duram entre quatro e 12 meses. Elas podem procurar por setores ou estágios específicos, mas nem sempre é o caso. A WOW Aceleradora, por exemplo, costuma fazer investimentos entre R$ 100 mil e R$ 500 mil nas startups que se destacam em seus programas.
“É um investimento em troca de participação acionária. Somos o primeiro cheque institucional da startup, por um percentual que gira entre 4% e 10% da empresa. O modelo de negócio de uma aceleradora envolve dinheiro e conexão em troca de participação, o que não inviabiliza a jornada de captação das startups se forem seguir essa trilha”, afirma Filipe Garcia, COO da aceleradora. A ideia é aparar as arestas para que a startup siga a sua jornada de crescimento a partir da captação com fundos de venture capital.
A WOW aceita startups desde o MVP ainda sem receita até as que faturam no máximo R$ 100 mil por mês.
Venture builder
As venture builders participam mais de perto do dia a dia das startups, contribuindo com as decisões que a empresa toma em tópicos como organização, governança e estruturação. “Fazendo uma analogia, é como se a aceleradora fosse uma loja de departamento que te oferece tudo o que está no mercado, mostrando o que cada peça pode fazer para o seu negócio. A venture builder traz para dentro o que a startup realmente precisa, junto de estratégia, planejamento e conexões para alavancar o negócio”, diz Carolina Gilberti, CEO da Mubius WomenTech Ventures, focada em startups fundadas ou lideradas por mulheres.
Cada venture builder tem uma tese de mercado, podendo atuar em setores específicos. A seleção é parecida com a curadoria feita pelos fundos de venture capital: avalia-se o potencial da ideia e as pessoas fundadoras, além de fatores como tamanho do mercado, disrupção e concorrência.
Uma vez dentro, as startups precisam bater metas e trocam com a equipe da venture builder sobre os desafios que enfrentam. Em média, esse relacionamento de sociedade estratégica dura cerca de cinco anos. E atente-se ao termo sociedade: a startup precisa dar parte do equity para a instituição.
“O modelo de negócio é baseado na negociação de uma pequena parcela do equity que pode variar entre 5% e 10%, podendo ser um pouco mais, a depender do estágio. Quanto mais no início a startup estiver, maior é o equity. Depende muito de quanto a venture builder vai despender de tempo, conhecimento e investimento econômico dentro da startup”, aponta.
Maria Rita Spina Bueno chama atenção para a prática de ceder equity. “É justo porque você recebeu ajuda, mas não tenha medo de negociar a fatia porque quem está no ecossistema quer apoiar bons negócios e times excelentes. Se você não tem um foco claro e não sabe do que precisa, 1% de equity já é caro. Quem está perdido, ouve todo mundo e aceita qualquer coisa”, frisa.
Hub de inovação
Um hub pretende fomentar a cultura de inovação a partir da conexão entre startups e com corporações, disseminando conhecimento e informações sobre o ecossistema para os seus membros e criando desafios para gerar oportunidades de negócio.
“Ele busca materializar um espaço de convergência para que oportunidades, talentos e tecnologias possam encontrar solo fértil para seus desenvolvimentos. É a efervescência dos atores do ecossistema”, declara Pedro Valério, CEO do Instituto Caldeira, localizado em Porto Alegre (RS). Ele acrescenta que a curadoria é pautada no estágio da interessada para entender como o hub pode gerar valor e como a empresa pode contribuir para a comunidade.
Atualmente, o Caldeira conta com 470 membros associados, que pagam a partir de R$ 1,6 mil para integrar o hub. Além do espaço físico – que pode variar de postos avulsos a salas fixas para equipes maiores –, a instituição promove eventos e encontros com especialistas. Não existe limitação de tempo para estar inserido no hub, mas o aproveitamento varia de acordo com o estágio da startup.
Entrevistas com investidores:
Investimentos iniciais
A busca por uma das iniciativas listadas anteriormente pode acontecer ao mesmo tempo em que a startup inicia a jornada de captação de investimentos. Normalmente, para fundar a empresa e começar os testes do produto ou serviço, busca-se levantar uma rodada com amigos e familiares (friends and family) ou os fundadores fazem um aporte inicial do próprio bolso.
Depois disso, além dos editais de subvenção, existem algumas opções de investimento antes de partir para os fundos de venture capital.
- Investimento anjo
“Quando a solução e o modelo de negócios começa a dar indícios de que pode ser viável, é necessário mais investimento e também mais apoio de mentorias, abertura de portas, conhecimento do mercado”, indica Rubens Approbato, presidente e cofundador do Poli Angels, grupo de investidores-anjo fundado por ex-alunos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo .
Esses são os investidores procurados quando a startup precisa de direcionamento, suporte e contatos. A ideia é aumentar a chance de sucesso a partir da troca com os anjos, que costumam ter experiência em negócios. Para Approbato, o estágio ideal para esse tipo de investimento é antes de encontrar o ajuste do produto.
As pessoas fundadoras podem encontrar investidores que atuam de forma individual ou buscar grupos de anjos – nesse caso, é possível se inscrever para passar pela curadoria e participar dos eventos de apresentação de pitch. Se os investidores se interessarem, um grupo de análise é formado para avaliar a startup de forma mais profunda. Caso o aporte aconteça, um conselho consultivo costuma ser constituído com os anjos para acompanhar a empresa.
Como uma coisa não exclui a outra, Approbato aponta que startups que tenham participado de programas de aceleração bem avaliados recebem atenção especial. Spina Bueno concorda: “Depende da reputação da aceleradora ou do hub a que a startup se associa. Como anjos, adoramos quem vem com planilha de faturamento detalhada, planejamento para os próximos anos, porque podemos focar na análise do futuro em vez de olhar para problemas do passado. Dá a sensação de que essas pessoas têm clareza do negócio e traz confiança de que serão capazes de levá-lo a outro estágio. Mas, se a empresa passou por 10 programas diferentes, analisamos por que a startup ainda não se encontrou”, finaliza.
- Equity crowdfunding
As plataformas de equity crowdfunding permitem que o público geral invista e se torne sócio de startups. A atividade é restrita a algumas plataformas que são reguladas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e as captações podem durar até seis meses.
De acordo com Camila Nasser, cofundadora e CEO da plataforma Kria, o momento ideal para captar por equity crowdfunding é do seed à Série A, quando a startup já validou a proposta e está iniciando a trilha de tração. As rodadas giram entre R$ 1 milhão e R$ 5 milhões, com a plataforma ficando com uma taxa de 5% a 10% do volume alocado.
“É importante que a empresa já esteja operando, não seja apenas uma ideia. Os empreendedores precisam idealmente estar com dedicação integral ao negócio e terem validado a proposta do produto ou serviço no momento de captação”, diz.
Para ter a sua captação listada na plataforma, é preciso passar por uma análise do time. Nasser conta que menos de 2% das startups que se candidatam são aprovadas. Ao fim, o Kria também investe em todas as empresas que captam pela plataforma.