A alta do dólar e dos juros no Brasil pode criar desafios significativos para as pequenas e médias empresas (PMEs), afetando desde o custo do crédito até a viabilidade de operações que dependem de importações. Para 2025, especialistas apontam que o cenário exige estratégias cuidadosas para mitigar os impactos econômicos.
O mercado projeta que a moeda americana se estabilize próxima de R$ 6,00 em 2025, mas fatores como guerras internacionais, o protecionismo nos Estados Unidos e o cenário fiscal no Brasil dificultam previsões mais concretas. O Itaú, no fim de novembro, subiu as estimativas para o dólar em 2025 de R$ 5,20 para R$ 5,70. Do mesmo modo fizeram o Santander e BTG, que subiram suas projeções, fixando os valores em R$ 5,80 e R$ 6,25, respectivamente.
De acordo com Gilberto Braga, professor de Economia do Ibmec-RJ, o aumento do dólar afeta não apenas empresas que importam diretamente insumos, mas também toda a economia, ao elevar a inflação. "Boa parte da tecnologia utilizada, como softwares, licenças e componentes de equipamentos, depende de importação. Com o dólar mais caro, os custos sobem, impactando desde a produção até os combustíveis, cuja conta é dolarizada", aponta Braga.
Neste caso, para empresas, fazer hedge cambial (proteção cambial) é uma alternativa, mas, sempre que possível, outra medida paliativa é substituir fornecedores estrangeiros por nacionais ou por parceiros de países cuja moeda também sofreu desvalorização frente ao dólar (como na Europa), avalia Marcelo Milech, planejador financeiro CFP pela Planejar.
Segundo a FecomercioSP, a solução de alocar recursos futuros em fundos de investimento lastreados em moedas internacionais é positiva. Contudo, a entidade alerta que o empreendedor deve separar ganhos operacionais de ganhos financeiros. "A empresa precisa gerar lucro com sua atividade principal e manter o negócio saudável. Não é sustentável especular com moedas utilizando recursos do caixa."
Por sua vez, João Branco, professor de Economia da ESPM, detalha que o impacto do câmbio dependerá do perfil de cada PME. Empresas exportadoras podem se beneficiar da desvalorização do real, tornando seus produtos mais competitivos no mercado internacional.
Por outro lado, negócios dependentes de importados enfrentam um cenário mais desafiador. "PMEs que importam e vendem no mercado interno estão no pior cenário. Nesse caso, a prioridade deve ser gerenciar estoques com cautela, evitar compras durante a alta do dólar e, sempre que possível, buscar alternativas locais", orienta Branco.
No cenário internacional, políticas protecionistas como as propostas pelo presidente eleito Donald Trump podem gerar impactos adicionais. "Se os Estados Unidos elevarem tarifas de importação, haverá aumento de custos para produtos estrangeiros, inclusive brasileiros. Isso pode dificultar exportações de PMEs brasileiras para o mercado norte-americano", explica Fábio Pasavento, doutor em economia pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e professor da ESPM.
Qual a expectativa para o cenário fiscal e o peso dos juros?
Em relação a Selic, que encerra o ano em 12,25%, o consenso do mercado estima uma subida do aperto monetário no próximo ano. Conforme Boletim Focus, a taxa básica de juros esperada no desfecho de 2025 subiu de 13,50% para 14%.
Para Braga, do Ibmec-RJ, a elevação dos juros torna o crédito mais caro e dificulta o acesso a financiamentos para as PMEs, devido a análises mais restritivas. "Isso exige cautela na contratação de empréstimos, especialmente em um cenário de dólar elevado, que também agrava os custos operacionais de algumas empresas", comenta.
A orientação é focar em financiamentos de longo prazo. Segundo Branco, ao optar por financiamentos mais longos, as PMEs ficam menos suscetíveis aos aumentos das taxas. "O pior dos mundos é uma empresa que financia o seu capital de giro no curto prazo. Nesse caso, a situação é muito ruim, porque você, no curto prazo, não vai conseguir escapar dos juros mais elevados", detalha.
Segundo Claudio Felisoni de Angelo, presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo (Ibevar) e professor da FIA Business School, o governo dá sinais contraditórios no que diz respeito ao controle das despesas públicas, o que traz consequências para política de juros do BC. "Com isso o Banco Central é forçado a implementar um novo ciclo de elevação da taxa básica de juros, penalizando a produção e a distribuição, especialmente as pequenas e médias empresas", afirma. Ele destaca que, diferentemente das grandes corporações, os pequenos negócios têm menor capacidade de repassar os custos adicionais aos preços finais, intensificando os desafios para se manterem competitivos no mercado.
A dinâmica dos juros no Brasil também está diretamente ligada à política monetária dos Estados Unidos, apontam analistas. "Se houver grandes taxações, isso pode aumentar o custo dos produtos, pressionando a inflação nos EUA e, consequentemente, levando a um aumento dos juros por lá", explica Branco, da ESPM. Uma alta na taxa de juros americana tende a atrair capitais estrangeiros, provocando uma saída de dólares do Brasil. Esse movimento intensificaria a desvalorização do real, pressionando um aumento de juros internamente.
Combinação de inflação e juros alto pode desacelerar consumo e afetar PMEs
Outro desafio destacado é a combinação de inflação, estimada entre 5% e 6% até 2026, com a desaceleração do crescimento econômico. Braga aponta que o consumo deve desacelerar devido à perda de poder aquisitivo da população e ao crédito mais caro. “O resultado é uma economia que cresce menos, com inflação persistente e impacto direto sobre as PMEs."
"O Banco Central já deu início a um novo ciclo de elevação da taxa básica de juros. Esse movimento deve desacelerar o consumo no primeiro trimestre do ano, com possível impacto na expansão econômica", pontua Angelo.
Segundo ele, embora ainda haja chances de crescimento, o desempenho de 2025 estará fortemente atrelado à trajetória dos preços.