Imóveis

O muro de divisa delimita os terrenos, além de servir de proteção proporcionando privacidade e segurança. Contudo, apesar de indispensável, muitas vezes é alvo de desavenças entre vizinhos.

“Antes de tudo é preciso entender que a construção de um muro, estabelecendo uma correta divisa, é considerado um benefício para ambas as casas vizinhas e a justiça e as normas legais existem para garantir a estabilidade e a correta responsabilidade de cada uma das partes”, explica Ricardo Neves, advogado especialista na área de direito condominial e propriedade intelectual e professor do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo.

“Assim como outras obras, de acordo com os artigos 1.297 até 1.313 do Código Civil, deve seguir normas rígidas impostas pela construção civil. Isso significa que precisa ser e estar de acordo com o alinhamento correto, o vizinho deve ser comunicado previamente sobre a ocasião da construção, deve haver o questionamento de um calculista sobre a carga do muro e se suportará a obra, e que cada um arque proporcionalmente com os custos para construir, além da manutenção”, ele complementa.

Construída pelo escritório Una MunizViegas, esta casa de 350 m², localizada no Jardim Paulistano, São Paulo, exibe muro de divisa com telado que eleva sua altura — Foto: Bebete Viégas / Divulgação
Construída pelo escritório Una MunizViegas, esta casa de 350 m², localizada no Jardim Paulistano, São Paulo, exibe muro de divisa com telado que eleva sua altura — Foto: Bebete Viégas / Divulgação

Entretanto, para serem definidos direitos e deveres de cada um dos vizinhos, é importante levar em conta se a situação configura um único muro exatamente na divisória entre lotes, uma parede em apenas um dos terrenos ou dois muros.

Um único muro na divisória dos terrenos

Conforme o § 1º do artigo 1.297 do Código Civil, ambos os vizinhos têm direitos e deveres em relação ao muro de divisa, quando este for único e compartilhado.

“A responsabilidade e o custeamento para construção e manutenção do muro caberá aos proprietários dos respectivos terrenos envolvidos, desde que ambos concordem e usufruam da utilização da construção”, informa Leonardo Morau, advogado especializado em direito imobiliário e sócio da TT & Co.

Dois muros, um em cada lote

Nesta hipótese, o direito de uso e a responsabilidade de manutenção são individuais. “Cada vizinho será responsável por seu próprio muro, conforme previsão do artigo 1.299 do Código Civil”, diz Leonardo. Nesse caso, na hora da construção, é importante estar atento a diversos fatores.

Nesta casa de 330 m², em Holambra, SP, há uma divisa já construída. Nesse caso, o vizinho que chegar no terreno ao lado não possui nenhum direito sobre o muro existente. Projeto do arquiteto Pietro Terlizzi — Foto: Guilherme Pucci / Divulgação
Nesta casa de 330 m², em Holambra, SP, há uma divisa já construída. Nesse caso, o vizinho que chegar no terreno ao lado não possui nenhum direito sobre o muro existente. Projeto do arquiteto Pietro Terlizzi — Foto: Guilherme Pucci / Divulgação

Um dos problemas mais comuns quando se constroem dois muros lado a lado, em cada terreno, é a formação de frestas ou espaços entre eles. Isso permite o acúmulo de sujeira, a entrada de água e problemas estéticos e estruturais. “As frestas amontoam detritos, folhas, ou sujeira, dificultando a limpeza e favorecendo o aparecimento de pragas, como insetos ou roedores”, afirma Leonardo.

Outra questão é que a água da chuva acumulada acaba causando infiltrações em ambas as estruturas levando a fissuras ou até mesmo ao desmoronamento.

“Além disso, a infiltração pode danificar tanto os muros quanto a fundação das casas e ainda provocar mofo e outros contratempos decorrentes da umidade", ele completa. Para evitar infiltrações, tanto na base quanto nas paredes dos muros, é importante que eles sejam devidamente impermeabilizados.

Um único muro, que pode ficar em qualquer um dos terrenos

“A responsabilidade pode ser compartilhada, mas é importante haver um acordo claro”, diz Leonardo. “No caso de qualquer nova construção, demolição, alteração e manutenção que comprometa o status anterior da obra compartilhada deverá ser obrigatoriamente conversado e acordado pelas partes”, acrescenta Ricardo.

O muro de divisa desta casa, com arquitetura original de Raul di Pace, ganhou jardim vertical idealizado pelo paisagista Alex Hanazaki e executado pelo Movimento 90°    — Foto: Yuri Seródio / Divulgação
O muro de divisa desta casa, com arquitetura original de Raul di Pace, ganhou jardim vertical idealizado pelo paisagista Alex Hanazaki e executado pelo Movimento 90° — Foto: Yuri Seródio / Divulgação

“Além disso, os vizinhos devem se comprometer pela manutenção, estabilidade e segurança do muro, bem como que o mesmo seja utilizado com zelo, evitando que ocorram danos a qualquer uma das propriedades e a obrigação de indenizar havendo algum prejuízo”, completa Ricardo.

Que tipo de barreira é mais vantajosa

Ter dois muros, um para cada vizinho, é o ideal. “Isso evita boa parte dos problemas, já que cada uma das partes pode usufruir e utilizar do seu próprio muro sem ter a preocupação ou a necessidade de buscar autorização pela utilização de algo que não lhe pertence”, afirma Ricardo.

“Construir dois muros também é interessante porque oferece maior privacidade e facilidade de manutenção, já que cada vizinho cuidará e será responsável apenas por seu próprio muro, concedendo maior autonomia a cada uma das partes a respeito do que acredita ser mais vantajoso ao seu terreno”, diz Leonardo.

É de responsabilidade de quem construir o muro ou fazer reparos?

A responsabilidade pela construção e manutenção do muro cabe ao vizinho interessado, sempre pensando em uma melhor privacidade e segurança. No caso de um dos vizinhos optar pela obra enquanto o outro não concorda, caberá as partes avaliar a situação em que a construção se dará.

“Por exemplo, se for um único muro na divisória dos terrenos, deverá haver a concordância mútua dos envolvidos para que a obra seja feita, visto que atinge o terreno de ambos. Já no caso de muro individual, ou seja, aquele sob o qual a construção não atinge o terreno do outro, caberá individualmente a cada um dos vizinhos decidir se construirá seu muro ou não, não podendo a outra parte contestar a decisão tomada”, explica Leonardo. A única exceção a isso é quando os prejuízos são evidentes, destaca.

Para disfarçar os altos muros de divisa dos vizinhos que prejudicariam o clima da casa  carioca, de 950 m²,  a paisagista Daniela Infante colocou, atrás dos canteiros que contornam a área, palmeiras com folhagens exuberantes. Projeto de Andrea Chicharo — Foto: André Nazareth / Divulgação
Para disfarçar os altos muros de divisa dos vizinhos que prejudicariam o clima da casa carioca, de 950 m², a paisagista Daniela Infante colocou, atrás dos canteiros que contornam a área, palmeiras com folhagens exuberantes. Projeto de Andrea Chicharo — Foto: André Nazareth / Divulgação

O mesmo vale se a ideia for elevar a altura de um muro já construído. Nesse caso é preciso também observar as normas urbanísticas para saber qual a altura máxima permitida pelo código de obras do município.

Quem paga a manutenção e construção

Depende se estamos falando de dois muros, apenas uma parede divisória entre os lotes ou um muro em um dos terrenos. Se forem duas construções, cada vizinho paga pelo seu próprio muro. Se a parede ficar na divisa, os custos deverão ser compartilhados.

“Agora caso o muro fique em apenas um dos terrenos, os gastos serão absorvidos exclusivamente pelo dono desta propriedade”, afirma Ricardo.

Uma exceção a estas regras, destaca Leonardo, é quando se trata de uma manutenção de ordem estética, como a pintura, por exemplo. “Nesse caso, o vizinho que desejar pintar o muro, deverá arcar com a totalidade das custas, no que diz respeito ao seu lado do muro”.

E se o vizinho se recusa a arcar com os gastos

Ninguém é obrigado a pagar pela construção ou manutenção de um muro que não é de sua responsabilidade. A obrigação depende da situação do muro.

“Se este for compartilhado e o vizinho se recusa a pagar pela construção ou manutenção do mesmo, deverá ser buscada uma solução legal. O mais indicado, nessa situação, é levar o caso para a justiça, a fim de assegurar o cumprimento da lei, para que os custos sejam justamente compartilhados”, diz Leonardo. Afinal, um muro divisório é um benefício mútuo, desta forma a lei visa garantir que o ônus também seja mútuo.

O que fazer quando já existe uma parede construída

Um ponto, que também deve ser levado em consideração, é o fato de o muro divisório já existir no local e ter sido construído, comprovadamente, por um dos proprietários há tempos.

“Neste caso, o vizinho que ali está chegando não possui qualquer tipo de direito sobre o muro existente, nem mesmo possui direito de melhorar, modificar, alterar ou demolir sob qualquer pretexto, sendo apenas possível se ambos concordarem em ratear todos os valores, tanto os futuros como os retroativos”, explica Ricardo.

Na casa de 500 m², em São Roque, SP, o muro de divisa é de pedra madeira bruta. A estrutura telada eleva a altura do paredão, sem deixar a solução com visual pesado. Projeto de Carolina Penna — Foto: Foto: Guilherme Pucci / Divulgação
Na casa de 500 m², em São Roque, SP, o muro de divisa é de pedra madeira bruta. A estrutura telada eleva a altura do paredão, sem deixar a solução com visual pesado. Projeto de Carolina Penna — Foto: Foto: Guilherme Pucci / Divulgação

Acordos verbais são suficientes?

“Um acordo verbal pode ser feito, mas é mais seguro ter um documento formal para evitar mal entendidos”, fala Leonardo. O ideal é contratar um advogado para documentar e redigir o combinado, colhendo a assinatura de todos os envolvidos e na presença de testemunhas.

E se o vizinho entrar sem autorização?

“O vizinho deverá permitir a entrada do outro, quando for indispensável tal ato para a reparação, construção, reconstrução ou limpeza do muro divisório, desde que o faça mediante aviso prévio, conforme descrição do inciso I do artigo 1.313 do Código Civil”, afirma Leonardo. “Salvo as hipóteses citadas, considera-se veementemente proibida a entrada forçada no imóvel do outro, visto que tal ato configura violação de propriedade”, alerta.

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