Andreas perdeu o passo, a bola, o jogo e o título

Hugo Lloris é um cara de sorte.

O goleiro e capitão francês, ao receber um recuo de bola na pequena área na final da Copa do Mundo de 2018, na Rússia, tentou fazer o que não devia: driblar o atacante.

Mandzukic esticou o pé direito, a finta de Lloris falhou, a bola bateu no croata e foi parar nas redes.

Um tremendo vexame, um erro clamoroso na decisão do mais importante campeonato de futebol do planeta.

Então por que Lloris é um sortudo?

Porque a França vencia a partida por 4 a 1 no momento da patacoada que ele fez, e a Croácia não teve força para fazer mais gols no duelo em Moscou.

A lambança do camisa 1 não foi esquecida, porém acabou minimizada por não afetar o resultado final.

O goleiro francês Lloris tentra driblar o atacante croata Mandzukic na final da Copa do Mundo de 2018 e se dá mal; clique para ver esse e outros lances da decisão (Reprodução/YouTube)

Lúcio, um dos melhores zagueiros que a seleção brasileira já teve, também é um cara de sorte.

Nas quartas de final da Copa do Mundo de 2002, disputada na Coreia do Sul e no Japão, ele errou feio ao tentar cortar um lançamento de Heskey para Owen.

Lúcio estava “torto” na jogada, e a bola bateu em seu quadril e sobrou para o rápido atacante, que deslocou o goleiro Marcos e colocou a Inglaterra na frente.

Um erro grosseiro, gritante, em um jogo entre duas potências do futebol, pode pôr tudo a perder.

Só que Lúcio é um sortudo, pois tinha no seu time um Ronaldinho Gaúcho inspiradíssimo naquele dia no estádio Shizuoka, na cidade japonesa de Fukuroi.

O meia-atacante puxou um contra-ataque no fim do primeiro tempo e deu passe açucarado para Rivaldo empatar.

Na segunda etapa, em um de seus gols mais famosos, cobrou uma falta que encobriu o goleiro Seaman. Até hoje questiona-se se Ronaldinho quis chutar para o gol ou se “errou” o cruzamento.

A bobeira de Lúcio, a exemplo da de Lloris, é recordada, mas não torna o beque um vilão, já que o Brasil ganhou o jogo e, depois, sagrou-se pentacampeão mundial.

O brasileiro Lúcio falha feio diante de Michael Owen, que faz gol para a Inglaterra na Copa do Mundo de 2002; clique para ver esse e outros lances do jogo (Reprodução/YouTube)

o belgo-brasileiro Andreas Pereira não é um sortudo.

O meio-campista do Flamengo cometeu um erro que custou muito caro –a ele, ao time e à maior torcida do Brasil.

No começo da prorrogação, na final da Libertadores contra o Palmeiras, no sábado (27) em Montevidéu, Andreas recebeu passe de David Luiz na defesa.

Estava sozinho, era o último homem, porém não parecia estar em situação difícil. Podia recuar para o goleiro Diego Alves ou passar para Rodrigo Caio, que estava a uma pequena distância.

Isso se não hesitasse ou bobeasse. Ao tentar dominar a bola, Andreas deu um passo em falso, e ela escapou. Em um segundo, o flamenguista se deu conta de estar em apuros.

Com a proximidade de Deyverson, que vinha em velocidade, o camisa 18 ainda tentou, em um esforço que se mostrou em vão, chutar a bola para que ela chegasse a Diego Alves.

O resto da jogada todos sabem. Deyverson ficou com a bola, entrou na área e fez o gol que deu ao Palmeiras a taça da Libertadores.

Andreas ficou desolado, caído no chão, ciente de que estava prestes a se tornar o vilão da nação rubro-negra. Começou ali a viver um pesadelo, que se mostrou real e do qual não despertará.

Diferentemente do que ocorreu com Lloris e com Lúcio, a falha não será esquecida ou minimizada.

Quando alguém, hoje ou daqui a anos, perguntar o que provocou a derrota do Flamengo na decisão da Libertadores de 2021, a resposta será: o deslize de Andreas.

Dizem que o futebol é um esporte coletivo. Que quando o time ganha o mérito é de todos e que quando o time perde o fracasso pertence ao conjunto.

Balela. Um erro individual, se de proporção gigante, não é culpa do time. O responsável é exclusivamente aquele que vacilou. Barbosa, goleiro do Brasil na Copa de 1950, que falhou no gol que deu o título ao Uruguai, que o diga.

Andreas Pereira. do Flamengo, perde o controle da bola e dá chance a Deyverson, que fica com ela e faz o gol da vitória do Palmeiras na final da Libertadores; clique e veja os lances da partida (Reprodução/YouTube)

Andreas, 25, deve ter passado um fim de sábado e um domingo terríveis, relembrando seguidamente o lance fatídico.

Muitas perguntas ele deve estar se fazendo até agora.

“Por que dominei tão mal uma bola fácil?” “Por que Deyverson não errou o chute?” “Por que Diego Alves não evitou o gol?” “Por que o Flamengo não conseguiu reagir?” “Por que isso aconteceu justo comigo?”

E a questão principal: “Como a torcida vai me tratar daqui para a frente?”.

São perguntas sem respostas claras ou até mesmo sem respostas.

Por ora, o que se pode afirmar, sem hesitação, é isto: Andreas não é um cara de sorte.