Viver o câncer
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Por — São Paulo

RESUMO

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GERADO EM: 15/11/2024 - 13:02

Médico supera leucemia e inspira outros

O médico Lucas Visconti, 29 anos, enfrenta a leucemia há 8 anos. Após quimioterapia, transplantes e tratamento inovador com CAR-T cells, vive em remissão. Pretende especializar-se em hematologia para ajudar pacientes com casos semelhantes, sendo um exemplo de superação.

Lucas Visconti, hoje com 29 anos, tinha acabado de entrar na faculdade de medicina quando foi incomodado por fortes dores de cabeça justamente em época de provas. Achou que era estresse por conta do período, mas com a intensidade do quadro decidiu investigar. Algumas idas e vindas a médicos depois, porém, foi constatado o diagnóstico de leucemia. Fez quimioterapia e ficou bem, mas a doença voltou.

Mesmo assim, o jovem de Paraíba do Sul, no Rio, persistiu e foi variando tratamentos em busca de uma solução para sua condição de saúde. Passou por dois transplantes de medula e mais o inovador tratamento das CAR-T cells (cujo mecanismo turbina células do próprio corpo para atacar o câncer). A doença entrava e remissão e depois voltava a aparecer. A último de seus aparecimentos foi em março deste ano. E, após tratamento com químio e radioterapia, indica estar em remissão mais uma vez. Ao GLOBO, Lucas falou sobre sua jornada até aqui e como acredita ter se tornado um profissional melhor após o diagnóstico. "Nunca tive dúvidas de que as coisas dariam certo, me mantenho positivo", disse. Veja os melhores trechos da entrevista:

Como soube de seu diagnóstico?
Foi em 2017, então serão oito anos no começo do ano que vem, porque recebi o diagnóstico em janeiro. São oito anos vivendo com o câncer. Quando começou eu estava no início da minha faculdade de medicina, eu tinha 21 anos. Desde o momento que passei a vivenciar a doença, como acadêmico, mudei minha percepção sobre o que era ser paciente.

Seus sintomas eram tradicionais?
Zero. Eu não tinha nada de leucemia. Meu diagnóstico, inclusive, foi difícil porque eu não tinha sintomas comuns (para a doença). Era uma dor de cabeça muito forte, que chegava a me fazer desmaiar. E tudo começou numa semana de prova, então achei que era estresse. Cheguei a tomar corticoides, numa dosagem bem alta, e eu tinha pressão intracraniana muito alta.Fui internado para operar para colocar uma válvula para drenar líquidos, mas o médico estranhou o quadro e só aí eu fui parar no oncohematologista

E fez quimioterapia?
Foram oito ciclos, mas no quarto já estava em remissão. Não tinha mais nada na medula e nem no líquor. No início eu não ia fazer transplante, porque é um procedimento muito agressivo. É como se você jogasse uma bomba em uma cidade para reconstruí-la depois. É assim com o sistema imune. No ano seguinte, porém, na rotina notamos uma recidiva. O câncer tinha voltado. Então decidimos pelo transplante. Fiz no começo de 2019, meu irmão foi meu doador, até foi um transplante relativamente tranquilo. Ia para faculdade com cateteres e bolsas de acesso. Eu só queria mesmo continuar vivendo, essa ideia me moveu bastante. O transplante deu certo. Pouco mais de um ano depois tive outra recidiva. Neste momento, não tinha mais nada consolidado para ser feito, em livros. Os médicos foram, por sua vez, bolando estratégias. Funcionava, eu entrava em remissão e (o câncer) voltava pouco tempo depois.

Como chegou a CAR-T CELLS?
O médico me apresentou como uma possibilidade. Fomos ver o custo e notamos que não tínhamos condições. Só a medicação, na época, eram 2 milhões de dólares, sem contar viagem e internação que teria que ser nos Estados Unidos. Segui tentando outros tratamentos e soube que a USP de Ribeirão Preto e de São Paulo, mais o Hospital das Clínicas faziam uma pesquisa (com o tratamento). O Instituto Butantan também faz parte do projeto. Passei pelo CAR-T em 2022. Eu tive alta e dois dias depois da liberação fui capaz de jogar vôlei em um campeonato, e fui super bem. Tem zero efeitos colaterais praticamente. O que me deu muita qualidade de vida. Só que em março de 2023 eu tive outra recidiva.

Mesmo depois da CAR-T?
Tive sim e também depois do segundo transplante. Sei bem o que é ser um paciente oncológico e lidar com câncer. A última recidiva veio comigo já sendo médico, em março deste ano e fiz radioterapia e mais quimio. Até o momento, estou em remissão. Espero que assim fique. Nesse período, meu pai, que tem 74 anos e é médico, abriu mão de tudo para estar comigo. Tem até um videozinho no meu Instagram que mostra que, quando eu não podia ter acompanhante no quarto após a Car-t cells, ele ia até o estacionamento para me dar tchau da janela, fizesse chuva ou sol. Fez toda a diferença para mim. Minha rede de apoio é forte e bem estabelecida. Nunca tive dúvidas de que as coisas dariam certo, me mantenho positivo. Mentalizo que estou trabalhando, vivendo a vida, viajando.

Tudo isso que você passou te mudou como médico?
Hoje, formado, faço clínica médica. Quero trabalhar com hematologia, oncohematologia, quero lidar com as pessoas que passaram pelo mesmo que eu. Quando descobri meu diagnóstico, procurei muitas pessoas que também tinham leucemia, para saber mais exemplos. Como médico, também quero ser exemplo de vitória deste tratamento. Quando passamos por um problema desses, a gente deposita muita esperança no médico, tenho vontade de agregar isso de ter sido paciente com a confiança (que o paciente tem) no médico.

A medicina é mais do que uma profissão, é uma missão de vida para você…
Penso que ter passado por tudo isso pode ter agregado muito na minha formação como médico. Me mudou, tenho a visão do que é estar do outro lado da mesa.

Como quer ser com os pacientes?
Penso que médico é alguém que pode te dar segurança, dizer que você poderá seguir seus sonhos, sua vida. Aprendi algo com a Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia, a Abrale, que é onde houver 1% de chance que haja 100% de esforço. Isso me marca muito. Estará na minha vida sempre como médico.

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