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GERADO EM: 24/12/2024 - 11:25

Expansão de Locação Temporada no RJ: Impactos e Tendências

Um novo modelo de locação por temporada está em crescimento no Centro e Zona Sul do Rio de Janeiro após mudanças na legislação. A flexibilização urbanística permitiu estúdios menores e dispensou exigências de garagens. Empresários e investidores estão explorando o filão, com mais de 5.000 unidades lançadas. Contudo, há controvérsias sobre concorrência com hotéis e impactos na oferta de imóveis para aluguel tradicional. A diversificação de modelos de locação também é observada, como condo-hotel e multi-propriedade.

Até 2020, o empresário Fábio Neves, de 48 anos, morava com a família na Ilha do Governador. Naquele ano, ele e a esposa foram assaltados por bandidos na Linha Vermelha à luz do dia. Além de objetos pessoais, os bandidos levaram cartões bancários e fizeram saques nas contas. Foi a gota d’água para o casal e o filho adolescente se mudarem para a Região dos Lagos. No entanto, ele manteve um escritório no Centro do Rio, o que o forçou a ficar pela cidade nos dias úteis.

— Primeiro, ia e voltava todos os dias. Perdia seis horas na estrada. Por um tempo, fiquei num hotel na Praça Tiradentes antes de optar por alugar um imóvel que fica a 300 metros do escritório, com contrato apenas para os dias de semana. Na Região dos Lagos, minha família tem melhor qualidade de vida — afirma Fábio.

O empresário aluga um apartamento no Residencial Mauá, no Centro, um antigo hotel que foi retrofitado. Ele é um dos clientes de um novo modelo de negócios de aluguel por temporada, que ganhou força nos últimos anos em São Paulo e desde 2023 no Rio. A principal razão foi a flexibilização da legislação urbanística carioca, que passou a permitir estúdios que podem ter menos de 20 metros quadrados, e o novo Plano Diretor, em vigor desde o início do ano, que dispensou ou reduziu a exigência de garagens.

O filão vem sendo explorado por fundos de previdência privada, de investimentos, pessoas jurídicas e pessoas físicas, que contratam empresas especializadas para gerir as unidades, que são oferecidas com mobiliário. Só no Centro e Zona Sul foram lançadas em 2023 e 2024 pelo menos 5.075 unidades, a maioria ainda em construção ou em reforma, segundo estimativas do Sindicato da Indústria da Construção Civil (SindusconRJ). Dessas, 4,4 mil ficam na Zona Sul. Na Barra e no Recreio, a legislação não permite esse modelo.

Fábio Neves no apartamento: o empresário perdia seis horas na estrada por dia entre Rio e Região dos Lago — Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo
Fábio Neves no apartamento: o empresário perdia seis horas na estrada por dia entre Rio e Região dos Lago — Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo

Marco do Centro

No mês passado, um desses imóveis chamou a atenção. Marco do art déco e um dos símbolos da revitalização do Centro, o edifício A Noite, na Praça Mauá, foi quase todo negociado pela empresa Anzo Inc para a filial brasileira da multinacional canadense Brookfield, que tem entre seus negócios só nos EUA a gestão de mais de 65 mil imóveis por meio de fundos.

De 457 apartamentos do prédio, que está passando por uma reforma, 434 foram adquiridos pela empresa, além de lojas e restaurantes previstos, como informou a coluna Capital, do GLOBO.

— Multifamily é um modelo de negócio relativamente recente no Brasil. O diferencial é que a locação é feita sem burocracia, e todos os empreendimentos são entregues mobiliados e com oferta de serviços customizados — explica André Lucarelli, vice-presidente sênior de investimentos da Brookfield.

A previsão é que as obras comecem em janeiro, cumpridas as exigências para licenciar a reforma no Iphan e durem 30 meses. O valor da locação não foi fechado. No Rio, a empresa também fará a reforma do Edifício Glória, na Cinelândia, com 119 apartamentos e, no telhado, vista para o Theatro Municipal.

Na Zona Sul, o filão já começou a mudar a paisagem. Em Copacabana, o sobrado na esquina da Rua Santa Clara com a Barata Ribeiro, onde desde 1942 funcionava uma floricultura, foi demolido para a construção de um prédio para aluguel por temporada. O negócio agora funciona num espaço menor, em outro ponto da Rua Barata Ribeiro. Na Avenida Rainha Elizabeth, em Ipanema, um hotel foi convertido para o formato.

Nesse modelo de negócio, as convenções de condomínio já trazem a observação de que os imóveis podem ser alugados por temporada e têm uma empresa gestora para fazer locações em troca de uma comissão. O aluguel de cada unidade não pode chegar a um ano, para que a parceria não seja enquadrada como um contrato tradicional de locação, evitando ações de despejo em caso de inadimplência.

Airbnb é permitido

Muitas administradoras não cobram depósito como garantia, mas em regra exigem aluguel antecipado. O sistema também permite o cadastro dos imóveis em aplicativos como o Airbnb. Em média, o custo de locação semanal varia de mil reais a R$ 2,5 mil.

— A relação de quem aluga esses imóveis é com uma empresa especializada, sem qualquer contato com os donos. Se desejar ficar por mais tempo do que aquele disposto no contrato, tem de trocar de apartamento — diz o CEO da Lobie, Ernesto Otero, que faz a gestão de 920 unidades na cidade.

Segundo o Sinduscon, o Rio é a quinta capital em relação a unidades lançadas por temporada nos dois últimos anos, atrás de São Paulo, Curitiba, Salvador e Porto Alegre. São Paulo é a que mais lançou apartamentos para locação nestes dois anos, com 27.060 unidades.

Entre os principais clientes, estão turistas em viagens de negócios, estudantes de melhor poder aquisitivo e profissionais liberais que moram sozinhos. O avanço desse modelo, porém, não é bem recebido por todos. O presidente do Hotéis-Rio, Alfredo Lopes, acusa o setor de concorrência desleal:

— Nós oferecemos serviços de qualidade e arcamos com uma série de impostos, inclusive para manter funcionários. Esse serviço de locação interfere na vida da cidade. Entre as várias modalidades existentes, já são 23 mil unidades. Locação por temporada é mais cara que o aluguel tradicional. Com isso, a tendência é reduzir a oferta de imóveis para aluguel, tornando-os mais caros. Isso leva à gentrificação, pois as pessoas se mudam por não poder pagar aluguel. É preciso ter um maior controle do governo sobre o setor.

Ernesto Otero rebate:

— Somos mais onerados que eles. Ao contrário da rede hoteleira, não temos benefícios fiscais de impostos federais. E os proprietários das unidades pagam Imposto de Renda.

Isenção de tributos

O executivo se refere ao Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), em vigor desde março de 2022 durante a pandemia. Pelas regras, o setor de eventos — que inclui hotéis, feiras gastronômicas, cinemas e outros — é isento até fevereiro de 2027 (60 meses) de tributos federais: PIS/Pasep, Cofins, CSLL e Imposto de Renda de pessoas jurídicas. O benefício pode ser extinto antes, caso a renúncia fiscal acumulada chegue a R$ 14 bilhões. Alfredo Lopes, por sua vez, diz que o setor omite o fato de que esses benefícios vão acabar.

Polêmicas à parte, o presidente do Sinduscon-RJ, Claudio Hermolin, observa que, apesar de os negócios de aluguel por temporada chamarem a atenção, esse tipo de transação não é maioria entre as unidades já vendidas pelo projeto Reviver Centro, o que permite manter a filosofia original da legislação, aumentando a população da região, que sofreu um esvaziamento durante a pandemia.

Desde o início do Reviver, em julho de 2021, 2.240 unidades foram oferecidas ao mercado. Deste total, 1.790 foram negociadas, sendo que 60% (1.074) foram vendidas para famílias.

— A maioria teve como interessadas famílias que ganham até dez salários mínimos. A tendência no futuro é que essa proporção para moradias alcance 70% das unidades, o que já está acontecendo no Porto Maravilha.

Essa divisão tende a variar conforme a região do Centro: no entorno da Cruz Vermelha, por exemplo, os lançamentos são mais residenciais — exemplifica Hermolin.

Existem outros tipos de locação semelhantes ao modelo mais adotado hoje, no qual a rentabilidade de cada unidade pode variar conforme o número de locações. Há o condo-hotel: um investidor compra uma cota do negócio (representada por um apartamento). Lucros ou prejuízos acumulados são divididos de forma igual. Outra modalidade é a cota de hotel ou multipropriedade. Nela, o investidor, ao comprar uma cota, tem direito de usar as unidades durante períodos do ano estabelecidos em contrato.

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