O combate às mudanças climáticas e a superação da pobreza são os dois maiores desafios deste século. As pautas estão atreladas e são muito caras à realidade brasileira. Nosso país, o 14º mais desigual segundo a ONU, é também a nona maior economia do mundo e uma potência ambiental, peça-chave de qualquer estratégia para um futuro mais verde. Temos, portanto, obstáculos enormes e potencialidades ainda maiores quando o assunto é a erradicação sustentável da pobreza.
Não resta dúvida da gravidade e da urgência desses desafios, mas como superá-los? Que projetos são mais eficazes e duradouros no combate à pobreza? Onde alocar recursos? Qual deve ser o papel do Estado, da iniciativa privada e do terceiro setor? Como envolver as comunidades na construção de soluções? Que experiências foram mais bem-sucedidas?
Responder corretamente a essas perguntas requer dados empíricos objetivos, abrangentes e de boa qualidade. Essa é uma crença partilhada por todos os presentes no SAI20, o grupo de engajamento do G20 dedicado às instituições de controle e governança — órgãos equivalentes, no caso do Brasil, ao Tribunal de Contas da União (TCU).
O último encontro do grupo, em Brasília entre os dias 17 e 18 de junho, representou um avanço significativo para quem acredita que a erradicação sustentável da pobreza tem de ser precedida pela correta medição desse fenômeno. O documento final, que será encaminhado à cúpula do G20, recomenda a criação de uma abordagem de alcance internacional para quantificar e estruturar informações sobre iniciativas relacionadas ao clima, bem como sistemas comuns, globais, para mensurar e monitorar a pobreza multidimensional.
A mensagem é muito bem-vinda, sobretudo quando endossada por um braço do G20. Combater a pobreza só é possível com uma metodologia sólida, baseada em dados concretos, que oriente esforços e ajude a traçar prioridades. Instituições de controle como nosso TCU precisam ser encaradas como engrenagens de um grande esforço social de erradicação sustentável da pobreza, não (apenas) como órgãos burocráticos.
Ao mesmo tempo, e talvez mais importante ainda, quem atua na área social, das agências governamentais às ONGs, deve entender a importância de coletar dados e mensurar resultados, para que o combate à pobreza saia do terreno das boas intenções e converta-se em prática eficiente. Espera-se que os países do G20 assumam de forma mais concreta seu quinhão de responsabilidade na construção de soluções para nossos desafios socioeconômico e climático, o que passa pela coleta e pela análise de dados sobre territórios vulneráveis.
Mais que indicar caminhos, o encontro do SAI20 nos deixa com um desafio: articular as escalas global e local no combate à pobreza e na defesa do meio ambiente. Temos muito o que aprender com experiências internacionais, da Europa a Bangladesh, de Medellín a Bogotá, mas não necessariamente esses modelos serão adequados para a favela brasileira.
Ironicamente, um setor social mais metódico, baseado no melhor da experiência empírica internacional, exigirá lideranças ainda mais sensíveis, capazes de articular e adaptar o que funciona no mundo para suas realidades locais. Nesse entroncamento entre o saber objetivo acumulado pelos agentes sociais e o olhar humano e empático de quem convive todos os dias com os problemas da favela, está a chave para erradicarmos a pobreza ainda neste século, antes que o primeiro homem coloque os pés em Marte.
*Nina Rentel é diretora de Tecnologias Sociais da ONG Gerando Falcões