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Por — Buenos Aires

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GERADO EM: 04/01/2025 - 17:07

Disputa política na Argentina: Cristina Kirchner versus Karina Milei

Cristina Kirchner e Karina Milei estão no centro da disputa política na Argentina. Enquanto a ex-presidente busca consolidar apoio e lidar com acusações de corrupção, a irmã do presidente Milei se prepara para possíveis eleições. A popularidade de Cristina cresce devido a questões econômicas, enquanto Karina enfrenta desafios por falta de experiência política. A incerteza paira sobre as eleições legislativas e presidenciais futuras.

A mulher mais poderosa do governo argentino — para alguns, com mais poder de decisão do que o próprio presidente — e a mulher que dominou, por 20 anos consecutivos, a política argentina até 2023 se posicionam como as principais figuras da batalha política mais importante do governo de Javier Milei neste ano: as eleições legislativas. A secretária-geral da Presidência, Karina Milei, irmã do presidente, e a ex-presidente e ex-vice-presidente Cristina Kirchner poderão ser candidatas à Câmara ou ao Senado, se quiserem, mas ainda não bateram o martelo. Por enquanto, articulam com aliados para construir uma estrutura capaz de garantir vantagem a seus grupos políticos nas urnas e preparar o terreno para as presidenciais de 2027.

Segundo o presidente argentino, não lhe cabe decidir se Karina será candidata:

— Não a vejo com essa intenção [de ser candidata], mas quem vai decidir é ela — declarou Milei em recente entrevista ao canal de TV Todo Noticias, do grupo Clarín.

Mas, apesar de as pesquisas por enquanto não a favorecerem, dizem analistas locais, “ter um Milei na lista de candidatos faz toda a diferença”.

Base central da eleição

Por enquanto, a secretária-geral da Presidência faz viagens internacionais e percorre o interior da Argentina com a missão de consolidar o partido governista A Liberdade Avança, que só se tornou uma força nacional reconhecida pela Justiça eleitoral no final de 2024. A primeira província em reconhecer o partido governista foi a de Buenos Aires, onde vive um terço do eleitoral nacional e, portanto, onde se definem todas as eleições na Argentina.

Essa mesma província é a base de operações de Cristina, que assumiu recentemente a presidência do Partido Justicialista com um discurso inflamado contra Milei:

— Temos um governo que venceu as eleições no segundo turno, uma vez que o voto antiperonista migrou para um candidato [Milei] que propôs a dolarização e uma serra elétrica contra a casta [política]. Hoje vemos a aceitação da sociedade a uma espécie de ajuste violento. Isso não é uma crítica, é uma descrição do que estamos vivenciando.

A ex-presidente argentina Cristina Kirchner durante a inauguração do estádio "Presidente Nestor Kirchner" em Quilmes, província de Buenos Aires, em abril de 2024 — Foto: Tomas Cuesta/AFP
A ex-presidente argentina Cristina Kirchner durante a inauguração do estádio "Presidente Nestor Kirchner" em Quilmes, província de Buenos Aires, em abril de 2024 — Foto: Tomas Cuesta/AFP

Segundo recentes pesquisas, a ex-presidente, condenada pela Justiça por casos de corrupção e com novos julgamentos agendados para os próximos tempos, é a dirigente mais popular entre os peronistas, preservando um capital político de 20 anos.

Segundo pesquisa da empresa de consultoria Proyección, na província de Buenos Aires a imagem positiva de Cristina atinge 43%, enquanto a negativa, 57%. A positiva supera, disse ao GLOBO o diretor da Proyección, Santiago Giorgietta, a do presidente, que alcança 42%. Já a irmã do chefe de Estado tem 33% de positiva e 50% de negativa.

Ajuste beneficia Kirchner

— Vemos um crescimento da imagem de Cristina nos últimos meses. Isso está relacionado a temas econômicos, como o ajuste — diz o analista, pontuando especificamente o aumento das tarifas de serviços públicos, a medida mais dura do ajuste de Milei.

Além disso, o resto da oposição não conseguiu lançar novas lideranças capazes de desafiar o poder de Milei e da própria Cristina. A ex-presidente perdeu fôlego, mas continua sendo a única liderança forte contra o atual governo.

— Nos grupos focais, as pessoas começaram a dizer que com Cristina se vivia melhor. Inclusive eleitores de Milei nos setores mais humildes. O tarifaço obrigou as pessoas a ajustarem suas despesas em alimentação, como fazia tempo não acontecia — afirma.

Pesquisa da CB Consultora mostrou que a ex-presidente tem uma base fiel de apoio de 29,1% e, com votos de aliados, poderia chegar a 42,3% ou mais. O teto do partido de Milei é de 42,1%, e sua base central chega a apenas 14,5%. A mesma pesquisa indicou que 59,2% jamais votariam por Karina. Mas o presidente está forte e, segundo vários analistas, hoje seu partido é favorito para as Legislativas de 2025.

Karina Milei ao lado do irmão e presidente da Argentina, Javier Milei, durante comemoração da vitória eleitoral em 2023 — Foto: Luis Robayo/AFP
Karina Milei ao lado do irmão e presidente da Argentina, Javier Milei, durante comemoração da vitória eleitoral em 2023 — Foto: Luis Robayo/AFP

— Karina conhece suas limitações e não quer ser candidata. Mas a história dos irmãos Milei é de ficção científica, tudo pode acontecer — afirma o jornalista e escritor Juan Luis González, autor de uma biografia não autorizada do presidente intitulada El Loco (O Louco, em tradução livre).

Para González, “a irmã do presidente gosta de protagonismo e de poder político e econômico. Ser candidata seria ousado, mas perder a eleição seria uma catástrofe”.

— Dentro do mundo libertário, a figura dela é muito questionada. Muitos discordam do poder que ela concentra, que é absoluto — frisa o escritor.

Em suas viagens dos últimos meses, a secretária-geral da Presidência discursou, pela primeira vez, num ato organizado pelo governo. Com capacidade de oratória limitada, sua estreia desatou preocupação em setores do governo, segundo jornalistas locais. Mas, como tem apoio do irmão, pode sair candidata apesar disso.

Sem dirigentes de peso

Um dos principais problemas do partido A Liberdade Avança é a falta de dirigentes de peso, com experiência e chances em uma eleição. Na visão de alguns analistas, essa precariedade do partido provavelmente obrigará o governo a selar uma aliança com o Proposta Republicana (Pro), liderado pelo ex-presidente Mauricio Macri. Mas sabe-se que o desejo de Karina é disputar a eleição sem os condicionamentos que seriam impostos por Macri, com quem a irmã do presidente nunca teve uma boa relação. O ex-presidente, segundo fontes próximas a Macri, “sente profundo desprezo pela irmã de Milei”.

No peronismo, Cristina deverá conter as crescentes tensões dentro do movimento e disputas complicadas, como a do governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, cuja carreira política nasceu durante os governos de Cristina, com o deputado Máximo Kirchner, filho da ex-presidente.

Sem se posicionar claramente, Cristina dedica seus dias a atacar Milei e a buscar uma reconexão com seus eleitores após a surra eleitoral sofrida pelo kirchnerismo em 2023. Longe dos holofotes, porém, há rumores sobre negociações secretas entre ela e o chefe de Estado. Quando a votação para aprovar o chamado projeto da “Ficha Limpa” fracassou, habilitando que dirigentes condenados pela Justiça possam ser candidatos, esses rumores se intensificaram — seria interesse de Milei manter como adversária alguém que lhe possibilite o discurso da polarização.

— Sempre estarei junto a vocês — disse a ex-presidente em recente visita ao município de La Matanza, na província de Buenos Aires, deixando a porta aberta para um retorno que parece cada dia mais provável.

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