Multidões lotam prisão na Síria, desesperadas para encontrar parentes e amigos detidos como presos políticos por Assad
Desde 2011, mais de 130 mil foram presos arbitrariamente pelo regime sírio, com mais de 15 mil mortes por tortura e 30 mil detentos mortos apenas em Sednaya, apontam organizações de direitos humanos
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GERADO EM: 09/12/2024 - 16:11
Aglomeração em prisão síria: esperança e medo por parentes detidos
Multidões se aglomeram em prisão síria, ansiosas por notícias de parentes detidos como presos políticos. Assad deixou poder, mas legado de repressão persiste com mais de 130 mil detidos e milhares mortos por tortura. Esperança e medo marcam busca por familiares desaparecidos. Rebeldes buscam libertar prisioneiros em prisões como a de Sednaya, revelando condições extremas e desespero das famílias. Capacetes Brancos procuram por políticos em esconderijos. Emoções conflituosas marcam espera por entes queridos.
Multidões foram até uma prisão nos arredores de Damasco, capital da Síria, nesta segunda-feira, desesperadas para descobrir o destino de amigos e parentes detidos em um local que simbolizou terror e morte sob o regime do presidente Bashar al-Assad, que caiu neste domingo. Alguns pegaram táxis ou esperaram ônibus para a prisão de Sednaya, que foi aberta no fim de semana após a queda de Assad. Outros encheram carros, avançando lentamente no trânsito. Muitos pareciam divididos entre esperança e medo, em meio à euforia que tomou Damasco desde que Assad fugiu para a Rússia.
— Tomar a cidade é uma alegria, estamos felizes — disse Mohammad Bakir, um combatente rebelde, sentado no banco de trás de um carro coberto de lama a caminho da prisão, com o rifle entre os joelhos. — Mas a verdadeira vitória será quando eu encontrar minha família.
Ele não tinha notícias da mãe, do irmão e do primo desde que desapareceram em 2012, após protestarem contra o governo e serem presumidamente detidos.
Outro caso é o do sogro de Jwan Omar, Mohammed Abdul Samad Khalil, preso em Aleppo sob a acusação de ajudar o Exército Livre da Síria, de oposição.
— Quando soubemos que o regime de Assad havia acabado, tivemos uma nova esperança — disse Omar à rede britânica BBC, após dirigir por cinco horas de sua casa na Turquia até a prisão em Damasco. — Mas eu não o encontrei e minha esposa está chorando desde ontem.
Rebeldes tomam Damasco e anunciam fim do regime Assad
Prisões foram centrais para a repressão de Assad contra o levante civil iniciado em 2011 e a rebelião que se seguiu. Ele montou um sistema em larga escala de prisões arbitrárias e de tortura, segundo relatórios de grupos de direitos humanos.
Mais de 130 mil pessoas foram presas e detidas arbitrariamente pelo governo, segundo um relatório de agosto da Rede Síria para Direitos Humanos, uma organização sem fins lucrativos que começou a contabilizar os casos no início do conflito em 2011. O relatório também aponta que mais de 15 mil pessoas morreram "devido à tortura" pelas forças do governo entre 2011 e julho deste ano.
O Observatório Sírio para Direitos Humanos, outra organização sediada no Reino Unido que documenta abusos na Síria, estima, por sua vez, que mais de 30 mil detentos foram mortos apenas em Sednaya. Em 2017, os EUA acusaram autoridades sírias de construir um crematório na prisão para ocultar assassinatos em massa de prisioneiros, segundo o Departamento de Estado.
Em uma entrevista ao New York Times em 2016, Assad disse que qualquer pessoa presa na Síria havia cometido um crime, sugeriu que os familiares dos detidos mentiam e insistiu que o número de prisioneiros mostrava que o sistema de justiça da Síria funcionava.
O segredo foi um elemento crucial do impacto dessas prisões sobre o país. As pessoas desapareciam no sistema, e as famílias frequentemente lutavam para descobrir se seus parentes haviam sido detidos, e mais difícil ainda era determinar seu destino. Assim, a abertura das prisões tornou-se uma prioridade para os rebeldes.
Vídeos enviados ao Times por um grupo de médicos que visitaram Sednaya mostraram as condições extremas do local. As imagens, compartilhadas pela Associação de Médicos Independentes, um grupo que fornece assistência humanitária e médica na Síria, exibem celas numeradas que pareciam abrigar uma dúzia ou mais de pessoas, repletas de destroços, roupas e pertences pessoais.
Jornalistas, combatentes armados e civis, incluindo crianças, circulavam pela prisão. Alguns homens tentavam escavar o concreto e grades em uma parede, aparentemente buscando alcançar celas escondidas.
Na cidade de Aleppo, no noroeste do país, dezenas de famílias se reuniram em uma rotatória, esperando a chegada de entes queridos que haviam sido detidos. O local era conhecido durante a guerra como Rotatória da Morte, alvo frequente de ataques aéreos do governo. Algumas pessoas tinham certeza de que seus familiares estavam vivos e chegariam em breve. Outras não tinham informações, apenas esperança.
Um veículo trouxe um ex-prisioneiro de Sednaya, com o rosto magro e o corpo debilitado por anos de detenção. Dois parentes o ajudaram a ficar de pé. Uma pequena banda tocou tambores para celebrar sua sobrevivência. Ele foi cercado por pessoas que mostravam fotos de detentos em seus celulares, na esperança de obter notícias sobre seus familiares.
Os Capacetes Brancos, uma rede de socorristas que atua em áreas controladas por rebeldes durante o conflito, também estão procurando prisioneiros políticos em esconderijos e porões nas masmorras da prisão. "Estamos trabalhando com todas as nossas forças para alcançar uma nova esperança e devemos estar preparados para o pior", declarou a organização em comunicado.
Aida Taha, de 65 anos, conta que percorreu as ruas "como uma louca" em busca de seu irmão, preso em 2012.
— Passamos muito tempo sendo oprimidos — disse a mulher.
Já a família Nadaf busca por Thaer, preso pelo regime sírio em 2011, aos 25 anos. Um médico que saiu de Sednaya recentemente afirmou que ele está vivo, possivelmente no segundo nível subterrâneo da ala vermelha.
— Thaer está desaparecido há 12 anos, e o tempo todo rezei para que ele pudesse ver seus filhos novamente. Criei os filhos dele, espero que ele saia da prisão para vê-los.
Com agências internacionais.
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