Baleia-jubarte faz a maior migração já registrada para a espécie, percorrendo mais de 13 mil km em cinco anos
Esses cetáceos migram entre as águas equatoriais e as da Antártica para se alimentar, mas esse macho migrou do leste do Pacífico para o oeste do Oceano Índico
RESUMO
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GERADO EM: 11/12/2024 - 17:54
Baleia-jubarte surpreende com migração de 13 mil km
Uma baleia-jubarte macho realizou uma surpreendente migração de mais de 13 mil km do Oceano Pacífico para o Oceano Índico, desafiando padrões de deslocamento da espécie. O registro inédito revela a maior distância já percorrida por uma baleia-jubarte, levantando questões sobre as razões por trás dessa jornada sem precedentes. A pesquisa destaca a importância da preservação desses animais, cuja população tem se recuperado após séculos de caça intensiva.
As baleias-jubarte estão entre os animais que percorrem as maiores distâncias. Seguem um padrão: passam a temporada de acasalamento e reprodução nas águas quentes próximas ao equador, para depois viajar milhares de quilômetros até os mares gelados do Ártico, Atlântico ou Pacífico Norte ou, no Hemisfério Sul, até as águas que banham a Antártida. Lá, alimentam-se de filhotes de anchovas, arenques ou sardinhas ou, no Oceano Antártico, de krill, um pequeno crustáceo semelhante ao camarão.
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No entanto, um grupo de biólogas marinhas publicou na revista científica Royal Society Open Science o relato da maior viagem já realizada por um exemplar dessa espécie, que não seguiu o padrão. Um macho avistado no Oceano Pacífico, próximo à costa da Colômbia, foi visto novamente perto de Zanzibar, no Oceano Índico, algum tempo depois. Entre esses dois lugares, conhecidos por serem áreas de acasalamento, há mais de 13 mil quilômetros. Essa migração supera em quase 4 mil quilômetros a maior distância já registrada entre esses cetáceos.
Embora existam aves capazes de viajar entre os polos no mesmo ano, como a andorinha do Ártico, entre os mamíferos ninguém viaja tanto quanto as baleias-jubarte (Megaptera novaeangliae). Abundantes no passado, sua caça intensiva durante séculos quase as levou à extinção. A proibição desde os anos 1960 tem permitido sua recuperação, embora atualmente somem apenas 5% do número que existia no passado.
Sua distribuição segue um movimento sazonal: passam o verão nas águas mais frias, mas ricas, do Norte ou do Sul. Com a chegada do inverno, migram para regiões equatoriais ou mais tropicais. Devido à inversão hemisférica das estações, as populações do Hemisfério Norte raramente se sobrepõem às do Sul. A migração é quase em linha reta, embora seja mais correto dizer que seguem a mesma longitude. Assim, as sete grandes populações identificadas pela Comissão Internacional da Baleia no Hemisfério Sul descem em latitude até a sua porção do Oceano Antártico quando lá é verão.
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Por exemplo, os centenas de exemplares que se cortejam e acasalam próximos às costas quentes do leste da Colômbia e do Equador seguem pela costa americana até chegar à Península Antártica, que está diretamente abaixo no mapa. Quando chega o inverno, as fêmeas grávidas retornam ao Norte para dar à luz, e os machos voltam em busca de parceiras. Por isso, o que fez a baleia registrada como HW-MN1300828 é tão especial.
— Essa baleia [um macho] foi avistada na costa da Colômbia (duas vezes) e, depois, novamente na costa de Zanzibar, cinco anos depois, o que a torna a maior distância ortodrômica [trajeto mais curto entre dois pontos em uma esfera] já registrada entre zonas de reprodução de uma baleia-jubarte — explica Ekaterina Kalashnikova, bióloga do Centro Bazaruto para Estudos Científicos (BSCC, na sigla em inglês), dedicado à pesquisa oceânica em Moçambique e no sudeste do continente africano.
Medida dessa forma, essa baleia migrou pelo menos 13.046 quilômetros em linha reta sobre a esfera da Terra. Nunca havia sido registrada uma migração tão longa nesses animais. No entanto, Kalashnikova, autora principal da pesquisa, acredita que sua viagem foi muito mais longa, mas não há como comprovar.
HW-MN1300828 foi avistada por biólogos no Golfo de Tribugá, no Pacífico colombiano, em julho de 2013. Foi vista novamente no verão de 2017, a 78 quilômetros dali, em Bahía Solano, também na Colômbia. No Happywhale, um repositório de avistamentos com dados de milhares de baleias, ela só reaparece cinco anos depois e muito longe dali: em 22 de agosto de 2022, foi avistada no Canal de Zanzibar, entre a Ilha de Unguja e a costa continental da Tanzânia, no sudoeste do Oceano Índico.
Os registros são baseados em fotografias, particularmente da nadadeira caudal (a cauda) da baleia, que funciona como uma impressão digital.
— Cada animal é identificado examinando-se o contorno posterior, os padrões de pigmentação e outras marcas naturais na parte ventral das nadadeiras caudais — explica Kalashnikova.
Como ela chegou da Colômbia a Zanzibar? Não se sabe. O mais provável é que, em uma de suas viagens anuais ao Sul, até a Península Antártica, algo a tenha levado para o leste, costeando a Antártida e, ao chegar na altura do extremo Sul da África, subindo até as costas da Tanzânia.
Embora, em teoria, pudesse ter tomado o caminho oposto, para o Oeste, contornando o continente gelado no sentido contrário, existe uma barreira física quase intransponível: o Oceano Antártico é dominado pela corrente circumpolar, a mais potente do planeta, que dificultaria muito um trajeto. Pelo lado leste, no entanto, ela precisaria apenas seguir a corrente. Ao retornar, a lógica também sugere que subisse relativamente em linha reta até as latitudes africanas.
— Embora as razões reais sejam desconhecidas, entre os fatores que podem estar envolvidos estão mudanças climáticas globais, eventos ambientais extremos (que são mais frequentes hoje em dia) e mecanismos evolutivos das espécies — disse Kalashnikova.
A longa viagem do macho HW-MN1300828 supera em pelo menos 3.715 quilômetros a maior distância registrada entre dois avistamentos da mesma baleia-jubarte. Antes disso, a maior distância foi registrada por uma fêmea avistada pela primeira vez em janeiro de 1997 nas águas ao redor da Península Antártica.