Recentemente, estive em Cingapura, pela primeira vez, para um evento. Depois de horas no ar, cheguei à cidade em pleno domingo. Fui recebida com muita umidade e verde. Algo que já traz certa familiaridade para quem vive no Rio.
Uma amiga que mora lá me convidou para experimentar a famosa comida de rua de chefs estrelados a “preços acessíveis”. Fomos até o Newton Center, uma praça de alimentação que ficou famosa pelas cenas do filme “Podres de ricos”. Pedimos um prato de arroz frito e um “bolo de cenoura”, que, na verdade, não tinha cenoura. É um prato típico, feito com rabanete e ovos. Havia também outras opções de menu como omelete de ostras, mas deixei para quando tivesse mais coragem e menos jet lag.
Após a degustação, chamamos o táxi para dar uma voltinha pela cidade pelo aplicativo local. O Uber não funciona lá. O motorista, falante e animado, nos contou que era chinês e morava no país há mais de 20 anos. Mudou-se pelas oportunidades de trabalho. Também comentou que pessoas de origem chinesa eram quase 80% da população, mas que o país também concentrava gente da Malásia e, cada vez mais, de outros países. As línguas mais faladas são o inglês e o mandarim. Há quem fale também malês, devido à fronteira com a Malásia, além da mistura de idiomas de vários outros povos que têm imigrado para a ilha.
Ele nos contou também que, recentemente, a Fórmula 1 passou por lá. Não por acaso, os carros ao nosso redor eram numerosos Porsches e Bentleys. Depois, ele nos mostrou que estávamos chegando a um dos pontos turísticos, o Merlion, chafariz de uma estátua do Leão Sereia onde também dá para ver o Marina Bay Sands, prédio icônico da cidade com três torres unidas por uma representação de um barco.
Antes de nos deixar, comentou que o local estava lotado porque era um “domingo filipino” e, nas casas das pessoas ricas, as empregadas filipinas só têm folga nesse dia. É fácil identificá-las: geralmente, têm a pele mais escura e andam em grupos. É curioso pensar que, enquanto Cingapura brilha com a modernidade, muitos trabalhadores ainda têm pouca chance para brilhar e sequer moram na cidade, mas na Malásia, cruzando a fronteira apenas para trabalhar. Afinal, trata-se de uma das cidades mais caras do mundo.
Isso me lembrou o Brasil e a situação das empregadas domésticas negras e nordestinas. E o quanto as identidades raciais e de gênero estão conectadas, globalmente, a certas profissões. De um ou de outro lado do mundo, vemos grupos com acesso limitado ao lazer e também com um cardápio restrito de opções de crescimento financeiro e de carreira.
Em conversas com representantes do governo local, eles mencionaram que o sistema de taxação é progressista, cobrando mais dos ricos e menos dos pobres, além de subsidiar casas e educação pública de qualidade para todos. Isso já ajuda a aplacar a questão das desigualdades, de alguma forma. Porém, eles reconhecem que os problemas das desigualdades étnicas e raciais são desafios a serem superados ainda.
Espero que, com toda a inteligência e os recursos que essa ilha tem, consigam acabar com o “domingo filipino” e proporcionar mais dias de lazer para todas as pessoas por lá. Torço pra que a garra deste tigre asiático seja literalmente usada para esta missão.