Sem Margem Equatorial, 'podemos perder autossuficiência em petróleo em menos de 10 anos', diz diretora da Petrobras
Executiva defende atividade na Margem Equatorial para elevar reservas. Região responde por quase 40% dos investimentos previstos. Alta do dólar deve afetar resultado financeiro no trimestre, mas não prejudica projetos
RESUMO
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GERADO EM: 23/12/2024 - 19:22
Investimentos cruciais na Margem Equatorial da Petrobras
Diretora da Petrobras alerta para risco de perda de autossuficiência em petróleo sem exploração na Margem Equatorial. Investimentos na região são cruciais. Alta do dólar impacta resultado financeiro, mas não prejudica projetos. Petrobras busca ampliar produção de gás.
Com expectativa de obter a licença ambiental do Ibama até fevereiro, Sylvia dos Anjos, diretora de Exploração e Produção da Petrobras, defende a atividade na Margem Equatorial. O tema, considerado divisivo no governo, faz parte da estratégia da petroleira e responde por quase 40% dos investimentos previstos em exploração.
De acordo com Sylvia, a produção do pré-sal começa a cair em 2029 ou 2030 e, sem descobertas de grandes volumes, o país corre o risco de perder a autossuficiência em petróleo em menos de dez anos.
Enquanto aguarda a decisão, a Petrobras volta as atenções para a África, onde surgem oportunidades, e para a Bacia de Pelotas. No curto prazo, a companhia deve sentir os efeitos da alta do dólar em seu resultado no trimestre. Veja trechos da entrevista.
O ano praticamente chegou ao fim sem a licença do Ibama para a Margem Equatorial. Qual é a expectativa?
A Petrobras foi criada para avaliar o potencial do Brasil e torná-lo autossuficiente em petróleo. E conseguimos, embora ainda precisemos importar derivados, pois não refinamos tudo o que consumimos. A Margem Equatorial vai do Rio Grande do Norte à Colômbia. Já encontramos petróleo no Rio Grande do Norte, no Ceará e na Colômbia. Já perfuramos mais de 60 poços no litoral do Amapá. No total, mais de 560 poços em toda a região. E quantos acidentes ocorreram? Zero.
Mas com questões como alta do dólar, ajuste fiscal e o potencial divisivo do tema no governo, há risco de a Margem Equatorial ficar em banho-maria?
Acredito que não. Sou muito otimista. Temos tudo mapeado. A primeira questão é: ‘há alguma ameaça ambiental?’ Digo que só tem ameaças se você tiver derramamento e não souber operar. Se a Petrobras for proibida de explorar, alguém vai trazer o petróleo. Então, não tem argumentos técnicos para não furar. Além disso, pegamos uma sonda mais robusta que tem duplas garantias. Vamos alocar 13 barcos de contenção. E temos 7 na Bacia de Campos. Tudo que se possa imaginar para dar conforto ao Ibama nós fizemos.
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O grau de exigência do Ibama é maior do que o de qualquer outra operação da Petrobras?
Sim. A Margem Equatorial está sendo muito mais complicada.
Quanto a Petrobras já gastou?
Foi muito dinheiro. Mais de centenas de milhões. Até o ano passado, tínhamos uma sonda lá. Uma sonda custa US$ 1 milhão a cada dois dias. Ela ficou dois meses. A sonda foi o mais caro. Também criamos um centro (de despetrolização de fauna) em Belém, mas ficava a 24 horas da costa. E aí pediram outro no Oiapoque de proteção de fauna.
Teve a questão do aeroporto, que já tem uma licença. E mesmo com o uso da Petrobras, o uso fica aquém da licença existente. Como a gente teve que fazer esse centro no Oiapoque, tivemos que comprar terreno. E começaram a perguntar qual é a quantidade de veterinários, se tem veterinários 24 horas por dia. Todas as perguntas foram respondidas.
Se a parte técnica já foi resolvida, falta a parte política?
Estamos zero confronto. Cumprindo as exigências. Só resta aprovar (risos).
Se a licença sair, quanto tempo leva para começar?
Demora. O navio que vai furar lá está aqui no Campo de Marlim (na Bacia de Campos). A hora que sair o sinal verde, tenho que fazer uma limpeza na sonda. Até chegar lá leva quatro meses. No local onde vamos perfurar, passam 1.100 navios por ano, inclusive petroleiros. Não é um santuário ecológico, um lugar totalmente protegido e que vai a empresa desvirginar o local. Não é.
Qual é a prioridade sem a Margem Equatorial?
Dos US$ 7,9 bilhões previstos em exploração, mais de US$ 3 bilhões são na Margem. A decisão é muito importante porque mostra para onde vou. Mas a gente vai continuar buscando áreas e bids (ofertas).
Quando houve a troca no comando da Petrobras, a cobrança era por mais investimento. Tem plano B?
Em fevereiro a gente deve terminar o centro de proteção à fauna. Depois disso, acredito que a gente tenha a licença. Mas continuo fazendo análise de portfólio. Fui no evento Africa Energy na África do Sul, pois adquirimos parte de um bloco (10% no DWOB, que tem entre os sócios TotalEnergies, Qatar Energy e Sezigyn). Apareceram vários países perguntando ‘o porquê de a Petrobras não vir'. Eu me senti a queridinha da África.
Quais países?
África do Sul, Namíbia, Angola, Gana, Guiné, Congo, Mauritânia, Moçambique, Tanzânia. Todos querendo que a gente participe mais. Não foi proposta. Esses países precisam de investimento e têm potencial de petróleo. Tanzânia já teve descobertas. A coisa mais importante é que viram a Petrobras como parceira. E isso é muito bacana.
Essa incursão está no radar?
Sim. Em 2025, vamos perfurar um poço em São Tomé, um poço na África do Sul e dois na Colômbia. São quatro poços no exterior.
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Qual é relação entre reservas e produção da Petrobras?
Está em 12,2 anos, mas vai aumentar no atual plano estratégico (de 2025 a 2029). O pré-sal é mais de 80% disso. É o maior de todas as empresas. E é tudo crescimento orgânico. Somos a única empresa que explora, produz e desenvolve. As outras compram outras companhias.
Mas há preocupação em aumentar as reservas...
O pico de produção na Bacia de Campos foi em 2009. Em 2006, nos tornamos autossuficientes. A sorte é que em 2007 a gente descobriu o pré-sal. Em 2029 e 2030, o pré-sal começa a cair. Podemos perder a autossuficiência em 2032.
Em menos de dez anos?
Sim. Já encontramos grandes acumulações no pré-sal. A Margem é muito parecida com a Bacia de Campos. Leva muito tempo até produzir. Se faço a descoberta hoje, levo um ano avaliando e quase um ano fazendo bid (licitação) de plataforma e depois quatro anos para construir. Se tudo certo, são seis anos ou até oito anos. E o que vou produzir daqui a oito anos já tem que ser descoberto hoje. O ciclo é muito longo. E a gente vai gastando reserva e declinando.
E como a Bacia de Pelotas, no Sul, entra na equação?
Vou acelerar o máximo possível. Em Pelotas, a gente já furou em água rasas, mas não em águas profundas. Adquirimos 29 blocos e vamos fazer sísmica. Até agora, a gente só conseguiu fechar sísmica de dois blocos. Ali é o caminho por onde passam baleias jubarte. Então, uma parte do ano não se pode fazer sísmica.
Onde vai furar no pré-sal?
Vamos furar em 2025 dois poços em Aram, mais dois poços em Alto de Cabo Frio Central e em Água Marinha. Raia Manta e Pintada a gente não vai furar mais, mas vai vai entrar para produzir.
Como a cotação do dólar a R$ 6 afeta a Petrobras?
O primeiro impacto vai ser no resultado. Nosso resultado do trimestre vai ser afetado fortemente. A gente já sabe disso.
Pode prejudicar projetos?
No momento não. Todos os projetos têm robustez muito grande e são feitos para condições extremas do dólar e do Brent (petróleo). Lógico que vai afetar, mas não fica inviável. Diminui a lucratividade. Como diminui para todas que dependem de importação.
Como a Petrobras pretende elevar a produção de gás nos próximos anos?
O primeiro grande negócio é a Rota 3. No final de 2026 a gente vai sair dos atuais 35 milhões de metros cúbicos por dia para 50 milhões de metros cúbicos por dia. Então já vai ter um ganho significativo até 2026. Depois, com Raia Manta, que tem a Equinor como operadora, estamos falando de mais 16 milhões de metros cúbicos por dia. E estamos com um bid (licitação) para Sergipe-Alagoas. Já teve muita consulta. Isso é muito positivo.