Apesar de ter recursos naturais abundantes para a transição energética, o Brasil precisa preencher uma lacuna anual de R$ 249 bilhões em investimentos em infraestrutura para aproveitar melhor o seu potencial. É o que mostra levantamento feito pelo BNDES com exclusividade para O GLOBO, com base em dados da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Por ano, seria necessário que as iniciativas pública e privada investissem R$ 462 bilhões nas áreas de transporte, eletricidade, telecomunicações e saneamento. Contudo, em 2023, o montante investido foi de R$ 213 bilhões, 46% do ideal.
— Nossa visão é de que nenhuma economia do mundo tem as vantagens que o Brasil tem. Estamos em uma posição geopolítica privilegiada, na qual dialogamos com o Sul Global e potências como Estados Unidos e países da Europa. Temos um sistema elétrico integrado e 88% renovável. Mais de 90% da frota de veículos leves rodam com biocombustíveis. Porém, entramos nesse cenário de transição energética com um gap (lacuna) grande em infraestrutura — diz a diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do BNDES, Luciana Costa.
A área de transportes é a que concentrou o maior déficit de investimentos em 2023, de cerca de R$ 200 bilhões. Já o setor de eletricidade teve superávit de aportes no mesmo período, recebendo R$ 4 bilhões a mais do necessário.
De acordo com Luciana, a diferença se explica pelo estágio diferente de maturação do arcabouço regulatório. Quanto mais a regulação evolui, maiores são as chances de serem estruturados bons projetos economicamente viáveis, capazes de atrair investimentos. É o caso do segmento elétrico, que já conta com uma regulação mais sofisticada comparado a outros setores:
— Transporte inclui mobilidade urbana, que é uma pauta cara para o BNDES. Estamos debruçados sobre essa questão com o objetivo de destravar financiamentos. O que falta também é oportunidade.
O banco e o Ministério das Cidades firmaram parceria para elaboração de uma Estratégia Nacional de Mobilidade Urbana, destinada a reduzir o déficit de investimentos em sistemas de transporte público de média e alta capacidades — como VLT, BRT e metrô— nas principais regiões metropolitanas do país. A aliança prevê a realização do Estudo Nacional de Mobilidade Urbana, para mapear as necessidades de investimento em 21 regiões metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes.
No ano passado, os investimentos públicos e privados em infraestrutura no Brasil cresceram 20% em relação a 2022. Para 2024, a projeção é de nova alta semelhante.
Além disso, em 2023, o Brasil foi o sexto país do mundo que mais investiu em transição energética, atrás de China, Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido e França. O valor dos investimentos foi da ordem de US$ 34,8 bilhões. A maior parte da quantia foi destinada à energia renovável.
Financiamento misto
Os financiamentos do BNDES para infraestrutura e energia em 2023 somaram US$ 16 bilhões (aproximadamente R$ 80 bilhões). Entre os projetos recentemente apoiados, estão a aquisição de 1.300 ônibus elétricos na cidade de São Paulo, que recebeu financiamento de R$ 2,5 bilhões do banco, e a implantação de múltiplas usinas de minigeração fotovoltaica (energia solar) pela Alsol, subsidiária da Energisa, em cidades de Minas Gerais, Ceará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. O investimento foi de R$ 667 milhões.
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— As taxas de juros altas são outro entrave para os investimentos. Mas, quando falamos de setores mais maduros e projetos economicamente viáveis, o retorno paga o financiamento. O desafio é para novas tecnologias que nem sempre são maduras e escaláveis. Aí pode haver perda de dinheiro.
Luciana afirma que, como as externalidades negativas não são precificadas, a solução passa pelo blended finance (financiamento misto), que une recursos públicos e privados a dinheiro de filantropia.
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