José Eduardo Agualusa
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José Eduardo Agualusa

Jornalista, escritor e editor.

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José Eduardo Agualusa

RESUMO

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GERADO EM: 08/11/2024 - 20:43

Miguel Sousa Tavares: Reflexões sobre Trump e o futuro incerto

O escritor português Miguel Sousa Tavares previu a vitória de Trump. Alerta sobre impactos ambientais e sociais. Expressa a importância de aproveitar o tempo diante da incerteza. Reflete sobre a decadência democrática e o aumento do ódio. Finaliza com um tom resignado, porém esperançoso, diante do futuro incerto.

O escritor e analista político português Miguel Sousa Tavares previu a vitória de Donald Trump, em diversos textos e entrevistas, com absoluta segurança — e um elegante travo de melancolia. Tavares é um cético com largos anos de prática. Não alimenta grandes ilusões quanto às virtudes da Humanidade. Ele é a melhor prova de que os pessimistas, como os gatos, enxergam melhor na escuridão.

Quanto a mim, fui derrotado pelo meu habitual excesso de otimismo e de confiança nas pessoas. Nunca acreditei que a maioria dos americanos fosse capaz de votar num homem tão explicitamente mau. Enganei-me uma vez mais.

O triunfo de Donald Trump representa, em primeiro lugar, uma derrota na luta por um planeta mais sustentável. O novo governo americano irá reinvestir nos combustíveis fósseis, desacelerando a aposta nas energias renováveis e colocando em causa ou mesmo abandonando os compromissos internacionais para o controle da crise climática. Veremos como fará para lidar com as consequências. Em qualquer caso, o planeta inteiro, e não apenas os EUA, pagará muito caro por tais opções.

Assistiremos, com certeza, a uma persistente degradação das democracias no mundo, e a um aumento do clima de ódio. Ah! Mas não haverá guerras — asseguram os admiradores de Trump. Donald acabará com todos os conflitos, começando pela guerra na Ucrânia, e tudo isto em apenas 24 horas.

É de prever, sim, que Donald Trump, cumprindo instruções do seu amigo e mentor, Vladimir Putin, abandone a Ucrânia, o que forçará Zelensky a negociar um acordo de paz. Infelizmente, a indústria armamentista, à qual Trump tanto deve, precisa de guerras. Quando não existem, inventa-as, e desde que isso não afete os interesses de Putin, Trump não se oporá a elas.

E agora?

Agora ainda não é o fim do mundo. Sosseguem. É apenas o princípio do fim do mundo.

Resta-nos algum tempo até que um furacão caia sobre nós. Ou uma bomba. Ou uma nova pandemia. Ou um daqueles balões com cocô que a Coreia do Norte vem lançando sobre a Coreia do Sul. Se for para escolher, prefiro o furacão.

Quero aproveitar estes últimos dias, ou meses, ou anos, para reler Eça de Queirós, Clarice Lispector, Sophia de Mello Breyner, García Márquez, Borges, Cortázar. Vou escrever um romance erótico. Vou nadar ao pôr do sol. Vou brincar com a minha filha pequena. Vou conversar mais com os meus filhos mais velhos. Vou visitar os pastores nômades do Sul de Angola. Vou escalar o Kilimanjaro. Vou voltar a inscrever-me num curso de danças africanas. Sempre fui o desastre dançante da família. Não tenho futuro como dançarino. Nesta altura, contudo, ninguém tem. Saber que tenho tanto futuro como dançarino, ou como escritor de romances eróticos, ou como empresário de novas tecnologias, quanto o Elon Musk — a menos que o desgraçado fuja para Marte — é quase consolador. Quase libertador.

Vem, fim — mas devagar! Os que não têm futuro te saúdam!

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