Proibição de celulares: pesquisa em escolas do Rio mostra ganhos após veto em sala, mas implementação causa dúvidas
Projeto diz que aparelhos devem ficar na mochila dos alunos e só podem ser usados em casos de saúde, perigo, de inclusão, acessibilidade, garantia dos direitos fundamentais e para fins pedagógicos
RESUMO
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GERADO EM: 16/12/2024 - 22:55
"Proibição de celulares em escolas gera debates e desafios no Rio"
Pesquisa no Rio mostra benefícios da proibição de celulares em escolas, mas gera dúvidas na implementação. Professores apontam dificuldades e falta de estrutura. Debate sobre interação social e desenvolvimento infantil. Alguns defendem flexibilização, enquanto outros destacam impactos positivos na concentração e saúde mental dos alunos.
Aprovado na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados na semana passada, o projeto de lei que proíbe o uso de celulares nas escolas tenta implementar em todo o país um modelo inspirado nas escolas cariocas. Apesar do apoio ao texto de partidos de espectros políticos distintos e dos primeiros bons resultados colhidos pela prefeitura de Eduardo Paes, a medida é criticada por professores, que apontam falhas e dificuldades no cumprimento da lei.
Os dados da pesquisa realizada pelo município mostram que os alunos têm mais chance de qualidade de aprendizado se não estiverem usando os aparelhos eletrônicos.
O texto que chegará ao Senado determina que os celulares devem ficar na mochila dos alunos e só podem ser usados em casos de saúde, perigo, de inclusão, acessibilidade, garantia dos direitos fundamentais e para fins pedagógicos. O projeto foi relatado na CCJ pelo deputado federal Renan Ferreirinha (PSD-RJ), que se licenciou do posto de secretário municipal de educação da gestão Paes.
O estudo da prefeitura aponta que a chance de um aluno estar no nível adequado de aprendizado de matemática varia de 32% a 53%, a depender da idade. Ferreirinha aponta que a disciplina é um indicativo importante por se tratar de um aprendizado específico para as salas de aula, diferente da língua portuguesa, que está presente no cotidiano do estudante. A avaliação municipal qualitativa também apontou uma redução de bullying e cyberbullying no ambiente escolar.
No Rio de Janeiro, professores da rede municipal apontam dificuldade para realizar a fiscalização e a falta de planejamento para a implementação da proibição. Ferreirinha, por sua vez, afirma que o ambiente escolar é “dinâmico” e que pedagogos estão acostumados a lidar com situações do tipo.
— O que acontece se o aluno não respeitar o professor? Chama atenção, tira de sala, vai para a diretoria. A escola é muito mais dinâmica, ela consegue conduzir muito melhor do que a gente imagina. Ela já está acostumada a lidar com situações assim — afirmou Ferreirinha.
Thais Coutinho, professora da rede municipal, afirma que a medida foi para "inglês ver" e que não há condição para a implementação.
— Gera uma demanda para o professor sem ter uma contrapartida. Temos casos de enfrentamento e agressões de professores por motivos variados e esse acaba sendo mais um desgaste. A medida veio sem um plano de ação concreto — afirma a pedagoga.
Andréia Prestes, professora no Lins e no Alto da Boa Vista, pontua que existem problemas mais antigos na educação carioca e que não passam pela necessidade de proibição dos aparelhos. Ela aponta, por exemplo, a falta de estrutura multimidia para a realização de atividades.
— Eu acho que deveria haver um investimento em tecnologia. Hoje não temos, os professores usam os aparelhos pessoais. A escola deveria fornecer multimídia para a educação não ser feita no telefone dos alunos. Tem gente que não tem celular, por exemplo. Se tivesse tecnologia para todos seria um ensino mais democrático.
A interação dos alunos e a realização de atividades fora das telas é mais um ponto chave no debate. Ferreirinha afirma que a prefeitura identificou uma “atrofia social” das crianças, causada pelo isolamento durante o uso dos aparelhos eletrônicos.
— É preciso ter interação social, convivência. Não pode ficar isolado. As crianças estavam com atrofia social. É preciso interagir, correr, fazer amigos, aprender a socializar.
Thais Paulino, mãe de uma criança de quatro anos, percebeu que desde a proibição o filho descobriu interesse em outras atividades e reduziu o uso do aparelho também dentro de casa.
— Ele está mais concentrado e tem brincado mais na escola e isso tem se estendido para dentro de casa. Ele esquece o celular e procura outras crianças para brincar, vai desenhar. Antes ele me pedia o telefone.
O deputado federal Rafael Britto (MDB-AL) defende que haja uma alteração no texto para permitir o uso dos aparelhos durante o recreio. Para o parlamentar, além de se tratar de um novo modelo de interação, é preciso pensar que diversas escolas no país não possuem espaço para recreação, como quadras esportivas.
— Acho que isso deveria ser decidido por cada escola de acordo com sua realidade. Tem escola sem quadra, laboratório de informática, pátio. E hoje os jovens não se isolam, eles estão juntos usando as redes sociais, fazendo vídeos, fotos.
O professor e psicanalista Pedro Cattapan, aponta que a limitação do uso dos aparelhos ajuda não só na concentração dos alunos, mas também na construção das capacidades humanas de lidar com desprazeres, fundamentais para evitar doenças como a depressão e o TDAH.
— Os alunos encontram janelas na internet para escapar da sala de aula e evitar lidar com as situações de desconforto, angústia e desprazer de estar vivendo o momento da sala de aula. Isso faz com que a gente não aprenda a tolerar o incômodo e entender que a vida tem desprazeres em prol de um prazer futuro. Essa situação pode chegar a extremo de saúde mental, que podem ser TDAH, depressão, e outras questões mentais.