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O passado com um pé no presente.

Informações da coluna

William Helal Filho

Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Editora Globo pelo programa de estágio, foi repórter e editor. Hoje é responsável pelo Acervo.

RESUMO

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GERADO EM: 12/12/2024 - 20:08

Memórias de Sid Watkins sobre Ayrton Senna

O médico Sid Watkins relembra a tentativa de salvar Ayrton Senna em acidente fatal na Fórmula 1 em 1994. Ele aconselhou Senna a não correr, sentiu sua alma partindo na pista e previu que ele poderia ter conquistado mais dois títulos, igualando Juan Manuel Fangio.

O cirurgião inglês Sid Watkins era o chefe da equipe médica que tentou socorrer Ayrton Senna depois do acidente fatal no Grande Prêmio de Ímola, em 1994. Como mostra a nova série sobre o tricampeão de Fórmula 1, disponível na Netflix, Waktins e o brasileiro eram amigos e tiveram uma conversa franca na véspera da morte do piloto. Em 1996, o britânico lançou o livro "A vida no limite", sobre seu dia a dia como um médico da elite do automobilismo. Nesta entrevista ao GLOBO, em 1997, o cirurgião falou sobre o trecho do livro em que relembra a conversa com Senna antes da prova e o atendimento após a batida. Ele explicou como sentiu a alma do brasileiro partindo quando ainda estava na pista.

O que o senhor disse a Ayrton Senna antes da corrida?

Foi na véspera do GP de Ímola. Senna chorou no meu ombro, e eu disse que seria uma boa ideia se ele não corresse. Era uma conversa a sós com Ayrton, e falei que ele já tinha feito o bastante. Já era um tricampeão mundial. Lembro-me das minhas palavras exatas: "Nós sabemos que você é o piloto mais rápido e mais corajoso. Já não precisa provar nada ao mundo. Se você deixar a Fórmula 1 agora, eu também deixarei. Então, poderemos ir pescar".

Por que o senhor pediu a Senna que ele não disputasse a corrida ?

Senna estava bastante chocado com o acidente fatal ocorrido com Roland Ratzenberger durante uma volta de classificação também na véspera da prova.

Que resposta ele deu ao senhor?

Quando a gente fazia uma pergunta difícil a Senna, ele não respondia imediatamente. Não importava que pergunta era. Se exigisse uma avaliação, Senna demorava-se pensando. Uma vez, levei Senna para um encontro numa escola na Escócia. Perguntei a ele sobre seus sentimentos religiosos e o que ele pensava do seu rival Alain Prost. Ele, então, pensou com todo cuidado. Cheguei a duvidar se iria dar uma resposta porque ele passou um longo tempo pensando. Já antes de ímola, Senna olhou por cima do meu ombro, como se estivesse mirando o infinito. Não estava olhando pra mim nem pra nada. Então, ele disse: "Sid, há coisas sobre as quais nós não temos escolha. Eu tenho que ir adiante".

Num trecho do livro, o senhor diz que é totalmente agnóstico, mas teve a impressão de que a alma de Senna o deixou ali, na pista de Ímola, no momento em que o senhor o socorria. O que deu ao senhor a impressão de que Senna perdeu a alma na pista? Senna estava clinicamente morto?

Senna deu um grande suspiro naquele momento. Seu rosto tinha uma expressão tranquila. Parecia em repouso. Tive ali, no momento em que o socorria ao lado do carro, a estranha sensação de que a alma de Senna tinha partido. Não posso explicar exatamente o que senti. Foi uma sensação que não tinha experimentado antes, talvez porque éramos bons amigos e nos amávamos.

Mas ele só morreu mesmo no hospital, certo?

Sim. Senna ainda estava vivo quando foi levado para o Hospital Majore, em Bolonha. Quero dizer, ele estava clinicamente vivo. O coração estava batendo. Senna ainda respirava. Mas percebi que ele não sobreviveria. Eu não suportava ficar ali por mais tempo. Sabia que ele logo estaria clinicamente morto.

Outros pilotos ganharam mais títulos que Senna. Que posição o brasileiro ocupa na Fórmula 1?

Se Senna tivesse sobrevivido ao acidente em Ímola, disputaria ao menos outras quatro temporadas. Quando ele morreu, tinha apenas 34 anos. Eu diria que ele levantaria dois outros títulos mundiais. Igualaria, então, a marca do argentino Juan Manuel Fangio, que foi cinco vezes campeão.

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