Tim Lopes começou a trabalhar na Globo como produtor de reportagens do Fantástico em 1996. Ele venceu o Prêmio Esso de Telejornalismo de 2001 pela série Feira das Drogas, exibida no Jornal Nacional. A morte do jornalista abalou o país em 2002. Tim foi morto durante a apuração de uma denúncia de consumo de drogas e exploração de menores em balies funk na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro.
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Webdoc sobre a cobertura do assassinato de Tim Lopes em 2002, com entrevistas exclusivas do Memória Globo.
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A tristeza pela morte de Tim Lopes permeou os telejornais do dia 10 de junho de 2002. O jornalista, que havia desaparecido oito dias antes, enquanto apurava uma denúncia de consumo de drogas e exploração de menores em bailes funk na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro, teve a morte confirmada depois da prisão de dois integrantes da quadrilha do traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco. “Acho que foi o fato mais triste da minha vida”, definiu Ali Kamel, então diretor da Central Globo de Jornalismo.
Arcanjo Antonino Lopes do Nascimento era filho de Maria do Carmo e Argemiro Lopes do Nascimento. Foi criado, desde os 8 anos, no Morro da Mangueira, no Rio de Janeiro, junto com os irmãos Miro e Tânia Lopes. Teve dois filhos, Bruno, do primeiro casamento, e Diogo, do segundo. Deixou uma viúva, Alessandra Wagner, com quem viveu por dez anos.
Formado em jornalismo pela Faculdade Hélio Alonso, Tim Lopes começou a trabalhar como contínuo na revista Domingo Ilustrado, do jornalista Samuel Wainer. Ele contava que seu apelido fora dado pelo próprio dono no jornal, devido a sua semelhança com o cantor Tim Maia.
Perfil de Tim Lopes narrado por Hélter Duarte, RJTV, 19/09/2002.
Ainda na década de 1970, trabalhou no extinto jornal O Repórter. Para uma matéria sobre as condições de trabalho nas obras do metrô do Rio, vestiu-se de operário. “Sempre procurei investigar, no fundo, a alma das pessoas”, afirmou certa vez. O repórter costumava entrar na pele dos entrevistados: passou-se por mendigo para retratar a realidade de meninos de rua em reportagem do Jornal do Brasil. Quando trabalhou no jornal O Dia, disfarçou-se de obreiro e sem-teto. Em uma das primeiras reportagens que fez na Globo, para o Fantástico, fantasiou-se de Papai Noel e ouviu crianças carentes sobre seus sonhos. Para realizar uma matéria sobre gangues de rua, se fez passar por vendedor de água de coco na Central do Brasil – e acabou gravando, com uma microcâmera escondida, a morte de um bandido.
Apesar de conhecer a fundo os personagens de suas matérias, para a maioria dos telespectadores brasileiros Tim Lopes não tinha rosto. O fato de se dedicar à produção jornalística, apurando os fatos, poupava-o de ficar na frente das câmeras. Somente assim, o repórter era capaz de mostrar o que, muitas vezes, ninguém tinha coragem de denunciar.
Ganhou muitos prêmios em sua carreira, inclusive o Prêmio Esso, em 2001. Em 1985, ganhou o 11º Prêmio Abril de Jornalismo na categoria Atualidades, pela matéria Tricolor de Coração, publicada na revista Placar. No ano seguinte, foi novamente agraciado com o Prêmio Abril, desta vez pela matéria Amizade sem Limite.
Tim Lopes trabalhou cerca de dez anos no jornal O Globo. De meados da década de 1970 até o começo dos anos 1980, cobriu como poucos a cidade do Rio de Janeiro. Em 1986, entrou para o Jornal do Brasil, no qual permaneceu por cinco anos. Trabalhou também na sucursal carioca da Folha de S. Paulo e no jornal O Dia, quando realizou a reportagem Funk: Som, Alegria e Terror, que recebeu, em fevereiro de 1994, o Prêmio O Dia de Melhor Reportagem. Sua matéria investigava a exploração sexual de menores em bailes funk, tema que voltaria a abordar oito anos mais tarde, tragicamente, na apuração que o levaria à morte.
Tim Lopes começou a trabalhar na Globo em março de 1996, como produtor de reportagens do Fantástico. Realizou a série Hora da Verdade, na qual familiares de vítimas ficavam frente a frente com assassinos presos. “É um desafio. Relatar a violência a partir dos próprios personagens e por eles mesmos. Mostrar a dor, o sentimento de vingança, a resignação, o perdão. Falar do sentimento humano, da emoção. Colocar a vítima e seu algoz cara a cara num momento de catarse, sofrimento e alívio. Propiciar a sua hora da verdade”, declarou à época, a respeito do programa.
Reportagem de Tim Lopes e Flávio Fachel sobre a feira livre das drogas no conjunto de favelas do Alemão, da série que foi ao ar no Jornal Nacional, 03/08/2001.
Após quatro meses de Fantástico, o repórter foi deslocado para a editoria Rio, na qual coordenou a equipe que realizou a série Feira das Drogas, exibida com grande destaque no Jornal Nacional. O trabalho, que recebeu o Prêmio Esso de Telejornalismo de 2001, denunciou a livre ação dos traficantes na Favela da Grota, no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro.
“Tim era um apaixonado pelo jornalismo investigativo e se orgulhava dos resultados positivos de cada denúncia que fazia”, relembra o então diretor-geral de Jornalismo e Esportes, Carlos Henrique Schroeder. Sua última série de reportagens para a Globo revelou os maus-tratos em clínicas para recuperação de dependentes químicos. Para apurar a matéria, internou-se e viveu como um ex-viciado. “Tim trazia grandes histórias, tinha autonomia total para investigar. Ele mesmo as prospectava, era um cara muito experiente”, recorda-se o apresentador e editor-chefe do Jornal Nacional, William Bonner.
Dia 2 de junho de 2002, Tim Lopes deixou a redação da Globo para concluir uma apuração. Ele havia recebido denúncias de moradores do bairro da Penha, no Rio de Janeiro, sobre consumo de drogas e sexo explícito em bailes funks na favela Vila Cruzeiro. O jornalista estivera na região quatro vezes, duas delas com microcâmeras escondidas, para fazer gravações. Na quinta, não voltou para casa.
A confirmação da morte de Tim Lopes veio após uma semana, com base nos depoimentos de cinco presos do bando de Elias Maluco, chefe do tráfico na favela. Segundo os envolvidos, o jornalista teria sido torturado, baleado e assassinado pelo próprio traficante. Como a polícia confirmou mais tarde, seu corpo foi esquartejado e queimado em pneus na Favela da Grota, no Complexo do Alemão. Mais de um mês depois, um exame de DNA comprovou que a ossada encontrada no cemitério clandestino da Grota era do repórter.
Tim Lopes foi velado em 7 de julho de 2002. Indignados, os jornalistas organizaram passeatas, clamando por justiça, além de homenagens em prol da memória do colega assassinado. “Com a mobilização de jornalistas, nas ruas, e as reportagens cobrando das autoridades a prisão dos algozes, nós conseguimos que todas as pessoas envolvidas com a morte do Tim fossem presas”, explica Ali Kamel. Nos meses que se seguiram, os setes acusados, incluindo Elias Maluco, foram capturados e condenados.
Tim Lopes foi homenageado diversas vezes. No dia em que se confirmou a sua morte, o Fantástico exibiu uma matéria especial relembrando a carreira do repórter. No dia seguinte, o Jornal Nacional teve uma edição especial, encerrada com uma nota da redação, lida por William Bonner, seguida de uma salva de palmas dos colegas. Seu nome batizou uma escola estadual no município fluminense de Paraíba do Sul e uma rua na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Homenagem a Tim Lopes no Jornal Nacional, 10/06/2002.
Em 2002, foi criado o Prêmio Tim Lopes de Jornalismo Investigativo, com o objetivo de estimular a imprensa a seguir cobrindo o abuso e a exploração sexual infantil – temas da matéria a que o repórter se dedicava quando perdeu a vida. No carnaval de 2003, a escola de samba Acadêmicos do Tucuruvi desfilou ao som de Não Calem Minha Voz, um samba enredo em sua homenagem, cujo refrão clamava pela verdade, “tim-tim por tim-tim”. Em 2012, seu filho, o jornalista Bruno Quintella, da TV Globo, dedicou-se à produção de um documentário sobre o pai, História de Arcanjo — um Documentário sobre Tim Lopes.
Tim Lopes sempre é lembrado com carinho pelos colegas de profissão, que carregam a missão de não deixar que sua morte seja em vão. “Antes do Tim Lopes, você se sentia como super-homem, achando que nada iria acontecer durante uma apuração”, pontua o repórter Roberto Kovalick. “Definitivamente, foi um divisor de águas, antes e depois do Tim”, reitera o jornalista Márcio Gomes.
A segurança das coberturas em favelas foi reforçada, mas a morte de Tim Lopes não calou a imprensa. A Globo continuou apurando os casos de violência, como explica o jornalista Luiz Cláudio Latgé: “Ninguém queria chegar à situação de não cobrir determinados fatos [em favelas]. Seria uma derrota parar de cobrir, e não aceitamos isso.” “Foi muito duro e, certamente, uma das maiores lições que aprendemos”, ressalta o Carlos Henrique Schroder.