Por Memória Globo

Renato Velasco/Memória Globo

Paulo Renato enfrentou um desafio quando começou na Globo: vencer o sotaque carregado do interior de São Paulo. O diretor da afiliada da emissora na época, João Garcia Duarte Neto (EPTV Central, em São Carlos), pediu para que ele lesse um manual de fonoaudiologia sem a pronúncia acentuada. A leitura da apostila durou uma madrugada inteira, e o repórter recém-chegado passou no teste.  Assim, o filho do policial militar aposentado Carmelino Soares e da dona de casa Maria Vitalina Botura Soares ingressou no jornalismo de televisão, onde está até hoje.           

Você pode correr risco em uma matéria de investigação, mas o mais difícil é quando você vê o sofrimento das pessoas em situações trágicas

Paulo Renato Soares — Foto: Globo

Nascido em Bauru no dia 7 de junho de 1970, Paulo Renato Soares estudou em escola pública e o seu primeiro trabalho foi na Rede Ferroviária Federal. Não tinha nenhuma afinidade com o jornalismo até ser estimulado por uma professora de português em um curso técnico. “Tenho um jornalista em casa (ele é irmão do diretor de Programação, Amauri Soares), mas também tinha um advogado. Fiquei na dúvida, mas acabei me decidindo por jornalismo”.

Quando estava no fim da faculdade, Paulo Renato conseguiu um estágio na afiliada da Globo em São Carlos e, em 1993, foi contratado como produtor. “Comecei na rádio escuta, que é como definíamos a função do jornalista que ficava, naquele tempo, ouvindo as rádios e ligando para hospitais, delegacias, pontos de táxi, para saber se estava acontecendo alguma coisa na cidade.” Três meses depois, ele foi para a reportagem. Pelo fato de São Carlos ser uma cidade universitária, a maioria das pautas era para divulgar pesquisas científicas, que iam ao ar nos telejornais locais e Bom Dia São Paulo.

Em 1994, na afiliada de Ribeirão Preto, Paulo Renato fez sua estreia em rede nacional. “Fui a uma cidade chamada Batatais e descobri que apenas um policial militar fazia a guarda de todas as obras de Portinari dentro de uma igreja. Eu tinha 24 anos.”

A chance de ir para a cidade de São Paulo começou a ser negociada depois do retorno de Paulo Renato para Bauru, onde ficou um ano e meio. Em 1997, o repórter, ávido para cobrir os fatos da capital, aceitou o convite para trabalhar na TV Cultura, onde permaneceu até 1999. Lá, fez matérias de economia, sustentabilidade e política. Em 1998, cobriu a reeleição de Mário Covas para governador de São Paulo e foi o primeiro repórter a anunciar, ao vivo, o resultado da apuração.

A experiência adquirida na TV Cultura foi levada para a TV Bahia, afiliada da Globo. Quando chegou a Salvador, em 1999, Paulo Renato Soares nem passou pelo hotel. Foi direto para a redação e logo a chefia o enviou para fazer a cobertura do sequestro da mãe de Vampeta, ex-jogador do Corinthians, para o Jornal da Globo. O repórter também fez matérias de política, festas religiosas, denúncias e carnaval. “Cobertura de carnaval de rua é diferente; carnaval com abadá, pipoca, pessoas pulando atrás do trio elétrico. Tem matéria para fazer o tempo todo”.

Ainda na TV Bahia, Paulo Renato destaca a cobertura dos 500 anos do Brasil, quando foi montada uma redação em Porto Seguro. Lembra os conflitos entre manifestantes e a polícia e uma imagem marcante: um índio ajoelhado na frente da tropa de choque. Outra matéria impactante foi a que denunciou o desperdício de dinheiro público em obras de fachada.

Paulo Renato Soares no dia do depoimento ao Memória Globo, em 2015 — Foto: Renato Velasco/ Memória Globo

Depois de um ano em Salvador, Paulo Renato Soares foi chamado para a afiliada da Globo em Porto Alegre, a RBS. A primeira matéria feita por lá foi citada por William Bonner, em um encontro interno da Globo, como exemplo de como usar a criatividade quando faltam pautas. A equipe mostrava o tempo que uma correspondência levava de uma cidade para outra, na fronteira com o Uruguai. “A carta teria que sair de Santana do Livramento, no Brasil, para Rivera, no Uruguai. Era só atravessar uma rua, mas o documento ia pelos Correios. Saía de Santana do Livramento, passava por Porto Alegre, Rio de Janeiro e depois chegava em Rivera.”

Na RBS, o repórter também participou da cobertura do Fórum Social Mundial, uma espécie de contraponto ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. “Foi um momento de discussão com pessoas do mundo inteiro, com ideias novas, falando de sustentabilidade, desenvolvimento social, de ajudar aos pobres, de distribuição de renda.”

Enviado especial

Logo que chegou a Porto Alegre, em 2000, Soares recebeu uma missão da RBS. A meta da afiliada era reconquistar a cobertura dos acontecimentos em Buenos Aires. Missão dada, missão cumprida. O enviado especial cobriu a crise política da Argentina de 2001 a 2003 e conseguiu uma entrevista exclusiva com o presidente eleito naquele período: Eduardo Duhalde. “Eu tinha me preparado para a entrevista e o presidente não gostou da conversa. Ele achou que eu fosse tomá-lo como salvador da pátria. Mas foi uma entrevista para cobrar o que ele iria fazer pelos argentinos que estavam passando fome. Quando terminou, ele disse que tinha feito uma das entrevistas mais duras. Isso foi gratificante pra mim.”

Próximo destino: África. Em 2003, ele foi designado a cobrir a chegada de tropas brasileiras em Angola. Depois da guerra civil que deixou a maioria da população na penúria, o governo brasileiro enviou tropas para ajudar na reconstrução do país.

“Por causa da guerra, as famílias se separaram. Em algumas esquinas, grupos de pessoas se reencontravam depois de cinco, seis, dez anos. Um país pobre, castigado pela guerra. Eu estava ali.”

Em julho de 2004, Paulo Renato Soares foi para Porto Príncipe, no Haiti, que estava sob o poder de rebeldes armados. Uma missão de paz da ONU foi enviada e, com a ajuda do Exército brasileiro, a democracia foi restabelecida no país As reportagens de Paulo Renato foram exibidas no Jornal da Globo.

RBS

De volta a Porto Alegre, Paulo Renato Soares recebeu uma denúncia sobre prostituição infantil. Crianças estariam sendo pagas para fazer sexo, principalmente, com caminhoneiros. A equipe de jornalismo foi em busca da verdadeira história. Passou várias noites conversando com pessoas em postos de gasolina e ganhando a confiança de meninos e meninas. Como a reportagem também era feita em lugares perigosos, os jornalistas usaram microcâmera, um tipo de equipamento polêmico. “Quando você usa a micro tem que haver o interesse público; você não vai expor e nem invadir a privacidade de ninguém, a não ser que haja ali um crime.” A reportagem foi exibida no Jornal da Globo. Em 2005, Paulo Renato fez sua primeira série para o Jornal Nacional. As oito matérias mostravam as condições precárias das estradas brasileiras. Enquanto ele saía de Porto Alegre para Fortaleza, o repórter César Menezes fazia o caminho inverso. “Conseguimos mapear a situação de duas das principais rodovias federais do país, a BR 101 e a BR-116, estradas péssimas, mas que melhoraram depois das reportagens.”

Além de estrear série no JN, Paulo Renato também fez o seu primeiro Globo Repórter pela RBS. Tratava-se de uma matéria especial sobre transplante de órgãos. Os pacientes eram crianças e uma delas morreu durante as gravações. Um momento dramático, mas que motivou a equipe a seguir em frente para alertar as pessoas sobre a importância da doação.

“Tinha um menino, o Henrique, que era sensacional, cheio de vida. Ele precisava de um transplante. Aquelas crianças respirando por aparelhos a espera de um pulmão. Foi difícil, mas foi um dos trabalhos que eu tenho muito orgulho de ter feito.”

Globo Rio

Em 2005, a convite de Renato Ribeiro, então diretor regional do Rio de Janeiro, Paulo Renato foi para a cidade fazer matérias para o Jornal da Globo e Jornal Nacional. O jornalista destaca uma série que abordou o estado dos ônibus municipais que percorriam o país. A equipe fez flagrantes perigosos de personagens que vivem o dia a dia nas estradas brasileiras: motoristas com carga excessiva de trabalho; drogados para se manter acordados; ônibus piratas sem nenhuma segurança. “Conseguimos a imagem de um motorista que dormia ao volante, na estrada.”

Além dos telejornais de rede, Paulo Renato também fez o RJTV. Participou de coberturas ligadas à violência urbana. Uma de suas primeiras matérias, em um plantão, o repórter e a equipe registraram um arrastão na praia: era briga entre gangues rivais. “Eu falei: ‘Nossa! Bem-vindo ao Rio de Janeiro’. O jornalista reconhece que o Rio passou por momentos mais seguros – com a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora, as UPPs-, mas que atualmente a segurança pública enfrenta problemas. “ E tem uma premissa na Globo: uma imagem não vale uma vida.”

Uma das maiores coberturas da editoria Rio foi sobre a implantação da UPP no Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro, em novembro de 2010. Naqueles dias, a missão de Paulo Renato era subir o morro assim que as tropas tomassem o território dos traficantes de drogas. “Fiquei onde os chefes das forças militares estavam. De onde iam partir policiais, soldados e carros blindados.” Foram sete horas ao vivo, mostrando a prisão de traficantes, a apreensão de armas e de drogas. No ano seguinte, as reportagens da Globo ganharam o prêmio Emmy, o equivalente ao Oscar da televisão.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Webdoc jornalismo - Ocupação da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão (2010)

Webdoc jornalismo - Ocupação da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão (2010)

O sumiço de Amarildo, o ajudante de pedreiro que desapareceu em julho de 2013, após ter sido detido por policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, no Rio, foi outro caso de repercussão acompanhado de perto por Paulo Renato Soares. O jornalista descobriu que a câmera de segurança que flagrou a prisão de Amarildo tinha sido adulterada, apesar de um major da PM dizer o contrário. “O importante foi discutirmos as informações que recebíamos da polícia. Tínhamos que desconfiar e desconfiar bem.”

A mesma intuição, Paulo Renato teve em outro caso de violência que também abalou a cidade. O médico e ciclista Jaime Gold, de 56 anos, foi assassinado na Lagoa quando pedalava. A polícia apontou três menores de idade suspeitos da morte do médico. O repórter desconfiou. E mais uma vez, percebeu a precipitação dos agentes de segurança para achar o culpado.

FONTE:

Depoimento concedido ao Memória Globo por Paulo Renato Soares em 28/08/2015
Mais do memoriaglobo
Projeto Resgate

Malhação reestreou em maio de 2001 com uma trama mais dramática que o habitual e investindo mais nas campanhas de responsabilidade social.

'Malhação Múltipla Escolha 2001' estreia no Globoplay  - Foto: (Memoria Globo)
Projeto Resgate do Globoplay

Adaptação de obra homônima de Antonio Callado, 'A Madona de Cedro' relata o drama de um homem religioso que contraria seus valores morais em nome do amor.

O roubo de uma obra de arte movimenta 'A Madona de Cedro' - Foto: (Jorge Baumann/Globo)
Dia de alegria!

A atriz Adriana Esteves nasceu no Rio de Janeiro. Estreou na Globo em um quadro do 'Domingão do Faustão', em 1989. No mesmo ano estreou em sua primeira novela, 'Top Model'.

Parabéns, Adriana Esteves! - Foto: (Ique Esteves/Globo)
O telejornal que acorda com o país

Com uma linguagem leve e informal, o telejornal informa as primeiras notícias do Brasil e do mundo para um público que acorda ainda de madrugada.

'Hora 1' completa 10 anos apostando no dinamismo e credibilidade  - Foto: (Arte/Memória Globo)
Fundador da TV Globo

O jornalista e empresário Roberto Marinho nasceu no Rio de Janeiro, em 3 de dezembro de 1904. Foi diretor-redator-chefe do jornal O Globo, aos 26 anos. Criou a TV Globo em 1965 e, em 1991, a Globosat, produtora de conteúdo para canais de TV por assinatura. Morreu em 2003, aos 98 anos.

Roberto Marinho nasceu há 120 anos: relembre a vida do jornalista e empresário - Foto: (Acervo Roberto Marinho)
"Quem cultiva a semente do amor..."

A novela exalta o poder feminino por meio da trajetória de Maria da Paz e traz uma história contemporânea de amor, coragem e esperança.

Relembre Maria da Paz, 'A Dona do Pedaço' - Foto: (João Miguel Júnior/Globo)
Projeto Fragmentos do Globoplay

A novela celebrava o centenário de morte de José de Alencar e se baseava em três obras do autor: A Viuvinha, Til e O Sertanejo.

'Sinhazinha Flô' teve Bete Mendes como protagonista  - Foto: (Nelson Di Rago/Globo)