Por Memória Globo

Cicero Rodrigues|Arte/Memória Globo

Muito pequeno, com menos de dez anos, Octavio Guedes lia para o pai, em voz alta, a Coluna do Castello, publicada no Jornal do Brasil. A intenção de seu pai era apenas ganhar tempo, enquanto fazia a barba, mas a experiência despertou no filho a vocação para o jornalismo. Formado na Universidade Federal Fluminense, Octavio Guedes trabalhou em 'O Globo', 'O Dia, no 'Jornal do Brasil' e ancorou, durante dois anos, o programa de rádio CBN Rio, antes de participar da equipe fundadora do 'Extra'. Durante 19 anos integrou a redação do jornal popular do Grupo Globo, como editor-executivo e diretor de Redação. Participou do processo de criação da versão digital do periódico e, depois, de sua unificação operacional com 'O Globo'. Desde 2017, é comentarista do Estúdio I, da GloboNews, e, em 2019, lançou o livro 'Essa República vale uma nota – Histórias do Brasil na visão de um impagável colunista de jornal'.

Essa capacidade de adaptação, de entender o meio e para quem a gente está falando, é o que garante a sobrevivência de um veículo

Octávio Guedes em depoimento ao Memória Globo, 2017. — Foto: Cicero Rodrigues/Memória Globo

Início da carreira

O carioca Octavio Massa Bragnoli Guedes nasceu em 21 de novembro de 1966, dois anos após o golpe que instaurou a ditadura militar no Brasil, e muito cedo entendeu a importância do jornalismo em sua vida. Filho da professora Lucy Massa Guedes e do capitão do Exército Jackson Bragnoli Guedes, cassado pelo regime militar, aprendeu cedo a ler a Coluna do Castello, no 'Jornal do Brasil', e a se informar sobre a situação política do país. “Com dez anos, eu era especialista em Arena, MDB, senador biônico, nenhuma criança da minha idade sabia aquilo”, brinca.

A vontade de ser jornalista surgiu daí, e, por mais que seu pai preferisse vê-lo advogado, Octavio Guedes não abandonou a vocação. O ex-capitão, que se tornou professor de geografia por ter sido perseguido, chegou a levar o filho, ainda estudante ginasial, para conhecer dois ambientes bem diferentes: a redação da pequena 'Tribuna de Niterói' e o escritório de Evaristo de Moraes, famoso criminalista que havia defendido Jackson Guedes gratuitamente. Apesar da clara organização do escritório de advocacia, em comparação com a desordem da redação, o jovem Octavio não foi influenciado – já sabia bem o queria.

Entrou no curso de Comunicação Social na Universidade Federal Fluminense e, no segundo período da faculdade, em 1986, foi procurar o dono da 'Tribuna de Niterói', em busca de estágio. Seu primeiro dia de trabalho foi de fortes emoções: o editor, Antonio Moraes, sentiu-se mal e entregou a produção do jornal ao jovem estudante sem nenhum conhecimento prático da profissão. “Ele ia me dando as instruções: ‘Pega o fax, leva na Cida’; ‘O que é Cida?’; ‘Não, Cida é uma moça’. Comecei como publisher; naquele dia eu mandava e desmandava na 'Tribuna de Niterói'. Fiquei tão nervoso que depois nem fui à faculdade, fui para casa dormir”, relembra.

No ano seguinte, Octavio Guedes conseguiu estágio em uma publicação maior, também de Niterói, o jornal 'O Fluminense'. Como agente comunitário de São Gonçalo (cidade vizinha), ele saía em um fusquinha e tinha que voltar com o relato de quatro demandas da comunidade. A função deu ao jornalista uma percepção mais clara dos problemas de impacto em locais pobres, com pouca presença do Estado, algo importante para a continuidade de sua carreira. De 'O Fluminense', foi para 'O Povo', onde descobriu a espetacularização da notícia. A forma como o jornal cobria crimes o incomodou, e a experiência durou pouco.

Depois de formado, no início da década de 1990, decidiu pedir emprego no 'Jornal do Brasil'. Começou com uma prova de fogo: no primeiro dia de trabalho, descobriu que o editor que o contratara havia pedido demissão. Desacreditado, foi enviado para fazer uma matéria sobre uma fábrica de medicamentos clandestina, que funcionava em um estábulo. Teve a sensibilidade de mostrar que os cavalos do estábulo tinham tratamento melhor que os doentes que recebiam os remédios, ganhou a capa do jornal e garantiu a vaga. Nos anos seguintes, o jornalista passou por períodos curtos em 'O Globo' e 'O Dia'. Neste último, escreveu uma matéria de grande repercussão. O jornalista conseguiu provar que o soldado da PM preso pela Chacina da Candelária, em que vários meninos foram assassinados no Centro do Rio, em 1993, era inocente.

Criação do Extra

Em 1998, Octavio Guedes recebeu um convite para participar da criação de uma nova publicação do Grupo Globo: o 'Extra'. “Decidi ir para essa aventura. Cheguei no início do ano, já estavam lá o Renato Maurício Prado, o Bruno Thys e o Eucimar de Oliveira. Fui com o Luiz André Alzer, colega de 'O Dia', entramos juntos. Entrei como editor-executivo – o máximo que eu tinha sido até então era chefe de reportagem –, com a missão de selecionar e treinar os repórteres”, explica.

A equipe de jovens profissionais passou por uma intensa preparação para conhecer e entender o perfil do jornal e de seus leitores, um grupo composto principalmente por segmentos da classe média que estavam chegando ao mercado consumidor, após o fim de um ciclo de inflação alta. Era preciso oferecer a esse cidadão, ávido por informações, notícias bem apuradas e redigidas, mas escritas de forma leve e pessoal. O 'Extra' logo se tornou um sucesso de vendas, impulsionado pelo sistema de cupons que os leitores juntavam e trocavam por produtos.

Um exemplo do bom jornalismo realizado pelo jornal foi a conquista do Prêmio Esso por uma matéria sobre as denúncias da Dona Vitória, nome fictício de uma mulher idosa que filmou de sua janela, em Copacabana, a relação corrupta entre traficantes e policiais militares. A reportagem, do jornalista Fábio Gusmão, levou à prisão de 34 pessoas, e só foi publicada depois que Dona Vitória conseguiu ser inserida no Programa de Proteção a Testemunhas, em 2005.

Pelo seu trabalho no 'Extra', Octavio Guedes ganhou três vezes o Esso, principal prêmio do jornalismo. Além da matéria sobre Dona Vitória, foi laureado duas vezes na categoria capa, em 2006 e 2007. Em 2010, recebeu o Awards of Excellence, da Society for News Design por uma capa homenageando o cantor Michael Jackson, logo após sua morte.

Em 2007, com o Extra consolidado como o maior jornal popular do Rio, foi a vez de lançar a versão da publicação na internet, o 'Extra Online'. Para avaliar a melhor maneira de organizar a redação, Octavio Guedes visitou as redações do 'Washington Post' e do 'New York Times', nos Estados Unidos, cada uma organizada a partir de modelos diferentes. Na primeira, os jornalistas que faziam as versões impressa e online estavam separados; na outra, estavam juntos. O editor-executivo percebeu que era possível escolher um caminho alternativo e buscou a criação de duas linguagens distintas, preparando os jornalistas da versão na internet para trabalhar também com vídeos.

Com as duas publicações, o 'Extra' pôde se aproximar ainda mais dos leitores e ampliar sua prestação de serviços. Um marco dessa fase foi o boneco João Buracão, fotografado pelo jornal em 2009 e, depois, adotado pela população da cidade do Rio de Janeiro e de outros municípios do estado, para a denúncia de ruas esburacadas. “A gente teve que encomendar mais bonecos João Buracão, porque um só não estava dando conta. João Buracão ganhou o título de cidadão honorário em várias câmaras de vereadores, e os políticos entenderam que era melhor recebê-lo do que brigar com ele. Viralizou de uma maneira que foi apresentado num congresso de jornalismo popular, e outros jornais da América Latina criaram seus bonecos”, conta.

Dupla função

Sem deixar as funções de editor-executivo, Octavio Guedes passou a comandar, em 2013, um programa matinal na CBN, o 'CBN Rio', ao lado da jornalista Lilian Ribeiro, no que seria sua primeira experiência como âncora. Levando ao ouvinte informações sobre trânsito e os acontecimentos na cidade, e abrindo pioneiramente a participação popular via WhatsApp, o programa propunha ser um permanente espaço de debates, conduzido com informalidade. No 'Extra', Octavio Guedes foi promovido a diretor de Redação em 2014, o que o levou a deixar a CBN no ano seguinte. Participou ativamente da unificação de redações com 'O Globo', promovida em 2017. O processo, bem-sucedido, tinha o objetivo de criar sinergias entre as publicações sem que houvesse a perda da identidade de cada uma. No final do mesmo ano, o jornalista deixou o cargo.

Na televisão

Depois da mídia impressa e do rádio, em 2017, Octavio Guedes descobriu a televisão. Passou a participar do 'Estúdio i', programa então comandado por Maria Beltrão na GloboNews, além de atuar como comentarista em outros jornais da emissora, como o 'Bom Dia Rio'. O jornalista sentia falta das manhãs na rádio, mas encontrou na TV uma maneira de matar a saudade. “A GloboNews tem o espírito que eu queria na CBN, que é o espírito da leveza, da seriedade, mas com leveza. Você vê que os comentaristas brincam, falam, mas ali tem a informação. A leveza não compromete a seriedade, e eu acho que esse é o espírito dos meios de comunicação”, ressalta.

Em 2019, junto com o colega de 'Estúdio i' Daniel Sousa, Octavio Guedes lançou o livro 'Essa República vale uma nota – Histórias do Brasil na visão de um impagável colunista de jornal' (Máquina de Livros). A obra mostra de forma bem-humorada a fixações recorrentes em alguns temas no Brasil: o medo do comunismo e o combate à corrupção e ao que se chama de velha política. “Nossa história é muito repetitiva, alterando períodos autoritários com democráticos nessa espera por um pai salvador e autoritário”, conclui.

Impeachment de Wilson Witzel foi assunto para Octávio Guedes no 'RJTV' em 06/11/2020

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Octavio Guedes segue atuando como comentarista em vários programas da GloboNews e da TV Globo.

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