A risada fácil é uma marca pessoal, torna o trabalho da apresentadora leve, principalmente quando tropeça no estúdio. Maria Beltrão ri das próprias gafes, aprende com os erros e segue adiante. Fazer jornalismo ao vivo é assim mesmo. Espontaneidade e descontração se equilibram com preparo, apuração, informação. “Embora eu brinque muito, porque sou esse ser que brinca, tenho muita noção da responsabilidade. Eu me preparo muito, improviso em cima. Quando o repórter entra no ar, sei a notícia inteira, já estudei, li, reli, vejo se tem alguma novidade, se eu posso acrescentar alguma coisa. Estar ao vivo é uma exposição enorme. Você tem que minimizar a possibilidade de erro”.
Maria Beltrão tem o dom de preencher os ambientes com bom humor e se destaca pelo jeito especial de abordar os fatos que noticia na GloboNews. Seja lá onde aconteçam. No Brasil ou no exterior, assuntos trágicos ou divertidos são tratados com seriedade e leveza pela jornalista. Marcas desta profissional de um metro e oitenta de altura, que consolidou o seu lugar no jornalismo ágil do canal a cabo. Maria fez parte da primeira equipe da GloboNews. Participou de inúmeros projetos pilotos até acertar o tom dos programas do canal. Ao lado de Márcio Gomes, apresentou o primeiro telejornal matutino. A jornalista se destaca também, desde 2006, na apresentação das transmissões do Oscar na Globo. A partir de 2008, passou a apresentar o 'Estúdio i'.
Despediu-se do programa em junho de 2022, para tornar-se apresentadora do 'É de Casa', da Globo, a partir de 9 de julho daquele ano.
Entrevista exclusiva da jornalista Maria Beltrão ao Memória Globo sobre o início na GloboNews.
Início da carreira
Maria Coutinho Beltrão nasceu no Rio de Janeiro em dia de feriado: sete de setembro. Era 1971. Filha da arqueóloga Maria da Conceição de Morais Coutinho Beltrão e do ex-ministro Hélio Beltrão, já falecido. O nome de batismo foi alterado quando ela se casou em 2015. A jornalista, que quando menina sonhava em ser professora, passou a assinar Maria Beltrão Saldanha Coelho. “Cheguei a dar aula em estágios, mas era mais difícil do que eu imaginava, embora fosse uma professora divertida, fizesse música sobre crase, história, música de tudo.”
Depois de se dedicar ao magistério, Maria resolveu fazer faculdade de Economia, mas também não deu certo. Foi aí que decidiu cursar Jornalismo e, em 1996, se formou pela extinta UniverCidade. “O curioso é que eu não ia bem nas aulas de televisão. Lá pelo quinto ou sexto período, fiz um curso de expressão e vídeo. O curso era da Alice-Maria, que tinha sido a grande diretora da Globo, grande jornalista, maravilhosa, meu ídolo. E achei que eu fui horrível no curso, porque tinha que ler o TP [teleprompter, equipamento acoplado à câmera que mostra o texto a ser lido pelo apresentador], e eu não enxergo direito, fico nervosa, gaguejo, sou péssima. Naquela época não existia GloboNews, o jornalismo de improviso. Só que quando eles brincavam no curso, dizendo que caiu o TP, para ver como a pessoa improvisava, os outros ficavam nervosos e eu ficava super calma, para mim isso era mais fácil. Então, quando eu estava no último período da faculdade, a Alice-Maria me ligou e falou: ‘Olha, vai aparecer um projeto’. Eu falei: ‘Mas, Alice, por que eu em televisão?’ Ela disse: ‘Porque esse projeto tem a ver com improviso e eu acho que nisso você é muito boa’”.
Contrariando as próprias expectativas, Maria Beltrão estreou como apresentadora. Ao lado de Márcio Gomes, capitaneava o 'Em Cima da Hora', no horário da manhã. “No começo do canal, cada casal apresentava seis jornais. Uma loucura. Mas eu adoro a adrenalina de estar ao vivo, ensina a ter responsabilidade, porque é uma janela aberta, é uma exposição enorme, e a chance de você falar besteira também é enorme. Quando entro para apresentar o jornal, estou munida das informações”.
Desde que o canal entrou no ar, Maria Beltrão apresentou diversos programas. De 'Pelo Mundo' ao Entre Aspas. Para o programa Almanaque foram mais de 500 entrevistas. “Entrevistei James Taylor, Robert Duvall, de quem eu era hiper fã, o pianista cubano Chucho Valdés, o Michel Legrand, um pianista francês por quem eu tenho a maior admiração e Mark Knopfler, do Dire Straits, meu ídolo maior. Entrevistei também Jorge Dória, Paulo Autran, Mauro Rasi, Cássia Kis, Tony Ramos, Pierce Brosnan, que era o 007 na época, entre outros”.
Maria não perde a simplicidade. Nunca virou blasée. Sabe exatamente a importância e a oportunidade de poder conversar com personalidades do mundo artístico. “Acho que ninguém é o artista, mas não dá para fingir que isso não seja importante. No começo, eu sempre fazia a linha de chegar e perguntar: ‘Como vai, tudo bem?” e quando acabava a entrevista: ‘Eu posso te dar um beijo?’ Sempre fui uma tiete”.
EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO
GloboNews - Coberturas (1996-2005)
Prova de fogo
Para Maria Beltrão, o início da profissão foi árduo. A apresentadora custou a acreditar que tinha talento para trabalhar em televisão. A ideia de que não se adaptava ao meio chegou a levá-la a querer sair do canal. “Eu pedi demissão da GloboNews dez vezes em cinco anos, mas Alice-Maria não me deu, graças a Deus”. A certeza de que era uma boa profissional só veio em 2001, quando Maria ancorou a cobertura dos atentados terroristas de 11 de setembro, em Nova York, Estados Unidos. “Esse atentado foi um divisor de águas na minha carreira. Foi o fim dessa pessoa insegura que se julgava uma fraude e questionava todo dia por que estava ali. Fiquei dez horas no ar. Ligaram para mim quando o avião havia batido na primeira torre e achavam que era um acidente. Já fui me maquiando, sentando no estúdio até apresentar o Jornal das Dez com o André Trigueiro. Fiz tradução simultânea do Jacques Chirac, do Bush, ou seja, francês, inglês. Enquanto absorvia o que estava acontecendo, a gente apreendia as informações junto com o telespectador sobre talibãs, Osama Bin Laden. Veio também a questão que me faltava antes, da naturalidade de informar o que eu ainda não sabia, que isso também é importante. Aí, eu falei: ‘Não, agora para com essa historinha de drama e assume que você é boa nisso e tenta melhorar.’ Eu acho que isso me ajudou muito, mas isso é maturidade, é essa noção do serviço, da importância da missão”.
Na Globo
Dois anos depois de estrear na GloboNews, Maria Beltrão foi convidada a apresentar, junto com Renato Machado, o Bom Dia Brasil, na Globo, em período de férias e licença da apresentadora Leilane Neubarth. O convite foi do então diretor de Jornalismo, Evandro Carlos de Andrade. “O Renato se interessou mais pelo meu jeito esquisito, então eu acho que ele tentou convencer o Evandro. Aí, lá vou eu para a Globo. Imagina o tamanho que tinha isso? A maior coisa do mundo, com aquela equipe inteligente.” O período durou alguns anos, até a jornalista passar a se dedicar de corpo e alma somente à GloboNews.
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Queda do avião da TAM
A imprevisibilidade dos telejornais ao vivo também traz surpresas trágicas. Uma delas foi enfrentada por Maria Beltrão em 1996, com a queda do avião da TAM, em São Paulo. A apresentadora foi pega de surpresa com a morte de um parente. Ela estava no estúdio. “A Sandra Annenberg entrou no ar lendo a lista. E ela falou: ‘Ernesto Igel’. Eu falei: ‘É o Ernesto, filho do meu padrinho!, muito próximo da gente’. Era muito inexperiente, e quando colocaram uma matéria no ar, a Alice-Maria entrou no estúdio e falou: ‘Maria, você vai sair do estúdio.’ Não tinha jeito de eu continuar, porque ao mesmo tempo que há uma questão de profissionalismo, a realidade se impõe. A imparcialidade total é impossível porque nós somos pessoinhas nesse universo. Quando você acha que está preparada, pode acontecer alguma coisa e te desestabilizar completamente”.
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Estúdio i
Em 2008, Maria Beltrão viu um desejo se materializar. A jornalista havia conversado, internamente, sobre a possibilidade de apresentar um programa jornalístico informal. Acabou convidada pelo então diretor de Jornalismo, Luiz Cláudio Latgé, para ancorar o Estúdio i. “Ele falou: ‘Ouse, Maria, pode ousar.’ Muitos jornais mudaram depois do Estúdio i, desse modo sem teleprompter, mais informal. Eu não gosto de teleprompter. Eu deixo o texto ali, mas eu dou meu jeito e raramente eu olho para o TP. Claro que às vezes chega notícia nova, mas eu assumo: ‘Peraí, gente, está chegando uma notícia’, aí eu vou lá e leio, mas eu tento fazer quase um bastidor do programa dentro do programa. Acho que no Estúdio i, alcancei essa pessoa aqui, que está conversando com você agora, é a mesma que apresenta. É a minha naturalidade o tempo inteiro”.
'É de Casa'
A jornalista permaneceu no comando do programa jornalístico até junho de 2022, quando passou o bastão para a colega Andréia Sadi. Em 9 de julho daquele ano, migrou para o entretenimento e passou a apresentar o 'É de Casa', nas manhãs de sábado.
Maria Beltrão fala sobre encontro com o Papa Francisco. É de Casa, 27/08/2022
Oscar na Globo
Outra paixão da vida de Maria era participar das transmissões da cerimônia do Oscar na Globo a partir de 2006. Em um estúdio montado no Rio de Janeiro, ela conduzia a transmissão e incita a participação dos comentaristas que a acompanham durante a noite – Artur Xexéo, a partir de 2015; e a atriz Dira Paes, a partir de 2018. O trabalho exigia dedicação: Maria assiste ao maior número de filmes possíveis que disputam os prêmios, toma notas, lia críticas e matérias sobre eles, tinha sempre em mãos dados levantados sobre atores, diretores, roteiristas que participam da premiação. “Ver filme é o de menos, eu sou âncora, tenho que dar informações, passar curiosidades. É mais trabalho de condução, de clima, eu amo de paixão”, comenta.
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