Por Memória Globo, Memória Globo

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Jô Soares foi um artista multifacetado. Sua trajetória acumula experiências como ator em teatro, cinema e televisão, além de dramaturgo, roteirista e diretor. Em seus primeiros anos de carreira, consolidou-se, sobretudo, como comediante, mas logo passou a destacar-se, também, como jornalista e escritor – embora até como artista plástico já tenha se arriscado. Ingressou na Globo em 1970, protagonizando o programa 'Faça Humor, Não Faça Guerra', depois de passagens pelas TVs Continental, Rio, Tupi, Excelsior e Record. Nesse período, atuou em humorísticos como 'Noites Cariocas' e 'Família Trapo'. Em 1981, estreou 'Viva o Gordo', seu próprio programa. Seis anos depois, Jô deixou a Globo para apresentar seu próprio programa, inspirado nos talk-shows americanos, no SBT. De volta à emissora em 2000, comandou por 16 anos o 'Programa do Jô'.

Tudo o que fiz e tudo o que faço sempre tem como base o humor. Desde que nasci, desde sempre.
Entrevista exclusiva do apresentador e humorista Jô Soares ao Memória Globo em 19/11/2002, sobre o início da sua carreira e o posterior ingresso na Globo.

Entrevista exclusiva do apresentador e humorista Jô Soares ao Memória Globo em 19/11/2002, sobre o início da sua carreira e o posterior ingresso na Globo.

Início da carreira

Filho do empresário paraibano Orlando Heitor Soares e de Mercedes Leal Soares, José Eugênio Soares, muda-se com a família aos 12 anos para a Europa. Poliglota, chegou a pensar em seguir a carreira diplomática, mas seu fascínio pelo teatro falou mais alto, ainda nos anos em que estudava na Suíça. “Sempre quando ia ao teatro, assistir a shows, ia para a coxia ver como era. E já inventava números de sátira do cinema americano; fazia a dança com os sapatinhos que eu calçava nos dedos”, conta.

Sua estreia se dá no papel de um americano em 'O Homem do Sputnik', filme de Carlos Manga estrelado por Oscarito, em 1958. No mesmo ano, escrevia para o 'TV Mistério', programa da TV Continental, dirigido por Adolfo Celli, com Paulo Autran e Tônia Carrero no elenco. “Consegui fazer ao mesmo tempo as três emissoras que tinham no Rio”, conta ele que, no ano seguinte, por incentivo do dramaturgo e humorista Silveira Sampaio, foi contratado para a TV Rio, onde atuou no programa Noites cariocas. Também nesta época fez participações na TV Tupi.

Começou a trabalhar na TV Record, em 1961, em São Paulo. Além de escrever o 'Simonetti Show', atuava em programas como o 'La Reuve Chic', 'Jô Show', 'Quadra de Azes' (ao lado de Zilda Cardoso, Darlene Everson e Cauby Peixoto), 'Show do Dia 7' e 'Você é o Detetive'. Jô Soares também interpretou o mordomo de 'A Família Trapo', seriado que escrevia com Carlos Alberto de Nóbrega.

Entrada na Globo

Com Renato Cortes Real, protagonizou, a partir de 1970, o 'Faça Humor, Não Faça a Guerra', sua estreia na Globo. A dupla também escrevia o programa, ao lado de Max Nunes, Geraldo Alves, Hugo Bidet e Haroldo Barbosa. Nele, interpretou tipos como Norminha e Padre Thomas. “Era um formato totalmente diferente. Era de quadros, mas quadros curtos, alinhavado por piadas e por dança, com músicas da época. Tinha quadros que as pessoas lembram até hoje. O Faça humor ficou quase quatro anos no ar”, comenta. E completa: “A gente criava uma média de vinte e tantos personagens por ano!”.

'O Faça Humor, Não Faça a Guerra' foi substituído por 'Satiricom', em 1973. Três anos depois, o humorista atuou como ator e redator, novamente com Max Nunes e Haroldo Barbosa em outro grande sucesso da Globo, o 'Planeta dos Homens', que ficou no ar até 1982. Jô Soares dividia a cena com grandes nomes do humor, como Agildo Ribeiro, Paulo Silvino, Luís Delfino, Sonia Mamede, Berta Loran, Costinha, Eliezer Motta e Carlos Leite.

“Tinha sempre um macaco [Orival Pessini] que falava coisas da maior sabedoria, e eu respondia: ‘O macaco tá certo!’, um bordão que acabou ficando marcadíssimo”. O comediante criou para o programa personagens como o Dr. Sardinha (inspirado no economista Delfim Netto, então ministro da Agricultura); Sebá, cognome Pierre, o último exilado em Paris; e o argentino Gardelón, famoso pelo bordão “Muy amigo!”.

Jô Soares deixou a equipe de 'Planeta dos Homens' em 1981 para se dedicar a seu próprio programa, o 'Viva o Gordo', escrito por Max Nunes, Hilton Marques, Afonso Brandão e José Mauro, que foi exibido até 1987. O título veio do show 'Viva o Gordo' e 'Abaixo o Regime!', um grande sucesso do teatro no qual o humorista fazia críticas veladas à ditadura. Entre os tipos marcantes que viveu nessa época, estão o Reizinho, sempre às voltas com os problemas do reino, uma sátira à situação política do país; o Capitão Gay, super-herói homossexual que usava um uniforme cor de rosa e andava sempre acompanhado de seu ajudante Carlos Sueli (Eliezer Motta); e o Zé da Galera, que ligava para o técnico da seleção brasileira de futebol e pedia “Bota ponta, Telê!”.

O meu humor tem sempre um fundo político, sempre tem uma observação do cotidiano do Brasil. Os meus personagens são muito mais baseados no lado psicológico e no social do que na caricatura pura e simples. Eu nunca fiz um personagem necessariamente gordo. Eles são gordos porque eu sou gordo.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Webdoc sobre o programa Viva o Gordo com entrevistas exclusivas do Memória Globo.

Webdoc sobre o programa Viva o Gordo com entrevistas exclusivas do Memória Globo.

Viva o Gordo: Capitão Gay

Viva o Gordo: Capitão Gay

Frases no ar: Zé da Galera (Jô Soares)

Frases no ar: Zé da Galera (Jô Soares)

Simultaneamente ao trabalho no 'Viva o Gordo', Jô Soares apresentava um quadro no Jornal da Globo e, em 1983, fez uma participação especial no musical infantil 'Plunct, Plact, Zuuum'. Em 1987, ele deixou a Globo e foi trabalhar no SBT, onde estrelou o humorístico 'Veja o Gordo' e realizou um sonho que acalentava há anos: apresentar um programa de entrevistas inspirado nos talk-shows americanos, o 'Jô Soares Onze e Meia'. “Não foi uma mudança radical, mas uma continuação do meu trabalho de humor e também de jornalismo. Trabalhei no jornal Última Hora durante quatro anos, escrevi na Folha de S. Paulo e na revista Veja. E tem um lado de entrevista irreverente que só eu posso fazer, com os políticos”, diz.

Durante os 11 anos em que o programa ficou no ar, fez mais de seis mil entrevistas, com grandes personalidades brasileiras e internacionais – como o ex-presidente da União Soviética Mikhail Gorbachev e Bill Gates, fundador da Microsoft – e figuras anônimas. E durante o processo do impeachment do presidente Fernando Collor, o 'Jô Soares Onze e Meia' funcionou como uma espécie de tribuna popular, com o apresentador entrevistando alguns dos principais implicados e testemunhas do caso.

Programa do Jô

Em 2000, o humorista voltou à Globo, comandando o Programa do Jô, um talk-show na mesma linha do Jô Soares Onze e Meia. “Voltei pela possibilidade de fazer mais entrevistas internacionais, pelas facilidades de gravação, pelo apoio do jornalismo”, lembra. A atração ficou 16 anos no ar.

O programa contava com a participação do Sexteto, grupo formado pelos músicos Derico (sax), Bira (baixo), Miltinho (bateria), Tomatti (guitarra), Chico Oliveira (trompete) e o maestro Osmar (teclados), além do garçom Alex. “As brincadeiras com eles foram surgindo à medida em que o programa foi se desenvolvendo. Então, comecei a criar um personagem para cada um deles: Derico é o que sabe tudo; o Bira, tem aquela gargalhada que é um presente”.

Durante os Jogos Olímpicos de 2000, o Programa do Jô foi transmitido direto de Sydney, na Austrália. O trabalho diário é árduo. “Recebemos cerca de 800 sugestões de pauta por semana e mais de 2.500 e-mails por dia. Alguns mandam e-mail dizendo: ‘Tem um vizinho meu que toca trombone’. As assessorias enviam material também, e procuramos equilibrar, para ter um pouco de tudo. Nós temos uma equipe pequena para o que fazemos”.

Em agosto de 2008, Jô Soares comemorou 20 anos de talk show com entrevistados especiais. Um dos destaques foi a conversa com Caetano Veloso, que ainda cantou alguns de seus sucessos. Também foi exibida uma edição com as melhores entrevistas feitas com anônimos: até aquele momento, cerca de 490 mil pessoas haviam participado da plateia dos programas, mais de 4 mil musicais foram apresentados e, aproximadamente, 4 milhões de e-mails recebidos pela produção.

Dois anos depois, em homenagem aos 10 anos de programa, Jô Soares comandou um especial com a nova geração do humor brasileiro. Em uma mesa redonda, ele recebeu Leandro Hassum, Marcelo Adnet, Bruno Mazzeo, Dani Calabresa, Dadá Coelho e Flávia Garrafa. Outra conversa marcante em sua trajetória na Globo foi com o cantor Roberto Carlos. Em uma rara entrevista, o Rei falou sobre suas manias. E cantou uma das músicas preferidas do humorista: Estrada de Santos. A entrevista foi exibida em setembro de 2011.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Webdoc sobre o Programa do Jô com entrevista exclusiva de Jô Soares ao Memória Globo.

Webdoc sobre o Programa do Jô com entrevista exclusiva de Jô Soares ao Memória Globo.

Publicações

Como jornalista, escreveu durante a década de 1980 para a revista Manchete, para o jornal O Globo e para a Folha de S. Paulo. Entre 1989 e 1996, foi colaborador da revista Veja. Em 1983, lançou o seu primeiro livro, O Astronauta sem Regime, uma coletânea de crônicas publicadas no jornal O Globo.

Com o romance O Xangô de Baker Street (1995), entrou para a lista dos mais vendidos. O livro, que virou filme dirigido por Miguel Faria Jr. em 2001, já foi traduzido para uma dezena de línguas. Também é autor de O Homem que Matou Getúlio Vargas (1998), Assassinatos na Academia de Letras (2005) e As Esganadas (2011).

Em dezembro de 2017, Jô Soares lançou o primeiro volume de sua biografia O Livro de Jô – Uma autobiografia desautorizada. O volume 2 foi publicado no ano seguinte.

Na entrevista exclusiva no programa Conversa Com Bial, o humorista falou do filho Rafael, morto em 31 de outubro de 2014.

Na entrevista exclusiva no programa Conversa Com Bial, o humorista falou do filho Rafael, morto em 31 de outubro de 2014.

Teatro

No teatro, estreou como ator em 1959, em O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. Ao longo da carreira, atuou em montagens importantes como Oscar (1961), de Claude Magnier, ao lado de Cacilda Becker e Walmor Chagas. Como diretor, assinou as montagens de Soraia, Posto 2 (1960), de Pedro Bloch; Os Sete Gatinhos (1961), de Nelson Rodrigues; O Estranho Casal (1967), de Neil Simon, com Lima Duarte e Francisco Milani; Romeu e Julieta (1969), de William Shakespeare, com Regina Duarte; Brasil da Censura à Abertura (1980), de Sebastião Nery; Frankenstein (2002), de Eduardo Manet; Ricardo III(2006), outra de Shakespeare, pela qual ganhou Prêmio Qualidade Brasil; e Às Favas com os Escrúpulos (2007), de Juca de Oliveira.

One man show

Também estrelou espetáculos de humor ao estilo one man show, entre eles Ame um Gordo Antes que Acabe (1976), Viva o Gordo e Abaixo o Regime! (1978), Um Gordoidão no País da Inflação (1983), O Gordo ao Vivo (1988), Um Gordo em Concerto (1994) e Na Mira do Gordo (2007). Em 2007, realizou uma apresentação solo declamando poemas de Fernando Pessoa, Remix em Pessoa.

Cinema

Jô Soares chegou a dirigir um filme, O Pai do Povo, em 1976, e atuou em clássicos como Hitler III Mundo (1968), de José Agrippino de Paula, e A Mulher de Todos (1969), de Rogério Sganzerla.

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Jô Soares morreu em 05 de agosto de 2022, aos 84 anos. Estava internado desde 25 de julho no Hospital Sírio-Libanês, na região central de São Paulo.

Fontes

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