Por Memória Globo

Fabricio Mota/ Memória Globo

Giorgio De Luca conseguiu o primeiro emprego como montador na TV Educativa, do Rio, trabalho que acumulava com a montagem de documentários e curtas-metragens. Como tinha intenção de deixar a TVE e queria manter um emprego fixo, aproveitou o surgimento de uma vaga na Globo, em 1977, fez um teste e passou, com destaque. Premiado internamente diversas vezes pela edição de reportagens, quadros e séries, participou de forma decisiva das mudanças técnicas e editoriais que permitiram ao 'Fantástico' construir uma relação de proximidade com seu público, ao longo de décadas.

“O 'Fantástico' foi evoluindo na maneira de contar as histórias, de apresentar o programa. A notícia tem uma velocidade tremenda em função da internet. Tentamos mostrar, no domingo, algo que não tenha sido registrado em lugar nenhum”

Na Globo, Giorgio De Luca logo ficou conhecido como Parola, por ser questionador e ter ascendência italiana. O pai, Cesare de Luca, era um engenheiro químico calabrês apaixonado por cinema e fotografia; a mãe, Cristina Trimeloni de Luca, natural de Milão, montou um salão de beleza quando veio para o Brasil.

Parola tornou-se logo editor e, em 2009, produtor executivo. Lidou com mudanças decisivas, como o uso do videoteipe no lugar dos filmes, e trabalhou em reportagens marcantes, entre as quais a sobre o menino que vivia em uma bolha nos Estados Unidos e as chacinas da Candelária e de Vigário Geral, além do premiado documentário 'Falcão – Meninos do Tráfico' e de séries com Dráuzio Varella.

Giorgio de Luca no dia de seu depoimento ao Memória Globo, em 2018 — Foto: Fabricio Mota/ Memória Globo

Durante quase 20 anos, Parola conciliou as atividades na TVE e na Globo, até se desligar definitivamente da emissora estatal, em 1996. Quando começou a atuar no 'Fantástico', ele tinha a tarefa de montar, de sexta para sábado, o material que seria exibido no domingo, em um tempo em que ainda se usava filme, o som era separado da imagem e havia necessidade de sincronizá-los. “Os editores na época – Jorge Segundo, Macedo Miranda, Maurício Tavares e Edson Resende – faziam os textos. Quando eu cheguei aqui, o processo era o de documentário mesmo. Eles separavam as sonoras e a gente montava as imagens, sem off, depois eles assistiam. O Gilberto Lima e o Dirceu Rabelo faziam toda a parte de locução”, explica.

O programa trazia um resumo dos assuntos da semana, as novidades do próprio domingo, uma extensa matéria de fechamento, quadros e musicais. Uma reportagem que o marcou, nesse início na empresa, foi feita por Helio Costa nos Estados Unidos, com grande repercussão, tanto que é lembrada até hoje. A história do garoto que vivia isolado numa bolha porque tinha baixa imunidade. Acabou virando filme.

Sua carreira na emissora transcorreria, a partir daí, no 'Fantástico', com apenas uma exceção: os trabalhos em especiais de música. Em 1983, ele montou o clipe de Eduardo Dusek para o sucesso 'Cantando no Banheiro', exibido no programa, o que lhe rendeu convite para participar de outras atrações, como o Rock In Rio e o Momento do Rock.

Mudanças tecnológicas

A passagem do filme para o videoteipe (VT), na década de 1980, trouxe num primeiro momento ganhos de tempo, mas também perda de qualidade, segundo Giorgio De Luca.

“No VT você não manipula, só aperta botão. Eu fiz um curso e achei aquilo uma brincadeira. Aí veio o U-Matic, eu peguei o processo do cinema e passei para o U-Matic. Só que o U-Matic não tem aquela qualidade e profundidade, você vê uma imagem empastelada, sem definição de foco.”

Giorgio de Luca dá seu depoimento ao Memória Globo, em 2018 — Foto: Fabricio Mota/Memoria Globo

Sua preferência pessoal por filmes foi responsável, ainda que de forma indireta, pela criação de um quadro fixo do programa. O então diretor José Itamar de Freitas viu a montagem que Parola fez de um filme que ele gravou com a namorada e aproveitou a ideia para lançar, em 1984, 'A Garota do Fantástico', quadro que ficou famoso por mostrar mulheres bonitas de biquíni, aos domingos.

Nessa época, Parola já era oficialmente editor, cargo para o qual foi promovido em 1983. Na função, editou matérias de impacto, como a denúncia sobre a forma com que eram tratados os doentes mentais da colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro e a exploração de ouro em Serra Pelada, que levou milhares de homens ao Pará em busca de riqueza.

Fantástico: O Garimpo em Serra Pelada (07/09/1980)

Fantástico: O Garimpo em Serra Pelada (07/09/1980)

Novidades dos anos 90

Durante a década de 1990, o 'Fantástico' passou por um rodízio de apresentadores, que teve uma alteração de perfil com a chegada de Evandro Carlos de Andrade à direção de Jornalismo. A partir daí, os apresentadores passaram a ser, obrigatoriamente, jornalistas. Houve também, em 1993, uma mudança no comando do programa, quando Luiz Nascimento tornou-se diretor do Fantástico. “O Luizinho diminuiu o tamanho das matérias, que ficaram mais curtas e com muita participação da arte. Ele dividiu bem o programa, não havia mais musicais, quando havia um musical internacional eu cortava o clipe para um minuto e meio. Ele assistia a todas as matérias do 'Fantástico' quando entrou, eu trabalhava a seu lado. O Luizinho dizia: “Vou mudar essa matéria, vou cortar aqui”, e eu fazia todas as modificações”, relembra.

Coberturas marcantes

Algumas coberturas levaram a significativas mudanças de planejamento em cima da hora e colocaram os profissionais à prova: as mortes de Ayrton Senna, em 1994, e da princesa Diana, em 1997. No caso da Lady Di, a informação chegou de madrugada e a equipe virou a noite para adaptar o programa. O acidente de Senna ocorreu no domingo de manhã, movimentou a Redação inteira e foi o destaque do Fantástico ao longo da edição.

A intensificação do acesso à internet, a partir dos anos 2000, trouxe para o programa um desafio a mais: buscar notícias exclusivas e ângulos novos nesse ambiente de troca intensa de informações. No caso mais emblemático daqueles anos, o atentado às torres gêmeas, em 2001, Parola e o jornalista Luiz Petry optaram por fazer a abertura do programa reconstruindo os acontecimentos apenas com áudios e imagens, sem a participação de repórteres, usando a narração feita por um médico que se escondeu atrás de um carro, durante a queda dos prédios.

Em 2006, Parola e outros dois editores decuparam 121 fitas recebidas da Central Única de Favelas (CUFA), do Rio de Janeiro, para que o documentário 'Falcão – Meninos do Tráfico' pudesse ser exibido no 'Fantástico'. A edição final, feita por ele, teve 58 minutos e foi apresentada em três blocos, algo inédito no programa.

35 anos em 15 segundos - Falcão, Meninos do Tráfico

35 anos em 15 segundos - Falcão, Meninos do Tráfico

Outro trabalho de edição destacado por Parola, na época, teve o médico Drauzio Varella como protagonista, em uma série sobre envelhecimento.

“'Tempo, Dono da Vida' foi toda pontuada por um relógio, a gente fez um boneco, ideia da Eugenia Moreyra. Ela colocou o boneco no terraço, com uma câmera. Enquanto o boneco enferrujava, nós gravávamos. A gente acelerou isso depois, ficou bonito.”

'Fantástico': Série 'Tempo, dono da vida' (2007)

'Fantástico': Série 'Tempo, dono da vida' (2007)

Prêmios

Tanto 'Falcão – Meninos do Tráfico', de 2006, quanto 'Tempo, Dono da Vida', de 2006 e 2007, renderam prêmios internos a Parola. Ele já havia recebido prêmios antes, como em 2004, pela edição da reportagem 'Queimada Aeronáutica', que mostrava a incineração de documentos da época da ditadura militar em uma base da Aeronáutica da Bahia. Em 2008, voltou a ter o talento reconhecido, pelo trabalho no caso Isabella Nardoni; em 2009, ganhou com 'Transplante, o Dom da Vida'; e em 2011, novamente, com 'Fantástico Steve Jobs'.

Fantástico: Série "Transplante, o Dom da Vida" (2009)

Fantástico: Série "Transplante, o Dom da Vida" (2009)

Quando recebeu as duas últimas premiações, Parola já havia sido promovido a produtor executivo. Nessa condição, acompanhou as mudanças no 'Fantástico' na última década, como as que ocorreram em 2014, com a incorporação da Redação ao cenário. “Com o novo formato, eu fiquei com a parte de acabamento do programa, que são os telões, as chamadas de programação, as chamadas de novela e a abertura, por exemplo. Continuo gravando as chamadas, com o Tadeu Schmidt e a Poliana Abritta”, afirmou à época de seu depoimento ao Memória Globo, em 2018.

FONTE:

Depoimento de Giorgio De Luca ao Memória Globo em 24/04/2018.
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