Por Memória Globo, Memória Globo

Bob Paulino/Memória Globo

Para Fernando da Silva Gueiros, filho de um administrador de empresas e de uma dona de casa, televisão é uma paixão de infância e uma eterna companheira, pura fascinação. Ainda garoto, morava no Leblon, na zona sul do Rio, a dois quarteirões da antiga TV Excelsior, onde podia ver os artistas de perto e participar com o irmão mais velho dos programas de auditório como plateia. Um dos amigos do irmão era câmera da Globo – “era uma espécie de herói para mim”. No estúdio da Excelsior, sentado na plateia, se via operando aquele equipamento fantástico com os fones no ouvido.

Até hoje, quando entro num estúdio e vejo a luz, as cores, fico fascinado.

Fernando Gueiros nos bastidores do debate dos candidatos à Prefeitura de São Paulo em 2012. — Foto: Bob Paulino/Globo

Início da carreira

Em 1965, foi morar com os pais em Los Angeles, nos EUA, e garante que aprendeu inglês vendo televisão. “Chegava do colégio às 15h, pegava um pacote de biscoito, ligava a televisão e assistia direto”, lembra. No mesmo prédio, morava Burt Ward, o Robin, companheiro de Batman no seriado de televisão: “Eu descia com ele no elevador. As coisas de televisão estavam sempre por perto de mim”, recorda. Para ele, o mais importante para fazer televisão é saber ver televisão, saber ser um bom telespectador. Seu primeiro contato com uma câmera foi com a Super-8 do pai. “Um belo dia, em 1977, no meu primeiro ano na faculdade de arquitetura Gama Filho, resolvi brincar com aquela câmera. Eu fazia coisas bacaninhas, modéstia à parte. Cheguei até a ganhar dinheiro fazendo festa de casamento e batizado. Comprei meu primeiro videocassete assim”, revela. Enquanto seus colegas de faculdade procuravam estágio em arquitetura, pegou o catálogo telefônico e ligou para a TV Tupi. “A pessoa que me atendeu foi muito gentil. Eu disse: meu nome é Fernando Gueiros. Eu tenho muita vontade de trabalhar em televisão, mas não tenho o menor contato. Como eu faço para conseguir um estágio? ‘Gueiros?’, perguntou a pessoa do outro lado da linha. Por coincidência, ela conhecia um primo meu e me convidou para aparecer por lá”, conta. Fernando Gueiros começou a acompanhar as equipes de reportagem da TV Tupi. “Eu ia com minha malinha de Super-8. Deve ser um dos primeiros making of da história, porque eu filmava a equipe da Tupi filmando”, brinca. Ficou amigo dos porteiros e teve acesso ao estúdio. Conheceu o Peteca, assistente de estúdio, que o apresentou ao Bira, chefe dos câmeras, e chegou a operar câmera ao vivo na TV Tupi.

Para atender à expectativa do pai e porque não surgiu uma oportunidade, deixou a televisão de lado e voltou para a faculdade. Formou-se em arquitetura, conseguiu um estágio e a televisão sumiu da sua vida ou pareceu ser assim. Em 1982, aos 26 anos, trabalhando como arquiteto num shopping da Barra da Tijuca, no Rio, encontrou uma amiga de infância almoçando numa churrascaria. “Minha vida em televisão começa a partir desse encontro”, conta. “Solteiro, ganhando meu dinheirinho, estou lá na prancheta normografando letrinha – ainda havia prancheta, normógrafo e papel vegetal – e ela aparece. Botei um capacete em mim, outro nela, e a gente foi circular pela obra no shopping. Na saída, ela me contou que o pai ia ser diretor da futura TV Manchete. E me perguntou se eu queria trabalhar em televisão. Claro que eu queria! Passado um tempo, ela me ligou: ‘Falei com meu pai e ele disse para você aparecer lá.’ Lá fui eu para o prédio da Manchete”, lembra.

Foi muito bem recebido. “Ele disse que a única vaga que tinha era de assistente de produção, ofereceu um salário que era a metade do que eu ganhava como arquiteto iniciante e disse: 'se você topar, vamos lá. A partir de agora é você que faz a sua carreira, vai depender de você'”, recorda. Para Gueiros, aquilo soou como um voto de confiança. A Manchete ia estrear em junho de 1983. Antes do Carnaval, recebeu um telegrama do departamento de pessoal e começou a trabalhar. Tinha 27 anos. Seu primeiro trabalho foi fazer o show de estreia da Manchete. Fazia de tudo, não recusava trabalho.

De assistente de produção, passou a coordenador de edição, editando os 24 programas da série 'Bar Academia', cada um deles dedicado a um grande nome da música popular brasileira, como Chico Buarque, Tom Jobim, Paulinho da Viola, Milton Nascimento, Edu Lobo e Jorge Ben, entre agosto de 1983 a agosto de 1984. Com o fim do 'Bar Academia', foi convidado a editar o 'Manchete Documento', um programa de jornalismo, e ganhou uma encomenda, um especial sobre os 20 anos de carreira de Maria Bethânia. O resultado agradou: “Ficou muito bom, rapaz, você conseguiu tirar leite de pedra”, disse seu chefe.

Em agosto de 1986, ainda trabalhando na TV Manchete, passou a ser diretor do 'Programa de Domingo', concorrente direto do 'Fantástico', da Globo. Já era um profissional de televisão em jornalismo. “Ali eu aprendi. A Manchete foi uma superescola”, reconhece.

Primeira experiência na Globo

No final de 1987, sob forte estresse, por conta de um especial sobre o Dia da Criança que não agradou à direção de emissora, deixou a Manchete. No início do ano seguinte, foi contratado pela Globo como diretor de segmento no 'Globo Repórter' e tornou-se coordenador-geral de produção. Seu primeiro programa, sobre assalto a banco, teve grande audiência. Sucesso absoluto. Até hoje guarda um exemplar do jornal 'O Globo' que creditava: “Direção de Fernando Gueiros”. Deixou o 'Globo Repórter' no quarto programa, designado para coordenar a cobertura das eleições de 1989.

Fernando Gueiros em entrevista ao Memória Globo, 2011 — Foto: Bob Paulino/Memória Globo

Após uma breve passagem pelo jornalismo, começou a trabalhar na CGP (Central Globo de Produção), como assistente de direção. Passou algum tempo no 'Vídeo Show'. Participou do primeiro especial de fim de ano do programa, que ainda não era diário. No início dos anos 1990, trabalhou na minissérie 'A, E, I, O… Urca'. Sua missão era recriar o Cassino da Urca, onde o programa foi gravado: “A Globo entrou e fez aquilo de novo voltar à vida”, recorda. Foi produtor executivo do 'Programa Legal' em 1991 e editor executivo do 'Fantástico' em 1992.

Depois de dirigir o programa 'Concertos Internacionais', recebeu uma proposta da Manchete para ser diretor artístico da emissora – que já não era mais a mesma. A aventura durou três meses. Em 1995, foi convidado para ocupar o cargo de diretor de programações de canais do Multicanal. “Foi um período muito bom”, relembra, “íamos para os EUA e para a Europa buscar novos produtos”. Em seguida, passou a dirigir o TV UD, do canal de compras Shoptime. O primeiro produto foi a pipoqueira Proctor Silex. “Até isso eu fiz”, comenta, bem-humorado. 

Em 1996, quando estava indo trocar um silencioso do carro em Botafogo, no Rio, recebeu uma mensagem para ligar urgente para São Paulo. Era um convite para ser gerente de operações da Globo em São Paulo. Aceitou o novo desafio. “Tive que aprender do zero, literalmente, o que eram as coberturas especiais”, comenta. No primeiro mês à frente da área de Operações, acompanhou um acontecimento trágico: a queda do Fokker 100 da TAM, após decolar do aeroporto de Congonhas, em São Paulo, na manhã do dia 31 de outubro de 1996. “A decisão do Jornalismo foi a realização de uma ancoragem a partir do local do acidente. Carlos Nascimento e Chico Pinheiro foram escalados para fazer entradas ao vivo, direto do bairro do Jabaquara, na rua em que o avião tinha destruído várias casas e feito vítimas fatais", recorda.

Permaneceu no cargo de gerente de operações por dez meses, até receber uma proposta da TVA, onde não ficou por muito tempo. De lá, saiu para a Globosat, no Rio. Fazia também a programação que passava nos aviões da Varig, um mix da Globosat, e também a do GNT Portugal, na qual sugeriu incluir novelas, fazendo com que a emissora passasse a ser o primeiro canal em audiência de TV fechada em Portugal.

Em 1999, recebeu novo convite para reassumir o cargo de gerente de operações em São Paulo. Nessa segunda fase, foi responsável por eventos marcantes, como o programa 'No Limite 2', a apresentação do U2 no 'Fantástico', os ataques de uma facção criminosa em São Paulo, a 'Caravana JN', a visita do papa Bento XVI ao Brasil, a 'Santa Missa' com o padre Marcelo Rossi e o programa 'Bem Estar'.

Uma das coberturas marcantes foi o incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em janeiro de 2013, que deixou 242 mortos e 382 feridos. “Tudo começou no domingo à tarde, dia 27 de janeiro. Voei para o Rio, onde me juntei a Ana Luiza Guimarães e Sandra Annenberg, que apresentariam o 'Bom Dia Brasil' e o 'Jornal Hoje', respectivamente, além de William Bonner e o editor Gustavo Gomes. Embarcamos em um jatinho fretado, seguindo direto, sem escalas, rumo a Santa Maria”, recorda. Gueiros lembra do trabalho de montar o set para a ancoragem em frente ao local do incêndio: “No caso do 'Jornal Nacional' em Santa Maria, o set foi montado no nível da rua. Fomos a única emissora a posicionar nosso âncora bem de frente para a fachada da boate, em um ponto exclusivo, coberto e resguardado. O Bonner ficou com a fachada da Kiss ao fundo. Foi uma negociação difícil, mas conseguimos o enquadramento exclusivo que buscava – daí essa imagem me valer como um troféu, operacionalmente falando”, comenta.

No mesmo ano, Fernando Gueiros participou das coberturas do conclave para a eleição do Papa Francisco, realizado no Vaticano, em março de 2013, e a visita do pontífice ao Rio de Janeiro, durante a Jornada Mundial da Juventude, em julho. “Na cobertura do conclave no Vaticano, conseguimos uma negociação com uma empresa de radiodifusão europeia, a Eurovision/EBU, para a cessão de um espaço no terraço do prédio onde operam, que tem a Basílica de São Pedro ao fundo. Assim, foi possível contar com toda a infraestrutura de apoio disponível, como energia elétrica, por exemplo, o que dispensava a contratação de um gerador”, relembra.

Queda de novo avião da TAM

Dia 17 de julho de 2007. À noite, em meio à chuva, um avião da TAM tentou um pouso no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, saiu da pista, passou por cima de uma avenida cheia de veículos, bateu num prédio do outro lado e explodiu. Fernando Gueiros, gerente de operações da Globo, em seu primeiro dia de férias, estava fazendo compras num shopping center e percebeu o burburinho das pessoas em volta falando ao celular: “Caiu? É mesmo? Morreu? A TAM? Avião? Bateu no prédio?” Resolveu pegar seu carro sem saber se ia para casa ou para a emissora, até ver o acidente na tela da TV, na cabine do ponto de táxi: “Vou para a emissora”, decidiu. Chegou em meio a uma reunião em que se discutia como ancorar o 'Jornal Nacional' no dia seguinte em São Paulo. Ficou na porta da sala, timidamente, calado. Raymundo Barros, então diretor de Tecnologia, que atendia ao Jornalismo em São Paulo, olhou para a porta e falou: “Gueiros, você tem experiência em arranjar locais para esse tipo de ancoragem. Descobre aí um local”, conta. Gueiros pegou o computador – “até hoje tenho a cópia da impressão” – abriu o Google Maps, achou o aeroporto de Congonhas e analisou as condições em volta. Vestiu um casaco de náilon escrito “TV Globo a serviço”, pediu um carro, deu as instruções ao motorista, Wanderley Mesquita, que driblou os bloqueios e o levou a um flat ao lado de Congonhas. O gerente do flat foi solícito e chamou um funcionário para mostrar a cobertura – Gueiros sempre com sua camerazinha à mão. Havia dois salões ligados por um corredor com um janelão. A 100 metros, o avião pegando fogo com os bombeiros ainda em volta. Eram 22h. “Tivemos que subir toda a nossa estrutura técnica até o 11º andar do prédio. Foram cerca de duzentos metros de cabos, equipamentos de iluminação, a antena de micro-ondas para geração de um segundo sinal de transmissão, três câmeras, monitores de vídeo, estrutura de áudio, sistema de comunicação e aparelhos de telefone, além da instalação de dois terminais de computadores, com uma impressora”, lembra. No dia seguinte, no final da tarde, estava tudo pronto. Foram duas ancoragens, nos dois dias seguintes a um dos piores acidentes da história da aviação brasileira.

Fernando Gueiros foi promovido a diretor de Produção e Eventos Especiais de Jornalismo no dia 8 de maio de 2014.

Fernando Gueiros deixou a emissora em abril de 2023.

FONTES:

Entrevistas concedidas ao Memória Globo por Fernando Gueiros em 11/5/2011, 7/6/2011 e 20/7/2011
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